Cinema Social

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O cinema pode participar da elaboração de visões fantasmáticas de cidades multipolares e multiculturais, submetidas a ondas de violência de “hordas de rapazes selvagens”, sinais de fraturas sociais. Certos filmes de autores populares como Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick, em 1971, e recentemente O Ódio, de Matthieu Kassowitz colocam em cena a cidade sob a forma de um clichê durável.

Crise urbana e fratura social

A expressão “fratura social”, em voga desde 1995 na França, não parece corresponder nem de longe ao único e verdadeiro problema da dessocialização se, se examina mais profundamente as relações entre a cidade e o cinema. A incivilidade sempre existiu, mas hoje este debate sobre a violência tornou-se recorrente.

Todavia, esta antiga problemática da fratura social sempre suscitou um fecundo diálogo entre os sociólogos e a cidade6, apesar de não existir, excetuadas raras monografias, nenhuma enquête sobre a ligação ou a ausência de ligação entre cinema e fratura social. Tal ligação seria então tão tênue? A cidade, apreendida como entidade global, tornou-se, porém, o ponto nodal destas questões de sociedade, sendo o cinema seu espelho deformador.

Não se trata aqui de analisar de maneira exaustiva esta fratura social geradora de violências urbanas, pretextos para múltiplos cenários de filmes na história do cinema. A transformação do habitat, a emergência da periferia urbana desde os anos sessenta, o recuo das redes tradicionais de inserção, as novas formas de ruptura são uma gama de fatores explicativos e evolutivos, de acordo com os contextos. Alguns bairros construídos no pós-guerra, afastados de qualquer eixo de comunicação fabricam exclusão hoje.

A questão do urbanismo não esgota a questão da violência social. A implantação progressiva nos subúrbios de três estratos de imigrações diferentes (aquela dos italianos de 1920, a dos espanhóis do pós-1936, depois a dos argelinos de 1960) não tinha, por exemplo, produzido estes mesmos efeitos de exclusão repertoriados desde 1995, quando o fluxo destas ondas migratórias se conjugava, nessas respectivas épocas, com uma grande crise de alojamento.

Todavia a expressão da “violência urbana” passou, pouco a pouco, para a linguagem comum das sociedades modernas hoje urbanizadas em 80%, onde a noção de fratura social torna-se a preocupação dominante das políticas.

Em uma sondagem de 1998, 82% das pessoas interrogadas estimavam que a violência urbana continuava sendo uma preocupação maior e um fenômeno sem precedente. Geralmente, estas sondagens satisfazem os discursos mais carregados de ideologia de direita ou de esquerda, alimentando há vinte e cinco anos múltiplos relatórios dos poderes públicos9.

Em face de um “mal recorrente”, aquele de uma violência banalizada, atingindo muitas vezes os mais desprovidos (aproximadamente mil bairros, classificados numa escala de 1 a 8), os poderes públicos empregando “políticas da Cidade”, se esforçaram para encontrar soluções mais eficazes no quadro dos contratos-cidade, quando a violência surgida do espaço público aparecia de modo cada vez mais imprevisível e incerto.

Em um quadro estrutural idêntico, refletindo um ambiente urbano estilhaçado, traduzindo os mesmos sintomas (fracasso escolar, integração profissional difícil em um mercado de trabalho anêmico…), esta fratura social não aparece como sempre reproduzível de um lugar em outro. Ela reflete a polarização dos modos de consumo do centro das cidades e a marginalização das periferias próximas.

Os mal entendidos entre cidades e cinema

Desde 1995, a evolução das práticas culturais em matéria de freqüência das salas de cinema parece seguir estas linhas de fraturas. As salas de cinema de Arte e de Ensaio estão essencialmente no centro da cidade, enquanto que os multíplex se estabelecem preferencialmente na periferia – na maioria das vezes no interior de centros comerciais -, aparecem como os símbolos de sociedades de consumo ao mesmo tempo massificadas e excludentes.

À sua maneira, a nova disposição das salas de cinema no meio urbano atual parece traduzir a fragmentação crescente das sociedades e suas perdas de referência comum. Estes novos “porta-aviões do cinema americano” não são geridos como lugares urbanos, mas integrados à diligência mercantil de centros comerciais multiplicados.

A este respeito, pode o cinema participar de um relançamento da ligação social? Alguns projetos conduzidos com a iniciativa de municipalidades nos anos oitenta, tendo em vista grandes conjuntos habitacionais, se revelaram fracassos (Meaux, Montpellier-La Paillade…). Poucos projetos incitativos nesta área foram realmente lançados.

A situação, muitas vezes erroneamente incriminando subúrbios, é o resultado de um processo cuja lógica não se refere apenas aos conjuntos habitacionais (cités), mas a mecanismos mais globais, como uma caótica política do alojamento conduzida desde 1960, agravada pelas sucessivas crises econômicas desde 1973 e ilustrada por um fenômeno de concentração urbana contínua em número restrito de aglomerações10.

Um bairro como o de Vaulx-en-Velin, muitas vezes midiatizado pelas suas formas explosivas de violência urbana, passou, sem reais formas de transição, de 1.588 habitantes em 1921, a 45.000 em 198211.

Donde, sem dúvida, o desejo da comunidade urbana de Lyon de um melhor controle de sua política de planejamento urbano, de uma proteção à exploração independente face ao projeto da implantação próxima de um multíplex Pathé de 16 salas na cidade de Genas, perto de Vaulx-en-Velin, tendo como objetivo enquadrar melhor esta atividade, da concepção arquitetural ao estabelecimento das tarifas.

Mas, globalmente, numa lógica expansionista, o cinema de bairro desapareceu aos poucos após 1970 em proveito de novos bairros.

O multíplex, fator de reconcentração, recolocou em questão a noção de proximidade. Paradoxalmente, ele participa da crise de refundação da cidade, ao mesmo tempo em que relança, mas muito pontualmente, a freqüência do cinema em termos de partes de mercado.

Paralelamente, o desenvolvimento desigual dos bairros se acelerou em proveito de uma disparidade entre centros e periferias.

Apesar de um projeto de bairro só poder fazer sentido verdadeiramente no quadro de uma dinâmica urbana global. Em 1973, a problemática de Desenvolvimento social dos bairros (DSB) tinha sido introduzida no quadro das primeiras políticas da cidade, induzindo um desenvolvimento global do bairro.

Tratava-se também, desde 1976, de colocar equipamentos novos que muitas vezes faltavam. Marcados pela queda acelerada da freqüência do cinema que gerava um fechamento maciço das salas, os exploradores replicaram na mesma época em termos de concentração e de modernização, com a abertura de multisalas, se esforçando para enfrentar a crise.

O preocupações com a profissão, muitas vezes endividada com seus esforços de modernização, preocupada em tornar rentável os novos equipamentos. Outros fatores aprofundaram os mal entendidos entre cidade e cinema.

O desgaste dos dispositivos tecnocráticos das políticas da cidade, funcionando de maneira disseminada e mal coordenada, muitas vezes na urgência eleitoral; as estratégias confusas de atores confrontando interesses setoriais com interesses locais geraram resultados pouco tangíveis. desenvolvimento..

