Governo José Sarney

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Nascimento: 24 de abril de 1930 (85 anos), Pinheiro, Maranhão.

José Sarney foi o primeiro governante civil depois do Regime Militar de 1964, José Sarney é eleito pelo Colégio Eleitoral vice-presidente da chapa encabeçada por Tancredo Neves, que morre sem ter sido empossado.

Sarney assume a Presidência em 15 de março de 1985 e fica até 15 de março de 1990.

Enfrenta três desafios: a reforma constitucional, a estabilização da economia e a retomada do crescimento em um quadro de recessão e inflação alta.

Sarney chega ao governo após uma série de circunstâncias inusitadas. Era o líder do Partido Democrático Social (PDS) e encarregado pelo então presidente João Figueiredo de coordenar sua sucessão.

Com a derrota no Congresso da emenda pelas eleições diretas em 1984, a oposição forma a Aliança Democrática, que reúne políticos de vários partidos, para disputar os votos do Colégio Eleitoral.

O PDS lança a candidatura de Paulo Maluf, outro nome importante do partido, o que leva José Sarney a se desligar da agremiação.

Entra como vice na chapa de Tancredo Neves, representando a Frente Liberal, dissidência do PDS, e filia-se ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).

Tancredo é eleito, mas, às vésperas da posse, apresenta um grave problema intestinal (diverticulite, segundo os médicos) e passa por muitas cirurgias.

José Sarney começa a governar interinamente em 15 de março de 1985.

Tancredo Neves morre em 21 de abril, e, no dia seguinte, Sarney assume oficialmente o cargo.

Empresta à sua administração o título de Nova República, que designava o programa da Aliança Democrática (formada pela Frente Liberal e pelo PMDB), e cumpre cinco anos de mandato, um a mais que o previsto na carta-compromisso da Aliança, negociada no Congresso.

Reforma constitucional

A reforma começa com a revogação da legislação autoritária. Entre 1985 e 1986, a eleição direta para a Presidência da República é restabelecida, o voto dos analfabetos é aprovado, os partidos políticos são legalizados, a censura prévia é extinta e acabam as intervenções nos sindicatos. Em novembro de 1985 realizam-se eleições diretas para 201 prefeituras, inclusive das capitais de estados e territórios. No ano seguinte, junto com os governadores estaduais, é eleito o Congresso Nacional encarregado de escrever a nova, promulgada em 1988.

Plano Cruzado

Os problemas da economia são enfrentados pelo Plano Cruzado, lançado em 28 de fevereiro de 1986. Ele muda a moeda de cruzeiro para cruzado, congela preços e salários por um ano e acaba com a correção monetária. Alcança bons resultados no início, mas os ajustes considerados necessários são adiados para não prejudicar os candidatos do governo nas eleições de novembro. A estratégia eleitoral dá certo, mas a economia fica desorganizada e a inflação dispara.

No decorrer dos anos seguintes são lançados mais dois programas de estabilização: os planos Bresser e Verão. No entanto, eles não obtêm sucesso. No último ano do governo, a inflação mensal cresce aceleradamente, ultrapassando 80% em março de 1990. Sarney é sucedido por Fernando Collor de Mello.

Governo José Sarney – Vida

Advogado, nascido na cidade de Pinheiro, estado do Maranhão, em 24 de abril de 1930.

Elegeu-se suplente de deputado federal pelo Partido Social Democrático (PSD), assumindo o mandato em 1956 e 1957.

Foi deputado federal (1959-1966) pela União Democrática Nacional (UDN) e, com extinção dos partidos políticos e a imposição do bipartidarismo pelo AI-2, em 27 de outubro de 1965, ingressou na Arena, partido de sustentação do regime militar.

Elegeu-se governador do Maranhão (1966-1970) e senador (1971-1985). Tornou-se presidente da Arena, em 1979 e, no ano seguinte, com a instalação do pluripartidarismo, do Partido Democrático Social (PSD). Em 1980 foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras.

Em 1984, juntamente com outros dissidentes do PDS, passou a integrar a Frente Liberal, que o lançou como vice-presidente da República na chapa de Tancredo Neves, do PMDB, tendo sido eleito pelo Colégio Eleitoral em janeiro de 1985.

Assumiu inteiramente a presidência, em 15 de março de 1985, em virtude da doença de Tancredo Neves e, com a morte de Tancredo, em 21 de abril, foi efetivado no cargo.

Após o término de seu mandato presidencial, elegeu-se duas vezes senador pelo Amapá (1991-2003), exercendo a presidência do Senado de 1995 a 1996.

Período presidencial

O governo do presidente Sarney foi marcado, sobretudo, por duas grandes tarefas que se impunham ao país: reconstruir a democracia e enfrentar a crise inflacionária.

Assim em 1º de fevereiro de 1987 instalava-se a Assembléia Nacional Constituinte, iniciando suas atividades sob a liderança do deputado Ulisses Guimarães.

A nova Constituição foi promulgada em 5 de outubro de 1988, tendo sido a mais democrática da história brasileira. A Carta estabeleceu eleições diretas em dois turnos para presidente, governador e prefeitos, adotou o presidencialismo como forma de governo, afirmou a independência dos três poderes, restringiu a atuação das forças armadas, estendeu o voto aos analfabetos e maiores de 16 anos, universalizara o direito de greve, entre diversas outras garantias civis, sociais e trabalhistas, deixando lacunas, no entanto, no que se refere à reforma agrária.

No plano econômico, o governo Sarney anunciou, em 1º de março de 1986, uma ampla reforma monetária que ficou conhecida como Plano Cruzado, em referência à nova moeda implantada. Comandado pelo ministro da Fazenda Dílson Funaro, e considerando heterodoxo por deferir dos planos recomendados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), tinha como medidas de estabilização econômica o congelamento de preços e salários, o abono de 8% para todos os trabalhadores, o “gatilho” salarial a cada vez que a inflação ultrapassasse 20% e, o incentivo à produção funcionaria como um instrumento de distribuição de renda, aumentando o poder de compras dos salários. Inicialmente, os resultados foram positivos, com a inflação inferior a 2% ao mês. Todavia, em dezembro daquele ano, foram avaliados como um aquecimento excessivo da economia.

E, fevereiro de 1987, as reservas cambiais caíram rapidamente e o ministro Funaro suspendeu os pagamentos dos juros da dívida externa aos bancos privados, enquanto a inflação atingia um patamar de 365,7% anuais. A moratória foi suspensa em novembro, quando o Brasil pagou 500 milhões de dólares ao FMI.

Em janeiro de 1988, o novo ministro da Economia, Luís Carlos Bresser, promoveu um outro plano de estabilização, que ainda assim, não conteve a inflação, cujo índice girou em torno de 1.000% naquele ano. Em janeiro de 1989, um terceiro programa econômico foi anunciado pelo governo, batizado de Plano Verão, porém o ano encerrou-se com a taxa anual de inflação de 1.764,86%.

O Brasil vivia então os efeitos da crise que atingiu amplamente América Latina e a recessão mundial atingiru as exportações brasileiras. Em conseqüência, verificou-se a diminuição dos investimentos públicos, traduzidos em cortes orçamentários, e a retração da iniciativa privada, dadas as altas taxas de juros e a reduzida perspectiva de consumo.

Destacou-se, nesse período, a criação do Ministério da Cultura, em 15 de março de 1985, obedecendo, segundo o decreto que originou, à “situação atual do Brasil” que não poderia prescindir de uma “política nacional de cultura, condizente com os novos tempos e com o desenvolvimento já alcançado pelo país”. Na política externa, foram reatadas relações diplomáticas com Cuba e assinado o protocolo do Mercosul, em conjunto com Argentina e o Uruguai.

Governo José Sarney
José Sarney

José Ribamar Ferreira de Araújo Costa ( José Sarney ) 1985 – 1990

Nasceu em Pinheiro, Maranhão, no dia 24 de abril de 1930.

Presidente da transição para a democracia, assumiu o cargo após a morte de Tancredo Neves, que faleceu antes de a tomar posse.

Enfrentou um período de inflação descontrolada através de diversos planos, sendo o Plano Cruzado o que teve sucesso por mais tempo.

Várias concessões políticas a seus grupos de sustentação impediram a manutenção de uma política econômica austera.

Resumo

Nascimento: Pinheiro – MA, em 24.04.1930
Profissão: Professor/Jornalista/Advogado
Período de Governo: 15.03.1985 a 15.03.1990 (05a)
Idade ao assumir: 55 anos
Tipo de eleição: indireta
Votos recebidos: 480 (quatrocentos e oitenta)
Posse: em 15.03.1985, em sessão conjunta do Congresso Nacional, pelo Senador José Fragelli
Afastamento: Várias vezes, por motivo de viagem, períodos em que os substitutos legais, Presidentes da Câmara do s Deputados, do Supremo Tribunal Federal e do Senado Federal, exerceram a Presidência

Observação: A partir de 21.04.1985, exerceu a Presidência da República, por sucessão, em virtude do falecimento do Presidente Tancredo de Almeida Neves. José Sarney foi o primeiro Governo civil após o Movimento Militar de 1964

Governo José Sarney – Biografia

Governo José Sarney
José Sarney

Sexto ocupante da Cadeira nº 38, eleito em 17 de julho de 1980, na sucessão de José Américo de Almeida e recebido em 6 de novembro de 1980 pelo Acadêmico Josué Montello. Recebeu os Acadêmicos Marcos Vinicios Vilaça e Affonso Arinos de Mello Franco.

José Sarney nasceu em Pinheiro (MA), a 24 de abril de 1930.

Filho de Sarney de Araújo Costa e Kyola Ferreira de Araújo Costa. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, pela Faculdade de Direito do Maranhão.

Casado com Marly Macieira Sarney.

Filhos: Roseana Sarney Murad, Fernando José Macieira Sarney e José Sarney Filho.

Vida política

Deputado Federal (1956-59, 1959-63 e 1963-65).
Governador do Estado do Maranhão (1965-1970).
Senador da República pelo Maranhão (1971-79 e 1979-85).
Vice-presidente da República (1985).
Presidente da República (1985-90).
Senador da República pelo Amapá (1991-99 e 1999-2007).
Presidente do Senado Federal (1995-97 e 2003-05).

Vida literária e cultural

Membro da Academia Brasileira de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, da Academia Maranhense de Letras, da Academia Brasiliense de Letras e da Academia das Ciências de Lisboa.

Redator dos jornais O Imparcial, Combate, Jornal do Dia, Jornal do Povo, O Estado do Maranhão, São Luís, Maranhão (1947-1980). Diretor do Suplemento de Letras e Artes de O Imparcial (1950). Colaborador dos jornais Diário de Pernambuco e Correio do Ceará, das revistas Clã, Ceará, Região, Pernambuco, e Ilha, Maranhão (1948), do Jornal do Brasil, de O Globo, das revistas Senhor e o Cruzeiro; da Folha de S. Paulo (a partir de 1982) e O Estado do Maranhão.

Membro do InterAction Council (chefes de Estado e de Governo).

Condecorações

Medalha Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras; Medalha José Bonifácio.

É Grão-Mestre e tem Grã-Cruz ou o Grão-Colar das seguintes ordens: Ordem Nacional do Mérito, Ordem do Rio Branco, Ordem do Mérito Judiciário, Ordem do Cruzeiro do Sul, Ordem da Legião de Honra (França), Ordem de Sant’Iago da Espanha (Portugal).

Governo José Sarney – Obras

José Sarney nasceu no município maranhense de Pinheiro, a 24 de abril de 1930, filho de Sarney de Araújo Costa e de Kyola Ferreira de Araújo Costa.

Em 17 de julho de 1980 é eleito membro da Academia Brasileira de Letras, sendo empossado a 7 novembro seguinte.

Fez seus estudos, primário e secundário, no Maranhão intressando depois na Faculdade de Direito do Estado.

Desenvolveu intensa atividade jornalística nos periódicos de São Luís – “O imparcial”, “Combate”, “Jornal do Dia”, “Jornal do Povo”, “O Estado do Maranhão”. Colaborou, também, nos jornais “Diário de Pernambuco” e “Correio do Ceará” bem como no “Jornal do Brasil” (Rio de Janeiro).

José Sarney lecionou em alguns estabelecimentos de ensino superior de seu Estado natal. Pertence a diversas instituições culturais e proferiu conferências em várias universidades norte-americanas.

A vida política do ex-Presidente da República teve início em 1956 quando, na qualidade de suplente, exerceu o mandato de Deputado Federal, sendo reeleito para as legislaturas de 1958-62 e 1962-66. Em 1965 assumiu, por cinco anos, o cargo de Governador do Maranhão. Ao deixar o governo tornou-se Senador da República, nas legislaturas de 1970-1978 e 1979-1986. Em 15 de janeiro de 1985 foi eleito Vice-presidente da República na Chapa da Aliança Democrática.

