Zumbi dos Palmares

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Zumbi dos Palmares – História do Brasil

Nascimento: 1655, União dos Palmares, Alagoas.

Morte: 20 de novembro de 1695, Serra Dois Irmãos.

Zumbi dos Palmares nasceu livre na região de Palmares do Brasil no ano de 1655, o último dos líderes militares da palavra Quilombo (kimbundo: ” Kilombo “, da língua do Norte Mbundu Bantu em Angola, que significa “Guerreiros da Aldeia ou liquidação” ) de Palmares.

Quilombo dos Palmares era uma sociedade livre, uma antiga república sul-americana, que incluía o Estado costeiro brasileiro atual de Alagoas, Brasil.

Hoje, Zumbi é conhecido como um dos grandes líderes históricos do Brasil.

Zumbi dos Palmares – Morte

Zumbi dos Palmares, cuja morte, em 20 de novembro de 1695, motiva a celebração, amanhã, em todo o país, do Dia da Consciência Negra, foi um dos líderes do Quilombo dos Palmares, o mais conhecido núcleo de resistência negra à escravidão no país.

Segundo cronologia publicada na página da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), órgão ligado à Presidência da República, Palmares surgiu a partir da reunião de negros fugidos da escravidão nos engenhos de açúcar da Zona da Mata nordestina, em torno do ano de 1600.

Eles se estabeleceram na Serra da Barriga, onde hoje é o município de União dos Palmares (AL). Ali, devido às condições de difícil acesso, puderam organizar-se em uma comunidade que, estima-se, chegou a reunir mais de 30 mil pessoas

Muitos dos quilombolas eram índios e brancos pobres, como conta texto na página da internet da Fundação Joaquim Nabuco, outro órgão federal, com sede em Recife.

Nabuco foi expoente do movimento abolicionista. “A vida de Zumbi, o rei do Quilombo dos Palmares, é pouco conhecida e envolta em mitos e discussões”, alerta o texto – vários dos trechos abaixo, portanto, são objeto de polêmicas entre os historiadores.

Ao longo do século 17, Palmares resistiu a investidas militares dos portugueses e de holandeses – que dominaram parte do Nordeste de 1630 a 1654. Segundo o historiador Pedro Paulo Funari, no artigo “A República de Palmares e a Arqueologia da Serra da Barriga”, em 1644, um ataque holandês vitimou 100 pessoas e aprisionou 31, de um total de 6 mil que viviam no quilombo.

Funari também afirma que o quilombo (termo derivado de língua da região de Angola) era chamado pelos portugueses de República dos Palmares, nos documentos da época, e termos como mocambo foram posteriormente utilizados no sentido pejorativo.

O quilombo era composto por várias aldeias, de nomes africanos, como Aqualtene, Dombrabanga, Zumbi e Andalaquituche, indígenas, como Subupira, ou Tabocas, e portugueses, como Amaro. A capital era Macacos, termo de origem incerta (pode ser português ou corrutela do banto macoco).

Zumbi nasceu livre, em Palmares, provavelmente em 1655, e, segundo historiadores, seria descendente do povo imbamgala ou jaga, de Angola. Ainda na infância, durante uma das tentativas de destruição do quilombo, ele foi raptado por soldados portugueses e teria sido dado ao padre Antonio Melo, de Porto Calvo (hoje, em Alagoas), que o batizou de Francisco e ensinou-lhe português e latim. Aos dez anos tornou-o seu coroinha.

Com 15 anos, Francisco foge, retorna a Palmares e adota o nome de Zumbi – termo de significado incerto. O nome de Zumbi apareceu pela primeira vez em 1673, em relatos portugueses sobre a expedição chefiada por Jácome Bezerra, que foi desbaratada pelos quilombolas.

Aos 20 anos, Zumbi destacou-se na luta contra os militares comandados pelo português Manuel Lopes. Nesses combates, chegou a ser ferido com um tiro na perna.

Em 1678, o governador de Pernambuco, Pedro de Almeida, propõe a Palmares anistia e liberdade a todos os quilombolas. Segundo o historiador Edison Carneiro, autor do livro “O Quilombo dos Palmares”, ao longo dos quase 100 anos de resistência dos palmarinos, foram inúmeras as ofertas como essa.

Ganga Zumba (possivelmente um título – nganga significa sacerdote, e nzumbi “possui conotações militares e religiosas”, segundo Funari), então líder de Palmares, concorda com a trégua, enquanto Zumbi é contra, por argumentar que o acordo favoreceria a continuidade do regime de escravidão praticado nos engenhos. Zumbi vence a disputa, é aclamado líder pelos que discordavam do acordo e, aos 25 anos, torna-se líder do quilombo.

Ao longo da vida, Zumbi teria tido pelo menos cinco filhos. Uma das versões diz que ele teria se casado com uma branca, chamada Maria. Ao longo de seu reinado, Zumbi passou a comandar a resistência aos constantes ataques portugueses.

Em 1692, o bandeirante paulista Domingo Jorge Velho, uma espécie de mercenário da época, comandou um ataque a Palmares e teve suas tropas arrasadas. O quilombo foi sitiado e só capitulou em 6 de fevereiro de 1694, quando os portugueses invadem o principal núcleo de resistência, a Aldeia do Macaco.

Ferido, Zumbi foge. Baleado, ele teria caído de um desfiladeiro, o que deu origem à história de que teira se suicidado para evitar a prisão. Resistiu na mata por mais de um ano, atacando aldeias portuguesas. Em 20 de novembro do ano seguinte, depois de ser traído por um antigo companheiro, Antonio Soares, Zumbi é localizado pelas tropas portuguesas.

Preso, Zumbi é morto, esquartejado, e sua cabeça é levada a Olinda para ser exposta publicamente.

Entre outros objetivos, o de acabar com os boatos que corriam entre os negros escravizados do litoral de que o líder quilombola era imortal.

Zumbi dos Palmares – Vida

Zumbi dos PalmaresZumbi dos Palmares

Zumbi foi um escravo afro-brasileira e um dos mais famosos líderes dos Palmares.

Zumbi foi o último dos líderes do Quilombo dos Palmares, no estado atual de Alagoas, Brasil.

Criado pelo padre Antônio Melo, aos 15 anos foge para Palmares e adota o nome Zumbi, que significa guerreiro. Logo ascende ao comando militar do quilombo, governado então por Ganga Zumba.

Em 1678, renega um acordo com as autoridades coloniais e provoca uma guerra civil no quilombo. Manda envenenar Ganga Zumba e assume seu lugar. Lidera a resistência contra os portugueses, que dura 14 anos.

Com a destruição de Palmares, em 1694, foge com outros sobreviventes e esconde-se na mata. É morto numa emboscada. Seu corpo é mutilado e a cabeça é enviada para o Recife, onde é exposta em praça pública.

O MITO DE PALMARES

Para o poder colonial, destruir Palmares era mais que uma necessidade imposta pelas regras do projeto colonial. Era uma questão de honra. Em 20 de novembro de 1695 era morto Zumbi, o Grande Chefe da “primeira república verdadeiramente livre das Américas”.

No final do século 16, as terras pernambucanas eram as mais prósperas das novas colônias portuguesas. Fazia poucas décadas que os portugueses tinham pisado ali, mas a Capitania de Pernambuco já era politicamente relevante. Havia 66 grandes engenhos na região e, no litoral, toda uma estrutura de suporte, criada para permitir o escoamento dos produtos.

O trabalho frenético dos engenhos se refletia na cidade do Recife, cada dia mais estruturada e organizada. O mesmo não ocorria no sul do país, onde os poucos europeus ali chegados ainda lutavam para conquistar a terra e se instalar de forma definitiva. Eram desbravadores, fundamentalmente. Aliás, sua fama de conquistadores tinha ultrapassado as fronteiras da região.

Em todo o país se dizia que os paulistas eram homens valentes e grandes lutadores. Cronistas escreviam que eles eram “criados entre as brenhas, como feras”.Foi essa reputação guerreira que, na segunda metade do século 17, levou o governador de Pernambuco a procurar o bandeirante Domingos Jorge Velho, chefe de um bando paulista em ação no interior brasileiro. Queria resolver seu problema maior.

Para ele, Palmares já estava deixando de ser preocupação para virar verdadeiro pesadelo.

O SONHO DOS QUILOMBOS

Em Pernambuco falava-se, sobretudo, de Palmares. Ninguém sabia certo onde ficava. Era lá nas montanhas, na parte superior do rio São Francisco, mata fechada, inacessível.

Diziam que precisava dias e mais dias para se chegar até esse lugar. Mas ninguém duvidava de que Palmares existisse de verdade. Não eram só histórias. Palmares havia surgido no final do século 16, quando os primeiros negros ali se refugiaram. Desde então, o mito de Palmares não havia feito outra coisa senão crescer e crescer.

Era a meta dos que buscavam liberdade, negros, índios e inclusive brancos. Havia lugar para todos. Em 1630, as autoridades pernambucanas calculavam que o quilombo de Palmares contava com uma população superior a 3 mil pessoas. Sabiam o que estavam dizendo.

Apoiavam-se no número de fugas escravas que diariamente deviam registrar. Independente do mito, o quilombo de Palmares representou uma estrutura alternativa à sociedade colonial.

Os negros viviam da agricultura. Uma agricultura, por sinal, mais avançada que a da colônia. O mundo escravocrata só conhecia a produção de açúcar. Em Palmares plantavam-se milho, mandioca, feijão, cana, legumes, batatas, frutas. Palmares tinha leis que regulamentavam a vida das pessoas, algumas, inclusive, bastante rígidas. Roubo, adultério, deserção ou homicídio eram punidos com a morte. As funções sociais estavam definidas.

A autoridade era reconhecida por todos. As decisões mais importantes eram tomadas em assembleias, da qual participavam todos os habitantes adultos. Mais do que isso. Palmares não era apenas uma cidade.

Chegou a ser uma rede de cidades. Na metade do século 17, contava onze povoados. Macaco, na Serra da Barriga, era a capital.

Possuía 1.500 casas, dos dois lados de ruas espaçosas. Os artesãos trabalhavam em suas oficinas, enquanto outros plantavam e colhiam. As crianças brincavam livres. Havia também igreja para as orações.

A população?

Mais de 8 mil pessoas. Depois, havia Amaro – com 5 mil habitantes e uma estrutura igualmente bastante organizada -, Subupira – a 36 quilômetros de Macaco – e, ainda, Zumbi, Tabocas, Acotirene, Danbrapanga, Sabalangá, Andalaquituche…

GRANDE CHEFE ZUMBI

Uma crônica de 1678 dava conta de que os palmarinos eram 20 mil. O governador ia mais longe. Dizia que, na realidade, eram mais de 30 mil. Uma multidão de gente que, além de pôr em xeque o projeto colonial, ameaçava fisicamente a sociedade pernambucana.

Era preciso esmagar Palmares, custasse o que custasse. A Coroa já tinha dado essa ordem em diferentes ocasiões.  Havia, ainda, a questão do mito, que incomodava mais que qualquer coisa. Nos engenhos e senzalas, Palmares era sinônimo de Terra Prometida, e Zumbi, considerado imortal, era visto como seu guardião fiel e valente.

Para destruir o quilombo, o poder colonial organizou dezesseis expedições oficiais. Quinze fracassaram. As montanhas pareciam intransponíveis.

E o que as montanhas não faziam ficava por conta dos negros e de suas estratégias militares.

O exército de Palmares era competente, embora carente de armas e munições. Tinha estabelecido seu quartel- general em Subupira, um povoado de oitocentas casas, todas elas cercadas de madeira, pedras e armadilhas. Chegar até Subupira era muito difícil. Superar os obstáculos e entrar na fortaleza, quase impossível.

A tarefa de destruir Palmares foi confiada pelo governador de Pernambuco a Domingos Jorge Velho, um bandeirante paulista sem escrúpulos, especialista na caça aos índios e líder de uma tropa de renegados.

Um bispo da época deixou escrito que Jorge Velho era um dos maiores selvagens com quem ele tinha topado.

Comandava um pequeno exército de 2 mil homens, armados de arcos, flechas e espingardas.

Em 1695, se preparou para a ação decisiva. Depois de ultrapassar mil barreiras, chegou a Macaco, descarregando contra a comunidade todo o seu poder de fogo e toda a sua raiva. A cidade resistiu durante 22 dias.

Zumbi, depois de lutar bravamente, fugiu e se escondeu. Pôde ser capturado e morto só depois de ter sido traído por companheiros.

A data: 20 de novembro de 1695. (Jõao Munari, p. 19)

Ataque aos Macacos

O Governador Caetano de Melo de Castro, armado de poderes extraordinário conforme o Alvará Real de 7 de Abril de 1693 para levar a guerra ao coração dos Palmares, e cercado dos melhores combatentes da capitania, dentre eles o grande Bernardo Vieira de Melo em Dezembro de 1693 iniciou os preparativos em Porto Calvo com o apoio das melhores e mais abastadas famílias de Olinda e de Recife, e em 16 de Janeiro de 1694 com o Mestre de Campo Domingos Jorge Velho no comando teve início a marcha das tropas para o Outeiro da Barriga e em 23 de Janeiro junto aos seus batedores Domingos Jorge Velho remeteu-se a um assalto contra posições de negros.

Da qual sofreu tremenda resistência dos comandados do Rei Zumbi deus e senhor da guerra que aparecia em todos os ângulos da fortificação que era precedida pela parte de fora, em toda a sua extensão de fossos, buracos, poços de água, paus de ponta aguçadas e trançados, enfim toda a sorte de empecilhos para os avanços inimigos que os palmerinos conseguiram arranjar na sua industria rudimentar, posta a serviço da guerra, a estimular com sua presença os destemidos defensores.

Fracassado o primeiro ímpeto do ataque, Domingos Jorge Velho tomou a decisão de dispor as suas tropas ao centro da fortaleza sob o comando de Bernardo Vieira de Melo; a esquerda da estrada ficando Sebastião Dias e a direita da estacada Domingos Jorge Velho se colocou com a sua gente, desta maneira formou-se um verdadeiro cerco a cidadela negra em cujo interior sem alarido homens e mulheres se dispuseram a defendê-la a todo transe, sendo que os primeiros avançaram e alcançaram a cerca galgaram-na por meio de escada e bailéus para caírem nos tachos de água fervente colocadas pelos defensores do Rei Zumbi, encontraram mortes horríveis devido a ousadia de tão temerário avanço, os que se aproximaram foram repulsados pelas flechas e armas de fogo disparadas pelos palmerinos.

