Tangarás

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Todas as lendas têm a sua origem na vida real e são um reflexo do nosso espírito. As florestas estão cheias de abusões e fantasmagorias, criados pela idéia sempre inventiva dos nossos caboclos. Até as danças serviram de pretexto à invenção de umas das lendas mais interessantes do Paraná. Floriu na marinha. Em Guaraquessaba.

Certa vez, um viajante foi até aquela vila. Sol a pino. Desembarcando da frágil canoa, o canoeiro seguiu abrindo caminho na floresta, por um carreiro ziguezagueante. Reinava em tudo um grande silêncio, o silêncio modorrento da canícula.

O viajante ia atrás admirando a paisagem e a pletora da floresta cerrada. Iam silenciosos, quando de repente o canoeiro parou e fez sinal de cautela ao companheiro, para que pisasse sem ruído. Que seria? Pé ante pé, o excursionista veio vindo, veio vindo, e nove passarinhos de cor azulada e crista vermelha trinavam e bailavam nos galhos de uma árvore quase desfolhada. Um dos pássaros, – o chefe, estava pousado no ramo superior, e executava, harmoniosamente, um canto suave, com as penas encrespadas pela volúpia da modulação, a cabecinha esticada, o bico entreaberto.

Quanto terminou este solo, romperam os outros em coro.

Houve, depois, um descanso rápido, em que os orquestrantes começaram a saltitar, de dois em dois, numa espécie de quadrilha. A um apelo do chefe, retomaram os seus lugares.

Recomeçou o chilreio, pondo-se o chefe a bailar, indo e vindo de um galho para outro. Enquanto isto, os bailarinos voavam, cantando, uns por cima dos outros, revezando-se, de modo que os primeiros ficavam atrás dos últimos, e estes atrás dos primeiros. Era um encanto vê-los!…

Curioso, o viajante quis ver de mais perto a dança. Mas fez ruído. E com isso os pássaros fugiram, de súbito.

– Que passarinhos são estes? – indagou o romeiro, apontando para o rumo em que eles desapareceram.

– O povo chama de Tangarás – informou o canoeiro – mas pro sinhô eu vô contá: São os fios do Chico Santos.

O viajante não entendeu o significado daquela revelação, e inquiriu:

– Filhos de quem?

– Eu lhe conto o causo – disse o caboclo, acendendo o seu cachimbo – Não vê que havia dantes nestes matos uma família de dançadores. Eram os fios do Chico Santos. Que gente prá gostá de dança! Dançavam por nada. Fandangueavam até nas roça, interrompendo o trabaio. Batiam os tamanco no chão quasi todas noite. Uma veis, meu sinhô, távamo na Semana Santa! Pois não é que a rapazaiada inventô de fazê um fandango? E feis. Dançaram inté de manhã. Mas Deus, que vê tudo, castigô os dançarinos. E sabe o que feis?

– Deu a bexiga nos fios dos Chico Santos. E cada um que ia morrendo, ia virando passarinho. E agora andam por aí cumprindo o seu fado… O meu avô sabia dessa história, por isso nóis nunca dançamos na quaresma.

E concluiu, num longo suspiro de piedade:

– Quem mandô eles dançarem na Semana Santa?”

Fonte: ifolclore.vilabol.uol.com.br

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