Assumiu o cargo de Presidente da República em exercício, de 15 de março a 21 de abril de 1985, no impedimento do titular, Tancredo Neves, gravemente doente, tornando-se Presidente da República, a partir de 21 de abril de 1985 a 15 de março de 1990. Depois de ter cumprido o seu mandato presidencial, José Sarney regressou às lides políticas elegendo-se Senador pelo Estado do Amapá.

Mantendo sempre o interesse pela literatura José Sarney conta, em sua bibliografia, com as seguintes obras: “A canção inicial”, 1952; “A pesca do curral”, 1953; “Norte das águas”, 1970; “Marimbondos de fogo”, 1979; “Partidos políticos”, 1979; “10 contos escolhidos”, 1985; “Brejal dos Guajas e outras histórias”, 1985; “O dono do mar”, 1996. Este último se constituiu em grande sucesso editorial, inclusive traduzido para o francês.

Ainda mantém José Sarney colaboração na imprensa brasileira, particularmente nas páginas de “O Globo” (Rio de Janeiro).

Governo José Sarney (1985-1990)

A transição democrática

Com o fim da ditadura, a sociedade civil esperava a redenção do país com o governo Tancredo, mas uma operação inesperada impediu a posse do presidente
Sarney passou de dissidente da ditadura para a condição de responsável pela efetiva construção da democracia brasileira
Continuísmo ou mudanças verdadeiras?

A redemocratização limitada

Sarney era representante de grupos políticos conservadores, dissidentes de última hora do regime militar
Seu governo foi montado por Tancredo, político habilidoso e conciliador, distante das aspirações da maioria da sociedade
Poucos eram os representantes de grupos populares no governo Tancredo-Sarney

A reconquista dos direitos civis

Sem fazer mudanças estruturais, Sarney ao menos comandou uma recuperação legal dos direitos do cidadão brasileiro
Entre as medidas mais importantes estão a liberdade sindical, o fim da censura, o pluripartidarismo ampliado, a convocação da Assembléia Constituinte, a remoção do “entulho autoritário” da ditadura

Atuação econômica

A crise herdada dos militares, as dívidas do Estado, a desnacionalização da produção em setores importantes e a inflação foram problemas enfrentados desde março de 85
Experimentando uma crise jamais vista no país, o presidente mudou a Fazenda várias vezes: Dorneles, Funaro, Bresser e Nóbrega
Infelizmente, nenhuma deu resultado

Os problemas fundamentais

Para superar a crise, o governo tinha que recuperar o crescimento com investimentos na produção, acabar com a especulação financeira, combater a inflação “galopante”, gerar empregos, atrair capital estrangeiro e desindexar a economia
Em dúvida entre o modelo liberal ortodoxo e uma política flexível, optou pelo segundo

Plano Cruzado (1986)

Planejado pela equipe de Dilson Funaro, o “choque heterodoxo” era uma política estruturalista para a economia nacional
Decretou a substituição da moeda, a queda dos juros, o congelamento por uma ano de preços e salários e a eliminação das ORTNs
Gerou no início deflação, estabilidade da moeda, crédito acessível e o consumismo

Resultados efêmeros

A população comemorou os resultados do plano, mas não por muito tempo
Com a popularidade em alta, o presidente contou com os “fiscais do Sarney” para impedir a volta da inflação, porém ocorreu uma disparidade entre consumo e produção
O comércio desabastecido praticou junto com a indústria a cobrança do ágio

Outros planos foram decretados

Após o fracasso do Cruzado, Funaro foi substituído por Bresser Pereira, que também deixou sua marca, o Plano Bresser (1987)
Sem resultados imediatos, Bresser perdeu o cargo para Maílson da Nóbrega, que em 1989 lançou o Plano Verão, outro fracasso
A sucessão de planos e a explosão da inflação desgastaram o governo Sarney

A constituinte (1987/1988)

Eleita na esteira do Cruzado, a Assembléia Constituinte foi o momento democrático do governo Sarney; as lutas entre o “Centrão” e os “Progressistas” marcaram os debates de Brasília no período
Promulgada em outubro de 1988, recebeu a denominação “Constituição Cidadã” pelos direitos garantidos aos brasileiros

A sucessão presidencial

Com o desgaste político de Sarney, vários candidatos procuraram concorrer ao cargo
Nenhum postulante ao cargo se aproximou do governo que tinha imagem de fracasso
Rotulado de corrupto, ladrão, incompetente, coronelista e fisiologista, o presidente não seria um bom cabo eleitorial em 1989 diante da rejeição popular

Uma disputa acirrada

Muitos partidos lançaram candidatura própria para a corrida eleitoral de 1989
Os mais conhecidos eram Covas (PSDB), Brizola (PDT), Maluf (PDS), Aureliano Chaves (PFL), Afif Domingos (PL), Ulisses Guimarães (PMDB), Enéas (PRONA), Lula (PT) e Collor (PRN); até Silvio Santos tentou participar mas foi impedido pela J.E.

Governo José Sarney – Presidente

José Sarney compôs o seu ministério com pessoas indicadas por Tancredo Neves.

Para acabar com seu caráter autoritário ele mandou ao Congresso várias emendas à Constituição de 1967. As emendas aprovadas foram aquelas eu estabeleciam eleições diretas para presidente e para os prefeitos das capitais e das áreas de segurança nacional; mandato de cinco anospara presidente; o direito de voto aos analfabetos; a liberdade para formação de partidos políticos e representação política para o Distrito Federal.

Sarney convocou uma Assembléia Nacional Constituinte e coube ao Congresso Nacional elaborar uma nova Constituição para o país.

A Constituição de 1998

Foi no 5 de Outubro de 1988, a Constituição mais democrática que o Brasil já teve. A participação da população contou muito através de baixo assinados que foi orientado por segmentos da sociedade.

Com essa Constituição o povo doi muito beneficiado, o trabalhador conquistou o direito de ampliação da licença maternidade para 120 dias, a licença paternidade para 5 dias, a redução da jornada de trabalho de 48 horas semanais para 44 horas, o direito de greve, a liberdade sindical o abono de férias de um terço do salário e o 13º salário dos aposentados.

O voto tornou-se facultativo entre 16 e 18 anos, também foi estendido aos analfabetos. As eleições passaram a ser em dois turnos para os cargos de presidente, governados, prefeito das cidades com mais de 200 mil eleitores. O mandado presidencial foi reduzido para 4 anos. Foi também abolida censura em relação a família, aprovado o divórcio e também o direito da criança e do adolescente, o racismo passou a ser crime inafiançável sujeito a pena de redução; os indígenas tiveram a sua cultura, proteção e também a demarcação de suas terras, suas riquezas.

O Plano Cruzado

No governo Sarney houve uma grave crise inflacionaria no país cujos índices chegaram a atingir 25% ao mês. Em 28 de Fevereiro de 1986, o presidente anúnciou um Plano de Estabilização Econômica, que ficou conhecido com Plano Cruzado do Dilson Funaro, ministro da Fazenda foi quem substituiu o cruzeiro pela nova moeda, o cruzado. Esse novo plano acabou fracassando e a inflação voltou a subir.

Tentaram equilibrar a situação com novos plano econômicos, com o plano Bresser que surtiu uma desvalorização da moeda e congelamento dos preços por 90 dias, o Plano Verão que entrou em vigor em 1989, a moeda passou a se chamar Cruzado Novo, foi outro plano que também não deu certo e a inflação voltou a subir.

Com a alta da inflação, greves, assassinatos de trabalhadores rurais, constantes denúncias de corrupção no governo este começou a enfraquecer e a fortalecer a oposição. Com isso o presidente convocou eleições presidenciais no qual saiu vitorioso Fernando Collor de Melo. Já na sua campanha voltou-se para a “caça aos marajás” com a moralização de vida pública, melhorias de condições de vida da população e ao apelo a modernização tecnológica, abertura do capital internacional. Collor com grande apoio da imprensa principalmente de rdes de televisão venceu as eleições.

O Governo de José Sarney

José Ribamar Ferreira de Araújo Costa nasceu em Pinheiro (MA) em 24 de abril de 1930, filho de Sarney de Araújo Costa e de Kiola Ferreira de Araújo Costa. Em 1965 adotou legalmente o nome de , do qual já se utilizava para fins eleitorais desde 1958, por ser conhecido como “Zé do Sarney”, isto é, José filho de Sarney.

Fez os estudos secundários no Colégio Marista e no Liceu Maranhense, cursando em seguida a Faculdade de Direito do Maranhão, pela qual se bacharelou em 1953. Por essa época ingressou na Academia Maranhense de Letras. Segundo Maurício Vaitsman, ao lado de Bandeira Tribuzi, Luci Teixeira, Lago Burnet, José Bento, Ferreira Gullar e outros escritores, fez parte de um movimento literário difundido através da revista que lançou o pós-modernismo no Maranhão, A Ilha, da qual foi um dos fundadores.

Iniciou suas atividades profissionais como oficial judiciário, tornando-se depois diretor da secretaria do Tribunal de Justiça do Maranhão. Ingressou na vida política ao eleger-se em outubro de 1954 quarto suplente de deputado federal na legenda do Partido Social Democrático (PSD), com 3.271 votos. Ocupou uma cadeira na Câmara entre agosto e setembro de 1956 e de maio a agosto do ano seguinte, além de outros curtos períodos. Segundo José Ribamar Caldeira, na história política do Maranhão o período de 1956 a 1966, que então se iniciava, caracterizou-se por um coronelismo particular, o vitorinismo, que consistiu no domínio absoluto dos interesses do senador Vitorino Freire.

Em 1957 assumiu a cadeira de professor de noções de direito da Faculdade de Serviço Social da Universidade Católica do Maranhão. Em fevereiro de 1958 encabeçou um abaixo-assinado que recebeu a adesão dos mais diversos partidos políticos, de líderes sindicais, advogados e jornalistas, em apoio à resolução da assembléia geral da Associação dos Trabalhadores Agrícolas do Maranhão (ATAM), mais tarde denominada Federação dos Trabalhadores Rurais do Maranhão, de convocar a II Conferência Agrária do Maranhão, a ser realizada em julho do mesmo ano. Rompendo a seguir com o vitorinismo, ingressou na União Democrática Nacional (UDN), cujo diretório regional presidiria desse ano até 1965, ao serem extintos os partidos.

Em outubro de 1958 concorreu novamente à Câmara, com o apoio das Oposições Coligadas – UDN, Partido Democrata Cristão (PDC) e Partido Republicano (PR) -, sendo eleito com 15 mil votos. Assumiu o mandato em fevereiro de 1959 e logo depois aderiu à Frente Parlamentar Nacionalista. Entre 1959 e 1960 foi vice-líder da UDN na Câmara.

Na “Bossa Nova” da UDN

No início da década de 1960, participou das primeiras articulações do auto-intitulado movimento renovador da UDN, identificado pela estreita vinculação com a candidatura, afinal vitoriosa, de Jânio Quadros às eleições presidenciais de outubro de 1960. Os objetivos dessa facção udenista – que seria denominada mais tarde “Bossa Nova”, por analogia com o movimento da música popular – foram expostos pela primeira vez em fins de 1960 ao presidente do Diretório Nacional, Magalhães Pinto, por Sarney e pelo deputado paraense Clóvis Ferro Costa, que defenderam “a adoção de nova tática política para corresponder aos anseios populares”.

Empossado Jânio em janeiro de 1961, três meses depois, numa convenção em Recife, o grupo apareceu ostensivamente, já com a denominação “Bossa Nova”, pregando uma linha de centro-esquerda, inspirada no programa de desenvolvimento com justiça social da doutrina da Igreja. Em termos políticos, o grupo apoiava as propostas reformistas de Jânio, consideradas nacionalistas e de interesse popular, tais como as leis antitruste e de remessa de lucros, a defesa das riquezas minerais, o combate à inflação, a reforma da lei de imposto de renda e a extinção das ações ao portador, entre outras. Nessa convenção, o deputado paulista Herbert Levy – do grupo denominado “Banda de Música”, que se opunha à dissidência “Bossa Nova” – foi eleito presidente do partido, cabendo a Sarney a vice-presidência, que exerceria até 1963. Segundo Maria Vitória Benevides, os udenistas “bossa-nova” eram acusados pelos “bacharéis da Banda de Música” de filocomunistas e pelos demais udenistas tradicionais – os radicais lacerdistas e os vinculados à Ação Democrática Parlamentar (ADP) – de adesistas e oportunistas. Após a renúncia de Jânio e a posse de João Goulart, a “Bossa Nova” manteve sua posição reformista.