Devido a resistência encontrada as tropas atacantes esmoreceram por um instante e retrocederam para não serem dizimadas pelos negros vigilantes. Desta maneira o ataque geral empregado foi sem resultado, onde as tropas atacantes perderam muitos dos seus combatentes, por este motivo o Capitão mor Bernardo Vieira de Melo diante da impossibilidade de um avanço geral e temendo uma sortida dos negros sobre sua gente, resolveu com os seus homens fazer uma estacada frente a frente à dos palmerinos em todo o seu setor e em pouco tempo a cerca do Rei Zumbi estava envolvida por uma contracerca dos portugueses.

E no dia 29 de Janeiro efetuaram o segundo ataque geral contra os palmerinos que com a mesma energia e a mesma ferocidade, defenderam a cidadela, obrigando as tropas do bravo Capitão mor Bernardo Vieira de Melo a recuar devido as sensíveis perdas e na ala esquerda as tropas do Sargento mor também sofrera duros reveses, não sendo totalmente desbaratada por ter sido socorrida pelas tropas do centro comandadas pelo Mestre de Campo Domingos Jorge Velho, que recuou vencido, desta dantesca batalha, sendo perseguido pelos negros que ao cair da noite desistiram do intento.

O Rei Zumbi recompôs as suas legiões e determinou que os velhos, mulheres, inválidos e as crianças empregassem seus esforços na industria de guerra para defesa geral do mocambo, após a refrega que sofrera o Mestre de Campo Domingos Jorge Velho determinou que a cerca de pau-a-pique fosse reforçada para evitar uma sortida dos negros, trabalho este efetuado debaixo de fechadas e estrepes atirados pelos negros palmerinos furiosos e vingativos e a partir deste momento a vigilância dos portugueses teve que se dobrado, permanecendo atentos de armas nas mãos, contra qualquer ataque.

Os assaltos a cerca do Rei Zumbi dos dias 23 e 29 de Janeiro de 1694 deixaram as tropas de Domingos Jorge Velho desfalcadas de muitos homens por este motivo o mestre de campo solicitou que fossem enviado para ele reforços de homens e artilharia, e estabeleceu o cerco total dos mocambos, impedido desta maneira que os negros tivessem contato com o mundo exterior do mocambo, pois deste modo venceriam os negros pela fome e pelo desespero.

O Rei Zumbi sentia a falta de armas e munição, que não havia recebido durante este período de sitio, porém restavam-lhes o moral e o heroísmo, as únicas forças ainda intangíveis para antepor aos sitiantes, os negros sofriam as maiores privações possíveis, por este motivo estavam se convencendo que toda resistência seria inútil, a repulsa aos atacantes estava cada vez menos impetuosa, e quando Gabriel de Gois, bravo alferes do Terço de Infantaria do Recife chegou de Alagoas com os reforços mandado pelo Governador Caetano de Melo de Castro se dirigiu para o Outeiro da Barriga e conseguiu abrir a cerca do Rei Zumbi com diversos tiros de artilharia.

Quebrando-lhes o moral e abrindo passagens para as tropas sitiantes ao mando de Bernardo Vieira Melo e Sebastião Dias, a reação no interior da cidadela foi medonho, dantesca e terrível, devido a selvageria dos invasores por todas os ângulos da cidadela, com os dois lados se enfrentando corpo a corpo trucidando-se mutuamente e o baluarte resistindo bravamente protegido pela escuridão da noite, foi quando o Rei Zumbi reuniu as suas tropas na extremidade da cerca na ala da direita saltando do penhasco para a fuga, que levou de roldão as forças ali dispostas por Bernardo Vieira de Melo, escapando-se assim do cerco tenebroso de vinte e dois dias que foram impostos pelo mestre de Campo Domingos Jorge Velho.

O desfecho inesperado que o Rei Zumbi dera ao sitio do Mocambo dos Macacos, precipitando-se do penhasco pela estreita faixa aberta na cerca, quando se vira perdido e impotente para conter pelas armas o ataque dos invasores, fora para os portugueses tão inopinado e brusco que eles não sabiam se faziam a perseguição aos fugitivos ou se entravam no Mocambo.

O heróico Zumbi preferiu lançar-se do penhasco a estender com os seus bravos comandados os pulsos as algemas do cativeiro, pois somente ele possuía o poder de fascinação de arrastar a tamanho sacrifico muitos homens dispostos a lutar, homens estes nascidos no magnífico altiplano da Serra da Barriga e ali criado e fascinados pela liberdade.

Passados cinco meses da tomada e destruição da cidade negra dos Macacos e da espantosa mortandade dos negros que a habitava e a defendiam e do heroico protesto de Zumbi que se atirou no despenhadeiro com seus bravos guerreiros, os negros fugitivos ainda dispersos pelas matas e pelas furnas ou pelos alcantis das serras palmerinas não preferiam mais resistência, pois famintos e maltrapilhos, enfermos e desenganados de obterem a liberdade que tanto se bateram e lutaram durante tantos anos iam sendo aos pouco capturados pelos capitães do mato e seus índios.

Rei morto, rei posto – sentenciaram os sobreviventes em demanda pela mata fechada na procura de outro sitio para instalação de outro mocambo, e segundo as ultimas disposições do grande rei morto na reunião que precedera à arrancada decisiva na orla do despenhadeiro! Surgirá outro grande Rei Zumbi, sobrinho do que havia morrido para continuar a guerra por mais alguns tempo, até ser traído por Antônio Soares, mulato de sua confiança.

O novo Rei Zumbi, foi preso e morto pelas tropas de André Furtado em 20 de Novembro de 1695 e a sua cabeça foi enviada para Recife, onde foi exposta para servir de escarmento aos negros fugidos, por ordem do Governador da Capitania de Pernambuco Caetano de Melo de Castro.

Os Primeiros Quilombos

Foram formados em época incerta, não coincidindo com a entrada dos primeiros negros no Brasil por volta de 1538 e nem foram originários das raças importadas da África no primeiro século da descoberta, pois as numerosas tribos importadas da Guiné, representados por grupos étnicos importantes que foram distribuídos proporcionalmente pelas diversas seções regionais da colônia portuguesa, porque não era conveniente que se juntasse na mesma capitania um grande número de negros escravos da mesma nação, o que facilmente poderiam resultar em perniciosas consequências, no entanto tudo leva a crer que tais intuitos de separar as nações de negros se tivessem frustrado na pratica, pois na Bahia fortemente se fez sentir a ascendência dos Sudaneses, ao passo que em Pernambuco e no Rio de Janeiro prevaleceram os do grupo Banto.

Os primeiros quilombos, que a principio foram reduzidos, de poucos negros, muitos dos quais famintos, e doentes, que fugiam dos engenhos, das fazendas e dos eitos, só foram possível graça a associação que o negro efetuou com o índio, na causa da resistência a escravidão, e no século XVIII foi o de grandes protesto da raça africana, quando se formaram os maiores e mais tremendos quilombos que tantos apreensões causaram aos colonos e aos governos.

Alguns historiadores fixam a data de 1630 para o inicio dos quilombos constitutivos dos Palmares pela entrada e distribuição de negros escravos provenientes de Angola pertencentes a tribo Jagas que eram indomáveis e amantes da liberdade, pelas fazendas de Pernambuco e Alagoas.

A razão preponderantes da formação dos quilombos no Brasil assentam-se na ferocidade atroz do colono dominante nos engenhos e nas fazendas, nos leitos e na mineração, protegidos pela mais brutal legislação negra que incluía os castigos, as penas e os maus tratos infligidos desde o momento de sua captura na África. Diversos fatos sociais tais como; de serem presos a correntes de ferro a um cepo, de trabalharem junto das caldeiras nos engenhos, de ser chicoteados para trabalharem, a alimentação e vestuário limitado, concorreram para acirrar o ódio entre o negro e o colono.

O negro que chegava, era considerado como peça de trabalho, por mais abatido e rebaixado que fosse em sua dignidade, em sua vontade de liberdade, pela prepotencia de seu semelhante tendeu a sacudir o jugo, fugindo da sociedade que o acabrunhava e o esmagava, procurando a expansão de sua liberdade, em algumas vez em insurreições.

O quilombo era sem duvida a ultima fase do protesto – pois o negro na sua aflição de liberdade, não sentia dificuldade nem hesitava em privar-se da vida para se livrar de seus sofrimentos infligidos pelos senhores e por isto só restava ao escravo a fuga para as montanhas, para os quilombos, para os ermos e para os antros e historicamente os Jagas da raça Banto que eram belicosos da tribo indomável do sobado do famoso N`gola Bandi, aprisionado pelos portugueses durante o governo de Luiz Mendes de Vasconcelos em Angola e mandados para o Brasil lhe cabe a paternidade do grande movimento palmerino já anteriormente iniciado com alguns negros desgarrados que seguiam para o Maranhão marchando dos centos da Bahia e pelos sertões a dentro de Caxias onde o africano ergueu as portas do grande sertão, uma cidade rica e prospera.

A região escolhida pelos negros aquilombados nas faldas da Serra da Barriga, no território de Alagoas, pela semelhança dos seus cômoros, colinas, montes, rochedo e sua flora e fauna dir-se-ia um pedaço de chão transplantado da África para lhes servir de abrigo das primeiras levas que por ali passaram acorrentados e voltaram os seus olhos para a região montanhosa que vinha desde o planalto de Garanhus no sertão pernambucano até as serras dos dois irmãos e do Bananal no município de Viçosa em Alagoas que compreendia as serras do Cafuchi, Jussara e Pesqueira, Comonati e da Barriga de terras virgens e extremamente fértil.

Cortada pelos rios Ipojuco, Serinhaém, Una em Pernambuco e pelos rios Paraíba, Mandau, Panema, Camaragibe, Porto Calvo e Jacúpe em Alagoas, com uma floresta povoada de arvores frutíferas e outras arvores excelentes para uso industrial, que cresciam em volta das palmeiras pindoba-palma attalea, pindoba, buriti-mauritia vinifera, catolé e inúmeros coqueiros de dendê- elaeis guineensis e no meio a essa mata se movimentava uma variada populçao animal onde puderam encontrar suas caças e pesca.

Esta era a região abençoada o valhacouto dos negros palmerinos, na realidade era as matas das palmeiras às mais ricas e bonançosas de todas as regiões, cuja pujança convidava as raças oprimidas a se aquilombarem na formação do maior e mais renhido centro de resistência negra em todo o período colonial, e não foi um simples acidente geográfico e nem tampouco um campo de batalhas sangrentas que deu o nome a região de Palmares no altiplano da Serra da Barriga; foi a frondosa e grande Álea de Palmares que ali se estendiam, ululante e viçosa, magnetizada pela natureza portentosa dos trópicos, caprichosa na sua beleza e rica na sua fartura, onde se encontrava as titaras com suas guirlandes enfeitadas de espinhos galgando as arvores próceras, que mais tarde seria a coroa de espinho dos tombados em lutas feroz pela liberdade.

Todas as palmeiras desta floresta deram aos negros aquilombados os alimento para o corpo e para o espírito, material para seus tijupares de amor e seus palácios e fibras para suas roupagens e estrepes na construção de suas defesas tiradas de seus caules endurecidos e fibrosos. E se mais não dessem, deram na saudade da África um pouco de esperança na terra magnífica que delas recebeu o nome Palmares !

O Negro

Homem negro era uma continuação do meio na sua brutal grandiosidade geofísica, meio absorvente e bárbaro e na sua entomologia, a raça Bantu a mais adiantada, detentora das ricas terras do Congo e de Angola, caminhou a passos de gigante para a regressão em face dos usos e dos costumes de suas tribos e nações incapazes de absorver a civilização da raça branca para lá mandada pelos portugueses, tinha o culto da liberdade até extremos desconhecidos.

Eram naturalmente anárquicos, não tinham união política entre si, e suas autoridades entre eles quase sempre eram tirânicas, absoluta e absorvente eram indisciplinados e desobedientes, por estes motivos foi fácil de serem vencidos em toda parte e em todos os tempos, esta raça robusta e por isto ela foi facilmente escravizada, podemos dizer-se que a nação de autoridade, só lhe veio depois do contato com a raça branca, depois que a rainha Ginga Bandi conseguiu tirar todo o partido das ações missionarias com o qual melhorou a sua raça em civilização e costume de crê-se que o espírito dessa formosa e famosa rainha tenha acompanhado um punhado de negros descendentes dos N`gola que foram vendidos para o Brasil e aquilombados em Mato Grosso e que fundaram o reinado negro de Quariterê, onde tanto sangue se derramou como em Palmares.

E os costumes das tribos africanas em geral pareciam estar no ínfimo grau de desenvolvimento a julgar por alguns signos característicos destas habitações em cavernas porém tais exemplos não poderiam ser representativo da raça africana em regra geral.

Pois o negro já estava fixado no solo e já constituía a sua tenda e quase todas os títulos protegiam as suas aldeias por uma cerca de arvores de troncos grossos e no recinto fortificado construíam as tendas formadas de juncos e palmas de forma cônica com teto de palha, que não possuía divisões salvo as vezes as dos chefes da tribo.

Os utensílios domésticos eram todos de madeiras e pedra que serviam de assento, os pratos eram de argilas, cuias, facas de pedra e de ferro, vasos para água e para o preparo da comida, algumas tribos dormiam no chão sobre palhas ou peles e algumas tribos construíam tarimbas.

A ordem domestica era perfeita pois cada tenda era ocupada por uma família onde o homem exercia a autoridade suprema do lar e na sua ausência era exercida pela primeira esposa, pois a poligamia era um costume em todas as tribos, e todo o trabalho domestico e nas pequenas lavouras ficava a cargo das mulheres, tanto os homens como as mulheres enfeitavam-se com muito capricho, particularmente da cabeleira, entre muitas tribos era costume se tatuarem e furar as orelhas, o lábio superior e o septo nasal.

Os homens cuidavam de preparar as terras para as grandes plantações, em algumas aldeias existiam as industrias pastoril, também a caça e pesca era atribuições parta os homens das tribos.

Sendo a caça no interior da África um serviço fatigante e arriscadíssimo, demandando grandes esforços, agilidade e coragem e de todos os animais eles aproveitavam a carne, o couro e do elefante o marfim.

Era muito raras as aldeias não terem em forno para fundir ferro e uma forja para fabricação de ferramentas, armas e artigos de uso comum, as armas que usavam era o arco e a flecha, a zagaia, a lança e o cajado nodoso, a antropofagia era usada por algumas tribos do interior e da costa ocidental, todos negros africanos tinham grandes conhecimentos das virtudes de muitas plantas medicinas e a sua medicina consistia no emprego destas plantas acompanhadas de muitos exorcismo.