Certas zonas equipadas com salas continuaram a ser desertadas em um contexto em que o impulso do perímetro urbano foi acompanhado por um declínio da freqüência. Neste contexto, ir ao cinema significa antes de tudo um comportamento urbano, ligado ao pertencimento sócio-cultural12.

Todavia, esta freqüência marca hoje clivagens mais de gerações (faixas de idade 15-25 anos) do que diferentes políticas de tarifas (estudantes, desempregados…) contribuíram para esta homogeneização. Se apesar de uma pequena subida desde 1996 a freqüência das salas de cinema conhece globalmente, há dez anos, variações mínimas (ou seja, 2,6 visitas por ano e por habitante em 1999, segundo o Cnc), ela tornou-se pouco a pouco uma prática substitutiva: “ir ao cinema” pode se conjugar com outras práticas como a utilização de um vídeo-cassete.

De fato, a ausência de equipamento de proximidade nos bairros foi aos poucos compensada pelos pontos de venda/locação de vídeo. Sem contar o uso massivo do audiovisual amplamente concorrente do cinema há quase quarenta anos, gerando uma nova cultura urbana da tela.

Cinema e audiovisual aparecem como práticas multiformes transbordando a sala tradicional de cinema.

Hoje, o cinema deve gerir duas incertezas de fundo: aquela do seu próprio estatuto, ligado ao porvir das salas e às novas formas de consumo da imagem, e aquela de seu público, que acusa uma mudança de destino, iniciada desde 1957 e tornada massiva após 1965. A exploração perdeu, desde 1982, quase um quarto de sua clientela.

O relançamento se fez à margem, em torno de “filmes-sucesso” ou de clientela alvo. As salas multíplex atraem uma clientela “rejuvenescida” e “intercalada” que retorna na maioria das vezes para ver filmes. Pode-se se interrogar sobre estas novas lógicas cinema/cidades tornadas mais funcionais, mas pouco conectadas com o exterior e cuja polivalência parece reduzida.

Os multíplex, buscando antes de tudo filmes padronizados de sucesso, funcionam numa lógica comercial, de rentabilização rápida, em detrimento dos independentes. Esta lógica de concorrência relançou um processo de massificação e de guerra de posições tradicionais dos circuitos. Mas estas novas salas interagem numa lógica de guetização dos centros comerciais, onde o espaço é vivido como templo deste novo consumo.

A instituição do cinema pelo cartão acentuou estas novas formas de consumo de imagens, instituindo um zapping generalizado em certas salas, o público passando de um filme a outro, obrigando também os exploradores a estabelecer novas formas de controle social na entrada tais como a vídeo-vigilância, o fichamento informatizado e a retirada dos cartões de assinantes para lutar contra o vandalismo…

Este conceito de um crédito ilimitado de filmes, oriundo da grande distribuição, reforça o desejo individual de rentabilização extrema e imediata do cartão em detrimento de uma visão cinéfila.

Cinema e laços sociais

Em sua história, a sala de cinema, longe de se dissolver completamente na noção de tempo livre, simbolizado no início do século XX pela emergência progressiva de uma sociedade do lazer, pouco a pouco forjou esta representação coletiva de convívio.

Tornada um dos lugares de convergência essencial dos laços sociais, a sala construiu sociabilidade, pontuando a sua maneira o tempo livre da coletividade. O cinema espetáculo de massa, diferentemente de outras práticas, conseguiu continuar sendo o antídoto constante da possível dissolução dos laços sociais.

Donde seu poder de captação mágico, se não quase religioso, permitindo interiorizar desde seu nascimento, em 1895, diante da imagem em movimento, um sentimento sempre coletivamente partilhado. A questão urbana desafia hoje a invenção de novas formas de socialização em que a sala de cinema reencontre um papel essencial.

É possível, refabricar a cidade com novos componentes, em que o cinema de proximidade reencontraria uma identidade e participaria de uma nova sociabilidade? O cinema foi ao mesmo tempo um terreno de experimentação e um campo de intervenção para o setor associativo, a cinefilia e os cine-clubes.

Em 1982, em um contexto de reforço orçamentário das políticas culturais, concretizado notadamente por inovações no apoio às salas – em primeiro lugar a criação da Agência para o desenvolvimento regional do cinema -, apenas quatro convenções de desenvolvimento cultural se referiam ao cinema.

Dez anos mais tarde, uma quinzena de novas convenções tinham sido assinadas na região Île-de-France (Essone, Seine-Saint-Denis), permitindo a certas salas melhor dedicação ao público Arte e Ensaio.

Mas, a concorrência dos multíplex favoreceu nessas mesmas periferias a evasão do jovem público (15-25 anos) tradicionalmente devotado ao cinema. Em certas condições, apoiado por dispositivos públicos (como o CNC, os ministérios da Juventude e dos Esportes, da Educação nacional, e as cidades…), o cinema contribuiu para reinsuflar desde 1994 ações mais coletivas como as operações “Colegiais no cinema”, “Ginasianos no cinema”, “Escola e cinema”.

Estes passos também encontraram ecos, fora do meio escolar, nas operações “Um verão no cinema” e “Cine-cidade”, iniciando categorias de jovens de bairros desfavorecidos na criação cinematográfica. Deste ponto de vista, a cidade encerra formas de sociabilidade permanentes.

O território continua marcado, devido à distribuição disparate das suas 5.000 telas, por uma desigualdade global de acesso aos filmes. O cinema, em uma história cultural mais ampla, só pode existir ao preço de uma história comum com aquela de seu bairro.

Não se trata simplesmente de querer programar um equipamento de salas de cinema ou de implanta-los, mas de realmente colocar este equipamento em relação com públicos diversificados.

As experiências, de formação para o cinema, conduzidas entre outros no Alhambra e nos bairros do norte de Marselha, são, a este respeito eloqüentes, mas ainda muito minoritárias.

Estas iniciativas continuaram na França no estado de experiências piloto em Créteil, Lyon ou Marselha… mas, poderiam ser generalizadas no quadro de pólos de educação para a imagem, supondo formações adaptadas adiante.

Através de associações, o cinema pode ser revitalizado e tornar-se verdadeiramente uma experiência de vida14. Ao se preocupar com uma demanda cultural específica, ele pode se revestir com uma forma de ação inovadora, entre outras.

Fator de renovação do intercâmbio cultural entre diferentes comunidades, o cinema numa perspectiva não normativa pode ajudar, se não a reduzir a fratura social, pelo menos a descompartimentar a sociedade.

Adaptada às realidades dos lugares e apoiada pelos políticos locais, a sala de cinema pode contribuir para desencravar as relações centro-periferia: estar na encruzilhada do planejamento de espaços urbanos de melhor convívio ao mesmo tempo em que participa de novas formas de desenvolvimento cultural.

Kristian Feigelson

Fonte: www.oolhodahistoria.ufba.br

Cinema Social

Cinema e representações sociais: alguns diálogos possíveis

Resumo

Este artigo pretende relacionar o conceito de representações sociais, entendido a partir de diferentes perspectivas, com os estudos do cinema, num esforço que visa apontar elementos que sirvam para analisar a sétima arte no que tange seu caráter representacional.

Propomos, num primeiro momento, apresentar o pensamento de Durkheim acerca da gênese de representação, relacionando-a às contribuições de Serge Moscovici e Denise Jodelet, importantes nomes da psicologia social.