Em outubro de 1962, na legenda das Oposições Coligadas, à qual se unira o Partido Trabalhista Nacional (PTN), foi reeleito com a maior votação obtida no Maranhão por um candidato da oposição: 21.294 votos. Em abril do ano seguinte tornou-se um dos signatários do manifesto da “Bossa Nova”, apresentado em Curitiba na convenção nacional da UDN pelo deputado José Aparecido de Oliveira (MG). O documento representou a ruptura decisiva da ala dissidente com relação aos udenistas tradicionais ao defender as reformas agrária, bancária, tributária e urbana, a política externa independente, o Plano Trienal do governo, a consolidação de Brasília, a democratização do ensino, o monopólio estatal do petróleo e a Eletrobrás. A “Bossa Nova” defendeu ainda a reforma agrária com emenda à Constituição, aceitando até a tese do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) a favor do “arrendamento compulsório”.

No fim de 1963, Sarney e José Aparecido não compareceram à votação da emenda apresentada pelo deputado Bocaiúva Cunha, do PTB da Guanabara, para a reforma constitucional. O ponto polêmico da emenda se referia à indenização de terras desapropriadas “mediante títulos da dívida pública, resgatáveis em prestações sujeitas à correção do valor monetário em limite não excedente a 10% ao ano”. A “Bossa Nova” discordou dos termos, considerando a indenização proposta “injusta e espoliativa”, e apenas um udenista, José Carlos Guerra, de Pernambuco, votou a favor da emenda, derrotada por 176 votos a 121.

Segundo Maria Vitória Benevides, poucos dias antes do movimento político-militar que depôs João Goulart, Sarney discursou na Câmara: “O regime de opressão e de opróbrio jamais satisfaz o povo. Foi através da democracia, da manifestação do pensamento em praça pública e do voto que os trabalhadores conseguiram conquistar a situação de que hoje desfrutam. Por isso mesmo, recuso-me a acreditar que uma política popular possa, em algum momento, conjugar-se com a supressão das liberdades políticas.”

Apesar das posições que assumira em defesa das reformas de base e em apoio a Goulart, Sarney se tornaria um dos principais nomes políticos do regime implantado com o movimento de março de 1964. Na situação que se criou, as facções udenistas se diluíram e o partido, de modo geral, foi favorável ao movimento.

Candidato da coligação da UDN com o Partido Social Progressista (PSP) e ostensivamente apoiado pelo presidente Castelo Branco, Sarney conquistou o governo do Maranhão em outubro de 1965, recebendo uma votação inédita na história do estado:121.062 votos, o dobro do segundo colocado, Antônio Eusébio da Costa Rodrigues, do PDC, apoiado pelo governador pessedista Newton Belo.

A eleição representou, acima de tudo, a primeira derrota política de Vitorino Freire: seu candidato, Renato Archer, obteve uma votação inexpressiva: cerca de 1/4 da que alcançou Sarney. Segundo depoimento de Archer ao Cpdoc da Fundação Getulio Vargas (FGV), “mesmo que não tivesse havido a pressão do governo federal, Sarney ganharia a eleição”. A pressão pessoal de Castelo Branco sobre o governador teria sido feita pelos coronéis João Batista Figueiredo e Dilermando Monteiro, que lhe impuseram o lançamento de outra candidatura e a retirada do apoio a Archer, com quem já estava comprometido. Ainda nesse depoimento, Archer afirmou que, na ocasião das eleições, Sarney fazia uma campanha contra o governador, acusando-o de desonestidade. Mais tarde, teria obtido pessoalmente de Castelo Branco a cassação de Newton Belo por força do Ato Institucional nº 2 (AI-2), em julho de 1966.

Segundo Alfredo Wagner B. de Almeida, a coligação UDN-PSP que apoiou a candidatura Sarney ao governo do Maranhão, consolidada na capital, voltou-se fundamentalmente para a arregimentação do eleitorado rural. Em várias regiões, a frente oposicionista procurou organizar os adversários do vitorinismo e, em particular, os remanescentes das associações de lavradores e trabalhadores agrícolas e dos sindicatos de produtores autônomos – entidades que haviam sido fechadas e tido seus principais líderes presos em virtude do movimento militar de março de 1964 – e com eles desmontar, em nível local, os esquemas de controle do voto dos pessedistas. Percorrendo inúmeros povoados, fazendo contatos e estimulando debates, os trabalhadores rurais apoiaram a candidatura Sarney. Em comícios, no interior, o candidato prometia a reabertura das agremiações e o seu livre funcionamento, caso lograsse êxito a coligação oposicionista.

Tal não aconteceria, entretanto. Os trabalhadores rurais que haviam participado da campanha no vale do rio Pindaré tentariam reabrir os sindicatos logo no início do governo Sarney, mas seriam desencorajados pelas autoridades municipais e estaduais.

Entre os objetivos definidos pelo governo Castelo Branco incluía-se o afastamento de alguns coronéis tradicionais do PSD dos centros de decisão política de alguns estados. Além de excluir Vitorino Freire dos mecanismos de poder, o governo central promoveu no Maranhão a revisão do colégio eleitoral para extinguir a corrupção. Descobriu-se então a existência de 206.206 eleitores “fantasmas” (dos 497.436 eleitores inscritos em 1962, após a revisão, em 1966, o número de eleitores passou para 291.230). Ao lado dessas medidas de ordem política, o governo Castelo Branco iniciou no Maranhão a implementação da infra-estrutura econômica e social, sem todavia contrariar os interesses dominantes no estado.

Empossado em março de 1966, Sarney encontrou no PSD e no vitorinismo uma oposição natural ao novo governo. Entretanto, a extinção dos partidos políticos pelo Ato Institucional nº 2 (27/10/1965) e a posterior instauração do bipartidarismo diluíram essa oposição formal, já que tanto Sarney como Vitorino ingressaram no partido do governo, a Aliança Renovadora Nacional (Arena). Segundo José Ribamar Caldeira, esse fato contribuiu para que Sarney desenvolvesse sua ação política com grande desembaraço, pois Vitorino manteve-se afastado do Maranhão, evitando o constrangimento de um confronto com um membro do mesmo partido.

Além disso, Sarney não encontrou grandes obstáculos por parte do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) maranhense – um partido de pouca expressão e dimensões – devido à popularidade do movimento de 1964 no estado. Dessa forma iniciou-se o predomínio do sarneísmo.

Durante seu governo, Sarney deteve, portanto, o controle efetivo da Arena maranhense. Desenvolvendo um estilo próprio de governo – popular, dinâmico e modernizador -, recebia em audiências diariamente dezenas de pessoas dos mais variados setores da população e provocou, segundo Veja (11/3/70), uma revolução na administração, chamada de “milagre maranhense”. Os investimentos decuplicaram, aumentando em 2.000% o orçamento do estado.

Em seu governo foi constituída a usina hidrelétrica de Boa Esperança, na fronteira sul do Maranhão com o Piauí, pela Companhia Hidrelétrica de Boa Esperança (Cohebe), que passou a fornecer energia a cerca de 40 cidades do interior dos dois estados e parte do Ceará.

Ainda segundo Veja (4/2/1976), nos quatro anos da administração Sarney o Maranhão deu um salto: o estado pulou de zero para quinhentos- quilômetros de estradas asfaltadas e mais dois mil quilômetros de estradas de terra. Criou-se, além disso, uma rede de telecomunicações cobrindo 85 municípios; elevou-se de um para 54 o número de ginásios estaduais e ampliaram-se de cem mil para 450 mil as matrículas escolares. No início de 1970, Sarney inaugurou, com uma assistência de cem mil pessoas, a ponte de São Francisco, sobre a foz do rio Anil, ligando a ilha de São Luís – onde fica a capital – ao continente. A construção da ponte já havia passado ao domínio da lenda, pois se estendera por vários governos. A construção do porto de Itaqui, a barragem do rio Bacanga e o planejamento da cidade industrial foram outras iniciativas.

No entanto, os moradores de cerca de sete mil palafitas, concentradas principalmente à entrada da capital, vinham sendo lentamente transferidos pelo governo para o outro lado da cidade, próximo à área reservada à cidade industrial, o que gerou queixas da população, devido ao afastamento de seus locais de trabalho.

Ainda no início de 1970, publicou seu primeiro livro de contos: Norte das águas, bem recebido pela crítica. Segundo Odilo Costa Filho em Veja, ele “sabia varar a noite contando coisas, anedotas, e nessa base fez sua campanha como orador popular capaz de entusiasmar as massas”.

Em meados do mesmo ano, antes do fim do mandato, deixou o palácio dos Leões para candidatar-se ao Senado, sendo substituído pelo vice Antônio Dino, vinculado à corrente política liderada pelo senador arenista e ex-pessedista Clodomir Millet. Ao deixar o governo, recebeu uma das maiores consagrações populares nas ruas de São Luís. Quarenta e oito horas depois de ter recebido o cargo, Dino rompeu com o antecessor. Iniciaram-se então, segundo José Ribamar Caldeira, os sinais de oposição entre o sarneísmo e o governo do estado.

De acordo com o Jornal do Brasil, o próprio Sarney ajudou a escolher o novo governador Pedro Neiva de Santana, seu ex-secretário de Fazenda e, portanto, um sarneísta de origem. Indicado pela Arena, Pedro Neiva foi eleito indiretamente pela Assembléia Legislativa em outubro de 1970. O relacionamento de Sarney com Neiva, entretanto, acabaria esfriando no governo Emílio Médici (1969 -1974), pois a corrente liderada pelo primeiro não recebeu nesse governo o apoio ostensivo que lhe tinha sido conferido nos anteriores. Neiva não era desautorizado pelo governo central em seus atos políticos, considerados prejudiciais à corrente sarneísta. Segundo Caldeira, era difícil para a população discernir qual das duas correntes – a de Sarney ou a de Neiva – representaria a Revolução no estado, “visto serem ostensivamente manifestas as suas dissensões”.

No Senado

Sarney foi eleito senador com 236.618 votos.

Entrevistado pela revista Veja em janeiro de 1971, declarou ser um anacrônico, apesar de jovem: “Tenho a doença do político liberal, num tempo em que todos proclamam que ela está ultrapassada.” Acrescentou que a revolução precisava preparar imediatamente o seu projeto político, prevendo a necessidade de uma liderança para garantir a sua continuidade.

Para Sarney, tanto o MDB como a Arena não podiam contestar o regime: “E seria angelismo achar que algum regime aceitaria uma contestação que o levasse à destruição.”

Com relação à “guerra revolucionária”, afirmou: “Ela existe, está aí e interessa a todos nós que ela acabe… A democracia tem instrumentos de defesa e acredito que outra coisa não tem feito o presidente Médici senão procurar construir e implantar esse sistema de defesa.”

Em fevereiro de 1971 Sarney assumiu o mandato no Senado e ainda nesse ano ocupou a presidência do Instituto de Pesquisas e Assessoria do Congresso (IPEAC). Nessa condição, foi um dos promotores do debate sobre a necessidade de modernização do Parlamento, tendo integrado, com Ney Braga (PR) e Franco Montoro (SP), uma comissão constituída com esse fim, presidida por Carvalho Pinto (SP). A comissão iniciou os estudos para a informatização da Casa e a criação do Prodasen, durante a gestão de Petrônio Portela na presidência do Senado (1977-1979). Participou, também, do II Encontro de Ecologia e População, promovido pela Tinker Foundation e Federal Population Bureau e realizado em Long Island, Nova Iorque. Suplente da comissão de Educação e Cultura e titular da Comissão de Relações Exteriores em 1972, integrou a delegação brasileira à XXVI Assembléia Geral das Nações Unidas na qualidade de observador parlamentar. Foi eleito titular da Comissão de Constituição e Justiça e reconduzido às de Relações Exteriores e de Educação e Cultura.

Em 1974, já no governo de Ernesto Geisel (1974-1979), Vitorino Freire retornou à atividade. Por sua influência e indicação foram eleitos indiretamente para governador e vice-governador Osvaldo da Costa Nunes Freire e José Dualibi Murad. Segundo Veja, apoiado em sólidos suportes, Vitorino conseguiu introduzir uma cunha entre Sarney e o governador Pedro Neiva, obrigando a um demorado reestudo dos candidatáveis no estado. Nunes Freire – ex-deputado udenista e ex-secretário de Saúde de Sarney – acabou surgindo como a única solução possível para representar igual distanciamento das duas lideranças, já que Sarney tentara indicar o senador Alexandre Costa. Ainda por influência de Vitorino, seu filho Luís Fernando (Lula) Freire foi colocado na suplência do deputado Henrique La Roque, partidário de Sarney, indicado para o Senado.