Eram muitos supersticiosos e tinham, entre eles os adivinhos e os feiticeiros que eram venerados por todos das tribos, se tatuavam com desenhos significativos que constituíam-se de figuras de animação de plantas e de desenhos geométricos o desenho era indelével e feito no corpo humano em geral no peito e nos braços e as línguas eram todas aglutinantes e os usos e costumes sempre varriam de tribos para tribos conforme o seu grau de civilização e de caráter religioso, a concepção da arte nos povos negros não eram de ordem estética mas tão simplesmente religiosa, a idolatria foi o mais forte motivo da arte negra em consequência do meio bárbaro em que viviam e os brutais contraste que o cercaram desde o alvorecer de sua idade, o negro criou a arte segundo a sua emoção e essa arte e arte e é beleza porque representa o seu conhecimento de tristeza, a sua dor e o seu medo.

A raça negra sempre tiveram grande pendor para as danças e a mais característica é o batuque, que o acompanhou na trajetória dolorosa de sua migração forçada para o cativeiro, e as suas danças consistiam num circulo formado pelas dançadores, indo para o meio de um preto que depois de executar vários passos, dava uma imbicada a quem chamava de semba na pessoa que escolhe entre as da roda, a qual ia para o meio do circulo substitui-lo.

Os instrumentos musicais eram mais guerreiros que de diversões e o principal deles era o tong-tong empregados nas solenidade de guerra, nas festas populares usavam o balafo muito usado na costa do ouro, tinham o berimbau, canzá, e o tambaque e estes instrumentos acompanharam os palmerinos para amenizar os seus sofrimentos e resistir as dores e aos desesperos.

A Escravidão

A origem da escravidão humana perde-se no tempo e se acha ainda oculta pela poeira dos séculos que envolvem a própria historia do homem sobre a terra.

É a luz do saber humano ainda não se projetou sobre a primeiro escravo, se branco ou negro, se asiático, africano ou europeu.

Admite-se, todavia, que surgiu a escravidão do homem com as primeiras lutas e teve origem no direito da força que foi corporificando e se espalhando entre os homens isolados, destes às famílias, às tribos e por fim, às nações e aos estados organizados.

A ferocidade do vencedor exaltada sobre o vencido fora a causa potencial da escravidão do homem desde a mais remota Antiguidade, desde os assírios, os egípcios, os judeus negros e romanos e bem assim os demais povos da mais alta Antiguidades, adotaram a escravidão e legislaram sobre ela, sobretudo os romanos que coibiram os abusos que se cometiam à sombra dos usos e costumes dos demais povos, estabelecendo princípios do modo de ser escravos, estes princípios constituíram um grande avanço em prol da liberdade humana, mas tarde duas poderosas forças vieram modificar os modos de ser escravos; o advento do Cristianismo e a evolução natural do direito.

O escravo era considerado como produto de venda era ou troca. No rosto mostra o sofrimento de dores e desgraças.

Foram criadas varias leis, as leis tinham disposições excepcionais que permitiam que os escravos sofressem torturas para fazerem declarações, as marcas de ferro quente, as mutilações de alguma parte do corpo, e a pena de morte estavam contidas no livro V das ordenações portuguesas, e ampliadas constantemente pelas Cartas Régias expedidas pela corte, para atender a cada caso, seja no engenho, nas minas.

Por toda a parte havia tortura, penas e castigos horrendos impostos aos negros e os arsenais de tortura se multiplicavam com as Cartas Régias e as ordenações e os alvarás que não eram de liberdade e sim de sentenças condenatórias, e a imaginação humana esgotou os recursos na invenção de penas e tormentos que subjugavam os negros escravos, por isto criaram virasmundos, algemas, gargalheiras, cadeira ajustada aos pulsos e ao tornozelo, a pescoceira de ponta curva, a mascara de ferro, a focinheira, o açoite, a palmatória, o tronco chinês, o cinto com seu cadeado pendente, as letras de fogo que eram impressas na espádua do negro fujão e o libando era o que compunha o arsenal de dor, maceração, tortura e mortificação dos negros a serviço do senhor dono do escravo que comprava o negro escravo e desumanizava-o, para o tornar manso e obediente, as vezes eles preferiam matar o escravos, antes de lhe permitir uma reação, que se estendesse a toda a colônia.

Matava-o quando se insurgia; e mutilava-o para purifica-lo, porém o branco era egoísta e tímido, pois necessitava de companhia que o seguisse para lhe resguardar pelos caminhos, sendo assim selecionava os pretos bons e fortes e os armava para sua segurança.

A escravidão na África foi uma imitação da escravidão dos Mouros e Sarracenos, que cresceu, desenvolveu-se, agigantou-se e envolveu todas as grandes potências marítimas, que eram a Inglaterra, França, Espanha e Portugal e outras quase todas arrastadas pelas rendas que o mercado de escravo oferecia, a África por conseguinte, passou a ser o grande palco da escravidão do homem pelo homem e quando criaram-se hordas de penetração ao interior desconhecido para aprisionamento dos negros, em vez de missões civilizadoras, e para legitimar a escravidão negra criou-se o principio hediondo, imoral e mentiroso do resgate.

O homem foi transformado em mercadorias e classificados nas alfândegas como objeto de utilidade para pagamento de imposto de exportação.

E os primeiros negros introduzidos em Portugal constituíram, os fundamentos naturais da organização de empresas de transporte de peças e despertaram a cobiça de seu comercio rendoso e pela facilidade de aprisionar os negros em toda costa africana onde os maometanos faziam suas presas para trocarem pelos prisioneiros que os portugueses lhe faziam nas suas conquistas pelos mares afora, e as Ilhas da Madeira e as Ilhas Canárias tornaram-se o principal foco de comercio de escravos, que logo se propagou nos mercados de Lisboa e de Sevilha.

Mouros, portugueses e espanhóis desfraldaram a bandeira de horrores em todos os rochedos da costa africana para a apreensão dos negros dispersos pelas orlas marítima, foi quando que os duzentos e trinta e cinco negros desembarcados no Algarves pelo escudeiro Laçarote em 1444 constituiu o prólogo que se ensaiava para ser levado no século seguinte, e estas apanha de negros tornou-se tão desumana e bárbara que os próprios governos interessados nela, se viram obrigados a tomar providencias para que as mesmas fossem mais humana, por isto provocaram algumas medidas dos poderes temporais romanos e para ameniza-la a igreja interviu desde o principio contra as barbaridades aplicadas aos negros invocando as leis divinas e naturais quando o Papa Pio II, em Bula de 7 de Outubro de 1462 o censurou, e com especialidade a redução dos neófitos da África à escravidão.

A compra de escravos aos poucos foi se organizando, com aquiescência e apoio e proteção de todos os governos; a competição mais forte dava-se entre os especuladores da França, Inglaterra, Holanda e Portugal que com os novos descobrimentos haviam aumentado a extensão de terras aproveitáveis, e para elas eram necessárias os escravos, riqueza sem a qual a terra nada valeria, e de inicio as ilhas de São Tomé e de Portugal e outras do Golfo da Guiné, tornaram-se entrepostos do tráfico onde o negro se submetia a um certo aprendizado a estes entrepostos eram compostos de um pequeno forte destinado a proteger a mercadoria, de algumas casas para os contratantes e de vários barracões para abrigar as levas de negros que vinham do interior.

No inicio os Mouros eram os intermediários entre os portugueses e os grandes fornecedores com o decorrer do tempo os entendimentos passaram a ser feito diretamente com os régulos em suas aldeias de onde os negros eram quase sempre caçados pelos próprios mercadores, mediante ao pagamento de um tributo junto aos régulos, os negros desde a sua apanha e durante o tempo de viagem eram conservados ligado uns aos outros com um pedaço de madeira semelhante a um bridão, amarrado à boca e em volta do pescoço ficavam presos a uma forquilha, com as mãos presas atrás das costas, amarrados por uma corda na cintura do condutor para evitar os gritos e fugas!

Até a feitoria onde eram abrigados em barracões durante um certo período que se da o nome de refresco a espera de navios para serem embarcados, e as levas de escravos negros antes de serem embarcados para o novo mundo eram batizados pelo Bispo de Luanda e desta maneira ficavam os traficantes livre do pagamento de imposto, quando os se destinavam ao Brasil.

Os negros lutaram, mas a glória ficou com Isabel

Em 1850, Eusébio de Queiroz motivou a lei contra o tráfico negreiro, entre outras coisas, pelo medo de o grande número de negros ( 3.500.000 para 1.500.000 brancos ) viesse a perturbar a ordem estabelecida.

Queiroz chegou a propor a contratação de um exército de mercenários estrangeiros para manter submissos os escravos, pois os soldados brasileiros se recusavam a cumprir tal oficio. Na verdade, boa parte dos escravos estavam se insubordinando.

Em 1823, cantava-se nas ruas de Pernambuco: Marinheiros e caiados, Todos devem se acabar, Porque só pardos e pretos, O país hão de habilitar ! Em 1821, os pretos ocuparam Vila Rica, após sangrentos combates, declarando sua liberdade e igualdades aos brancos.

Em 1849, em Queimados, Espíritos Santo, 200 escravos tentaram um levante, visando atingir todo o estado.

Lei do Ventre Livre: Em 28 de setembro de 1871 o governo conservador do Visconde do Rio Branco promulga a Lei do Ventre Livre. De poucos efeitos práticos, a lei dá liberdade aos filhos de escravos, mas deixa-os sob tutela dos senhores até 21 anos de idade.
Lei dos Sexagenários: 
Em 28 de setembro de 1885 o governo imperial promulga a Lei Saraiva-Cotegipe, conhecida como Lei dos Sexagenários, que liberta os escravos com mais de 65 anos. A decisão é considerada de pouco efeito, pois a expectativa de vida do escravo não ultrapassa os 40 anos.

Abolição no Ceará

A campanha abolicionista no Ceará ganha a adesão da população pobre. Os jangadeiros encabeçam as mobilizações, negando-se a transportar escravos aos navios que se dirigem ao sudeste do país.

Apoiados pela Sociedade Cearense Libertadora, os “homens do mar” mantêm sua decisão, apesar das fortes pressões governamentais e da ação repressiva da polícia.

O movimento é bem-sucedido: a vila de Acarape (CE), atual Redenção, é a primeira a libertar seus escravos, em janeiro de 1883. A escravidão é extinta em todo o território cearense em 25 de março de 1884.

O Brasil foi o último país do continente a abolir formalmente a escravidão mas, a liberdade veio mesmo por motivos econômicos.

Entre estes, os historiadores apontam a necessidade da criação de um mercado consumidor para os produtos industrializados, provenientes da Inglaterra. Os portos brasileiros foram, então, abertos aos imigrantes europeus, tendo sido permitido aos escravos alforriados, ou libertos, que retornassem à África.

Em 1888, a Princesa Isabel assinou a lei que abolia a escravidão. Lei Áurea – Em 13 de maio de 1888, o gabinete conservador de João Alfredo apresenta, e a princesa Isabel assina, a Lei Áurea, extinguindo a escravidão no país.

A decisão, porém, não agrada aos latifundiários, que exigem indenização pela perda dos “bens”. Como isso não acontece, passam a apoiar a causa republicana. Em 1899 partiu o último navio – ” o Aliança ” – levando de volta à África um grupo de ex-escravos. Uma criança que seguiu para a África naquele navio, Maria Romana da conceição, chegou a visitar o Brasil em 1963.

ZUMBI, HERÓI DE PALMARES

Ele entrou para a história como o último líder do maior foco de resistência negra à escravidão no Brasil, no século 17.

Em fevereiro de 1685, uma carta quase inacreditável cruzou o Atlântico e chegou a Pernambuco. Estava assinada simplesmente “Rei”.

O texto dizia: “Eu El-Rei faço saber a vós Capitão Zumbi dos Palmares que hei por bem perdoar-vos de todos os excessos que haveis praticado (…), e que assim o faço por entender que vossa rebeldia teve razão nas maldades praticadas por alguns maus senhores em desobediência às minhas reais ordens.

Convido-vos a assistir em qualquer estância que vos convier, com vossa mulher e vossos filhos, e todos os vossos capitães, livres de qualquer cativeiro ou sujeição, como meus leais e fiéis súditos, sob minha real proteção”.

Quem capitulava na mensagem era o próprio rei de Portugal, dom Pedro II (o deles, não o nosso). Mas não sabemos se o “capitão” aceitou o convite. Na verdade, não sabemos nem se a carta chegou um dia a ser entregue. Mas sabemos que o destinatário, tratado nessa linguagem cheia de honoríficos e rapapés, era mesmo o guerreiro Zumbi, um opositor quase mítico do domínio português no Brasil.

Se ele já era um mito no século 17, os debates e pesquisas dos últimos 300 anos tampouco revelaram muito sobre o verdadeiro Zumbi.

Isso se deve em boa parte ao fato de que os relatos acerca de sua vida foram, sem exceção, feitos por seus inimigos: os colonos e portugueses que se puseram a combatê-lo, a soldo de senhores escravistas.

“Toda a documentação sobre a vida de Zumbi e de Palmares está meio cifrada, vista pelos olhos das expedições que tentavam tomar o quilombo”, diz a historiadora Silvia Hunold Lara, da Universidade Estadual de Campinas. Segundo ela, a incerteza é tão brutal que se estende até a forma do nome do líder palmarino – o certo é Zumbi ou Zambi? A primeira forma é mais comum nos relatos lusos, mas isso não quer dizer que seja a certa.

Para valorizar o próprio esforço ou para justificar os fracassos em capturá-lo, os primeiros relatos acerca de Zumbi, feitos em sua maioria por militares portugueses, ajudaram a criar o personagem que acabaria se tornando um fundador da identidade dos descendentes de africanos no Brasil. Um homem forte, orgulhoso, inconformado com sua condição social, que resolveu enfrentar seus algozes e libertar seu povo.

Mas tampouco essa imagem de um Zumbi revolucionário se sustenta em fatos. Sua biografia está envolta em diversas dúvidas. Entre as mais elementares está sua origem.

Era ele um chefe africano trazido à força para ser escravo? Ou teria nascido no Brasil?

Sobre uma coisa, pelo menos, os especialistas concordam: ele viveu e morreu em Palmares, um quilombo – ou seja, um reduto de ex-escravos e seus descendentes.

