Morte em Sêneca

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Lúcio Aneu Sêneca é um dos filósofos mais importantes do estoicismo romano, também chamado de Nova Stoa. Para mais informações ler o texto Estoicismo deste portal. Em 65 d.C., o filósofo é condenado à morte e obrigado, pelo Imperador Nero, a causar sua própria morte. Esse fato foi eternizado pelo pintor e ilustrador espanhol Manuel Domínguez Sánchez em seu quadro ilustrado no texto.

Baseando-se em sua filosofia da morte, poderíamos afirmar que causar a sua própria morte não lhe provocou nenhum mal, mas antes o libertara de todos os sofrimentos e males que assolavam a sua vida enquanto estava vivo. Parece difícil, num primeiro momento, identificar algo de positivo em causar sua própria morte, mas o filósofo empreendeu grande parte de sua reflexão filosófica intentando justamente justificar o caráter libertador da morte diante das situações insolúveis da existência humana.

Morte em Sêneca

Desse modo, a filosofia senequiana entende a morte como uma determinação da natureza humana à qual todos os homens estão inevitavelmente submetidos. Noutros termos, o homem é um ser que nasceu para a morte. Seria a morte, para ele, a mais efetiva profilaxia contra os males insuportáveis que assolam a sua existência. E, no limite, enaltece os grandes homens: Sócrates, Rutílio, Pompeu, Cícero, Catão etc. Esses não tiveram medo da mortee, por isso, alcançaram a imortalidade.

Embora também ressalte os inúmeros homens simples que tiveram coragem de romper com as barreiras do sofrimento e da servidão humana e num ímpeto de coragem alcançaram o “porto seguro da morte”. Narrando um desses casos cometidos por homens de baixa condição, Sêneca nos diz:

“um dos Germanos destinados aos combates com feras, enquanto se faziam no circo os preparativos para o espetáculo da manhã, retirou-se para satisfazer uma certa necessidade corporal – a única oportunidade que teve para estar sozinho, longe do olhar dos guardas; então agarrou num daqueles paus com uma esponja atada na ponta que se usam para limpar as imundícies e enfiou-o pela garganta abaixo, morrendo por asfixia. É o que se chama o cúmulo do desprezo pela morte.[…] podes ver como, para morrer, o único obstáculo que se nos põe é a vontade! Sobre o ato tão determinado deste homem cada um pode pensar o que quiser, desde que se assente neste ponto: é preferível causar sua morte mais imunda à mais higiênica servidão”.

O relato desse cometido pelo germano é encarado pelo filósofo com extrema naturalidade, pois este indivíduo certamente já não aguentava os fardos da sua existência sobrando-lhe a morte como um consolo existencial. Em outro texto, o filósofo diz: “Perguntas qual é o caminho da liberdade? Qualquer veia do teu corpo”. Nesse sentido, a morte não se resume a um processo físico-biológico que se dá com o tempo, ela pode ser induzida pelo causa da própria morte sem que perca a sua grandiosidade.

E isso, para nós ocidentais pode parecer descabível, mas era plenamente aceitável para os estoicos que entendia o a causa da própria morte, inclusive, como um ato sábio em determinadas situações nas quais o indivíduo perdera o controle da sua vida feliz. E isso está intimamente ligado ao desprezo que os filósofos estoicos possuíam para com o corpo em detrimento do espírito.

Temer à morte seria a mais profunda contradição humana já que também não aguentaríamos o fardo da imortalidade (própria aos deuses): ciclos sucessivos de dor, sofrimento, perdas de entes queridos, doenças crônicas e toda espécie angústias que assombram o homem em vida. Desse modo, o aprender a morrer é parte integrante do saber-viver.

Comparando a vida a um espetáculo teatral, Sêneca nos diz: “Na vida é como no teatro: não interessa a duração da peça, mas a qualidade da representação. Em que ponto tu vais parar, é questão sem a mínima importância. Para onde quiseres, mas dá à tua vida um fecho condigno”. Nesse sentido, uma vida breve digna é infinitamente superior à uma longa jornada indigna num corpo impotente, que a muito já perdera a sua vontade de vida.

E nisso, os homens teriam uma vantagem sobre os demais animais: diante de situações insuportáveis eles poderia simplesmente suicidar-se, por fim a esse ciclo eterno de sofrimento. É sua a famosa frase: “Nenhuma meditação é tão imprescindível como a meditação da morte”. No limite, Sêneca pensa a morte a partir duma concepção fatalista obrigando o indivíduo a tomar consciência e romper com o medo da morte que a cada dia está a bater à sua porta semelhante ao mensageiro que vem lhe trazer a boa nova.

Dica de Vídeo

Levando em conta a complexidade do tema, embora na contramão do pensamento de Sêneca, considero importante que assistam a esse vídeo, elaborado pelo canal Nerdologia, que sintetiza os célebres casos de pessoas que causam a própria morte, seus dados, analisando-os caso a caso e quebrando um pouco do romantismo em torno disso a partir de dados científicos.

Fábio Guimarães de Castro

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

PIRATELI, Marcelo A.; MELO, José J. P. A morte no pensamento de Lúcio Aneu Sêneca, p. 63-71, 2006.

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