Segundo José Ribamar Caldeira, nos dois anos iniciais do governo Geisel a política maranhense caracterizou-se pela oposição entre o governador Nunes Freire e o sarneísmo. Logo em seguida à posse de Nunes Freire, Vitorino passou a apoiar, sem quaisquer reservas, as atitudes do governador contra o sarneísmo. Sua volta à cena política estadual e sua influência determinaram o aprofundamento das dissensões internas na Arena, colocando os dois grupos – sarneístas e vitorinistas – em oposição frontal. Essa dissensão acabou aproximando o senador Clodomir Millet – grande opositor de Sarney no Maranhão – de Vitorino, o qual viria a integrar o Diretório Nacional da Arena a partir de 1975.

Ao longo do governo Geisel, Sarney manifestou-se reiteradas vezes em favor da política de distensão inaugurada pelo presidente. No início de dezembro, ainda segundo Veja, declarou-se um “otimista no processo de redemocratização”. Garantiu o fim da “hibernação política provocada pelos acontecimentos de 1968”, pois “o desenvolvimento econômico é incompatível com o subdesenvolvimento político”. Em sua opinião, a Arena amargara os resultados de uma derrota eleitoral em novembro de 1974 porque “não soube encarnar o espírito de um país que, ao longo dos últimos dez anos, modificou-se estruturalmente e se modernizou”.

Em março de 1975, afirmou que a vocação do movimento de 1964 sempre fora a democracia, “mas uma democracia a salvo das investidas totalitárias”. Em maio declarou que a distensão não podia comprometer nem abrir condições de risco ao processo de desenvolvimento econômico.

Em 1975-1976, agravou-se a crise do poder no Maranhão, com a deflagração, pelo sarneísmo, de incisiva campanha contra a administração Nunes Freire, acusada de corrupta. A crise política aguçou-se durante o período eleitoral de 1976, nas eleições para 128 prefeituras e câmaras municipais. A campanha desenvolveu-se dentro de radicalismos extremados, opondo os dois grupos arenistas. Os resultados eleitorais não apenas demonstraram uma supremacia da liderança de Sarney nos centros urbanos mais importantes do estado como também caracterizaram a fragilidade do MDB maranhense, que conseguiu apenas 12 prefeituras, quando em 1972 conquistara 14.

Em 1976, Sarney fez diversos pronunciamentos sobre os principais temas políticos em debate. No início de julho, afirmou no Senado que “o bipartidarismo de fato, que não significa imperiosamente a existência de apenas dois partidos, é o caminho e a fórmula da estabilidade”. Alguns dias depois, em palestra no Instituto dos Advogados Brasileiros, declarou que “sem Parlamento não há democracia, sem democracia não há liberdade e sem liberdade o homem é apenas uma aspiração a engordar”. Entrevistado em meados de setembro, defendeu a liberdade de informação, dizendo que esta não implicava “nenhum risco para o governo, para a imprensa, para a revolução”.

No início de 1977, Sarney precisou dedicar-se exclusivamente à política de seu estado, em virtude do agravamento da crise entre sua corrente e a de Vitorino.

Em 2 de abril foi fechado o jornal A Cidade de São Luís, fundado por Sarney. O fato foi atribuído a pressões econômicas que teriam partido do governo estadual. Dois dias antes, também o matutino Posição deixara de circular sob as mesmas alegações.

Ainda em abril, o Diretório Nacional do MDB decidiu fechar questão contra o projeto governamental de reforma do Judiciário. Esse fato evidenciava a intenção do MDB de não aprovar as reformas políticas, elemento central na tática eleitoral do governo.

A decisão do MDB acabou por levar o presidente Geisel a decretar, ainda em abril, o recesso do Congresso e a editar o chamado “pacote de abril”, que visava a fortalecer o governo para enfrentar a oposição nas eleições de novembro de 1978. O “pacote de abril” continha um conjunto de medidas que impunha limites ao processo eleitoral, estabelecendo eleições indiretas para governador ainda em 1978, reduzindo para apenas a maioria absoluta o quorum para a aprovação de emendas constitucionais e aprovando a coincidência de mandatos em 1982, as sublegendas para o Senado, as eleições indiretas de um senador em cada estado e o voto vinculado para deputado estadual, federal e senador.

Em maio Sarney reapareceu no cenário político nacional, analisando o fracasso da tentativa de “acordo político entre governo e oposição”. Como vice-líder da maioria do Senado, começou a ocupar, outra vez, os espaços políticos do Congresso, que sempre dividira dentro da Arena com Petrônio Portela, Virgílio Távora e Jarbas Passarinho. Entrevistado pelo Jornal do Brasil, preconizou um entendimento do seu partido com o presidente Geisel para que se encontrasse uma fórmula para o projeto político do movimento de 1964, admitindo, em princípio, a convivência do AI-5 com uma Constituição que começasse a experimentar instrumentos novos, como um conselho de Estado.

Nesse mesmo mês defendeu a situação institucional respondendo ao terceiro discurso sucessivo do senador Paulo Brossard, do MDB gaúcho, um dos mais veementes adversários do regime. Em junho voltou à tribuna para responder às críticas de Brossard. No discurso – anunciado como o primeiro de uma trilogia -, acusou a oposição de acirrar posições e intensificar tensões, postergando a distensão. “As formulações e comparações da oposição sobre o regime brasileiro pecam pelo irrealismo. Estamos num processo de transição revolucionária, o poder revolucionário afirma que deseja continuá-lo e, portanto, não cabe à oposição julgar sua determinação, a não ser que o derrube pela força. Esta, contudo, não será jamais uma atitude nem sensata nem viável.”

Em meados de setembro, Sarney pediu o enquadramento do governador Nunes Freire no Código Penal por crime de falso testemunho. O pedido foi feito à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigava o sistema fundiário. Sarney depôs na CPI defendendo-se das acusações de Nunes Freire – que denunciara a situação irregular das terras da fazenda Maguari, pertencente ao senador – e, segundo o Jornal do Brasil, exibiu documentos demonstrando não possuir título algum de propriedade de terra no Maranhão, a não ser a propriedade da família, herdada do sogro, cuja documentação também apresentou.

Entretanto, segundo dados do recadastramento geral do INCRA, de 1978, citados por Alfredo Wagner B. de Almeida, a fazenda Maguari, em Santa Luzia, apareceria registrada em nome de José Sarney, com uma área de 4.253 hectares.

Em janeiro de 1978, manifestou-se contrário à legalização do Partido Comunista em países subdesenvolvidos. Declarou também que chegara o momento de escolher entre o voto proporcional e o distrital ou majoritário. Com a permanência do primeiro, “não terá sentido manter o bipartidarismo, pois esse sistema pressupõe a multiplicação de partidos”. No segundo caso, o país teria dois partidos fortes revezando-se no poder, “a exemplo de todas as democracias ocidentais”. Em sua opinião, seria essa a única saída para a prática de uma democracia liberal. Nesse mesmo mês, o nome do chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), general João Batista Figueiredo, foi anunciado como candidato do governo à presidência da República.

Em abril, Sarney teve seu nome novamente cogitado para o governo do estado. Segundo o Jornal do Brasil, o governador Nunes Freire, dizendo-se apoiado por 110 entre 130 prefeitos da Arena, tentou impedir a indicação de Sarney. Todavia, não foi recebido no palácio do Planalto e teria sido o único governador não contemplado com o privilégio de anunciar formalmente o nome de seu sucessor. Não obstante, a situação de crise permanente na política maranhense acabaria por impedir a indicação de Sarney.

Nesse mesmo mês, o Supremo Tribunal Federal (STF) arquivou a representação criminal contra Sarney, feita por dois posseiros no Maranhão, residentes na fazenda Maguari. Os posseiros tentaram, inicialmente, contestar a posse da fazenda, mas no entender do STF a propriedade “foi adquirida legitimamente pelo sr. José Sarney, através de escritura particular”. Segundo a opinião pública maranhense, a reivindicação dos posseiros foi prejudicada pela disputa entre o governador Nunes Freire e Sarney, tornando a questão apenas uma briga política.

No fim do mês, Sarney distribuiu nota à imprensa comunicando ter atendido ao apelo do general Figueiredo no sentido de permanecer no Senado. Sua aquiescência foi obtida com a garantia de que poderia disputar a eleição direta. No fim do documento, apoiou a indicação do deputado sarneísta João Castelo para o governo do estado, bem como a escolha do senador Alexandre Costa para concorrer à vaga de senador indireto.

Em meados de setembro, na qualidade de relator do projeto de reformas políticas, entregou a Geisel o relatório, constando entre outras alterações a limitação de 60 dias para a duração das medidas de emergência, a eliminação da suspensão automática dos mandatos parlamentares e a liberalização para a formação de partidos. Segundo Sarney, em relação à “ordem constitucional” o projeto restaurava totalmente o estado de direito e, em relação à “ordem política”, não esgotava as “aspirações liberalizantes, nem da sociedade, nem do próprio governo”.

Por esse motivo, achava que o MDB não podia deixar de apoiar o projeto, pois ele consagrava todos os seus temas de campanha nos últimos anos: o fim do AI-5, a restauração do estado de direito e a superação dos atos de exceção.

Em outubro, o candidato oficial à presidência, general João Batista Figueiredo, secundado por Aureliano Chaves, governador de Minas Gerais e candidato à vice-presidência, derrotou por larga margem de votos as candidaturas alternativas apoiadas pelo MDB (general Euler Bentes Monteiro e Paulo Brossard).

Em novembro de 1978 Sarney reelegeu-se – com mais de duzentos mil votos – batendo recordes de votação: 63,7%, o maior percentual registrado por um candidato da Arena naquelas eleições. José Sarney Filho foi eleito deputado estadual, liderando também a votação da legenda. No último dia do ano, o governo promulgou a Emenda Constitucional nº 11 que extinguiu o AI-5, entrando em vigor a partir de 1º de janeiro de 1979 as chamadas reformas políticas contendo as “salvaguardas constitucionais”.

Na presidência da Arena

Em meados de janeiro de 1979, o presidente eleito, João Figueiredo, indicou Sarney para a presidência nacional da Arena em substituição a Francelino Pereira, indicado governador de Minas Gerais. De acordo com o Jornal do Brasil, Sarney voltara a ser, nos últimos anos, o parlamentar combativo de antes, duelando no plenário com os mais talentosos senadores da oposição. Eurico Resende, Jarbas Passarinho e Sarney, nos temas políticos, e Virgílio Távora, nos econômicos, formavam a linha de frente do partido governista. Para eleger Sarney substituto de Francelino foi necessário ao governo recorrer a um artifício, pois não sendo membro do Diretório Nacional ele não poderia atingir aquele posto. Optou-se então por conseguir renúncias e deixar o diretório com uma vaga a menos a ser preenchida pelo senador maranhense. No lugar do amplo colégio da convenção partidária, o novo presidente do partido seria indicado pelo diretório nacional em 31 de janeiro. O expediente suscitou comentários de órgãos da imprensa, como o Jornal do Brasil, que observou: “A Arena não terá apenas 21 senadores biônicos, mas também um presidente indireto.”

Pouco depois da indicação, Sarney concedeu entrevista no escritório de Figueiredo. Prometeu envidar esforços, com os demais líderes, para transformar a Arena num partido moderno, de orientação socialdemocrata, lutando ainda “por criar lealdades voluntárias que ofereçam ao governo o respaldo político de que precisa e ao partido a força de que necessita”.

Em 15 de março de 1979 Figueiredo substituiu Ernesto Geisel na presidência da República. No fim de julho, Sarney abandonou sua luta em favor da conservação do bipartidarismo, convencido de que seu esforço era completamente infrutífero diante das decisões dos escalões superiores. Numa mudança brusca de estratégia, dirigiu sua atuação no sentido de que a reformulação partidária se processasse com o fim da Arena e do MDB, resultando na organização de um grande partido que daria respaldo ao governo.

Em meados de agosto, foi decidida pelo governo a manutenção da sublegenda em nível municipal, “com a finalidade de assegurar a convivência de divergências de ordem pessoal e permitir a formação de um único partido de sustentação do governo”. A tese, ainda alvo de algumas críticas, recebeu a orientação da Casa Civil da Presidência da República e a coordenação do presidente da Arena no sentido de ser assimilada pelos setores arenistas que se manifestaram contra.