Vida em Palmares

Os primeiros relatos sobre o quilombo de Palmares são desencontrados e datam do início do século 17. Eles indicam que ele surgiu em fins do século 16, no sul da então capitania de Pernambuco.

Fugindo provavelmente de um engenho de cana nordestino, um grupo de escravos africanos deixou o litoral e foi para o interior – tentando evitar caçadores de recompensa e soldados que, a mando dos senhores de engenho, capturavam e matavam fugitivos.

A jornada a pé, que pode ter durado até dois anos, levou os ex-escravos para a serra da Barriga, região conhecida genericamente como “os Palmares”: um pedaço de mata Atlântica coberto por palmeiras, encravado no meio do sertão (atualmente território de Alagoas). Aquelas terras tinham fama de ser férteis, mas a combinação entre mata fechada e terreno íngreme fazia dela uma fortaleza natural.

Se os criadores do quilombo realmente vieram de um engenho, a grande maioria deveria ser homem, pois as fazendas abrigavam poucas mulheres.

A proporção de escravos nascidos no Brasil também devia ser muito baixa, uma vez que era raro que africanos conseguissem viver o suficiente para ter sua própria família.

“Tudo indica que africanos do complexo angolano (região que englobava, além de Angola, uma parte do atual Congo) teriam tido um papel determinante em Palmares”, afirma Mário Maestri, do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul. Há, por exemplo, a tradição de que eles chamavam seu reduto de Angola Janga, ou “Angola Pequena”.

Se essa idéia estiver correta, o povo original de Palmares era composto, em grande parte, por gente do grupo lingüístico banto – um dos primeiros na África a desenvolver a agricultura, a criação de animais e o uso do ferro, tendo se expandido por boa parte de seu continente.

Já nos primeiros anos de organização, o aglomerado de fugitivos se tornou uma pedra no sapato dos portugueses. Os habitantes de Palmares, periodicamente, invadiam engenhos para libertar escravos, roubar comida e armas e raptar mulheres, artigo raro no quilombo em formação.

Em 1602, o governador-geral do Brasil, Diogo Botelho, mandou uma expedição contra eles – a primeira de 40, ou até mais de 60, de acordo com alguns historiadores.

Depois de destruir cabanas e fazer alguns prisioneiros, os portugueses pensaram ter acabado com a vila.

Mas, sempre que uma tropa aparecia, os palmarinos migravam para o mato, deixando para trás roças e cabanas que eram destruídas e queimadas. Dias depois, outras eram erguidas.

Esse modo de vida limitava o crescimento do povoado. Mas, em 1630, a sorte sorriu para Palmares. Foi quando os holandeses desembarcaram em Pernambuco, na tentativa de tirar os lucros do açúcar das mãos de portugueses e espanhóis, então governados pelo mesmo rei.

A invasão colocou em polvorosa o Nordeste. Com a vitória inicial dos holandeses, em 1645, parte dos luso-brasileiros manteve uma espécie de guerrilha. Donos de engenho alistaram seus escravos para a luta, o que facilitava as fugas. Em meio à instabilidade, Palmares cresceu, recebeu milhares de novos moradores e, quando enfim os holandeses foram expulsos, em 1654, a vila tinha virado uma potência formada por vários aglomerados populacionais.

Os dados sobre as dimensões de Palmares são desencontrados. Documentos coloniais falam em 30 mil pessoas, número provavelmente superestimado.

O crescimento demográfico deu-se principalmente pela chegada de novos moradores.

Existe também a possibilidade de que a população de Palmares fosse poligâmica e até poliândrica – o que significa que uma mulher podia ter vários maridos. Para alimentar a população crescente, a economia local era composta por uma mistura de caça, coleta e agricultura, em que se plantavam gêneros como mandioca, batata-doce e feijão.

É certo que também havia comércio com os vizinhos. “A ideia de que Palmares era um refúgio isolado no mato pode até ser verdadeira para os primeiros anos de assentamento. No entanto, após a metade do século, o relacionamento entre os negros e seus vizinhos certamente já evoluíra para um intenso intercâmbio com índios e até com brancos”, diz Flávio Gomes, pesquisador do Departamento de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A presença de brancos em Palmares ainda é motivo de discussão, mas sabe-se que isso ocorreu depois em quilombos de outras regiões. Apesar da suposta hostilidade em relação aos brancos, há indícios de que criadores de gado levavam seus rebanhos para pastar na região de Palmares e mantinham comércio com os quilombolas, a ponto de serem chamados, com desdém, de “colonos dos negros”.

Em relação aos índios, o convívio parece ser mais evidente. Escavações arqueológicas têm encontrado cerâmica indígena, provavelmente contemporânea ao quilombo.

“É tentador fazer essa associação e dizer que havia índios dentro do quilombo, mas pode se tratar também de algum tipo de comércio”, diz o arqueólogo americano Scott Allen, da Universidade Federal de Alagoas.

Já segundo Pedro Paulo Funari, historiador e arqueólogo da Unicamp que integrou a primeira equipe a fazer sondagens no local, há 15 anos, a cerâmica indica que havia índias em Palmares: “A produção de cerâmica estava ligada às atribuições das mulheres. A presença desse material em Palmares pode querer dizer que os ex-escravos tinham esposas indígenas”.

Coisa perfeitamente consistente com a escassez de mulheres negras por lá. De qualquer modo, a mestiçagem estava na ponta da língua dos palmarinos.

Seu idioma parecia ter uma base africana misturada a palavras e estruturas tiradas do português e do tupi – os colonos precisavam de intérpretes para falar com eles.

A consolidação do quilombo culminou na criação de uma espécie de confederação entre os vários povoados de Palmares. A população local escolheu como chefe um guerreiro conhecido como Ganga-Zumba, que governava a partir de Macaco, a principal vila do refúgio. Não se sabe se Ganga-Zumba seria nome próprio ou um título dado ao líder. “A palavra ganga significava ‘poder’, ou ‘sacerdote’ em várias sociedades da África central”, diz Flávio Gomes.

Para a maioria dos especialistas, foi nessa época de relativa calmaria que Zumbi teria nascido em Palmares. Um dos motivos para sustentar que o líder nasceu ali mesmo e não chegou depois, fugindo da escravidão, é o fato de que ele seria sobrinho de Ganga-Zumba.

Porém, o traço familiar é também incerto. Para Mário Maestri, a designação de “sobrinho” não deve ser entendida literalmente. “A trama de parentescos deve ter sido sobretudo simbólica.

As condições históricas não teriam permitido a formação de um clã familiar que dominasse politicamente Palmares”, diz Maestri. Assim, dizer que Zumbi era “sobrinho” de Ganga-Zumba equivaleria a afirmar que ele era um protegido do chefe.

A origem de Zumbi permanece controversa. Ter nascido ou não em Palmares determina se ele foi ou não escravo. E caso ele tenha nascido livre em Palmares, onde, como diz o professor Funari, a miscigenação entre negros e índios era comum, não se pode afastar a chance de que ele próprio fosse mestiço de pai africano e mãe índia.

Dá para imaginar o tamanho da polêmica em que estamos nos metendo aqui? “Não se pode dizer o quanto essa possibilidade é confiável. Mas que é possível, é”, diz Funari.

Se a origem de Zumbi é incerta, a infância é definitivamente lendária. Décio Freitas, historiador gaúcho morto no ano passado, escreveu um texto clássico sobre Palmares, em que dizia ter descoberto um relato da captura de Zumbi ainda bebê por uma expedição portuguesa ao local.

Ele teria sido vendido ao padre Antônio Melo, que o teria criado para ser coroinha. Aos 15 anos, no entanto, Zumbi teria fugido. “Essa é uma versão fantasiosa, mas não impossível”, diz Flávio Gomes. “Décio jamais mostrou o documento em que apoiava essa biografia de Zumbi. E, além disso, ele ficou conhecido por romancear sistematicamente sua produção”, diz Maestri.

Exceto pelo texto de Décio, não há outro relato sobre a juventude de Zumbi. Ele deve ter crescido num período anterior à guerra que os portugueses moveram contra o quilombo, impulsionados pela falta de mão-de-obra nos engenhos.

Nessa época, a vida social em Palmares era um arremedo daquilo que seus habitantes conheciam dos antepassados na África, talvez com elementos indígenas e até portugueses incorporados ao seu cotidiano.

Seus líderes, a exemplo de Ganga-Zumba, deviam ser guerreiros e guias religiosos. Não sabemos se Zumbi se casou ou teve filhos (embora a carta do rei de Portugal, reproduzida no início desta reportagem, sugira isso). Zumbi é geralmente descrito como guerreiro porque os relatos sobre ele aparecem num período de guerra. Mas não é difícil imaginar que, em tempos de paz, Zumbi plantasse mandioca e caçasse porcos-do-mato.

General Zumbi

Foi num relatório do comando militar da capitania de Pernambuco, escrito por volta de 1670, que o nome Zumbi apareceu citado pela primeira vez. O documento atribui a ele o sucesso dos ex-escravos “fugidos” nos combates com colonos nas cercanias da serra da Barriga.

Zumbi seria o homem de confiança do chefe Ganga-Zumba, uma espécie de general dos exércitos de Palmares. Outros documentos da mesma época destacam a capacidade militar de Zumbi. Um deles diz que, ao enfrentar uma expedição liderada por Manuel Lopes Galvão, Zumbi levou um tiro na perna que o teria deixado manco, mas não o impedira de continuar lutando.

Sob ataques constantes, Palmares se tornou uma fortaleza, com diversos povoados cercados por muralhas reforçadas de pau-a-pique. Na encosta que levava até a vila de Macaco, os quilombolas cavavam buracos, colocavam estacas no fundo e as cobriam com folhas secas.

Isso era tão comum que o local entrou para os mapas dos soldados coloniais com o apelido de Outeiro dos Mundéus (mundéu, ou mundé, é justamente o nome dessa armadilha).

E os palmarinos também partiam para a ofensiva. “Diversas expedições quilombolas atacaram, entre 1660 e 1670, os povoados de Serinhaém, Porto Calvo, Penedo e Alagoas, principalmente para capturar armas e munição, mas também para saquear fazendas e estabelecimentos comerciais”, escreveu Décio Freitas em seu Palmares – A Guerra dos Escravos.

Por volta de 1675, as comunidades atacadas financiaram uma grande expedição militar sob o comando de Fernão Lopes Carrilho, que já tinha enfrentado e vencido índios e escravos rebeldes em outros cantos do Nordeste. Ele aprisionou ou matou vários dos principais chefes do quilombo, feriu o próprio Ganga-Zumba e quase capturou a mãe do líder. Carrilho chegou a anunciar que tinha destruído Palmares de vez. Não era verdade, mas, pela primeira vez em décadas, a situação forçou Ganga-Zumba a negociar.

Em 1678, uma missão enviada pelo “rei de Palmares”, como foi anunciado, adentrou o Recife.

Um cronista escreveu: “Notável foi o alvoroço que causou a vista daqueles bárbaros. Porque entraram com seus arcos e flechas, e uma arma de fogo (…), corpulentos e valorosos todos”.

O acordo de paz previa que os nascidos em Palmares ficariam livres, ganhariam terra para cultivar, direito de comercializar com seus vizinhos e a condição de vassalos de Portugal. Parecia ótimo, não fosse o fato de que os escravos libertados (e talvez o próprio Zumbi, de acordo com aqueles que defendem a tese de ele nasceu escravo e fugiu para Palmares) teriam de voltar para seus senhores.

Ganga-Zumba decidiu aceitar as cláusulas e se mudou com algumas centenas de seguidores e seu irmão Gana-Zona para a localidade de Cucaú. Zumbi se recusou a ir e declarou ser o novo líder de Palmares (Ganga-Zumba morreu logo depois e as histórias da época dão conta de que Zumbi teria mandado envenená-lo). Seguiu-se uma guerra entre partidários de Zumbi e de Gana-Zona que levou à intervenção dos portugueses e à extinção do “quilombo livre” de Cucaú.

As autoridades coloniais e o próprio rei de Portugal tentaram repetidas vezes oferecer ao novo chefe um acordo semelhante ao que fizeram com Ganga-Zumba, mas Zumbi nunca aceitou. No início da década de 1690, o bandeirante Domingos Jorge Velho foi chamado e recebeu a missão de liderar uma expedição para caçar e exterminar de vez os focos de resistência em Palmares.

À frente de mateiros experientes e conhecidos pelos métodos particularmente sanguinários, Jorge Velho não escapou de tomar algumas sovas dos guerreiros de Zumbi. Em 1692, num combate de três semanas, sua tropa de cerca de mil homens foi reduzida pela metade, antes de fugir e se perder no mato. Dois anos depois, Jorge Velho voltou.

Tinha sob seu comando um incrível exército para a época: 9 mil homens – e alguns canhões.

A resistência de Palmares dependia de manter a artilharia inimiga longe das muralhas de Macaco. Depois de um cerco que durou semanas, no entanto, Jorge Velho conseguiu se aproximar com seus canhões.

Zumbi liderou pessoalmente um ataque desesperado para evitar a destruição das barreiras, mas falhou. Os bandeirantes mataram centenas de guerreiros e invadiram a capital palmarina. Zumbi fugiu.

O último ano da vida do líder foi marcado por ataques esparsos, ao lado de um punhado de companheiros, que tentavam manter viva a rebelião escrava. Foi por meio de um membro desse grupo, Antônio Soares, que os homens de Jorge Velho chegaram a Zumbi.

Capturado e torturado, Soares aceitou levar os bandeirantes em sigilo até o esconderijo rebelde. Lá chegando, ele mesmo teria matado Zumbi com uma traiçoeira punhalada. De posse do corpo do líder, os mercenários arrancaram-lhe um dos olhos e cortaram-lhe a mão direita. O pênis de Zumbi foi decepado e enfiado em sua própria boca. Já a cabeça foi salgada e levada para Recife, onde apodreceu em praça pública.

Zumbi dos Palmares – Líder

Nascido em Palmares, coube a Zumbi liderou a gente do quilombo num momento decisivo da luta contra os escravistas, empenhados em sufocar a semente da liberdade que teimava por crescer no solo brasileiro.

A história daquele que seria o Zumbi começa quando Brás da Rocha ataca Palmares, no ano de 1655, levando um recém-nascido, entre os adultos capturados, a criança foi entregue ao chefe da coluna atacante, que por sua vez resolveu fazer um presente ao padre Melo cura de Porto Calvo que decidiu chamá-lo Francisco, Padre Melo achava Francisco inteligentíssimo por este motivo resolveu desasná-lo em português, latim e religião.