Numa perspectiva mais filosófica, buscamos apresentar as reflexões de Michel Foucault sobre a crise da representação, abrindo-nos também a horizontes teóricos mais plurais e agregando os pensamentos de Gilbert Durand e a noção de imaginação simbólica, e de Paul Ricoeur e sua concepção de mimese.

Introdução

Este artigo é fruto do esforço de elaborar uma refl exão acerca do cinema, buscando entendê-lo a partir de seu diálogo com o conceito de representações sociais. Sabe-se que os meios de comunicação de massa, esse universo plural do qual o cinema também faz parte, ocupam um importante papel na organização e na construção de uma determinada realidade social.

Eles tanto reproduzem essa realidade, representando-a através de seus diferentes discursos, quanto a modificam, reconstruindoa por meio de uma interferência direta em sua dinâmica, em seu funcionamento.

Nossa preocupação inicial é, portanto, a de compreender como a sétima arte pode servir de palco para a manifestação de tais representações e, ao mesmo tempo, como elas são geradas, e difundidas pelo discurso cinematográfico.

O termo representar permite ser traduzido como o ato de criar ou recriar um determinado objeto, dando-lhe uma nova signifi cação, um outro sentido. As representações formam, segundo Jodelet (2001, p. 21), um sistema, e quando partilhadas e compartilhadas pelos membros de um grupo, possibilitam o aparecimento de uma visão mais ou menos consensual da realidade.

Ora, se há uma visão que decorre dessa nova apreensão da realidade, há, forçosamente, para ela, uma imagem, entendida aqui como elemento que busca no estatuto da imaginação seu próprio lugar de articulação; uma consciência, que Deleuze (1985) conecta, no universo cinematográfico, ao papel da câmera

Traduzir ou substituir algo por meio de uma imagem propõe, entretanto, um dilema que, segundo Case i e Di Chio (1998, p. 123), condiciona qualquer tipo de processo analítico, pois vincular nossa compreensão a uma representação faz com que passemos a aceitá- la como uma verdade. Porém, não seria o conceito de verdade também uma forma de representação?

É possível, no caso de nosso objeto, identifi carmos como premissa uma relação analogicamente construída entre o cinema e o filme, estendida para além da dualidade do dispositivo e da projeção.

Tanto na dinâmica interna como externa do filme – ou seja, tanto dentro como fora da narrativa fílmica – uma espécie de “jogo” é instituído entre câmera e olhar. Nessa dupla articulação, a representação desdobra-se, assumindo uma ambigü idade que tem como elemento fundador o desejo, seja ele fruto da relação estabele estabelecida entre o sujeito fi lmado e o olho mecânico da câmera, seja ele o desejo projetado daquele a quem o filme quer seduzir, encantar ou fascinar, ou seja, o espectador.

Desta maneira é que se pretende entender esse entrecruzamento explicitado entre cinema e representações sociais. Este artigo propõe relacionar as idéias de Serge Moscovici e Denise Jodelet, importantes nomes da psicologia social, com as perspectivas fi losófi cas de Michel Foucault sobre a representação e abrese a horizontes teóricos plurais, agregando os pensamentos de Émile Durkheim acerca da gênese do conceito de representação; de Gilbert Durand e a noção de imaginação simbólica; e de Paul Ricoeur e sua concepção de mimese, por exemplo.

Há, nesses autores tão diversos, interesses comuns, mas visadas notadamente diferentes, olhares muitas vezes divergentes, e esse talvez seja o maior mérito deste trabalho: perceber e avaliar tais distinções. É necessário compreender que as representações sociais não oferecem, elas mesmas, um conceito a priori.

Se o que interessa em relação ao cinema é a troca que estabelecem sujeito e câmera, o que importa aqui é que entendamos que as representações sociais são, na verdade, um processo dinâmico no qual indivíduo e sociedade aparecem como pólos de um mesmo pêndulo.

Visões clássicas sobre a representação: a sociologia de Durkheim

Como é sabido, o termo “representação coletiva” foi proposto por Émile Durkheim na intenção de ressaltar a primazia do pensamento social frente ao pensamento individual.

Para Durkheim, assim como a representação individual deve ser considerada um fenômeno psíquico autônomo e, portanto, não redutível à atividade cerebral que o fundamenta, a representação coletiva tampouco se reduziria à soma das representações dos indivíduos que compõem um grupo.

Ao fazer creditar a existência de uma suposta consciência coletiva que organizaria o mundo sensível comum, Durkheim afi rma que as representações, manifestações dessa consciência comum, fundamentam- se a partir de certos hábitos mentais; certas categorias que existiriam com relativa autonomia e que, ao atuarem entre si, se modifi cariam. Durkheim dá, a essas representações coletivas, o nome de fato social.

O que ele chama de fato social, nomenclatura introduzida em seu trabalho As Regras do Método Sociológico, publicado em 1895, deve ser entendido a partir da premissa apresentada acima.

Preocupado com questões de cunho metodológico, o pensador tenta colocar os estudos da sociologia no campo das ciências empíricas e objetivas, insistindo em considerar o fato social como “coisa”, distanciada de qualquer teleologismo.

O estudo da vida social buscava, então, construir um discurso científico que superasse as deficiências encontradas no chamado senso comum, possibilitando investigar possíveis relações de causa e efeito a partir de fenômenos previamente defi nidos e elegendo a coletividade como princípio para a compreensão do indivíduo como ser social.

Ao assumir tal posição, Durkheim esforça- se para que as especifi cidades das representações ditas coletivas ultrapassassem o substrato orgânico ou os fenômenos mentais, e propõe entendê-las como a própria essência das consciências tanto individuais quanto coletivas.

É possível identifi car, a partir da ambigü idade apresentada pelo pensamento durkheimiano entre indivíduo e sociedade, uma das questões mais relevantes no que diz respeito a qualquer função artística, em especial, ao cinema: a questão da objetividade do olhar que fi lma versus a subjetividade do olhar que se deixa fi lmar; do real da escritura fílmica versus a ilusão do espetáculo.

Se a intenção maior do cinema é representar uma determinada realidade, há, neste movimento, um caráter objetivo, uma preocupação em fazer valer o mundo da experiência, aquilo que Jean-Louis Comolli (2008) chama de ‘inscrição verdadeira’.

Existe, na imagem cinematográfica, uma presença indicial do real que permite antever os corpos e os gestos, apreendidos no momento mesmo em que se constitui a relação entre aquele que fi lma e aquele que é filmado. Contudo, há também, no cinema, algo que é da ordem da subjetividade, que diz respeito à interpretação, à história de vida de cada um dos sujeitos que assistem ao filme.

Testemunhar a realidade sob a forma de uma representação pressupõe, entretanto, uma ordenação, uma organização, um método. É interessante notar que o livro citado de Durkheim, As Regras do Método Sociológico, aparece no mesmo ano em que os irmãos Lumière apresentam publicamente o cinematógrafo, ou seja, o ano de 1895.

E é justamente a montagem, entendida enquanto processo de signifi cação, que interessará importantes nomes das teorias do cinema do início do século XX, notadamente Dziga Vertov e Sergei Eisenstein.