O senador maranhense considerou a anistia, concedida em 28 de agosto de 1979, como um primeiro passo no processo de reformulação partidária. No início de setembro, propôs a dirigentes e líderes arenistas e oposicionistas que iniciassem entendimentos visando à reformulação partidária. Disse ainda que as posições assumidas publicamente pelo deputado paulista Ulisses Guimarães, presidente do MDB, condicionando a reorganização partidária ao restabelecimento da plenitude democrática, não conduziam a nenhum caminho e também não ajudavam a evolução do processo de abertura democrática com o qual estavam comprometidos o governo e a Arena. Afirmou que o debate em torno da reformulação partidária poderia estabelecer no Parlamento um sistema de aproximações sucessivas que poderiam desembocar num programa muito mais amplo, identificado com a conciliação nacional, já que para isso o presidente Figueiredo dera o primeiro passo quando dissera que estava de “mão estendida”. Segundo Sarney, “ninguém no Brasil nega que estamos caminhando em um processo de liberalização política, cuja evolução já se torna flagrante com o retorno ao país dos exilados, graças à Lei de Anistia”.

Alguns dias depois, defendeu sua antiga tese de que o país necessitava de partidos não ideológicos fortes para contrabalançar o ressurgimento de partidos populares. A esses partidos não ideológicos estaria destinado o papel de unir as forças sociais de centro democrático, a fim de conferir estabilidade às instituições políticas. A discussão em torno da criação de um ou dois partidos de sustentação do governo continuou dividindo os arenistas durante o mês de setembro. Sarney liderou a corrente que defendia a tese de criação de um único partido governista.

No fim de setembro, justificou a necessidade da reformulação partidária em palestra intitulada “Análise dos partidos políticos” na Escola Superior de Guerra (ESG), afirmando que ela “é necessária para dar maior autenticidade ao sistema partidário e evitar que grupos que não obtenham canal próprio para participar busquem outros meios, que prejudicariam a consolidação democrática”. Enfatizou ainda que os partidos não tinham promovido integralmente nos últimos anos a missão de filtrar aspirações da sociedade e transformá-las em decisões do governo. Por isso, os grupos de pressão tradicionais, como Igreja, federações, associações, sindicatos e outros, extrapolaram de suas órbitas para ditarem políticas e sobre elas firmarem posições e exercerem militância.

Ainda em setembro, apoiou as manifestações do ministro da Aeronáutica, brigadeiro Délio Jardim de Matos, a favor das eleições diretas em todos os níveis, inclusive para a presidência da República.

No dia 27, anunciou na presença de Ulisses a disposição do governo de extinguir os dois partidos, acrescentando: “Ninguém irá extinguir o MDB para acabar com a oposição. O fato é que estão ocorrendo divisões no interior dos dois partidos. E o futuro vai dizer se o nosso desejo era a extinção do MDB ou a criação de uma estrutura partidária democrática, que permita a alternância do poder. A oposição é inextinguível. A oposição sempre existirá.” Ulisses contestou essa afirmação dizendo que “a oposição se institucionaliza apenas através de um partido de oposição”, aduzindo: “Em política, a receita certa para um partido perder voto é mudar de nome.”

O projeto governamental, que recebeu criticas de setores da própria Arena, foi defendido por Sarney, que afirmou ser legítima a extinção dos partidos, pois a Arena e o MDB haviam sido criados por uma legislação de exceção já revogada pela Emenda Constitucional nº 11. Em sua opinião, o projeto da reformulação partidária estaria acabando com o remanescente do regime de exceção ao propor a extinção do seu partido e do MDB.

O projeto estabelecia um ritual para a fundação, organização e funcionamento dos partidos, obrigando-os a se estruturarem desde a base municipal, sem o que não obteriam o registro definitivo do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Manteve-se a proibição dos partidos terem vínculos “de qualquer natureza com governos, entidades ou partidos estrangeiros”, segundo o Jornal do Brasil, numa alusão direta aos partidos comunistas e ao PTB, “pelas ligações do sr. Leonel Brizola com a socialdemocracia alemã”. Para justificar o desaparecimento da Arena e do MDB, o projeto estabeleceu que a agremiação teria de se denominar, obrigatoriamente, partido. Manteve-se a fidelidade partidária, de forma que o deputado ou senador que ingressasse num bloco – depois partido – nele seria obrigado a permanecer pelo menos durante todo o quadriênio. E dele só poderia sair para fundar outro partido, depois daquele prazo.

Em meados de novembro, o governo descobriu a existência de um pacto secreto entre dissidentes da Arena – cerca de 35 – e o MDB, pelo qual aqueles se comprometeriam a apoiar emenda da oposição, contrária à extinção dos partidos. Com os líderes da maioria no Senado e na Câmara, Jarbas Passarinho (PA) e Nélson Marchezan (RS), Sarney participou de uma reunião com o ministro da Justiça, Petrônio Portela, que considerou viável a aprovação da reforma por decurso de prazo, por achar reduzidas as chances de um acordo entre arenistas fiéis a Figueiredo e os dissidentes. Estes reivindicavam a supressão da sublegenda. Durante todo o mês foram mantidos entendimentos entre o presidente da Arena e os líderes do partido na Câmara e no Senado com os chamados independentes, para garantir a aprovação do projeto de reforma partidária tal como desejado pelo governo. Extinto afinal o bipartidarismo em 29 de novembro de 1979, começou então a reformulação partidária propriamente dita.

Em dezembro, numa palestra na ESG, Sarney expôs sua proposta de estrutura do novo Partido Democrático, que deveria ser o sucessor da Arena. No início do ano seguinte, na qualidade de último presidente da extinta Arena e um dos fundadores e coordenador do novo Partido Democrático Social (PDS), como acabou se chamando, criado para substituir a Arena na sustentação político-parlamentar do governo, deu entrevista ao Jornal do Brasil afirmando entender que “o Brasil não pode ser uma potência econômica e nem uma democracia da justiça social se não tiver um sistema político que opere esses dois outros setores, de maneira a que seja também uma grande potência política”. Em meados de janeiro foi ratificado o nome de Partido Democrático Social e dado a público o projeto do manifesto do partido, de autoria de Sarney. O manifesto do PDS ao povo brasileiro defendeu o estado social de direito autoproclamando-se “o partido da reforma e da transformação”. Sua ação “se realizará dentro da paz, da não-violência, da liberdade e da socialdemocracia”. De acordo com o manifesto, o partido propunha-se a apoiar, entre outros pontos, a participação dos trabalhadores não apenas nos lucros das empresas, mas também na sua administração, defendendo a implantação do sistema da co-gestão. Outro ponto, considerado revolucionário, pregava a participação dos trabalhadores na gestão dos fundos sociais, como o PIS-Pasep, o que atenderia a uma antiga reivindicação das classes trabalhadoras. A exemplo da extinta Arena, defendeu o direito de greve, a liberdade sindical e a autonomia das assembléias de trabalhadores.

Alguns dias depois, Sarney classificou o programa do Partido Popular (PP), criado pela oposição moderada, divulgado em 12 de fevereiro, de “extremamente demagógico”, acrescentando tratar-se de “um tipo de ação política que já vai ficando ultrapassado no país”. Além do PDS, do PP e do sucessor do MDB, o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), os primeiros a obterem seu registro provisório, os demais partidos políticos viriam a estruturar-se em maio de 1980. Em meados desse mês, seria concedida pelo TSE a posse da sigla PTB ao grupo liderado pela ex-deputada Ivete Vargas. O grupo chefiado por Leonel Brizola – que também disputava a sigla – formaria então o Partido Democrático Trabalhista (PDT). Também no fim de maio, o Partido dos Trabalhadores (PT), fundado em meados de fevereiro, lançaria seu programa definitivo.

Na presidência do PDS

Em 28 de fevereiro de 1980, a comissão nacional provisória do PDS elegeu, para presidente e secretário-geral, José Sarney e Prisco Viana, deputado pela Bahia, designando ainda os integrantes das comissões regionais provisórias em 11 estados. No decorrer de 1980, o novo partido governista viria a enfrentar sérias dificuldades internas, que colocariam em xeque a liderança de Sarney. A questão da sublegenda voltaria a dividir os pedessistas. As lideranças estaduais pressionariam a direção do partido em virtude da marginalização que lhes era imposta pelo governo federal. E, finalmente, havia ainda o problema do restabelecimento das prerrogativas do Legislativo, tese defendida pela ala liberal do partido e que reforçaria as dissensões.

Do lado da oposição, a escalada de atentados terroristas de direita contra setores oposicionistas provocaria uma reação mais intensa desses, que exigiriam a rápida apuração e punição dos culpados. Novamente a oposição ensaiaria a tese da convocação imediata de uma assembléia nacional constituinte.

No fim de maio, Sarney negou categoricamente que a extensão da sublegenda para a eleição de governadores estivesse sendo objeto de qualquer apreciação pelo governo, desautorizando as declarações de pedessistas, inclusive o líder da bancada na Câmara, Nélson Marchezan. Segundo Sarney, a posição do PDS pela limitação da sublegenda ao pleito municipal já fora decidida pelo presidente da República. No início de junho foi firmado um acordo entre as lideranças do governo e da oposição no Congresso no sentido de se conceder prioridade à tramitação da emenda denominada Flávio Marcílio que restabelecia as prerrogativas do Legislativo, suprimidas pela junta militar, através da Emenda Constitucional nº 1 de 1969, sem, no entanto, antecipar a apreciação do projeto do governo, de realização de eleições diretas para governadores e a totalidade do Senado. No fim de julho, Sarney manifestou-se a favor da total inviolabilidade parlamentar, concordando com a posição assumida pelo deputado Flávio Marcílio (PDS-CE), presidente da Câmara. Devido à pressão governamental, a emenda Flávio Marcílio seria, entretanto, arquivada nesse ano.

No início de julho, Sarney afirmou que só o caos institucional justificaria a instalação de uma assembléia constituinte, “o que não ocorre no Brasil, que vive pleno estado de direito, com suas instituições funcionando livremente”. No dia 17, foi eleito para a cadeira nº 38 da Academia Brasileira de Letras, tomando posse em novembro.

No fim de agosto, Sarney anunciou que procuraria Ulisses e o senador Tancredo Neves, presidente do PP, para estabelecer o que chamou de “mecanismos de consulta”, através dos quais os partidos teriam respeitadas as suas posições, mas buscariam encontrar “um terreno comum de interesse público”. Na ocasião, sucediam-se atentados terroristas de direita que, segundo o senador pedessista Luís Viana Filho, partiam “de elementos que querem perturbar a marcha do país para a democracia”. No mais grave desses atentados, explodira uma bomba na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no Rio de Janeiro, causando uma morte: Lida Monteiro da Silva, diretora da Secretaria. Ao enterro, transformado em manifestação de protesto contra a escalada do terror, compareceram cerca de dez mil pessoas, entre as quais representantes de todos os partidos, à exceção do PDS.

No início de setembro, Sarney declarou que, como resultado do trabalho de mobilização já executado, tinham sido instaladas 2.545 comissões municipais, com 24.400 lideranças atuantes, tendo sido filiados ao partido, até aquele momento, cerca de dois milhões e quinhentos mil eleitores. No decorrer da primeira quinzena de setembro reiniciou os contatos com representantes da oposição, ainda com o propósito de estabelecer canais de comunicação interpartidária. O deputado pernambucano Tales Ramalho, secretário-geral do PMDB, o terceiro representante da oposição a ser procurado, definiu esse trabalho como uma “quebra do radicalismo político”. No encontro, foi feita uma análise dos atentados terroristas e debatido o documento do PP apoiando o governo para a adoção das medidas necessárias ao combate ao terror. Sarney reiterou sua intenção de não excluir qualquer partido desse entendimento político, anunciando que deveria encontrar-se ainda com os presidentes do PDT, Leonel Brizola, e do PT, Luís Inácio da Silva, o Lula. Seriam também procurados os líderes dos partidos na Câmara.

No fim de novembro, entretanto, Sarney advertiu que, se seu partido perdesse a maioria no Congresso, “seria ruim para o PDS, mas pior para o país… porque o Brasil ainda não tem as instituições políticas para viver um sistema no qual um governo tenha minoria no Congresso”. Acrescentou que ainda estávamos “saindo de uma área de turbulência”. Justificou sua iniciativa de procurar os líderes oposicionistas afirmando que “tínhamos realmente uma fase difícil, em que alguns setores dentro do Congresso davam a impressão de cobrar da área militar sua participação na Revolução de 1964”. Em sua opinião, seria impossível o processo de abertura política “se as forças armadas não estivessem conscientizadas e garantindo essa mesma abertura”.