Talvez olhasse com orgulho o moleque passar com o turíbulo. Numa noite em 1670, ao completar quinze anos, Francisco fugiu em busca da liberdade deixando a liberdade e o conforto de Padre Mela para voltar a Palmares como Zumbi, onde foi livremente constituída sua família – pai, irmãos, tias e tios, e dentre os seus parentes o principal se chamava Ganga Zumba, mais tarde, aos vinte e três anos rejeitou a paz firmada por Ganga Zumba com os escravistas, paz que garantia sua liberdade, aos vinte e cinco anos continuava em Palmares para liderar sua gente no quilombo num momento decisivo da luta contra os escravistas, empenhados em sufocar a semente da liberdade que teimava por crescer no solo brasileiro.

Independente do mito o quilombo de Palmares representou uma estrutura alternativa à sociedade colonial, aonde os negros viviam da agricultura, por sinal, mais avançada que a da colônia num mundo escravocrata que só conhecia a produção de açúcar.

Pois em Palmares plantavam-se milho, mandioca, feijão, cana, legumes, batatas, frutas. Palmares tinha leis que regulamentavam a vida das pessoas, sendo que algumas inclusive eram bastante rígido onde roubo, adultério, deserção ou homicídio era punido com a morte, as funções sociais estavam definidas, a autoridade era reconhecida por todos, as decisões mais importantes eram tomadas em assembleias da qual participavam todos os habitantes adultos.

Mais do que isso, Palmares não era apenas uma cidade, chegou a ser uma rede de cidades e na metade do século XVII contava onze povoados que tinha a sua capital no quilombo do Macaco, na Serra da Barriga.

Depois, havia Amaro com uma estrutura bastante organizada, Subupira e, ainda, Zumbi, Tabocas, Acotirene, Danbrapanga, Sabalangá, Andalaquituche.

Em Pernambuco falava-se, sobretudo, de Palmares porém ninguém sabia certo onde ficava, era lá nas montanhas, na parte superior do rio São Francisco, mata fechada, inacessível, diziam que precisava dias e mais dias para se chegar até esse lugar, mas ninguém duvidava de que Palmares existisse de verdade, não eram só histórias, Palmares havia surgido no final do século XVI, quando os primeiros negros ali se refugiaram, desde então, o mito de Palmares não havia feito outra coisa senão crescer e crescer, era a meta dos que buscavam liberdade, negros, índios e inclusive brancos.

Sendo as terras pernambucanas as mais prósperas das novas colônias portuguesas, fazia poucas décadas que os portugueses tinham pisado ali, mas a Capitania de Pernambuco já era politicamente relevante havia sessenta e seis grandes engenhos na região e, no litoral, toda uma estrutura de suporte, criada para permitir o escoamento dos produtos, o trabalho frenético dos engenhos se refletia na cidade do Recife, cada dia mais estruturada e organizada, enquanto isto o mesmo não ocorria no sul do país, aonde os poucos europeus ali chegados ainda lutavam para conquistar a terra e se instalar de forma definitiva, eram desbravadores, fundamentalmente.

Aliás, sua fama de conquistadores tinha ultrapassado as fronteiras da região, em todo o país se dizia que os paulistas eram homens valentes e grandes lutadores e devido a esta reputação guerreira foi que na segunda metade do século XVII levou o governador de Pernambuco a procurar o bandeirante Domingos Jorge Velho, chefe de um bando paulista em ação no interior brasileiro no comandando um pequeno exército de dois mil homens, armados de arcos, flechas e espingardas sem escrúpulos na caça aos índios.

Nos engenhos e senzalas, Palmares era sinônimo de Terra Prometida, e Zumbi, considerado imortal, era visto como seu guardião fiel e valente, e para destruir o quilombo o poder colonial organizou dezesseis expedições oficiais onde quinze fracassaram.

As montanhas pareciam intransponíveis, e o que as montanhas não faziam ficava por conta dos negros e de suas estratégias militares. O exército de Palmares era competente, embora carente de armas e munições e tinha estabelecido seu quartel-general em Subupira, um povoado de oitocentas casas, todas elas cercadas de madeira, pedras e armadilhas e para chegar até Subupira era muito difícil pois era preciso superar os obstáculos e entrar na fortaleza, quase impossível.

Domingos Jorge Velho, comandante do exército colonial, nunca tinha visto nada parecido em toda sua vida.

Custava a crer que fosse obra de negros entre o verde do mato e o azul puríssimo do céu numa extensão semicircular de cinco quilômetros e meio se erguia a escura muralha de troncos e pedras e tinha redentes, guaritas, quebrava em diversos lugares, abria torneiras para atiradores a cada dois metros.

E no momento em que Domingos Jorge Velho ordenou que seus batedores se aproximassem dos fossos que circundavam a fortificação eles foram duramente atacados

Então um dos subcomandantes lhe deu, então, a ideia de construir contracercas de proteção, enquanto traçavam o plano final de ataque, e para isto foram erguidas de troncos de árvores rapidamente. E na manha do dia 23 de janeiro, somente um capitão, com cinquenta homens, conseguiu sob uma chuva de flechas e balas encostar-se à muralha palmarina atacando-a com machados, enquanto isto os quilombolas, lá do alto, lhes abriam as cabeças com pedregulhos enormes, pescando os sobreviventes a gancho, pelas costas.

Fracassado o assalto, Domingos Jorge Velho temeu pela própria segurança do seu acampamento, e por isto mandou buscar na cidade de Recife um reforço de duzentos homens e seis canhões que se tornaram inútil, mesmo sob proteção das contracercas devido à distância à demasiada para o alcance dos canhões.

E na noite de 5 de fevereiro, a raiva de Domingos Jorge Velho cedeu vez à inteligência e para isto chamou os subcomandantes e traçou a única saída e imediatamente ordenou que começassem, em silêncio, a construção desta nova contracercas, oblíqua à muralha palmarina que deveria ser erguida até encostar no grande precipício esquerda do Macaco de maneira tão rápida que tivesse pronta a clarear do dia seguinte.

Quando, no meio da noite, Zumbi de Palmares descobriu o ardil de Domingos Jorge Velho, sua primeira providência foi executar a sentinela que não dera o alarme, e no desespero de uma guerra total.

Zumbi de Palmares estava mais uma vez encurralado e com uma única chance de escapar e para isto Zumbi juntou os comandantes e oficiais e confessou o fracasso do plano que urdira, ao atrair o exército colonial em peso para uma grande batalha às portas da capital e massacrá-lo e se caso perdesse os sobreviventes poderiam recomeçar a vida em outro lugar onde eles seriam o novo Palmares.

Se vencessem, o governo colonial ficaria de tal forma fraco e desmoralizado que aceitaria Palmares como nação soberana. Na beira do abismo, do lado ocidental da fortificação, restava uma passagem que o inimigo não tivera tempo de fechar e por ali sairiam os guerreiros – rápidos e mudos para serem recompostos em algum ponto de onde recomeçariam as guerras.

E no momento em que passaram os últimos guerreiros aconteceu que algumas pedras rolaram e um mameluco abriu fogo sobre eles, e sem saberem se combatiam ou escapavam, os guerreiros palmarinos se entrecochavam em pânico, e perto de duas centenas de negros despencaram pela cratera sem fundo.

Porém Domingos Jorge Velho não quis persegui-los pois a melhor caça estava dentro do quilombo e para isto ele mandou os canhões cuspirem fogo contra a cidadela, onde Zumbi e seus guerreiros lutaram como nunca o último momento contra os canhões de Domingos Jorge Velho, e pelos escombros da formidável parede, a multidão de índios, mamelucos e soldados finalmente penetraram em Palmares em uma fúria que não deixou nada de pé ou inteiro em Palmares quando seus soldados massacraram mulheres e crianças sem um pingo de compaixão.

Zumbi vendo a batalha perdida, fugiu para tentar construir um novo Palmares, mas um ano mais tarde, foi traído, vindo a ser morto nas brenhas da Serra Dois Irmãos por volta de cinco horas da manhã de 20 de novembro de 1695

Seu corpo foi esquartejado, sua cabeça ficou exposta em uma praça em Recife para servir de exemplo para aqueles que quisessem resistir a escravidão, morreu, mas não se entregou ao cativeiro, que apesar de toda a violência e da selvageria dos prepostos do sistema colonial, não conseguiu derrotar o símbolo do heroísmo do povo brasileiro, da resistência à dominação, Zumbi dos Palmares é referência legada tanto às gerações africanas trazidas ao Brasil quanto aos seus descendentes afro-brasileiros, mestre na luta pela liberdade, seu vulto se confunde com o caminho para a consciência do povo brasileiro, de forma exemplar, Zumbi encarna os horrores do escravismo.

E este é, para sempre, um cadáver insepulto, um morto vivo. Sua lembrança sobreviverá aos tempos que nos obrigam a sonhar, à historiografia oficial que insiste em ignorar sua real importância.

Permanecerá como símbolo das atrocidades infindáveis do poder ilimitado, arbitrário, prepotente. Ficará, acima de tudo, como exemplo a todos que resistem à opressão e lutam por liberdade e justiça.

20 de Novembro é o Dia Nacional da Consciência Negra

Zumbi, símbolo da resistência negraZumbi, símbolo da resistência negra

A data – transformada em Dia Nacional da Consciência Negra pelo Movimento Negro Unificado em 1978 – não foi escolhida ao acaso, e sim como homenagem a Zumbi, líder máximo do Quilombo de Palmares e símbolo da resistência negra, assassinado em 20 de novembro de 1695.

O Quilombo dos Palmares foi fundado no ano de 1597, por cerca de 40 escravos foragidos de um engenho situado em terras pernambucanas. Em pouco tempo, a organização dos fundadores fez com que o quilombo se tornasse uma verdadeira cidade.

Os negros que escapavam da lida e dos ferros não pensavam duas vezes: o destino era o tal quilombo cheio de palmeiras.

Com a chegada de mais e mais pessoas, inclusive índios e brancos foragidos, formaram-se os mocambos, que funcionavam como vilas. O mocambo do macaco, localizado na Serra da Barriga, era a sede administrativa do povo quilombola. Um negro chamado Ganga Zumba foi o primeiro rei do Quilombo dos Palmares.

Alguns anos após a sua fundação, o Quilombo dos Palmares foi invadido por uma expedição bandeirante. Muitos habitantes, inclusive crianças, foram degolados.

Um recém-nascido foi levado pelos invasores e entregue como presente a Antônio Melo, um padre da vila de Recife.

O menino, batizado pelo padre com o nome de Francisco, foi criado e educado pelo religioso, que lhe ensinou a ler e escrever, além de lhe dar noções de latim, e o iniciar no estudo da Bíblia. Aos 12 anos o menino era coroinha. Entretanto, a população local não aprovava a atitude do pároco, que criava o negrinho como filho, e não como servo.

Apesar do carinho que sentia pelo seu pai adotivo, Francisco não se conformava em ser tratado de forma diferente por causa de sua cor.

E sofria muito vendo seus irmãos de raça sendo humilhados e mortos nos engenhos e praças públicas. Por isso, quando completou 15 anos, o franzino Francisco fugiu e foi em busca do seu lugar de origem, o Quilombo dos Palmares.

Após caminhar cerca de 132 quilômetros, o garoto chegou à Serra da Barriga. Como era de costume nos quilombos, recebeu uma família e um novo nome.

Agora, Francisco era Zumbi. Com os conhecimentos repassados pelo padre, Zumbi logo superou seus irmãos em inteligência e coragem. Aos 17 anos tornou-se general de armas do quilombo, uma espécie de ministro de guerra nos dias de hoje.

Com a queda do rei Ganga Zumba, morto após acreditar num pacto de paz com os senhores de engenho, Zumbi assumiu o posto de rei e levou a luta pela liberdade até o final de seus dias.

Com o extermínio do Quilombo dos Palmares pela expedição comandada pelo bandeirante Domingos Jorge Velho, em 1694, Zumbi fugiu junto a outros sobreviventes do massacre para a Serra de Dois Irmãos, então terra de Pernambuco.

Contudo, em 20 de novembro de 1695 Zumbi foi traído por um de seus principais comandantes, Antônio Soares, que trocou sua liberdade pela revelação do esconderijo. Zumbi foi então torturado e capturado. Jorge Velho matou o rei Zumbi e o decapitou, levando sua cabeça até a praça do Carmo, na cidade de Recife, onde ficou exposta por anos seguidos até sua completa decomposição.

“Deus da Guerra”, “Fantasma Imortal” ou “Morto Vivo”.

Seja qual for a tradução correta do nome Zumbi, o seu significado para a história do Brasil e para o movimento negro é praticamente unânime: Zumbi dos Palmares é o maior ícone da resistência negra ao escravismo e de sua luta por liberdade. Os anos foram passando, mas o sonho de Zumbi permanece e sua história é contada com orgulho pelos habitantes da região onde o negro-rei pregou a liberdade.

Zumbi dos Palmares – Resumo

Após quase um século de sucessivos fracassos, em 20 de dezembro de 1695, uma tropa mercenária, contratada pela Coroa portuguesa e os usineiros de açúcar da então capitania de Pernambuco no nordeste brasileiro, trucidavam o último foco da resistência armada dos escravos que passaria à história como o Quilombo dos Palmares. Seu líder, conhecido pelo nome de guerreiro africano, Zumbi, era morto em um combate heróico e desigual. Sua cabeça seria decepada do corpo, enfiada em uma estaca e exibida em na praça principal de Olinda até descarnar-se totalmente para mostrar que o grande líder negro não era imortal e para meter medo nos escravos e prevenir futuras rebeliões.

A repressão contra o Quilombo não se esgotou com a morte de Zumbi.

A historiografia oficial procurou retirar legitimidade histórica à resistência negra, com o argumento de que, caso saíssem vitoriosos, os quilombolas teriam transformado o Brasil em um outro Haiti, ou seja, liquidado a cultura europeia, lusitana, substituindo-a pela barbárie africana e condenando o país a um atraso sem perspectivas de redenção, concepção esta que ignora o atraso nacional existente causado justamente pela predominância e longa sobrevivência da escravidão: “A todos os respeitos menos indiscutível é o serviço relevante prestado pelas armas portuguesas e coloniais, destruindo de uma vez a maior das ameaças à civilização do futuro povo brasileiro, nesse novo Haiti, refratário a todo o progresso e inacessível a toda civilização, que Palmares vitorioso tria plantado no coração do Brasil” (Os Africanos no Brasil, Nina Rodrigues)

Na década de 40 iniciam-se no Brasil o estudos negros voltados para recuperar a verdade histórica sobre a escravidão, a situação do negro e suas lutas. Um dos pioneiros deste gênero de historiografia, Édison Carneiro, escreve o clássico O Quilombo dos Palmares onde, pela primeira vez, a história da epopeia dos escravos é relatada sobre a base de uma documentação rigorosa e um método científico.