Apesar de divergentes, ambos os autores revelaram a importância da montagem na compreensão do fi lme. Se há uma linguagem cinematográfi ca, ela pode ser conectada à idéia mesmo de montagem, que, segundo Comolli (2008, p. 46), é “o procedimento pelo qual a ditadura do corte e do fragmento impõe a aceleração do olhar em detrimento da experiência da duração e da continuidade”.

É crucial notar esta confluência, presente tanto no pensamento sociológico quanto nos estudos desenvolvidos sobre o cinema no fi – nal do século XIX, início do século XX, pois ele vem ressaltar algumas das mais importantes questões que concernem às artes dramáticas e pictóricas modernas, tais como a presença de pessoas comuns como protagonistas da cena; o notável crescimento das grandes cidades ocidentais e, conseqü entemente, a necessidade de se repensar as relações espaciais entre as diferentes classes sociais que emergiam de tal contexto.

O cinema viria mesmo a servir de importante ferramenta para as Ciências Sociais – notadamente a Antropologia – no intuito de registrar o cotidiano de diferentes sociedades, transformando a própria imagem em objeto etnológico.

Dessa forma, uma nova dinâmica, tanto social quanto artística se estabelece, fazendo com que o cinema seja pensado não apenas como uma máquina de registrar imagens do cotidiano, mas como elemento ordenador de um discurso que, muito mais do que mostrar imagens em movimento, serve também para organizá-las, inaugurando uma forma de discurso próprio, servindo também aos interesses do pensamento científico.

Com a intenção de legitimar o cinema como uma nova forma de arte, Louis Delluc, crítico de arte francês, lança, no início da década de 1910, o termo “cineasta”.

Tal termo, utilizado como sinônimo de um artista profi ssional inteiramente responsável por sua obra, aparece em contradição ao termo “cinematografi sta”, título dado ao técnico da imagem, àquele que fi lmava sob as ordens de um estúdio ou de uma instituição.

A partir dessa oposição, o escritor italiano Ricio o Canudo lança, na seqüência, o “Manifesto das sete artes” (1911), no qual propunha que o cinema fosse entendido como uma síntese de todas as outras artes, a emergência de uma “arte total”.

A abordagem da psicologia social: Moscovici e as representações sociais

Se a noção elaborada por Durkheim de representações coletivas foi central para explicar a dicotomia indivíduo/sociedade, possibilitando o nascimento da Sociologia e da Antropologia, ela também será fundamental para a Psicologia, servindo de base para esboçar os contornos de uma psicologia dita social que toma como norte a idéia da representação, entendendo-a como uma passarela entre os mundos individual e social, associada à perspectiva de uma sociedade em transformação (Moscovici in Jodelet, 2001, p. 62).

O conceito de representação social aparece como consequência da mudança de paradigma que enfrentam as Ciências Humanas a partir do fi nal da década de 1960, início de 1970. No que concerne a Psicologia, por exemplo, Jodelet (2001) sugere que o declínio do Behaviorismo e do Cognitivismo abre perspectivas fecundas de pesquisa e permitem encontrar no conceito de representações sociais um elemento reunifi cador da Psicologia e das Ciências Sociais.

Também é possível estabelecer uma conexão entre o surgimento dessa nova perspectiva e o fortalecimento dos estudos culturais.

Esses estudos constituem um ramo da sociologia geral, mas têm uma grande relevância para a comunicação a partir do momento em que se propõem a entender os meios de comunicação como geradores de sentidos e mediadores na apreensão e na constituição da cultura.

Sua abordagem exige “novos tipos de análise social das instituições e formações especifi camente culturais, e o estudo das relações concretas entre estas e os meios materiais de produção cultural” (Williams, 1992, p. 14).

Algumas importantes teorias a propósito do cinema aparecem nesta época, infl uenciadas tanto pelas diretrizes da psicologia social, quanto pela corrente pós-estruturalista liderada por Michel Foucault, entre outros autores.

Politicamente, as minorias começam a ganhar espaço com a liberação sexual e o fortalecimento dos movimentos feministas e dos negros americanos, passando a protagonizar histórias no cinema e em outros meios de comunicação de massa.

Stuart Hall (2000) fala desta perspectiva, afi rmando que tanto o cinema quanto a televisão sempre foram analisados como se apenas reproduzissem ou transformassem as formas de produção cultural, sem levar em conta a incorporação e a transformação de discursos produzidos fora das mediações.

Assim, a noção de representação social passa a servir de suporte para que essa troca, esse diálogo entre meios de comunicação e realidade social, se estabeleça e ganhe força.

Serge Moscovici apresenta um interessante percurso histórico dos estudos das representações sociais em seu artigo publicado em 1976, intitulado “Das Representações Coletivas às Representações Sociais: Elementos para uma História” (in Jodelet, 2001), explicando que as representações dominantes na sociedade causam pressão nos indivíduos, e é nesse meio, por conseqüência, que os sujeitos pensam e exprimem seus sentimentos.

Tal perspectiva fornece aos meios de comunicação de massa um importante papel: é através dos discursos, das imagens e das mensagens midiáticas que tais representações circulam e é neles que acontece o que Jodelet (2001) chama de “cristalização de condutas”.

Essas condutas seriam materializadas na linguagem e seriam estruturadas a partir da articulação de elementos tanto afetivos quanto mentais e sociais que, integrados, passariam a afetar, por sua vez, a realidade material, coletiva e ideativa.

Aqui, novamente abre-se um lugar para o cinema. Como todos sabemos, qualquer obra cinematográfi ca vem carregada de ideologia e encontra um espectador que também carrega consigo toda uma história de vida, sua própria maneira de decodifi car os sentidos produzidos pela obra; de compreender, assimilar e reproduzir uma ideologia.

É justamente na elaboração de um discurso particular possibilitado pela relação da câmera com o sujeito, que podemos identifi car os artifícios de uma linguagem própria à sétima arte e, conseqüentemente, toda uma carga ideológica reproduzida por ela. Jodelet (2001) explica da seguinte forma o papel da comunicação na criação e na reprodução das representações:

Primeiro, ela (a comunicação) é o vetor de transmissão da linguagem, portadora em si mesma de representações. Em seguida, ela incide sobre os aspectos estruturais e formais do pensamento social, à medida que engaja processos de interação social, infl uência, consenso ou dissenso e polêmica. Finalmente, ela contribui para forjar representações que, apoiadas numa emergência social, são pertinentes para a vida prática e afetiva dos grupos (Jodelet, 2001, p. 32).

Segundo a pesquisadora, é o desejo de completude que propicia o sentimento de identidade, assim como, paralelamente, o efeito de literalidade ou unidade no domínio do sentido.

Dessa contradição entre identidade e reconhecimento versus alteridade, nasce um movimento que distingue e ao mesmo tempo integra o sujeito em relação ao outro, ao seu diferente, ao seu Outro. E a mais explícita condição para a manifestação da imagem fílmica é a presença de seu espectador, sua alteridade por excelência.

Este sujeito-espectador assumiria, então, o papel de articulador da ordem dual condicionada pela imagem. Ele possibilita a emergência de um “terceiro olhar”, compondo uma tríade no jogo estabelecido pelo eixo-de-ação1 fílmico e assumindo a posição de “sujeito desejante”, onipresença imperceptível, mediação que condiciona a própria existência da imagem. O cinema requer um receptor que o vivencie, que complete sua signifi cação, que lhe forneça sentido.