O ano de 1981 seria particularmente difícil para o governo Figueiredo, que teria várias vezes ameaçada sua política de abertura. Os principais obstáculos foram a intensificação das atividades terroristas e a perspectiva de um revés do situacionismo nas eleições marcadas para novembro de 1982, em função da qual o governo criaria um processo eleitoral destinado a reduzir substancialmente as possibilidades de vitória da oposição. Em 20 de janeiro desse ano, Sarney recusou apoio à proposta de um grupo de parlamentares do PP e do PMDB visando à adoção de compromisso de governo e oposição para a superação dos problemas econômicos, sociais e políticos, defendendo como opção o estabelecimento de um entendimento interpartidário.

Em 21 de janeiro de 1981, a pedido do presidente Figueiredo, Sarney iniciara a missão de percorrer o país para fazer um balanço da situação do partido do governo nos estados. Além do objetivo político – conter as dissidências que então ameaçavam a precária maioria do governo no Congresso -, a Missão Sarney tinha o objetivo estratégico de levantar a correlação de forças nos estados que formaria o quadro de fundo da reforma eleitoral. Os dois objetivos completavam-se com o estímulo que a passagem da missão pelos estados representava para o PDS, desencadeando as disputas internas pela indicação dos candidatos a governador e mobilizando o partido para a campanha eleitoral, cuja meta principal ultrapassava 1982: garantir a maioria do colégio eleitoral que elegeria em 1984 o sucessor de Figueiredo. Segundo o Jornal do Brasil, a Missão Sarney era praticamente a mesma que o falecido senador Petrônio Portela executara sete anos antes para escolher, na antiga Arena, os governadores da safra de 1974. Havia, porém, inequívocas diferenças: os governadores seriam eleitos pelo voto direto e faltavam apenas 21 meses para as eleições.

Em meados de fevereiro, Sarney cumpriu a décima-primeira etapa de sua missão, entrando em contato com os líderes de seu partido no estado do Rio.

O senador constatou a desagregação do PDS fluminense, com três comandos diferentes: o senador Ernâni Amaral Peixoto, presidente do diretório regional, o médico Guilherme Romano, amigo do general Golberi do Couto e Silva, chefe da Casa Civil da Presidência da República, e o deputado Léo Simões, amigo do presidente da República. Sarney definiu a posição do partido ante a questão constitucional, afirmando que “o atual Congresso tem poderes para uma ampla reforma da Carta, sem a convocação de uma constituinte”, o que descartava a proposta do jurista Afonso Arinos nesse sentido. Ao término da missão, O Estado de S. Paulo (22/2/1981) analisou seus primeiros resultados. “A Missão Sarney tornou clara ao governo e à opinião pública a divisão do PDS, irreconciliável em certos estados, e as dificuldades que o partido enfrentará, por causa disso, nas eleições de 1982. As viagens do senador também provocaram um acirramento da discussão sucessória.”

Finalmente, em 27 de abril, Sarney entregou a Figueiredo, na reunião do Conselho de Desenvolvimento Político do governo, o relatório da missão. Entre as reivindicações apresentadas – quase todas relacionadas com a situação do partido nas diversas regiões – a extensão das sublegendas às eleições de governadores e o pedido para dificultar as coligações partidárias, a fim de afastar o fantasma da eleição de caráter plebiscitário que atormentara a antiga Arena em 1974 e 1978, foram as mais correntes, particularmente no Nordeste. Houve até quem reivindicasse a vinculação total de votos como um recurso adicional “contra o fermento oposicionista que ameaça o governo nos grandes centros urbanos com o crescimento do bolo eleitoral da oposição”. Segundo o Jornal do Brasil, praticamente todos os governadores do Nordeste pediram a Sarney a vinculação de votos.

Em 26 de março, Nélson Marchezan foi eleito para a presidência da Câmara com apenas 37 votos de diferença para seu opositor, também do PDS, Djalma Marinho (RN), que representava a dissidência e era apoiado pelos partidos da oposição. O Planalto mobilizara-se para garantir a eleição de Marchezan. No dia 24, o Senado elegera Jarbas Passarinho, do PDS, como seu presidente.

Na instalação da comissão partidária incumbida de examinar a reforma da legislação eleitoral, para espanto e protesto de alguns correligionários, como o deputado Ernâni Sátiro, da Paraíba, Sarney desaconselhou o exame da proposta de implantação do voto distrital – de sua autoria -, sob o argumento de que se tratava de assunto tão polêmico que polarizaria as atividades da comissão em prejuízo da grande tarefa que lhe cabia. Segundo O Estado de S. Paulo (29/3/1981), o presidente do PDS sabia que 2/3 da bancada eram ostensivamente contrários à inovação. Em 6 de abril, Sarney revelou ser candidato à reeleição, porque, segundo ele, contava com o apoio das bases do partido, como também de “figuras relevantes”, a exemplo do presidente Figueiredo.

Ainda em abril, a comissão Executiva Nacional do PDS reuniu-se, num primeiro esforço, para compor, no mesmo campo de ação, o ministro da Justiça, Ibrahim Abi-Ackel, e Sarney. Segundo a Folha de S. Paulo, o desentendimento era antigo, datando da época em que Abi-Ackel fora escolhido o substituto de Petrônio Portela, contrariando as pretensões de Sarney. Reunida durante duas horas, a comissão decidiu apoiar o diálogo do ministro com líderes e dirigentes dos partidos oposicionistas para alterar o Estatuto dos Estrangeiros. Aprovado em agosto de 1980, por decurso de prazo, o projeto, de autoria do governo, tornara passíveis de expulsão sumária os missionários de nacionalidade estrangeira, criando assim um ponto de atrito com a Igreja e com os setores oposicionistas. Por iniciativa de Abi-Ackel, que convencera a cúpula governista da necessidade de manter o diálogo com a Igreja diante do ano eleitoral, foram, então, iniciados entendimentos visando a uma futura modificação do estatuto. O novo projeto de lei dos estrangeiros, após passar pelo crivo da Igreja e das oposições, que viram incluídas as reivindicações mínimas apresentadas depois de dez meses de discussão e debates, seria aprovado em meados de abril de 1981, por consenso interpartidário.

No dia 13, os partidos de oposição decidiram, após reunião com o ministro da Justiça, que aprovariam, sem emendas, as alterações propostas pelo governo.

A decisão mais importante da Executiva Nacional do PDS, entretanto, foi a de constituir uma comissão de 11 membros para estudar a elaboração de uma nova proposta de emenda constitucional devolvendo as prerrogativas do Legislativo. Dessa comissão fariam parte os deputados Célio Borja, Djalma Marinho e Flávio Marcílio, autores da primeira emenda das prerrogativas, quando o último ainda era presidente da Câmara. Segundo o Jornal do Brasil, a decisão foi fruto da reclamação do presidente da Câmara, Nélson Marchezan, de que tanto ele quanto o presidente do Senado, Jarbas Passarinho, haviam defendido o reexame da questão. Sarney iniciou a constituição da comissão em 29 de abril, nomeando o deputado mineiro Homero Santos, primeiro-vice-presidente do PDS, para a presidência. Nesse mesmo dia, o PMDB anunciou também a formação de sua comissão encarregada de elaborar um projeto de restauração das prerrogativas.

Na noite de 30 de abril, no Riocentro, no Rio, onde se realizava um show musical comemorativo do Dia do Trabalho, com a presença de cerca de 20 mil pessoas, ocorreu o maior atentado terrorista do ano. O espectro do terrorismo, que vinha ameaçando desde o ano anterior o projeto de abertura política de Figueiredo, reaparecera na cena política, suscitando um clamor geral de condenação por parte de amplos setores da sociedade. Os atentados de 1980 não tinham sido esclarecidos. Novos atentados se verificaram em março e abril. O episódio do Riocentro – onde uma bomba explodiu num automóvel matando um de seus ocupantes, o sargento do Exército Guilherme Pereira do Rosário, e ferindo gravemente o outro, o capitão do Exército Wilson Luís Chaves Machado – viria a se transformar no mais grave fato político de 1981.

Em 10 de maio, em São Paulo, Sarney assegurou que o governo envidaria todos os esforços para encontrar e punir os responsáveis pelo atentado terrorista. Os líderes dos partidos se reuniram para oferecer a Figueiredo solidariedade na investigação do atentado. Numa nota divulgada em 11 de junho, a Presidência da República acentuou que a melhor forma de responder a essa solidariedade era reiterar o seu compromisso de garantir a paz, com o apoio das forças armadas, “mantenedoras da ordem e guardiãs das instituições”. O inquérito policial-militar (IPM) instaurado sob a jurisdição do Exército para investigar a ocorrência concluiria, no dia 30 desse mês, que os dois militares teriam sido “vítimas de uma armadilha ardilosamente colocada no carro do capitão”. Instado pela imprensa a pronunciar-se sob o resultado do IPM, Sarney preferiu nada comentar. Em 17 de julho seria pedido o arquivamento do inquérito por não conter indícios de autoria. Finalmente, em 10 de outubro, por dez votos contra quatro, o Superior Tribunal Militar (STM) decidiria arquivar o inquérito.

Em 30 de junho, Sarney entregou a Figueiredo um conjunto de documentos contendo subsídios oferecidos por seu partido ao projeto de reforma eleitoral que o governo pretendia enviar ao Congresso em agosto. A proposta incluía a utilização da sublegenda em todos os níveis de eleições majoritárias – de prefeitos, governadores e senadores -, a vinculação (para o PDS, restrita às eleições proporcionais, de vereadores, deputados estaduais e deputados federais), as coligações (o PDS não propunha proibição direta ou indireta do recurso às coligações partidárias) e a inelegibilidade (foram mantidos os prazos de domicílio eleitoral de um ano para as eleições estaduais e federais, tornando inelegíveis todos os beneficiados pela Lei da Anistia). No fim de julho, segundo o Jornal do Brasil, o palácio do Planalto já estava convencido da impossibilidade de qualquer acordo com a oposição em torno do projeto de reforma eleitoral.

No início de setembro, a antiga rixa entre o ministro da Justiça e o presidente do PDS voltou a se manifestar. Perante a comissão Executiva Nacional, Sarney criticou a atitude de Abi-Ackel, acusando-o de desprestigiar os dirigentes do partido. O ministro convocara em primeiro lugar o presidente do PP, Tancredo Neves, para informá-lo dos projetos de reforma eleitoral do governo, e só depois chamou-o como dirigente do PDS para tomar conhecimento dos textos “submetidos privilegiadamente” a um partido de oposição. Ainda na reunião, o PDS decidiu dirigir um apelo ao governo para incluir no projeto de reforma da Lei das Inelegibilidades um dispositivo que tornasse elegíveis os processados pela Lei de Segurança Nacional e por crimes comuns.

Ao longo do ano, episódios como as bombas do Riocentro, a renúncia de Golberi à Casa Civil, em agosto, e o impedimento, por doença, do presidente da República, em setembro, pareceram comportar sérias ameaças ao processo de abertura, mas foram afinal absorvidos num clima de normalidade constitucional.

A crise política maior seria desencadeada por uma decisão do Congresso, em 22 de outubro, quando foi rejeitado o projeto do governo que estendia a sublegenda à eleição para governador em 1982. O quorum pretendido pela oposição foi alcançado com o apoio de dez votos de dissidentes do PDS e de seis parlamentares sem partido. O governo recebeu com extremo desagrado essa derrota infligida não propriamente pelos seus adversários, mas pela quebra de coesão de seu partido. Alguns dias depois, em 27 de outubro, as oposições obtiveram nova vitória no Congresso ao aprovarem o projeto de reforma da Previdência, com emendas que, entre outras, rejeitavam os artigos que tiravam dos aposentados que recebiam até três salários mínimos mais 10% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) nos reajustamentos semestrais e 75% dos proventos dos que voltassem a trabalhar.

Em 25 de novembro, Figueiredo decidiu romper inesperadamente o diálogo com as oposições e enviou ao Congresso um projeto de reforma eleitoral, logo conhecido como “o pacote de novembro”. Grande parte das medidas propostas estava no relatório da missão Sarney. Havia quatro pontos principais. O primeiro era a vinculação de votos, que obrigava o eleitor a votar em candidatos do mesmo partido. O segundo consistia na proibição de coligações, que reforçava a primeira proibição – pois os partidos ficavam obrigados a apresentar chapas completas, não podendo um partido apoiar, por exemplo, o candidato a governador de outro. O terceiro se referia à sublegenda municipal, existente na legislação, e que permitiria ao partido apresentar até três candidatos a prefeito. O quarto era o que proibia que o candidato a governador desistisse da campanha “expressa ou tacitamente”. A proposição visava impedir que os partidos menores de oposição mantivessem candidatos fictícios e, na última hora, despejassem os votos no candidato do PMDB.