Escrito em pleno Estado Novo – que foi, entre outras coisas, um regime de segregação racial – o livro é proibido e tem que ser publicado pela primeira no estrangeiro.

Na década de 70, a luta dos escravos será restada pelas tendências nacionalistas e foquistas, sendo Zumbi transformado em símbolo da resistência nacional ao imperialismo, da mesma forma que em outros países latino-americanos o foram os líderes das grandes rebeliões indígenas como Tupac Amaru e Tupac Catari. Os historiadores deste período (Décio Freitas, Palmares, a guerra dos escravos, originalmente, Palmares, a guerrilha dos escravos; Clóvis Moura, Quilombos e rebelião negra).

A crise da ditadura militar, onde novamente intensificou-se a opressão do negro, com manifestações de aberta segregação racial, levou ao surgimento de um novo movimento negro como parte da luta antiditatorial do movimento estudantil e operário.

Esta nova vaga da mobilização política do negro brasileiro terá maior envergadura que o do período 45-64, expressa nos Congressos negros da década de 40 inspirados pelo próprio Édison Carneiro e outros, cuja atividade política se colocava claramente nos marcos do nacionalismo burguês varguista. O movimento do final dos anos 70 levará à constituição do Movimento Negro Unificado, um primeiro esforço de dar um caráter unificado e nacional às tendências política do movimento negro e, pela primeira, vez de claras características nacionalistas, ou seja, de afirmação do negro parte oprimida da sociedade e de condenação das tentativas de “integração racial” que, em absolutamente nada, modificaram a sorte da segundo maior população negra do planeta, maior que todos os países africanos, com a exceção da Nigéria.

O impasse do incipiente nacionalismo negro brasileiro – que nunca conseguiu definir um programa ou criar uma verdadeira organização política, apesar do seu começo vigoroso na luta contra a ditadura – não impediu o crescimento de uma consciência e uma mobilização negra, impulsionada pela situação geral do negro, formando a camada mais miserável da população, que abrange a maioria dos desempregados, dos sem-teto, ganhando salários mais baixos que os brancos, continuando a vítima preferencial da arbitrariedade judiciária e da violência policial e tendo bloqueada todas as possibilidades de ascensão social, a começar pela própria universidade, onde os negros que perfazem cerca de 60% da população do país constituem menos de 5% do total de matrículas.

A grande repercussão dos 300 anos do martírio de Zumbi, que a própria imprensa burguesa reconhece ser um “herói ignorado pela história”, inclusive com a inédita benção oficial é expressão do crescimento das contradições sociais e da revolta do negro(Fernando Henrique Cardoso, ladeado pelo ex-rei do futebol e ministro dos Esportes, Pelé, e a senadora petista Benedita da Silva, compareceu ao município de União dos Palmares, no Estado de Alagoas, na Serra da Barriga, próximo ao legendário mocambo do Macaco, centro da resistência Palmarina para prestar a homenagem cínica dos opressores ao herói dos oprimidos).

As manifestações políticas e culturais da cultura negra – que se recusa a ser enterrada segundo os desejos da classe dominante que se julga mais próxima da Europa do que da África ou das Antilhas – mostram que o passado está alcançando o presente e a questão negra, assim como na África do Sul e nos EUA, desloca-se rumo ao centro da crise política, como resultado da gigantesca crise capitalistas que acentuou as tendências a empurrar os setores mais oprimidos e explorados da população para o último degrau da miséria e da violência.

A escravidão africana no Brasil

A escravidão africana no Brasil foi uma parte fundamental de um dos maiores empreendimentos mercantis dos primórdios do capitalismo, a indústria do açúcar, somente suplantada pela extração de metais preciosos na América hispânica e, posteriormente, no próprio Brasil.

O atraso brasileiro foi uma consequência direta da excelência das condições naturais que permitiam a monocultura de produtos tropicais de grande valor comercial na Europa dos séculos XV e XVI.

Os objetivos comerciais da colonização determinaram o monopólio da terra, de alto valor como investimento e a reunião de mão-de-obra escrava necessária às grandes plantações de cana e aos engenhos de açúcar.

Da mesma forma que as terras relativamente inférteis da Nova Inglaterra terminaram por dar lugar à pequena propriedade agrícola e a uma acumulação de capital nativo, as terras tropicais do nordeste brasileiro, de extraordinária capacidade produtiva, deram lugar ao latifúndio escravagista que bloqueou o caminho para um desenvolvimento capitalista próprio.

A mão-de-obra africana foi trazida ao país por meio de uma violência sem paralelo na história da humanidade nos célebres navios negreiros, onde se amontavam seres humanos em um porão infecto, em viagens de dois e três meses que transformavam uma parcela da carga em cadáveres e mutilava definitivamente uma outra, de tal forma que a contabilidade dos traficantes de escravos sempre previa com uma perda como resultado da viagem.

No tempos do embargo ao tráfico tornou-se comum os navios negreiros arrojaram a sua carga de miséria humana ao mar para evitar a repressão da marinha britânica.

Nas fazendas de açúcar, a sorte do escravo africano não melhorava em nada. Os feitores faziam os escravos trabalharam até o limite das suas forças e, para disciplinar as tentativas de rebeldia, faziam uso das mais violentas formas de tortura que iam desde as chibatadas até as mais hediondas formas de mutilação como arrancar dentes, língua, olhos, dedos, orelhas e os seios no caso das mulheres.

O estupro das negras tornou-se uma verdadeira instituição, praticada inclusive pelos piedosos frades da Igreja Católica, o que deu origem ao abominável comércio que os pais faziam dos próprios filhos, como ocorreu com o notável líder abolicionista e poeta, Luiz Gama, filho de um comerciante português com uma escrava e que foi vendido pelo próprio pai.

Esse martírio inacreditável chegou ao extremo de dar lugar a uma forma de resistência passiva, conhecida como banzo, onde os negros morriam de uma inanição espiritual que era na realidade uma forma de suicídio por falta de vontade de viver.

Esse quadro dantesco de horrores inacreditáveis não impediu que boa parcela da intelectualidade burguesa, inclusive do modernismo do século XX, difundissem a extraordinária versão de que a escravidão no Brasil teria sido uma dominação “branda e humanitária” (Gilberto Freyre) e exaltassem o caráter naturalmente “cordial” (Sérgio Buarque de Hollanda) do homem e da cultura brasileira, tudo o que teria desaguado em uma sociedade que seria um modelo de “democracia racial”!

Calcula-se que cerca de 50 milhões de almas foram trazidas ao Brasil durante os mais de 300 anos de escravidão partidas principalmente das possessões portuguesas de Angola, Moçambique, Cabo Verde e Guiné Bissau.

A selvageria inaudita do regime escravista – que não dava ao escravo nenhuma alternativa – despertou uma dura e permanente resistência dos negros que se traduziram em milhares de revoltas de todos os tamanhos e por todo o país, algumas das quais como as revoltas dos negros islâmicos, os malês e hussás na Bahia, no início do século XIX ou ainda os levantes escravos realizados como parte da campanha abolicionista como a grande marcha em São Paulo e as rebeliões em Campos no Rio de Janeiro no final do mesmo século assumiram a forma de verdadeiras insurreições contra o regime escravagista.

As rebeliões escravas, no entanto, assumiram, mais comumente, a forma dos quilombos, os quais durante todos os três séculos de escravidão brotaram por todos os estados do país como cogumelos após a chuva, não se excetuando os estados mais distantes e menos povoados como os do norte do país, na região amazônica. Nos estados originais da colonização portuguesas os escravos rebelados criaram centenas de quilombos, o mesmo ocorrendo em Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e até Santa Catarina no sul do país,alguns dos quais sobreviveram até os dias de hoje como comunidades que reivindicam a posse das terras dos antigos quilombos que lhe deram origem.

Os quilombos têm sido retratados, de maneira completamente equivocada, por muitos historiadores como sendo uma forma subalterna de resistência à escravidão, na medida em que não tinha uma concepção de conjunto, um “projeto político” etc. mas se “limitavam” a agrupar os escravos fugidos das fazendas.

Na realidade, o quilombo, ou seja, a fuga e a criação de um foco de resistência em forma de comunidade produtiva é a forma mais tradicional de revolta de escravos na história da humanidade.

No princípio das guerras servis em Roma, encontrava-se o mesmo método inevitável: a fuga de escravos, muitas vezes com a liquidação dos donos, dava lugar a comunidades fortificadas as quais inevitavelmente, na medida em que cresciam eram obrigadas, para sobreviver, a engajar um combate de vida ou morte contra o regime escravagista.

A atribuição de um caráter inócuo aos quilombos como instrumento de destruição do regime escravagista parte de uma ilusão de ótica.

A maioria dos quilombos foram focos relativamente isolados de resistência porque a revolta do escravos não havia podido se aproveitar de uma crise interna do regime, ou, para utilizar, uma expressão conhecida, a crise “por baixo” não havia se combinado com uma crise “por cima”, ou ainda, embora os “de baixo” não pudessem mais ser governados como antes, os “de cima” continuavam conseguido manter a sua dominação como antes.

Justamente a importância histórica do quilombo dos Palmares é que mostra que, diante da crise do regime colonial, a revolta escrava apresentava um alto potencial subversivo em relação ao regime escravagista em seu conjunto.

A crise das metrópoles e da colônia

Portugal constituiu-se como reino independente de Castela apenas em 1385, onde um levante nacional inaugurou com D. João I a dinastia de Aviz. Com a vitória das forças portuguesas na batalha de Aljubarrota, consolidou-se o novo reino que conhecerá sua fase de maior prosperidade a partir de 1415 quando, com a conquista de Ceuta, inicia-se o expansionismo português que, após a conquista da passagem do Cabo das Tormentas (África do Sul) por Bartolomeu Dias, alcançará o apogeu no reino de D. Manuel I (1495-1521), conhecido como “o venturoso”, durante cujo reinado realiza-se o ciclo principal das navegações portuguesas com a famosa viagem de Vasco Gama estabelecendo o caminho marítimo para o oriente.

A descoberta e o início da colonização do Brasil vieram a culminar esta obra.

Ao final do século XVI, a dinastia de Aviz inicia o seu nadir, extinguindo-se com a morte do rei D. Sebastião I (1557-78), morto com boa parte do seu exército nas cruzadas na batalha de Alcácer-quibir contra os mouros.

A partir daí, enfraquecido, a nobreza mercantil Portugal submete-se à coroa espanhola, então a maior potência europeia, em busca de estabilidade política e econômica e assim permanecerá de 1580, com Felipe I (Felipe II da Espanha) até 1640, quando o levante da aristocracia portuguesa contra Felipe III (Felipe IV da Espanha) separa os dois reinos, estabelecendo no trono português a dinastia bragantina com D. João IV (1640-56).

Em 1624, os holandeses, através da chamada Companhia das Índias ocidentais invadem a Bahia, centro da colônia, e são expulsos por uma força conjunta hispano-lusitana. Em uma segunda tentativa, seis anos depois, os holandeses conseguem se apoderar da capitânia de Pernambuco, segundo centro produtor das possessões portuguesas, aí permanecendo até 1654.

É neste marco, do que foi provavelmente a maior crise da colônia portuguesa, com os holandeses se apoderando concomitantemente das terras africanas de Portugal que se dá o crescimento do Quilombo de Palmares.

A guerra leva a extremos a debilidade do regime escravagista, a tal ponto que os portugueses oferecem aos negros a alforria em troca de participarem da guerra contra a potência dos países baixos e é formado o “terço” (formação militar tradicional do exército espanhol da época) do comandante negro Henrique Dias que, graças aos serviços prestados, não apenas contra os holandeses, mas também contra o próprio Palmares, alça-se à condição de fidalgo negro em uma terra de escravos.

As formações quilombolas da região dos Palmares datavam já do final do século XVI. Ali reuniam-se os escravos fugitivos das fazendas da região, índios e inclusive homens brancos que, por um motivo ou outro, sofressem a opressão ou a perseguição do regime colonial. Durante a guerra contra a ocupação holandesa, as comunidades embrionárias receberam o reforço de um incremento das fugas e de várias rebeliões que, não raro, terminavam com a morte dos donos e feitores dos engenhos e a fuga em massa dos escravos.

A partir daí, o Quilombo dos Palmares já não era uma comunidade única, mas um conjunto de quilombos chamados de mocambos, os quais podem ter atingido uma população de cerca de 30 mil pessoas, um número extraordinário para a época. Segundo Décio Freitas (op. cit.) “conhecemos o nome e a localização de onze povoações palmarinas. Macaco, sobre a serra da Barriga, num ponto a sudoeste da atual cidade alagoana de União dos Palmares, era a maior e mais importante. Possuía 1.500 casas e uma população de cerca de oito mil habitantes.

Estrategicamente era quase inexpugnável e por isso veio a converter-se na capital da república negra. Seguia-se Amaro, 54 quilômetros a noroeste de Serinhaém, com uma extensão de seis quilômetros, mil casas e uma população avaliada em cinco mil habitantes. Nas cabeceiras do rio Satuba e imediações da serra da Juçara, numa distância de 36 quilômetros do Macaco, erguia-se Subupira. Media 6 quilômetros de extensão e situava-se na distância de três montes. Entre os ribeiros Paraibinha e Jundiá, perto do lugar onde mais tarde existiu o aldeamento do limoeiro, ficava a povoação de Osenga, 20 quilômetros a oeste de Macaco. Zumbi situava-se 96 quilômetros a noroeste de Porto Calvo.

Acotirene estava 30 quilômetros ao norte de Zumbi e 180 quilômetros a noroeste de Porto Calvo. havai duas povoações contíguas chamadas Tabocas, e Acotirene a leste de Zumbi. Danbrabanga se erguia a 84 quilômetros de Tabocas, no lugar onde depois existiu o povoado de Sabalangá, no caminho da serra Dois Irmãos, atual município de Viçosa. A noroeste de Alagoas, 150 quilômetros, na serra do Cafuxi, ficava Andalaquituche. Nas redondezas da atual cidade de Garanhuns estavam as povoações de Alto Magano e Curiva” (Palmares, a guerra do escravos).