Mimese e desejo: as colaborações de Paul Ricoeur e René Girard

Há, no pensamento de Paul Ricoeur, uma notável mudança de perspectiva. Até então, relevamos um caráter mais sociológico ou psicológico das representações, que ganham, agora, uma refl exão que toma como base a fi losofi a da linguagem.

Para Ricoeur, as representações constituem-se como objeto da linguagem, ou seja, são originárias de sua própria dinamicidade. Segundo o autor, os signos devem ser entendidos como instâncias de mediação, traduzidas a partir de um hiato entre o referente e a matéria própria do signo.

Esse hiato viria a constituir um espaço de diferença, uma instância produtora daquilo que chamamos realidade.

Para Ricoeur, é necessário que pensemos a linguagem como um espelho da vida social, portanto, um mundo aberto e incompleto, inconcluso. Um dos méritos de seu pensamento talvez seja a ligação estabelecida entre a fenomenologia e a análise contemporânea da linguagem, que, através dos estudos da metáfora e do mito, legitima a narratividade como componente fundamental da linguagem humana.

Desta forma, infl uenciado pelo pensamento aristotélico, Ricoeur propõe que o mundo seja interpretado como um lugar instável, signo aberto para a significação, o que vem a permitir sua articulação com o conceito de mimesis, elemento fundamental no funcionamento de qualquer linguagem.

Em seu texto Tempo e Narrativa, publicado no início da década de 1980, Paul Ricoeur nos propõe uma detalhada análise da apreensão de sentidos do mundo a partir de sua transposição ao universo do texto. O pensador interroga a relação existente entre o tempo vivido e o tempo narrado e afirma que a percepção humana se dá a partir de sua dimensão narrativa.

O mundo visto como um texto só pode ser confi gurado pelo leitor a partir de sua porosidade, de sua falta de rigidez. Esse mundo se abriria nos vazios que tal porosidade provoca, deixando entrever possibilidades de confi – gurar e de selecionar os elementos que nele se apresentam.

É justamente a distribuição desses elementos e a relação que eles estabelecem com o tempo da narrativa em sua dimensão episódica que interessam Ricoeur. O tempo, que perde seu caráter linear, é tomado em sua dimensão estendida de presente, sendo o passado uma forma de ‘presente da memória’, enquanto o futuro seria apenas uma ‘projeção’ do presente.

Dessa forma, Paul Ricoeur tenta categorizar a experiência, distinguindo três movimentos diferentes, três momentos distintos para a mimesis.

A chamada mimesis I é uma prefi guração do campo da prática. Ela diz respeito a um ‘agir no mundo’, à trama conceitual que antecede a própria linguagem e que orienta o agir tanto daquele que produz o texto – o autor – quanto daquele para quem o texto é produzido – seu leitor.

Já a mimesis II refere-se ao mundo da mediação, da confi guração da estrutura da narrativa, portanto, é entendido como o espaço da mediação entre essas duas instâncias de produção, no qual a imaginação ganha um caráter sintético, possibilitando a construção de representações.

Toda a produção sintética da imaginação só aconteceria, segundo o autor, por meio das implicações do que ele chama de tradicionalismo – que poderia ser traduzido por mundo cultural –, condicionantes do trabalho criador do texto e que permitem sua conexão com o mundo chamado social.

A mimesis III seria, então, a refi guração que advém da recepção do próprio texto, que só passa a fazer sentido quando atinge seu leitor.

É essa refiguração que possibilita uma reorganização do mundo do texto ao mundo do leitor, que encontra, na dinâmica da cultura, o próprio sentido das representações.

Percebemos uma forte inclinação estrutural no pensamento ricoeuriano, no sentido de criar categorias que possam explicar a realidade do texto como uma metáfora da realidade social. Entretanto, é digno de se notar que Ricoeur, contrariamente a outros autores ditos estruturalistas, não vê a linguagem como um conceito limitante ou limitador.

Ele dá à linguagem um caráter dinâmico, tentando apanhar seu movimento, seu fl uxo. Assim, seu pensamento foge da rigidez característica do pensamento estruturalista, ultrapassando-a de forma a vislumbrar, na troca entre autor e leitor, o verdadeiro sentido da signifi cação.

A relação entre o cinema e a literatura não é recente. Os estudos cinematográficos do início do século XX já aproximavam essas duas artes. A expressão Caméra-stylo2 lançada por Astruc e os estudos críticos de Bazin são provas disso. Metz (in Xavier, 1983, p. 116) afi rma que o filme é exibicionista assim como era o romance clássico do século XIX com suas intrigas e seus personagens, modelo que o cinema imita semiologicamente, prolonga historicamente e substitui sociologicamente.

É possível, no que tange à História, traçar um paralelo entre o fortalecimento da análise do discurso e da narratologia e sua aplicabilidade no campo dos estudos do cinema, o que acontece justamente no fi nal da década de 1970, início dos 1980.

A comunicação vem apropriar-se destas ferramentas metodológicas, utilizando-as no intuito de aclarar os sentidos produzidos pelos diversos produtos culturais da comunicação de massa, visando compreender como são (re) produzidas e construídas as representações sociais em torno de um determinado objeto, no caso, o discurso cinematográfico.

Por uma antropologia da imagem: a imaginação simbólica de Gilbert Durand

Tomando questões mais subjetivas como ponto de partida, Gilbert Durand lança, em 1964, sua conhecida obra A Imaginação Simbólica. Num estreito diálogo com a psicologia junguiana e a fi losofi a de Bachelard, Durand propõe entender a imaginação a partir de um ponto de vista mais subjetivo e fenomenológico.

Percebe-se que o termo imaginário aparece como uma contraposição à idéia de ideologia, conceito marxista bastante utilizado nesta mesma época para explicar as diferenças de classe e a dominação do capital. Como nos aponta Cliff ord Geertz (1978, p. 163), o termo ideologia acabara transformando-se num sistema cultural fechado, tornando-se, ele mesmo, totalmente ideológico.

Neste sentido, o conceito de imaginário para Durand refl ete uma relação de consciência com o mundo, possibilitada de forma direta pela intervenção dos sentidos frente a ele e, indiretamente, pela intervenção daquilo que comumente chamamos de signos, elementos que compõem o universo das mediações.

Afastando-se das concepções de Peirce acerca dos signos, Durand busca as refl exões de Cassirer como norte, assumindo uma perspectiva de cunho antropológico. A apreensão indireta do mundo, aquela que é construída a partir da ausência do objeto, dar-se-á, para Durand, a partir da intervenção de três categorias distintas representadas na consciência da imagem: o signo, a alegoria e o símbolo, elemento que nos interessa particularmente neste artigo.

O símbolo, em sua dimensão signifi cante, não é arbitrário nem convencional. Ele teria, segundo Durand, um caráter exclusivista e parabólico, o que o possibilitaria reconduzir à signifi cação.

No que diz respeito ao seu signifi cado, ele nunca pode ser captado diretamente pelo pensamento e sua percepção é dada a partir de um processo simbólico, manifesto por meio do que o autor chama de epifania.

Ele não se reduz, contudo, a um único sentido, mas apresenta um campo de significado amplo e movediço. Poderíamos, numa metáfora, entendê-lo como a porta de entrada para o mundo dos sentidos.