A oposição reagiu ensaiando formas de resistência. A mais importante foi a proposta de incorporação do PP ao PMDB. Em 10 de dezembro, Sarney anunciou que seu partido pretendia apresentar um pedido de impugnação tão logo o PP entrasse com o pedido no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Sarney considerou ilegal, injurídico e inconstitucional o ato preconizado pelas duas legendas oposicionistas. Posteriormente, entretanto, modificou inteiramente sua argumentação, confirmando estar prevista na legislação – desde os tempos da Carta de 1946 – a incorporação de partidos.

O empenho do dirigente do PDS no sentido da disciplina e obediência às ordens do comando, encarnado na figura do presidente da República, acabaria dando os resultados desejados. Reunindo toda a bancada, já agora sem uma única defecção, o partido governista fez aprovar o projeto que alterava a Lei das Inelegibilidades – o qual reabilitava todos os ex-cassados para a vida pública – e a criação do estado de Rondônia. O projeto de reforma eleitoral seria aprovado por decurso de prazo, em 11 de janeiro de 1982.

Em meados de janeiro de 1982, Sarney e Prisco Viana declararam que o governo resolvera absorver normalmente a decisão tomada em 20 de dezembro pela maioria da convenção nacional extraordinária do PP em favor da incorporação ao PMDB. A mudança de tática do governo – que de início temera o crescimento do PMDB – decorria de sua pretensão de absorver os descontentes com a incorporação nos dois partidos. No fim do mês, Sarney reiterou a disposição de apoiar projeto que permitisse aos militantes do PP e do PMDB insatisfeitos com a incorporação, como o deputado Magalhães Pinto, a mudança para nova agremiação partidária, assegurada a sua elegibilidade para as eleições de 1982.

No fim de janeiro, Sarney declarou considerar a Lei Falcão, que regulamentava a propaganda eleitoral pelo rádio e televisão, “superada pelos fatos” e defendeu o fim da tutela do governo sobre a forma de divulgação da propaganda dos partidos. Em meados de fevereiro foi efetivada a incorporação PP-PMDB, celebrada como uma resposta ao pacote eleitoral do presidente Figueiredo, transformado em lei sem os votos do Congresso. No ato, foi eleito o novo Diretório Nacional do partido, com a inclusão de egressos do PP.

No início de março, Sarney justificou a decisão governamental de propor a reabertura do prazo para filiação partidária afirmando que os descontentes com a incorporação do PP ao PMDB não haviam tido tempo suficiente para amadurecer uma decisão. O prazo expirara em 2 de março de 1982, 48 horas após a decisão do TSE, que manteve a incorporação por quatro votos a dois. O novo prazo proposto encerrar-se-ia a 16 de março.

No início de abril, Sarney admitiu que aceitaria ser o candidato do PDS ao governo do Maranhão nas eleições de novembro, se fosse liberado pelo presidente Figueiredo de permanecer à frente do partido. O escolhido seria afinal Luís Alves Coelho Rocha, vinculado à corrente sarneísta do PDS maranhense, e que seria eleito em novembro de 1982.

Em maio de 1982 foi enviada ao Congresso proposta de emenda constitucional alterando a composição do colégio eleitoral encarregado de eleger o presidente da República, instituindo o voto distrital misto para 1985, suprimindo exigências relacionadas com a formação de partidos e restituindo ao Legislativo algumas das prerrogativas que havia perdido depois de abril de 1964. Esse conjunto de medidas passou a ser conhecido pelo noticiário político como “emendão”.

Em 25 de junho, o “emendão” foi aprovado pelo Congresso, ficando estabelecido que:

1) o Colégio eleitoral passaria a ser constituído de todos os membros do Congresso, mais seis deputados estaduais de cada Assembléia Legislativa indicados pelo partido majoritário;
2) as emendas constitucionais, para serem aprovadas, deveriam contar com 2/3 da Câmara e outros tantos do Senado;
3) o sistema distrital misto seria aplicado nas eleições de 1986 para a Câmara e assembléias legislativas;
4) os prazos para desincompatibilização seriam reduzidos para quatro e seis meses;
5) os prefeitos e vereadores eleitos em novembro de 1982 teriam mandatos de seis anos;
6) as câmaras municipais das cidades com mais de um milhão de habitantes passariam a ser compostas de 33 vereadores, em vez de 21;
7) a eleição do próximo presidente da República seria realizada em 15 de janeiro de 1985; e
8) os partidos estariam desobrigados, para se constituírem, do alcance de 5% do eleitorado, com 3% distribuídos pelo menos em nove estados. Esses percentuais, no entanto, seriam restabelecidos depois de 1986.

Algumas das prerrogativas do Legislativo foram restauradas. Por 2/3 dos votos dos senadores e deputados, o Congresso poderia assumir a iniciativa de autoconvocar-se. Da inviolabilidade do mandato parlamentar ficaram excluídos apenas os delitos contra a honra, aplicando-se a Lei de Segurança Nacional somente para os crimes cometidos fora da tribuna parlamentar. Foi aumentado o número de deputados federais de 420 para 479, estabelecendo-se que nenhum estado poderá ter mais de 55 representantes, elevando-se os dos territórios de dois para quatro. O decurso de prazo foi igualmente aliviado. O projeto de interesse do Executivo que não fosse aprovado em 45 dias ingressaria em pauta preferencial nas cinco sessões seguintes, ao fim das quais, se nada fosse deliberado sobre ele, seria aprovado por decurso de prazo. O “emendão” indicou ainda que as sessões da Câmara e do Senado não seriam limitadas. Todo pedido de informação por parlamentares seria imediatamente respondido pelo Executivo. As comissões parlamentares de inquérito (CPIs) poderiam viajar pelo país se desejassem estender o objeto de suas investigações, e os deputados e senadores que viajassem para o exterior em missão diplomática ou cultural não dependeriam de autorização prévia do presidente da República.

No fim de julho, Sarney afirmou que os problemas econômicos que o país enfrentava, como as altas taxas de inflação, “não levam o partido ao desespero e nem comprometem o projeto político do governo, que tem o respaldo da nação inteira”. O presidente do PDS prestou solidariedade ao ministro do Planejamento, Delfim Neto, em nome da comissão executiva do PDS. No início de agosto, contestou as críticas ao “voto domiciliar”, por ele preconizado. Sua posição – contraditória com a da antiga UDN, o partido que mais lutou contra esse sistema de votação – foi por ele assim defendida: “Hoje a situação é outra e o método não poderia mais servir como uma forma de manipular o eleitor.”

Em novembro de 1982 realizaram-se eleições gerais, exceto para presidente da República. Pela primeira vez, desde 1965, os governadores foram escolhidos pelo voto direto. O PDS sofreu importante derrota parcial com a chegada do PMDB e do PDT ao governo em dez dos estados mais desenvolvidos. No Legislativo, outra derrota: o governo militar perdeu a maioria absoluta de que desfrutava na Câmara.

A ofensiva oposicionista procuraria, em seguida, alterar o método de escolha do presidente da República. Em março de 1983, o deputado Dante de Oliveira (PMDB-MT) apresentou proposta de emenda constitucional que restabelecia as eleições diretas para a escolha do sucessor de Figueiredo em 1984. A proposta foi acolhida por importantes líderes da Igreja, demais partidos de oposição, entidades da sociedade e artistas. Em junho, o PMDB promoveu, em Goiânia, seu primeiro comício popular pelas eleições diretas.

Também no PDS o ambiente era de inquietação. Em julho de 1983, a eleição para o Diretório Nacional apontou o avanço do movimento dissidente Participação, que conquistou 42 das 121 vagas. No mês seguinte, a maioria parlamentar que dava estabilidade ao governo, formada pela aliança PDS-PTB, rompeu-se, quando o Executivo enviou ao Congresso decreto que alterava os reajustes salariais. A aliança foi restabelecida, mas o episódio chamou a atenção para a fragilidade do esquema governista num momento em que começava a acirrar-se a disputa entre postulantes à indicação do PDS às eleições presidenciais, marcadas para 15 de janeiro de 1985. Nessa ocasião, se reuniria o Colégio Eleitoral, formado pelos membros do Congresso e representantes das assembléias legislativas, totalizando 686 delegados, entre os quais o governo tinha maioria.

Sarney foi encarregado por Figueiredo de coordenar a sucessão dentro do PDS e apoiou a postulação do vice-presidente Aureliano Chaves. Também pleiteavam a indicação Paulo Maluf, ex-governador de São Paulo; Mário Andreazza, ministro do Interior; Costa Cavalcanti, presidente da Itaipu Binacional; Marco Maciel, senador e ex-governador de Pernambuco; e Hélio Beltrão, ministro da Previdência e da Desburocratização.

No PMDB, a despeito de seu programa contrário à participação no processo indireto, uma grupo começava a sustentar que Tancredo Neves, governador de Minas e político dotado de perfil moderado e conciliador, reunia condições para aglutinar a maioria dos oposicionistas, obter a vitória no Colégio Eleitoral e comandar a última fase da transição política em curso. Simultaneamente, crescia a campanha pelas eleições diretas. Depois de um comício em Curitiba, que teve a presença de cerca de 40 mil pessoas, mais de cem mil manifestantes reuniram-se em São Paulo, em 25 de janeiro de 1984, para exigir a aprovação da emenda Dante de Oliveira.

Preocupadas com a amplitude do movimento pelas diretas, inédita na história política do país, autoridades militares alertaram o presidente para os riscos que o processo sucessório estaria correndo. Em março, porém, o ministro da Marinha, almirante Maximiano da Fonseca, que vinha se pronunciando por uma atitude tolerante em face da campanha, renunciou, alegando razões pessoais.

Em 10 de abril, o Rio de Janeiro foi palco de um comício multipartidário que atraiu cerca de um milhão de pessoas e contou com a presença de representantes de uma dissidência do PDS favorável às diretas. Seis dias depois, outro comício, em São Paulo, reuniu um milhão e meio de pessoas – a maior manifestação política jamais realizada no país – para pedir a aprovação da emenda. Seguiram-se comícios em outras cidades. No dia 25, foram montados, em vários locais, painéis com os nomes dos deputados e espaço para registrar publicamente os votos dados à emenda.

A ausência de 113 deputados à votação impediu que se formasse o quorum regimental na Câmara. Entretanto, a emenda obteve 298 votos favoráveis, 55 dos quais dados por deputados do PDS. Esse resultado e a convicção de que a campanha pelas eleições diretas mudara o eixo da política nacional apontavam a possibilidade de vitória no pleito indireto e o PMDB decidiu “ir ao Colégio para destruir o Colégio”, conforme palavra de ordem lançada por Ulisses Guimarães.

Em junho, os governadores peemedebistas oficializaram a candidatura de Tancredo.

A campanha popular pelas diretas ainda marcava o clima político quando, em 11 de junho de 1984, a Executiva Nacional do PDS, cuja maioria simpatizava com a candidatura de Maluf, que fazia intensa campanha de aliciamento dos delegados, vetou proposta de realização de uma consulta prévia às bases sobre os candidatos à eleição presidencial, apresentada por Sarney e pelo grupo anti-Maluf. Sarney renunciou imediatamente à presidência do PDS. Alguns dias depois, seu sucessor, senador Jorge Bornhausen (SC), também renunciou, sendo substituído pelo senador Ernâni Amaral Peixoto (RJ).

O fortalecimento da posição de Maluf levou seus adversários a unirem-se numa frente contra ele. Em 3 de julho, Maciel anunciou que, com Aureliano, se retirava da disputa. Dois dias depois, em reunião de que os dois se ausentaram, o senador Augusto Franco (SE) foi escolhido para presidir o PDS. Em 13 de julho, Aureliano se pronunciou publicamente em apoio à candidatura de Tancredo. Em seguida, os dissidentes pedessistas se organizaram na Frente Liberal, que, em 18 daquele mês, indicou Sarney para vice de Tancredo. Cinco dias depois, Sarney desligou-se do Diretório Nacional do PDS. Nesse mesmo dia, o PMDB e a Frente Liberal fecharam um acordo para a candidatura de Tancredo. Entre os nove pontos acertados, destacavam-se a realização de eleições diretas para o seu sucessor, a fixação do mandato presidencial em quatro anos, a garantia de que a Frente Liberal indicaria o companheiro de chapa de Tancredo e a opção por uma campanha apoiada preferencialmente no uso dos meios de comunicação, deixando os comícios em segundo plano.