Quilombo dos Palmares

A organização social e política dos quilombos deu lugar a inúmeras especulações e confusões entre os historiadores de diversas tendências. Alguns acreditam terem sido os Palmares uma república, outros uma monarquia. Aparentemente os líderes eram eleitos por um conselho de características militares e havia uma autoridade pessoal que seria o rei dos quilombos, o que dá a entender que seria uma monarquia eletiva, como assinalaram alguns historiadores. No período final do quilombo, este posto estava ocupado pelo Ganga Zumba, nome que para alguns designaria o cargo, mas que para outros seria o nome próprio do rei. O mesmo ocorre com Zumbi, que alguns historiadores acreditaram ser a designação de um cargo militar que corresponderia ao posto de general.

A historiografia mais moderna estabeleceu, de forma relativamente sólida que ambas personagens existiram de fato e que seus nomes não se referem a cargos e posições políticas.

Longe de ter sido um aglomerado caótico, os Palmares parecem ter tido uma organização social e política complexa e muito bem estruturada, com instituições, leis e costumes definidos. Mais ainda, seriam rigorosas estas instituições refletindo o estado de guerra permanente do quilombo: “todos os negros fugitivos que conquistaram a sua liberdade, a conservam entre os habitantes de Palmares; todos os que se arrancavam das roças ficavam escravos. Melhor se desenvolveu e apurou esta polícia (política NR) na defesa externa e interna em um esboço de organização da justiça e da guerra.

Ali eram punidos de morte o homicídio, o adultério e o roubo; de morte se puniam ainda aqueles que, já sendo livros em Palmares, voluntariamente regressavam ao cativeiro em casa dos seus antigos senhores; menor era a pena em que incorriam os escravos de Palmares que se evadiam. Devia ser assim. A suprema lex na manutenção de Palmares era a capacidade de manter a liberdade adquirida: faltar a esse dever era desertar e trair a causa comum e o máximo da punição devia correr em auxílio dela, a soerguer e sustentar os ânimos dúbios” (Nina Rodrigues, op. cit.).

O historiador hostil aos quilombolas retrata a extraordinária tensão de forças na luta pela liberdade e o princípio constitutivo da organização do quilombo de maneira insofismável.

Do ponto de vista econômico, os quilombos teriam se organizado através da produção agrícola e do artesanato – muitos escravos detinham conhecimento em profissões técnicas, inclusive como metalúrgicos e armeiros – voltado para as necessidades da comunidade e realizada em caráter comunitário. parece não haver dúvida do êxito econômico do quilombo retratado nos diversos relatos de intenso comércio entre os moradores do quilombo e os habitantes da regiões próximas, com os quais os ex-escravos trocavam produtos agrícolas e gado principalmente por armas e munições.

Segundo Edison Carneiro, “uma das atividades principais dos negros palmarinos era a agricultura. Os homens do quilombo lavravam e disciplinavam a terra, beneficiando-se da experiência que traziam como trabalhadores do eito, na fazendas e canaviais dos brancos.

“A lavoura mais importante era a do milho, que plantavam e colhiam duas vezes por ano, descansando depois de duas semanas, ‘entregando-se soltamente ao prazer’, mas também plantavam, de acordo com Barleus, feijão, batata-doce, mandioca. A expedição Blaer-Reijmbach (1645) encontrou com efeito, grandes plantações, ‘na maior parte de milho novo’.

Lavouras igualmente importantes eram a da banana e a da cana-de-açúcar. Os holandeses, em 1645, tiveram de atravessar, no caminho dos Palmares, ‘um denso canavial na extensão de duas milhas’ e, depois de passar o ‘velho’ Palmares, andaram cerca de milha e meia, “sempre por dentro de roças ou plantações abandonadas’, onde acharam pacovas e canas para matar a fome” (op. cit.).

O mesmo autor assinala ainda que “a expedição holandesa de 1645 encontrou quatro forjas nos Palmares e o governador Fernão Coutinho, em 1671, dizia que os negros rebelados já possuíam ‘tendas de ferreiro, e outras oficinas, com que poderão fazer armas, pois usam de algumas de fogo que de cá levam; e este sertão é tão fértil de metais, e salitre, que tudo lhes oferece para a sua defesa, se lhes não faltar a indústria que também se pode temer dos muitos que fogem, já práticos em todas as mecânicas…’” Em contraste com esta situação, assinala que, “em volta do quilombo, os moradores arrastavam uma existência miserável empobrecidos pelo domínio holandês e pelas contínuas contribuições, mais tarde, para a guerra contra os Palmares. Especialmente os moradores das vilas de Alagoas, Porto Calvo, Serinhaém e Rio de São Francisco (Penedo)” (op. cit.).

A guerra contra Palmares

Durante todo o período de existência do quilombo, a coroa portuguesa e, por um período, o governo holandês do Brasil, enviaram contra Palmares dezenas de expedições, das quais cerca de 30 apenas após a expulsão dos holandeses de Pernambuco.

Terminado o longo período de guerra contra os holandeses, os senhores de engenho e o governo português intensificaram a campanha contra Palmares, colhendo na maioria das oportunidades retumbantes fracassos nas mãos dos quilombolas, decididos, bem armados e fortificados. Os redutos dos palmarinos eram protegidos pelas condições naturais, em meio a selvas e montanhas que dificultavam o acesso das expedições repressivas, bem como o transporte de armamentos e a comunicação com as cidades.

A primeira expedição bem-sucedida, que abre uma aguda crise no quilombo foi dirigida por Fernão Carrilho, em 1677. Soldado de carreira, Carrilho conquistara a patente de capitão de infantaria através da repressão dos mocambos e quilombos na região. Após uma série de incidentes, em que perdeu metade dos homens, a expedição conseguiu invadir a povoação de Amaro, ferindo o chefe Ganga Zumba, matando vários importantes líderes quilombolas e fazendo cerca de 200 prisioneiros.

Voltando a Porto Calvo, Carrilho apresentou o resultado da expedição como “destruídos os Palmares e vencidos os negros”, o que estava longe da realidade. No entanto, o sucesso relativo da expedição abriu uma cisão no interior dos Palmares. O chefe Ganga Zumba decide estabelecer uma negociação com os brancos e procurar um tratado de paz.

Uma delegação é enviada à cidade para parlamentar com o governador geral que a recebe como uma delegação governamental.

A partir daí fica estabelecido um acordo em que o governo se compromete a respeitar a liberdade e a autonomia dos palmarinos, com a condição de que estes abandonem os Palmares – cujas terras férteis já eram cobiçadas pelos brancos – estabelecendo uma comunidade no interior em um lugar chamado Cucaú, que entregassem todos os escravos fugidos não nascidos nos Palmares e depusessem as armas. O acordo final foi firmado em Recife, capital da capitania, pessoalmente pelo próprio Ganga Zumba em 5 de novembro de 1678.

As terras do quilombo foram distribuídas pelo governador geral entre os grandes proprietários fundiários da capitania.

Contra o que pensaram os senhores de engenho e o governo colonial, o Quilombo ainda estava longe de terminar. Seriam necessários mais 18 anos de luta.

Zumbi

A maioria dos quilombolas acabará voltando as costas ao chefe Ganga Zumba e continuará a luta sob o comando de um novo chefe, Zumbi, comandante militar do Quilombo.

As incertezas quanto à história de Palmares são ainda maiores no caso do famoso chefe negro. Alguns historiadores sustentam que se chamava Francisco, fora escravo de um padre que o educara e o ensinara a ler e escrever e algum conhecimento do latim para o ofício de coroinha. Segundo esta versão, o menino educado no catolicismo, teria fugido, abandonado suas crenças e adotado nome africano. Mais provável é que, como defende Décio Freitas, teria nascido livre em Palmares, seria casado e teria filhos.

Mais recentemente, o antropólogo Luiz Mott levantou a suposição de que o líder negro seria homossexual, o que provocou uma injustificada e reacionária reação agressiva de vários setores do movimento negro.

O que é certo é que ao redor de Zumbi agrupou-se a maioria dos quilombolas e apenas mil pessoas seguiram com Ganga Zumba para o Cucaú. Zumbi retomou o Macaco, impossibilitando a colonização planejada pelos latifundiários e organizou um plano para destruir o Cucaú que se erguia como uma ameaça à luta contra o opressor branco.

Os adeptos de Zumbi infiltraram-se entre os moradores do Cucaú e elaboraram um plano para envenenar Ganga Zumba e, a partir daí, deflagar uma insurreição que tomasse conta da povoação levando os seus habitantes de volta para os Palmares. Segundo a versão apresentada por Édison Carneiro, os conspiradores chegaram a envenenar Ganga Zumba, mas a conspiração foi revelada prematuramente por alguns dos homens de confiança do antigo chefe o que possibilitou a intervenção de tropas governamentais que esmagaram a insurreição, o que de qualquer maneira levou à destruição do Cucaú.

Confrontado com uma situação de emergência, Zumbi estabeleceu nos Palmares, uma espécie de governo de salvação publica, ou seja, uma ditadura revolucionária, impondo a lei marcial, a militarização de todo o quilombo e a pena morte para os renegados. Segundo Décio Freitas, “há informações precisas de que Zumbi sem perda de tempo subordinou toda a vida de Palmares às exigências da guerra implacável que se anunciava. Deslocou povoações inteiras para lugares mais remotos. Incorporou às milícias e submeteu a adestramento intensivo todos os homens válidos. Multiplicou os postos de vigilância e observação na orla das matas. Despachou agentes para reunirem armas e munições. Reforçou as fortificações do Macaco a ponto de torná-la quase inexpugnável.Finalmente, decretou a lei marcial: os que tentassem desertar para o Cucaú, seriam passados pelas armas” (Op. cit.).

A reviravolta na situação dos acordos concluídos por Ganga Zumba com o governo colonial colocam em evidência o valor como líder político e militar de Zumbi e uma determinação revolucionária que justificam plenamente a comparação com o grande líder das revoltas escravas da antiguidade, que quase colocou o império romano de joelhos, Espártaco.

O grande mérito de Zumbi foi o de que, com a sua rejeição do acordo feito por Ganga Zumba, denunciou de maneira insofismável a ilusão que consistia a tentativa de um acordo entre os escravizados e os escravizadores para estabelecer um modus vivendi nos marcos do regime escravagista.

A destruição de Palmares

Após o fracasso do acordo entre o governo colonial e os quilombolas novas expedições foram tentadas, inclusive sob o comando do mesmo Fernão Carrilho, que havia obtido a primeira vitória sobre o Macaco, mas fracassaram. Finalmente, tendo superado os problemas externos, a coroa portuguesa pode preparar-se com calma e superar relativamente as suas contradições internas de forma a organizar uma ofensiva mais efetiva sobre o reduto de rebeldia negra.

A derrota do legendário quilombo passaria à história como obra de um paulista, o que, naqueles tempos, era sinônimo da população mais selvagem do país, sendo a capitania de São Vicente, onde ser localizava a cidade de São Paulo de Piratininga, a mais atrasada de todo o país. Ali criaram-se as famosas “bandeiras”, tropas mercenárias de brancos, mestiços e índios cuja missão era fazer a guerra – principalmente aos índios – por encomenda e expedições arriscadas pelo sertão em busca de ouro e pedras preciosas. Os nomes dos principais “bandeirantes” (chefes das bandeiras) – apresentados idilicamente na história oficial como pioneiros e desbravadores – como Fernão Dias Paes Leme, Raposo Tavares, Borba Gato, o “Anhanguera”, que enfeitam as estradas de São Paulo, estão relacionados com os piores massacres e conflitos com a Igreja pela escravização dos índios, tendo sido os responsáveis pela destruição da famosa “república comunista”-cristã” dos índios guaranis na fronteira do Brasil.

Foi um dos mais brutais destes chefes mercenários, o bandeirante Domingos Jorge Velho, o homem chamados para comandar a destruição da resistências de Zumbi. Mameluco, ou seja, mestiço de índio com branco, o paulista foi caracterizado pelos próprios senhores de engenho pernambucanos, brutais donos de escravos, nas palavras do próprio bispo de Pernambuco: “este homem é um dos maiores selvagens com que tenho topado: quando se avistou comigo trouxe consigo língua (tradutor NR), porque nem falar sabe, nem se diferencia do mais bárbaro tapuia mais que em dizer que é cristão, e não obstante o haver-se casdo de pouco, lhe assistem sete índias concubinas, e daqui se pode inferir como procede no mais; tendo sido a sua vida, desde que teve uso da razão, – se é que a teve porque, se assim foi, de sorte a perdeu que entendo que não achará com facilidade, – se até o presente, andar metido pelos matos à caça de índios e índias, estas para o exercício de suas tropezas, e aqueles para os granjeios de seus interesses” (citado por Edison Carneiro, op. cit.)

Depois de muitas indas e vindas, relativas a negociações sobre o pagamento das tropas, a recompensa aos bandeirantes, a ajuda em homens e munições e vencidas as resistências dos donos de engenho, estava pronta a expedição final contra os Palmares. Na primeira tentativa, os paulistas lançaram-se contra um mocambo próximo da capital do quilombo e foram rechaçados pelos guerreiros de Zumbi sofrendo pesadas perdas e de homens e equipamento.

As tropas de Alagoas e de Porto Calvo foram tomadas de pânico e fugiram. Jorge Velho, que havia chegado com mais de mil homens, entre brancos e índios, voltou para Porto Calvo com 600 índios e 45 brancos.

O bandeirante pediu reforços ao governador-maior e “Em novembro de 1793 começaram a chegar a Porto Calvo os comboios de mantimentos e material bélico da Bahia.

Em dezembro chegam os grandes efetivos: 3.000 homens recrutados em Olinda e recife, comandados pelo capitão Bartolomeu Simões da Fonseca; 2.000 de Alagoas e Porto Calvo, sob as ordens do sargento-mor Sebastião Dias Mineli, mais um corpo de elite, sob o comando o capitão-mor Barros Pimentel.

De Penedo e São Miguel chegaram 1.500 homens. Os irmão Bernado eAntônio Viera de Mello se apresentaram à frente de 300 homens e uma boiada. Da Bahia, paraíba e Rio Grande do Norte vieram mais 800 homens. Eram ao todo mais de nove mil homens – brancos afildagados, mamelucos bronzeados, mulatos beiçudos, índios, pernambucanos, paulistas, baianos, piauienses, reunidos no maior contingente militar até então organizado na colônia.

“A guerra dos Palmares transformara-se em uma cruzada contra os negros” (Domingos Jorge Velho e a penetração paulista no Nordeste, Renato Castelo Branco).