Desta maneira, as representações ganham um caráter formal, a partir do qual os indivíduos percebem o mundo, se relacionam com ele. Para o autor, sempre que abordamos o símbolo e os problemas de sua decifração, encontramo-nos em presença de uma ambigü idade fundamental:

“Não só o símbolo tem um duplo sentido, um concreto, preciso, outro alusivo e fi gurado, como também a classifi cação dos símbolos nos revela ‘regimes’ antagônicos sob os quais as imagens vêm ordenar-se”, nos explica Durand (1971, p. 97).

A partir deste antagonismo, Durand traça uma genealogia do mecanismo do imaginário face à idéia de símbolo, apontando uma série de forças opositivas que tomam o senso comum e o racionalismo cartesiano como extremos.

De tal genealogia, em primeira instância, manifestam-se o que Durand chama de “hermenêuticas redutivas”, tais como a Psicanálise de Freud, que via nos símbolos representações fantasmagóricas, e a Antropologia de Lévi- Strauss, que os reduz a simples projeções da vida social.

Porém, em contraposição, o autor aponta outra perspectiva, assinalando os trabalhos de Cassirer, de Jung e de Bachelard, nos quais o símbolo ganha um caráter vivifi cador, presença irrefutável do sentido, batizando-a como “hermenêuticas instaurativas” justamente por terem o poder de instaurar uma ordem para a vida social.

De Cassirer, Durand apreende a pregnância simbólica que permeia os mitos e símbolos em sua função de condutores de sentidos. Do pensamento de Jung, Durand toma a noção de arquétipo, entendido como núcleo simbólico de estrutura organizadora, sentido vazio preenchido por formas dinâmicas; uma espécie de centro invisível de forças.

Quanto a Bachelard, Durand ressalta a distinção construída pelo fi lósofo a propósito de dois mundos, dois regimes que tomam o símbolo como potência, como força criadora. O primeiro deles, chamado de “Diurno”, diz respeito às imagens que podem ser expressas “à luz do dia”, enquanto o segundo, dito “Noturno”, fala das imagens que restam latentes, sem expressão, escondidas.

Ao conectar tal bipartição com o pensamento nietzschiano, recorrendo à origem da tragédia, poderíamos associar o primeiro regime a Apolo e o segundo a Dionísio, distinguindo os dois pólos do discurso do trágico.

Percebe-se, portanto, uma essência dialética do símbolo que, segundo Durand, faz sentir seus benefícios pelo menos em quatro setores da vida social. Em sua determinação imediata, o símbolo surgiria como restabilizador do equilíbrio vital devido a seu caráter espontâneo.

Pedagogicamente, ele seria utilizado para o restabelecimento do equilíbrio psicossocial; enquanto que em sua dimensão antropológica, a simbólica viria a estabelecer um equilíbrio em relação à negação da assimilação racista da espécie humana a uma pura animalidade.

Finalmente, em última instância, o símbolo erigiria “[…] face à entropia positiva do universo, o domínio do valor supremo e equilibra o universo, que passa por um Ser que não passa, ao qual pertence a eterna infância, a eterna aurora” (1971, p. 98), desembocando numa teofania.

O universo da imagem é o universo da fi – guração. Entretanto, seu papel não é da ordem da reprodução, mas da produção de sentidos. Durand nos fala da ação da imagem como função instauradora da realidade, assim como também parece fazer Ricoeur, sem, no entanto, rejeitar nenhuma das duas hermenêuticas apresentadas por Durand.

É através do imaginário simbólico que um grupo ou uma coletividade designa sua identidade ao elaborar uma representação de si; portanto, a imaginação se traduziria em uma experiência aberta e inacabada, dinâmica, mas com uma realidade e essência próprias.

O simbolismo é, para o autor, cronológica e ontologicamente anterior a qualquer signifi cância audiovisual; sua estruturação está na raiz de qualquer pensamento.

A noção de imaginário nos auxilia a pensar o cinema. O cinema é uma representação de imagens em movimento, imagens que colocam em relação o real e o imaginário através de um mecanismo que permite uma dupla articulação da consciência, no qual o espectador percebe a ilusão, mas também o dinamismo da realidade.

A imagem em movimento relativiza o tempo histórico, dando-lhe um caráter atemporal. Ela torna-se um suporte que conecta o espectador ao tempo do filme, enfatizando o vivido e buscando, para signifi cá-lo, elementos do simbólico. Dito isso, é possível verificar dois eixos de compreensão que, ao interagirem, buscam apreender a complexidade do imaginário cinematográfi co: um deles, da ordem da pragmática, permite perceber o cinema como produto de um meio cultural no qual está inserido; o outro, lhe condiciona a um determinado processo que é da ordem do subjetivo, que “projeta”, por meio da representação, mitos e símbolos, produtos deste imaginário do qual nos fala Durand. O cinema torna-se, assim, lugar de recepção e de revivifação do símbolo.

A mise en scène cinematográfi ca coloca em dúvida o mundo, nos afi rma Comolli (2008). Esconde e subtrai mais do que “mostra”. A conservação da parte da sombra é sua condição inicial. Sua ontologia está relacionada à noite e ao escuro de que toda imagem tem necessidade para se constituir.

Filmar é, pois, sempre colocar em cena, mas enquadrar pressupõe uma escolha que coloca em relação, numa alegoria ao pensamento de Durand, regimes diurno e noturno. A câmera é essa “máquina” que permite (re) materializar o corpo e simbolizar o olhar, fazer dele essa “porta de entrada da signifi cação” apontada pelo pensador.

É sua condição onipresente que permite a entrada e a saída dos sentidos, num movimento relacional de troca, possibilitando reviver uma nova representação do mundo, reconstruir uma mesma narrativa de inúmeras maneiras.

É justamente dessa mise en abyme de sentidos que nos fala Michel Foucault ao analisar “As Meninas”, obra-prima de Velásquez, numa exemplar arqueologia da imagem e da representação.

Michel Foucault e a crise da representação

Em sua obra As Palavras e as Coisas (1966), Foucault nos fala das transformações dos modos de saber das ciências sociais e aponta uma virada epistemológica decorrente do impacto do surgimento das ciências humanas no fi nal do século XIX, apontando-nos novos desafi os epistêmicos.

Tal virada refl ete uma crise no campo das ciências ditas modernas, que passam a reservar, para as ciências humanas, um lugar peculiar que advém do imbricamento do humanismo com o positivismo, do senso comum com o empirismo.

Cada momento da história se caracterizaria por um campo epistemológico particular, segundo Foucault. O autor nos lembra que o conceito de episteme é, em si mesmo, histórico, e que é a partir dele que as diversas ciências sociais se constituem.

Ao levar em consideração a linguagem, a vida e o trabalho como modelos epistemológicos, o autor tenta traçar uma refl exão sobre as teorias da representação, oferecendo, como alegoria, uma genial desconstrução de “As Meninas” de Velásquez. Para Foucault, é a noção de representação que funda o princípio que organizaria os saberes na idade clássica e é justamente sua transformação que nos permitiria avaliar esses novos desafi os epistêmicos apontados por ele.

O pensador indica uma espécie de “ponto- cego” que comporta toda visão, tentando trazê-lo à luz. Para tanto, toma os elementos invisíveis que estruturam o quadro, revelando a mise en abyme criada pelo pintor espanhol que redimensiona o olhar do espectador e, por conseqü ência, a sua mise en scène.

Se o lugar clássico do espectador é o de fruir esteticamente de uma obra artística, tendo como função interpretá-la, no caso de “As Meninas” há um movimento inverso que se desenha: a obra é quem interpreta o espectador. Há, portanto, um outro lugar para o olhar, um desdobramento da representação.

Foucault atrela a noção de representação à questão da identidade. Ela permite o aparecimento da alteridade, do “Outro”, objeto por excelência das ciências humanas. Esse desdobramento de sentidos provocado pela tela de Velásquez serve de metáfora para essa conexão.

Não é a princesa Margarida e o grupo de aias, anões ou animais que vemos em primeiro plano o verdadeiro objeto do quadro. Este “verdadeiro objeto” esconde-se por trás do refl exo de um espelho que aparece na profundidade, na extensão da tela, disperso, quase confundido entre outras telas que aparecem representadas.

É desta dispersão, desse vazio que se abre que o pintor consegue, segundo Foucault, retirar o valor essencial de sua obra: o desaparecimento do sujeito.

É neste aspecto que seu pensamento deve ser tomado. Percebemos que três elementos distintos são representados no quadro de Velásquez: (i) Os reis e o que é visto por eles (objeto representado), (ii) o pintor (sujeito representante) e, por conseguinte, (iii) aquele para quem tal representação é construída (o espectador).

A tela exibe o próprio processo de representação, muito mais do que uma cena comum ou um momento singular, transformando-o em “representação de uma representação”. É possível nomear, descrever, falar sobre o quadro, mas as ferramentas da linguagem nada dizem sobre o real, elas são e sempre serão apenas refl exo da realidade.

A palavra estabelece uma profunda relação com as coisas, mas resta somente uma sombra daquilo que querem signifi car. Representar, pois, permite inaugurar três instâncias distintas que assumem um papel fundamental no que tange à nova condição de sujeito: a semelhança, a similitude e a simulação. A consciência do limite, da incompletude da linguagem, lugar do arbitrário, é o prêmio do sujeito face ao aparecimento das ciências modernas.

Ao trabalhar com a idéia de uma episteme, Foucault aborda as condições históricas daquilo que é possível dizer e ver em uma determinada época. É o hiato, o espaço impreenchível entre estas duas ações que nos permite pensar o conceito de diferença, de simulacro, de negação da semelhança.

Se um enunciado mostra algo, ele também esconde ao mesmo tempo. Neste sentido é que podemos entrecruzar o pensamento de Foucault acerca da representação e o papel do cinema na composição de um novo sujeito que se vê representado nas telas.

Para Comolli (2008), que evoca no título de sua obra o trabalho Vigiar e Punir3, o cinema é encarregado de revelar os limites do poder ver, designando o não visível como condição daquilo que vemos. A sétima arte desloca o visível no tempo e no espaço, subtraindo mais do que mostrando.

A máquina do cinema produziria, segundo Comolli (2008), tanto luz quanto sombra, tanto um fora de campo quanto um campo, como o faz também “As Meninas” e é esse um dos aspectos principais levados em consideração pela análise foucaultiana.

Esquecemos o que mais sabemos: que o quadro é antes de tudo uma máscara e o fora-de-campo mais potente que o campo. É tudo isso que o cinema convoca ainda hoje: o não visível como o que acompanha, margeia e penetra o visível; o visível como fragmento ou narrativa ou leitura do não visível do mundo – e, como tal, historicamente determinado e politicamente responsável; o visível como episódio de uma história que ainda está por ser contada; o visível como lugar do engodo renovado quando quero acreditar que verdadeiramente vejo (Comolli, 2008, p. 83).

A parte da sombra, aquilo que não se deixa ver, tornar-se-ia, portanto, o desafi o e o agente da representação. É ela, ainda segundo Comolli (2008), que permite que a imagem se abra para o espectador como a possibilidade de perceber e entender o que não se deixa observar, o que escapa ao concreto da representação, confrontando-o com os próprios limites do ver, exigindo-lhe uma nova visada, tirando- o de seu confortável lugar e inquirindo-lhe acerca do espetáculo da representação, portanto, da simulação.

Finalmente, é o desejo de encontrar-se no simulacro que faz com que a experiência estética se modifique.

Considerações finais

As representações sociais, em seus mais variados aspectos, servem de chave conceitual para os estudos da comunicação.

Este trabalho, como dito na introdução, é uma tentativa de aproximar os pensamentos de diversos autores a propósito desta noção, verifi cando, seja em seu viés histórico, social ou estético, uma confluência com o cinema, entendido aqui em seu potencial artístico ou industrial, riquíssimo meio de representação que coloca em relação os sentidos do real por meio de sua transformação em imagem em movimento.

Percebemos que, desde Durkheim, há uma preocupação em estabelecer um lugar comum para o pensamento do sujeito contemporâneo em relação à representação.

Seja tomada em sua dimensão sociológica, a partir da dicotomia indivíduo/sociedade; seja através da tentativa de estabelecer-se como uma ciência fundada na psicologia social; ou ainda, em seu aspecto simbólico e subjetivo, a noção de representação estabelece-se como potência maior da imagem cinematográfi ca, revelando os mecanismos que se encontram por trás da impressão da realidade, da inscrição verdadeira reivindicada por Comolli.

O conceito de representações sociais é tão instável e plural quanto o é a própria representação. É necessário compreendê-lo não mais como ferramenta de descrição, mas utilizá-lo para explicar os mecanismos de transformação que sofre o sujeito moderno frente ao universo de imagens no qual ele vive.

A alteridade é a condição para que o desejo estético se manifeste, pois é no outro que se ancora e que se espelha o meu próprio desejo, num jogo onde sujeito e objeto se confundem no desejo de se fundirem. Analogicamente, a imagem cinematográfi ca pode ser entendida como a expressão do desejo do outro, pois ela é a apreensão do olhar alheio.

Melhor dizendo, ela é a representação de seu desejo, que uma vez reproduzida na tela de uma sala escura, se transforma em objeto que se pode simbolicamente possuir. Assim, a principal função da imagem é seduzir o olhar a fi m de buscar, na representação, sentido e signifi cação.

Este artigo não tem a intenção de exaurir o assunto das representações sociais conjugado à sétima arte, mas acreditamos que os caminhos apontados por meio de nossas refl exões abrem uma possibilidade ímpar no sentido de construir, para a comunicação, e em especial às teorias da imagem, um lugar de estudo das relações que o ser humano estabelece com o Outro, aqui representado, justamente, pelo cinema.

Referências

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COMOLLI, J-L. 2008. Ver e poder: a inocência perdida: cinema, televisão, fi cção, documentário. Belo Horizonte, UFMG, 373 p.

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Henrique Codato

Fonte: www.unisinos.br

Cinema Social

Cinema Social – Resposta a Gore? Chamem Lomborg

Até então um diretor de carreira discreta forjada majoritariamente em séries de TV, o norte-americano Davis Guggenheim experimentou um salto em prestígio, nos círculos cinematográficos e também nos ambientais, há cerca de quatro anos.