Em janeiro de 1794, esta força armada chegou ao mocambo do Macaco e estabeleceu seu quartel general defronte da enorme paliçada montada por Zumbi, conhecida como a Cerca Real do Macaco. Ali constituíram acampamento e construíram um pequeno forte denominado Nossa Senhora das Brotas. Do outro lado da cerca estavam preprados para lutar cerca de 11 mil guerreiros negros do quilombo.

O cerco à capital, no entanto, não estava dando resultado.

Os palmarinos rechaçaram mais um ataque com grande perdas aos sitiantes que não conseguiam aproximar-se da Cerca Real:“Foi então que o capitão-mor Bernado Vieira de Melo, que comandava a tropa pernambuca, postada do outro lado das forças de Domigos Jorge Velho, ‘por indústria sua’ construiu, com seus escravos e solados, uma cerca de 270 braças (594 metros) de pau a pique, acompanhando a dos negros. Os outros comandantes – por ordem do mestre de Campo – foram fzendo o mesmo nas ‘testadas’ que defendiam, envolvendo, por fim, numa contra-cerca de enromes dimensões, o reduto plamarino (…) Ainda assim, a luta parecia indecisa. paulistas, alagoanos e pernambucanos não podiam paroximar-se da ‘cerca’ do Zumbi sem perigo de vida… O Mestre de Campo ‘excogitou’, então, construir uma nova cerca, ‘obliquamente, desde seu quartel a uma ponta daquela do inimigo, a qual não era defendida de posto nenhum, fiada com que se terminava em um precipício inacessível’ (…) Na sexta-feira, 5 de fevereiro de 1694, o Zumbi passou em revista as defesas da praça e ao chegar a esse ângulo notou que faltava somente ‘coisa de’ duas braças (4,40 metras) para que a cerca oblíqua encontrasse com a sua. (Os homens de Domingos Jorge Velho só podiam trabalhar durante a noite e a manhã os surpreendera sem terminar a tarefa).

O chefe negro repreendeu severamente o guarda local e deu um ‘catanásio’ no comandante do posto, dizendo-lhe, de acordo com a narrativa do Mestre de Campo: – ‘E tu deixaste fazer essa cerca aos brancos? Amanhã seremos entrados, e mortos, e nossas mulheres e filhos cativos!’”

A alternativa que restou aos guerreiros de Zumbi foi tentar escapar pela brecha que havia junto ao precipício. Na noite seguinte, centenas de pessoas procuraram escapar em silêncio por ali e, descobertos pelas sentinelas, sofreram pesadas baixas com muitos despencando pelo abismo e centenas de feriados, a tal ponto que, no dia senguinte, as sentinelas puderam seguir os fugitivos por um amplo rastro de sangue, tendo sido o próprio Zumbi um dos feridos.

Bernardo Vieira de Mello perseguiu os fugitivos e iniciou-se um massacre aterrados. Segundo relatos, degolou mais de 200 guerreiros, somente deixando com vida duas mulheres e duas crianças. Pela manhã, entraram na cidadela do Macaco. “Os expedcionários degolavam e matavam sem misericórdia. menciona-se que o alferez João Montez como um dos qua mais se distinguiram na carnificina. Os soldados, disse Jorge Velho, ‘degolaram os que puderam’. Desvairados pela sede de sangue, não pensavam em fazer presas. Conta Frei Loreto de Couto que avançavam cortando e matando tudo o que econtravam’ e os cadáveres se amontoavam ‘tendidos tantos que lhes faltou a muitos terreno para caírem’ (…) Arrasada e incendiada, a cidadela negra ardeu a noite inteira em uma enorme fogueira cujos rubros clarões puderam – assim reza a tradição – ser divisados de Porto Calvo. Apenas quinhentos e dez negros apareceram vivos como prisioneiros”(Décio Freitas, op. cit.).

A fúria das hostes repressivas fora tão intensa que esqueceram-se de capturar os homens para reescravizá-los, apesar do seu alto valor comercial.

Após a derrota do Macaco, os mercenários de Domingos Jorge Velho capturaram um por um os demais mocambos dos Palmares matando, incendiando e degolando com a mesma intensidade em todos os lugares, de tal forma que somente sobreviveram mulheres e crianças. Em muitos casos as mulheres se suicidavam e matavam seus filhos para escapar à escravidão.

A resistência, porém, ainda não havia terminado. Zumbi escapara à carnificina e havia reorganizada uma pequena quantidade de guerreiros em torno a ele, ingressando agora em uma guerra de guerrilhas contra os brancos. Os sobreviventes começaram a atacar em vários lugares através de pequenos grupos armados.

Esta situação perdurou até o final do ano, quando finalmente, um dos grupos dirigido por Antonio Soares foi capturado por André Furtado de Mendonça que torturou o prisioneiro e, finalmente, conseguiu obter a localização do esconderijo de Zumbi.

“O esconderijo se situava em um ponto recôndito da mata, provavelmente na serra Dois Irmãos, lugar de desfiladeiros, penhascos abruptos e gargantas profundas por uma das quais se precipita o rio Paraíba. Zumbi mantinha sempre junto a si uma guarda de 20 homens, mas quando Soares chegou seguido à distância pelos paulistas a guarda se achava reduzida a 6 homens.

“O drama foi rápido. Cercado o lugar por Furtado de Menença, encaminhou-se Soares para o chefe, que o acolheu confiadamente. Então, bruscamente, Soares enterrou-lhe um punhal no estômago e deu sinal aos paulistas. Acudido logo pelos companheiros e apesar de mortalmente ferido, Zumbi ainda lutou com bravura. Em carta de 14 de março de 1696 para o rei, Melo e Castro contou que Zumbi ‘pelejou valorosa e desesperadamente, matando um, ferindo alguns e, não querendo render-se nem aos companheiros, foi preciso matá-lo e não só a um se apanhou vivo” (Décio Freitas, op. cit.).

Uma luta sem perspectivas?

Se a historiografia burguesa oficial, como Nina Rodrigues, procurou tirar legitimidade histórica à luta do Quilombo, impugando-o por ser uma perspectiva de acentuar o atraso nacional, a historiografia da esquerda nacionalista em foquista não foi capaz de atribuir à luta de Zumbi uma perspectiva histórica real, ou seja, que se caracterizava como uma tentativa historicamente inviável.

Segundo Décio Freitas, um dos principais historiadores do Quilombo e da luta dos negros brasileiros em geral, a derrota dos Palmares “estava selada por limitações históricas objetivamente intransponíveis” (Op. cit.).

Para o autor, a sociedade colonial brasileira, criada nos marcos do mercado mundial capitalista e dependente dele, é assimilada à sociedade escravista antiga, ou seja, pré-capitalista, esquecendo-se que o Quilombo é contemporâneo da revolução burguesa na Inglaterra e que, histórica e socialmente, está mais próximo, principalmente em suas perspectivas, das rebeliões camponesas (como por, exemplo, na Alemanha no século anterior) do que das rebeliões de escravos da Roma antiga.

No entanto, mesmo na Roma antiga, não é correto dizer que as rebeliões escravas estavam inevitavelmene fadadas ao insucesso.

A rebelião de Espártaco esteve muito próxima de derrotar os exércitos romanos e de invadir e ocupar a própria Roma, o que não ocorreu em função das dificuldades da liderança dos rebelados que, naturalmente, se atemorizaram diante de tão extraordinária perspectiva. A demonstração de que poderia ter liquidado com o regime escravagista estava em que, após as guerras servis, o regime escravagista entrou em declínio em todos os lados, tendo inclusive uma expressão jurídica na forma de inúmeras leis que colocavam limites à escravidão, feitas pelo próprio patriciado romano.

Segundo o autor, “a trágica contradição que pesava sobre as rebeliões escravas consistia em quem por um lado, não podiam triunfar a menos que ganhassem a adesão de alguma categoria social importante e, por outro lado, esta possibilidade estava objetivamente excluída nos marcos da sociedade escravista. Deste modo, lutando pateticamente sós, contra tudo e contra todos não tinham perspectiva.

Suas tentativas se limitavam a uma série de insurreições, de repressões, de novas insurreições” (Op. cit.).

A experiência história da própria escravidão latino-americana desmente esta análise, como ficou comprovado cerca de 150 anos depois no caso do Haiti, onde os escravos, aproveitando-se da crise da metrópole acabaram com a escravidão e com toda a classe dominante colonial branca da ilha. O caso do Quilombo de Palmares não é diferente.

A comparação com o Haiti está longe de ser coincidência, mas expressa o temor que se apoderou da classe dominante desde o próprip crescimento da resistência escrava na Serra da Barrga no início do século XVII.

É notório o empenho colocado pela administração colonial em sufocar a comunidade rebelde e o pensamento de que esta se erguia como uma ameaça à própria ordem escravagista.

Por outro lado, em vários momentos a classe dominante nativa, particularmente a partir do final do século XVIII e início do século XIX formulou a extinção do cativeiro.

Outra coisa é que a burguesia que propugnava a emancipação nacional, a emancipação do escravos, ou seja, as tarefas da revolução democrática se mostrassem capazes de levá-las adiante.

De um ponto de vista teórico, ou seja potencialmente real, a perspectiva para a libertação do escravo era a revoluçào burguesa contra o regime colonial em seu conjunto. Neste sentido, a própria abolição, resultado de uma mobilização revolucionária manipulada e frustrada, não realizou a verdadeira emancipação do negro justamente porque foi a expressão da incapacidade da burguesia brasileira de realizar as tarefas da democracia plenamente.

O fim da escravidão

O regime de trabalho escravo no Brasil foi o último a ser eliminado em todo o mundo, chegando até 1888, quando todo o seu potencial como regime de produção encontrava-se exaurido.

As derrotas dos incontáveis movimentos de luta dos escravos na colônia e dos inúmeros movimentos revolucionários diante do poder centralizado do “império” está na raiz deste desenvolvimento histórico.

Para liquidá-lo, mesmo assim, foi necessário uma das maiores mobilizações de massas a que o país assistiu em toda a sua história.

Referindo-se à destruição do “Quilombo” fantoche do Cucaú, a revista Veja, em matéria recente (22/11) caracteriza que “estava destruída a experiência de negociações que poderia ter aberto precedentes importantíssimos nas futuras relações entre senhores e escravos.

Se Cucaú, onde a liberdade e o direito à propriedade dos negros eram reconhecidos, não tivesse fracassado pelo racha interno e pela hostilidade dos brancos, a história da escravidão no Brasil poderia ter sido diferente – e Ganga Zumba hoje talvez fosse reconhecido como um Nelson Mandela avant la lettre, um negociador refinado que encontrara uma solução de convivência.

Não aconteceu assim e quem ficou para encabeçar a resistência sem concessões foi Zumbi. Entrincheirado em Palmares, com um regime extremamente militarizado, ela partiu para o tudo ou nada”.

Claro que esta delirante “interpretação” da história da escravidão nada mais é que uma transposição nada sutil das ilusões políticas do presente para o século XVII, mas estabelece as perspectivas políticas que se colocam, inclusive hoje.

Deixando de lado a ideia fantástica da convivência pacífica entre escravos e seus donos, garantidos os direitos políticos e sociais dos primeiros, a história do país comprovou que a própria ideia de uma solução negociada para o problema do negro não tem qualquer fundamento.

Muitos estudiosos esquerdistas, inclusive participantes dos diferentes movimentos pelos direitos dos negros, disseminaram a tese de que a abolição foi uma dádiva das classes dominantes (dos senhores de escravos!) e de que o negro não teria participado do movimento abolicionista, daí o caráter limitado da emancipação do trabalho servil.

Na realidade, tanto uma tese quanto a outra são extraordinariamente falsa. Primeiro, que o fim da escravidão foi o resultado de uma das maiores mobilizações de massa já realizadas no país. A chamada Lei Áurea – apresentada como uma magnanimidade da princesa Isabel, regente do país – foi aprovada pelo parlamento como única alternativa às tendências revolucionárias que já começavam a provocar uma profunda crise institucional, inclusive com o amotinamento do Exército, que se recusava abertamente a cumprir as ordens governamentais referentes à repressão dos escravos fugitivos das fazendas do Rio e de São Paulo.

A não intervenção dos escravos é outro mito. Nos momentos finais da campanha abolicionista, que havia obtido até então precários resultados, a tendência ao levante dos escravos era patente. Em Campos, no interior do Rio de Janeiro, os escravos levantavam-se em série de queimavam as fazendas, obrigando os fazendeiros, diante da paralisia que havia acometido o Exército, a organizar verdadeiras milícias pára-militares para enfrentar a rebelião.

Em São Paulo, a crescente fuga de escravos, auxiliadas por uma ampla organização nas cidades (os “caifazes” de Antônio Bento) já estava se transformando em um levante, com a fuga em massa conhecida como a “grande marcha”, a qual, também havia paralisado o Exército.

O regime político foi obrigado a conceder a emancipação (sem o ressarcimento reivindicado pelos fazendeiros, muitos dos quais foram simplesmente à falência) para evitar uma crise revolucionária de consequências imprevisíveis, principalmente se apoiada em um levante generalizado dos escravos concentrados naquele momento na região Sudeste do país.

Apresentava-se, uma vez mais, a fórmula tradicional do “prussianismo” brasileiro da solução tardia e castrada por cima para prevenir a eclosão iminente da rebelião generalizada dos de baixo.

Este fato é confundido com uma ausência de mobilização revolucionária.

Evidentemente que tais soluções somente foram possíveis diante do caráter capitulador da direção burguesa do movimento abolicionista (Nabuco, Patrocínio etc.) cujo programa colocava-se em aberta oposição à mobilização dos escravos e da fraqueza dos setores pequeno-burgueses revolucionários (e ainda mais da classe operária, extremamente incipiente naquele momento) – organizativa, mas, principalmente, programática, uma vez que não colocavam nem a questão da República, nem a questão agrária de maneira consequentemente democrática – deste mesmo movimento (os irmãos Lacerda no Rio, Silva Jardim, Luiz Gama e, depois, Antônio Bento, em São Paulo).

A experiência da história assinala claramente que nada, absolutamente nada, que diga respeito às reivindicações dos explorados – e. particularmente, da enorme população negra do país entre eles – foi conseguido sem uma luta encarniçada, prolongada e cruel. E isto serve para a situação presente do negro no país. Rui Costa Pimenta

Fonte: blackwomenofbrazil.co/www.segal1945.hpg.ig.com.br/ruicpimenta.com.br

 

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