Com “Uma Verdade Inconveniente” (1996), ele recebeu o Oscar de melhor documentário – o filme ganhou também outro prêmio da Academia, de melhor canção – e contribuiu para incrementar o debate sobre o aquecimento do planeta, ampliando o palanque de seu protagonista, o ex-vice-presidente norte-americano Al Gore.

Entre as diversas outras láureas internacionais obtidas por “Uma Verdade Inconveniente”, figuram os prêmios de melhor documentário do ano segundo as principais associações nacionais de críticos dos EUA e o prêmio do público na Mostra Internacional de São Paulo.

Estima-se que a bilheteria do filme em todo o mundo tenha se aproximado de US$ 50 milhões, cifra muito expressiva para um documentário.

A experiência positiva levou Guggenheim a se manter no terreno do cinema de intervenção social: seu mais recente trabalho, “Waiting for Superman”, vencedor do prêmio do público no Sundance Festival deste ano, investiga as razões do fracasso do ensino público norte-americano.

A parceria com Al Gore pode ser apenas uma ótima lembrança na vida de Guggenheim, já relegada ao baú de recortes, mas continua bem viva para o diretor Ondi Timoner e para os produtores Terry Botwick e Ralph Winter.

O trio está envolvido na produção do documentário “Cool It”, que planeja concluir até setembro para que possa fazer sua estreia internacional no Festival de Toronto. Concebido como uma resposta a “Uma Verdade Inconveniente”, o filme adota como referência as ideias do cientista político e escritor dinamarquês Bjorn Lomborg, que ocupa espectro conservador no campo ambientalista.

Em entrevista ao jornal “The New York Times”, Timoner – já experiente em filmes de engajamento político – afirmou que o longa de Gugenheim gerou, na sua avaliação, “certa dose de histeria que não é realista”. Além de oferecer leitura mais “moderada” do cenário climático, seu projeto teria o objetivo de fazer um apelo a soluções práticas.

Imagina-se que Winter tenha motivos ideológicos para produzir “Cool It”: associado a iniciativas cristãs, ele tem no currículo filmes de caráter religioso. Mas é também um dos produtores da milionária franquia “X-Men”, entre outros longas-metragens de grande orçamento. Botwick, seu parceiro no projeto que divulgará as ideias de Lomborg, é um bem-sucedido executivo de TV, com uma longa passagem pelo Family Channel.

Já se ultrapassou, portanto, o estágio em que filmes sobre questões ambientais eram resultado do engajamento pessoal de seus realizadores, produzidos de maneira independente para circular à margem do mercado audiovisual. Executivos de Hollywood passaram a enxergar viabilidade comercial nesse nicho. Se isso é boa ou má notícia, dependerá do desdobramento do fenômeno nos próximos anos – e, claro, do lugar ocupado por quem observa o debate.

Sérgio Rizzo

Fonte: www.ideiasustentavel.com.br

Cinema Social

9 anos entre o porto seguro e o além mar

Aprofundar questões filosóficas que resgatam e radicalizam a arte. Apossar-se da natureza mítica, simbólica e dionisíaca do cinema. Projetar esta magia no imaginário de todos que o realizam. Desabrochar nos corações e mentes o estado absoluto da comunhão da arte com a poesia.

Em síntese, são estes os objetivos do Cineclube Amazonas Douro, que comemora este mês 9 anos der existência.

A programação acontecerá às 19H desta quarta 18 de abril), no Instituto Nangetu (Pirajá, 1194 – entre Duque e 25). “Uccellacci, uccellini”, do italiano Pier Paolo Pasolini (PPP) é o filme a ser exibido. O crítico Mateus Moura dinamizará a sessão, que terá comentários pesquisador catalão Antônio Gimenez, autor do livro “Una fuerza del pasado. El pensamiento social de Pasolini” (Editora TROTTA, 2003 / 168 PG),

O Cineclube – Ainda no ano de 2003, antes mesmo de marcar a data de sua fundação, o Cineclube Amazonas Douro organizou em Belém o Concílio Artístico Luso-Brasileiro, do qual participaram o realizador brasielrio José Mojica Marins, o Zé do Caixão, e Sério Fernandes, Mestre de cinema da Escola do Porto. Os dois são presidentes de honra da entidade.

Da pauta do Concílio, constavam ações de intervenção artística e social, além de conferências, oficinas e projeções de filmes em vários suportes. Através deste Concílio, foi produzido e realizado, coletivamente, o filme “Pará Zero Zero”, que deu mote a um projeto literário de mesmo nome.

Sob a coordenação do poeta e realizador Francisco Weyl, o Cineclube Amazonas Douro realiza ações de intervenção artística e social, estabelece a comunhão artística entre poetas e realizadores, em encontros em que se fazem projeções de filmes, exposições de fotografias, leituras de poemas e conferências artísticas e filosóficas, e também via projetos editoriais e outros articulados a Internet com os mesmos propósitos.

“Nosso objetivos são conquistados com o cinema poético, que ainda resiste de forma independente e se realiza fora do domínio da cultura técnico-comercial e ao leste de Hollywood, um cinema criado sem economia de esforços e com a coragem absoluta de afrontar o lugar comum das produções cinematográficas financiadas pela indústria cultural global”, afirma Weyl.

Princípios – Situado numa fértil região em que as relações de poder germinam as próprias contradições, o cinema, arte e indústria em simultâneo, fabrica e destrói sonhos, escreve com fotogramas a história do homem: conscientiza, ilude, diverte, reflete, propõe, aliena, dicotomiza, supera diferenças.

Pensado e realizado neste campo paradoxal e inspirado fundamentalmente na poética de realizadores como Antônio Reis e Glauber Rocha, o projeto do Cineclube Amazonas Douro afirma uma concepção estética em que a sua natureza filosófica restitui ao cinema o próprio estado de magia dionisíaca.

O Filme – De origem italiana, “Uccellacci, uccellini” foi traduzido para o português ou como “Gaviões e passarinhos” ou “Passarinhos e passarões”. No Brasil, o filme estreou no dia 4 de maio de 1966, ano em que também integrou a seleçãoloficial do Festival de Cannes. Enquadrado no gênero comédia, o filme, à preto e branco, dura 89 minutos, e narra a saga da viagem de pai (Totó) e filho (Ninetto Davoli), ambos trabalhadores proletários.

A meio caminho de uma estrada deserta, eles encontram um corvo que fala e tem ideais. O trio faz uma longa viagem e o homem e o filho regressam ao passado onde São Francisco os manda converter os pardais e os falcões, mas a fome aperta e o pai faminto faz da ave o seu jantar. É, pois, uma parábola ferina de PPP (*1922+1975) sobre o universo dos marginalizados, tão comum à obra do autor de “Accatone” “Mamma Roma”, “Salô”, entre outras.

Serviço – 9 anos do Cineclube Amazonas Douro. Projeção do filme “Uccellacci, uccellini”, de Pier Paolo Pasolini. Quarta, dia 18, às 19H. Instituto Nangetu (Pirajá, 1194 – entre Duque e 25). Dinamização: Mateus Moura. Cometários: Antônio Gimenez. Antes da sessão será exibido o curta “O chapéu do metafísico”, de Francisco Weyl, ganhador do grande prêmio do Douro Film Festival (2006).

Fonte: socialcine.blogspot.com.br

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