Ratificada a candidatura de Sarney pela Frente Liberal em 1º de agosto, data em que deixaram o PDS os governadores Gonzaga Mota (CE) e Roberto Magalhães (PE), seis dias depois formalizou-se em Brasília a Aliança Democrática com o PMDB. Na ocasião, foi firmado um documento intitulado Compromisso com a nação, em que se propunha uma reforma institucional como meio para alcançar a democracia plena, profundas modificações na economia, uma reprogramação global da administração da dívida externa, a reformulação da política salarial e o estabelecimento de um novo pacto social, no bojo do debate sobre uma nova constituição.

Sarney não participou da convenção do PDS em 11 de agosto para escolher o candidato à eleição presidencial. Ausentaram-se, também, outros dissidentes, inclusive seis senadores e 27 deputados federais que, liderados por Maciel e Aureliano, haviam aderido à Aliança Democrática. Maluf derrotou Andreazza, que contou com o apoio de Figueiredo.

Apesar do distanciamento do PDS, Sarney teve seu ingresso na chapa da Aliança Democrática seriamente discutido por elementos do PMDB, dada a sua ligação com o regime militar. Como permanecia filiado ao partido situacionista, questionou-se também a base jurídica da candidatura de um membro do PDS na legenda de outro partido. Prevaleceu, contudo, a tese de que se tratava de uma questão política, e não jurídica. A hostilidade de setores do PMDB foi neutralizada pela ação de destacados dirigentes do partido, como Ulisses, a favor da aliança. A convenção do PMDB, no dia 12, homologou a chapa Tancredo-Sarney, num momento em que rumores de golpe militar, alimentados pela participação popular na campanha pelas eleições diretas, ameaçavam interromper o processo sucessório. No dia seguinte, Sarney contornou a questão legal, filiando-se ao PMDB.

O primeiro comício da Aliança Democrática realizou-se em Goiânia em 14 de setembro, reunindo cerca de trezentas mil pessoas. No mês seguinte, os governadores pedessistas José Agripino Maia (Rio Grande do Norte), Hugo Napoleão (Piauí), Divaldo Suruagi (Alagoas), João Durval (Bahia) e João Alves Filho (Sergipe) aderiram à Aliança, consolidando as perspectivas de vitória oposicionista no Colégio Eleitoral. A linha francamente ascensional da campanha, incrementada pelo apoio maciço dos meios de comunicação, provocou a reação de Figueiredo, que, por meio de cadeia de rádio e televisão, acusou a oposição de pretender coagir o Colégio Eleitoral. Mas reafirmou seu propósito de manter-se fiel ao projeto de abertura política.

Em 11 de dezembro – mês em que a Frente Liberal anunciou que se transformaria no Partido da Frente Liberal -, a Aliança Democrática divulgou os pontos básicos do seu programa de governo: prioridade para o Nordeste; apoio à agricultura; fortalecimento da federação e reconhecimento do papel da iniciativa privada no processo de desenvolvimento e da contribuição do capital estrangeiro, sempre que esse não ameaçasse a segurança nacional. Realizada a eleição em 15 de janeiro de 1985, a chapa da Aliança recebeu 480 votos, contra 180 dados a Maluf e ao seu companheiro de chapa, Flávio Marcílio, 17 abstenções e nove ausências. Entre os partidos de oposição, apenas o PT não a apoiou, por considerar ilegítima a eleição indireta.

Tancredo, que vinha adiando uma cirurgia para depois da posse, marcada para 15 de março, internou-se na véspera, às pressas, para operar o intestino. O fato provocou grande comoção popular, que, explorada intensivamente pelos meio de comunicação, atingiria dimensões inéditas na história do país.

Sarney, segundo declararia alguns anos mais tarde à Folha de S. Paulo, (22/8/1993), foi informado pelos dirigentes da Aliança Democrática de que seria empossado e, como o presidente eleito se recuperaria em uma semana, o governo deveria ser organizado de acordo com compromissos anteriormente assumidos por ele. Avaliando os fatos, contudo, admitiu que os documentos que tratavam das nomeações poderiam trazer a assinatura de Tancredo falsificada.

Entretanto, o presidente eleito, ao contrário do que divulgavam parentes, médicos e dirigentes da Aliança Democrática, sofria de câncer e tinha poucas chances de se recuperar.

Sarney se queixaria mais tarde: “A mim, diziam que estava tudo bem (…). Só quem soube do câncer foram o Ulisses, o Tancredo Augusto (filho de Tancredo), outras pessoas íntimas da família e os médicos, coagidos sob o pretexto de preservar a segurança nacional. Fui um dos brasileiros que foram manipulados pela informação falsa.”

A solução para o problema criado pelo impedimento de Tancredo foi objeto também de considerações jurídico-políticas. Circularam notícias de que o chefe da Casa Civil do governo, Leitão de Abreu, emitira um parecer sustentando a tese de que o presidente da Câmara, Ulisses Guimarães, deveria assumir como presidente da República em exercício. Essa tese seria apoiada por setores do PMDB, mas não pelo PFL. Na supracitada entrevista, contudo, Sarney diz que isso não passou de lenda, já que, diante da informação oficial de que Tancredo tomaria posse, preferira esperar para assumir com ele e, nesse caso, a Constituição indicava que o presidente da Câmara deveria ser investido interinamente no cargo. Na véspera da posse, contudo, uma reunião de Leitão e líderes políticos teria deliberado que Sarney assumiria interinamente a presidência da República.

Considerando Sarney traidor do PDS e de seu governo, Figueiredo se recusou a participar da cerimônia de transmissão do cargo em 15 de março. Sarney foi empossado em condições muito peculiares. Como ele mesmo explicaria dez anos depois em artigo na Folha de S. Paulo (28/4/1995), Tancredo surgiu como candidato “numa engenharia política que só ele sabia e levou para o túmulo, compôs um governo que juntava as correntes mais heterogêneas e inconciliáveis. (…)

Mantive os seus objetivos básicos e enfrentei obstáculos que ele jamais enfrentaria. O ministério e o governo não eram meus, não me tinham fidelidade e compromisso. Por outro lado, as forças que formavam a Aliança Democrática não me aceitavam, porque fui vice-presidente para viabilizar a vitória de Tancredo no Colégio Eleitoral, mas tinha a marca de um egresso do PDS”.

O ministério, organizado por Tancredo de maneira a garantir a transição pacífica, tinha feição fortemente conservadora, incluindo cinco políticos que até meses atrás haviam apoiado o governo militar – Aureliano (Minas e Energia), Olavo Setúbal (Relações Exteriores), Maciel (Educação) e Paulo Lustosa (Desburocratização), do PFL, e Antônio Carlos Magalhães (Comunicações), do PDS. O demais, a maioria ligada ao PMDB, eram Afonso Camargo (Transportes), Almir Pazzianotto (Trabalho), Aluísio Alves (Administração), Carlos Santana (Saúde), Fernando Lira (Justiça), Flávio Peixoto (Desenvolvimento Urbano), Francisco Dornelles (Fazenda), João Sayad (Planejamento), José Aparecido de Oliveira (Cultura), Nélson Ribeiro (Reforma e Desenvolvimento Agrário), Pedro Simon (Agricultura), Renato Archer (Ciência e Tecnologia), Roberto Gusmão (Indústria e Comércio), Ronaldo Costa Couto (Interior), Valdir Pires (Previdência), José Hugo Castelo Branco (Casa Civil), general Rubens Bayma Denis (Casa Militar), general Leônidas Pires Gonçalves (Exército), brigadeiro Otávio Júlio Moreira Lima (Aeronáutica), almirante Henrique Sabóia (Marinha), general Ivan de Sousa Mendes (Serviço Nacional de Informações) e general José Maria do Amaral (Estado-Maior das Forças Armadas).

No dia 17, Sarney presidiu a primeira reunião ministerial, quando leu um discurso preparado por Tancredo que indicava as duas linhas de força do governo da Nova República, expressão criada por Ulisses para designar o plano de governo da Aliança Democrática: austeridade nos gastos públicos e combate à inflação.

Iniciando o governo sob suspeitas geradas por suas ligações com os governos militares e em meio à expectativa geral em torno do restabelecimento de Tancredo, que se submeteria a uma série de cirurgias, uma das primeiras medidas que Sarney tomou, em 19 de março, foi a suspensão de mais de cem concessões e permissões de emissoras de rádio e televisão assinadas por Figueiredo a partir de outubro de 1984.

Em seguida, iniciou o processo de desmontagem dos dispositivos de exceção herdados do regime militar – o “entulho autoritário”. Em abril, anunciou que não assinaria mais decretos-leis e que todos os atos que precisassem de lei para entrar em vigor seriam remetidos ao Congresso em regime de urgência, medida que, ainda que não viesse a ser observada estritamente, teve o mérito de chamar a atenção para a necessidade de rever os instrumentos de ação do Executivo.

No dia 19, o governo aprovou um programa de emergência, com a definição das seguintes áreas prioritárias: merenda escolar; alimentação de gestantes, de jovens mães e de crianças; oferta de cesta básica de alimentos; saneamento e construção de habitações populares, presídios e delegacias.

Após submeter-se a sete cirurgias, Tancredo morreu em 21 de abril. No dia seguinte, Sarney assumiu efetivamente a presidência, anunciando que seu governo seria “o governo de Tancredo”. Em seu primeiro discurso na nova condição, tratou da duas maiores prioridades nacionais – a redemocratização e a crise econômica herdada do último governo militar -, prometendo que convocaria a Assembléia Constituinte “o mais cedo possível” e que o país cumpriria seus compromissos com os credores internacionais, mas não ao preço do sacrifício do povo.

A redemocratização

Sarney sancionou em 10 de maio várias medidas aprovadas pelo Congresso com o objetivo de redemocratizar o país:restabelecimento das eleições diretas para presidente, em dois turnos, e prefeitos das capitais, estâncias hidrominerais e municípios até então considerados áreas de segurança nacional; concessão do direito de voto para os analfabetos; representação política para o Distrito Federal e fim da sublegenda e da fidelidade partidária, bem como liberdade de criação de partidos e formação de coligações partidárias. Os partidos clandestinos – Partido Comunista Brasileiro (PCB) e Partido Comunista do Brasil (PCdoB) – foram legalizados e, com a liberalização das regras, criaram-se várias legendas.

O prosseguimento do processo de redemocratização era, contudo, limitado pela sobrevivência da Constituição imposta pelo regime militar em 1969, bem como de dispositivos como a Lei de Segurança Nacional e o decreto que estabelecera a censura prévia. A iniciativa de convocação da Assembléia Constituinte cabia ao presidente e Sarney deveria optar entre as duas propostas de encaminhamento apresentadas. Uma – defendida por setores do PMDB, pelo PT, maioria do PDT e demais partidos de esquerda – preconizava que se elegesse, ainda em 1985, uma assembléia constituinte especialmente para fazer a nova Constituição, independentemente do Congresso e dissolvendo-se em seguida. A outra, defendida pelas forças do centro político, setores conservadores do PMDB, pelo PFL e pelo PDS, propunha que se fizesse a eleição em 1986.

Anunciando que cumpria “o mais grave compromisso da Nova República”, Sarney encaminhou ao Congresso, em 28 de junho, proposta de emenda convocando a Assembléia Nacional Constituinte, composta pelo Congresso eleito em novembro e pelos senadores no exercício de mandato, que se reuniriam a partir de 1º de fevereiro de 1987 para elaborar uma nova Constituição. Em seguida, nomeou a Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, articulada por Tancredo e que, integrada por 50 membros sob a presidência de Afonso Arinos de Melo Franco e incumbida de, no prazo de dez meses, elaborar um anteprojeto de constituição, instalou-se em 3 de setembro.

Procurando um canal de comunicação direta com o eleitorado de maneira a fortalecer suas posições em relação aos temas políticos que entrariam em discussão, Sarney, embora anunciasse que se manteria em posição de neutralidade, estreou, em outubro de 1985, o programa Conversa ao pé do rádio. Usaria o programa durante os trabalhos da Constituinte para criticar os congressistas que divergiam de seus pontos de vista e o manteria até 1989, com índices nacionais de audiência baixos. No fim de seu mandato, pesquisa feita em Curitiba revelaria que 91,2% dos entrevistados nunca tinham ouvido o programa.

Eleições para prefeitos e vereadores realizadas em 15 de novembro em 201 cidades, inclusive todas as capitais, deram a vitória ao PMDB, embora o partido perdesse em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Recife. A Aliança Democrática saiu enfraquecida da disputa, que em várias cidades opôs o PMDB e o PFL. À esquerda, a oposição também obteve trunfos importantes, como a vitória do PDT no Rio de Janeiro e em Porto Alegre e a do PT em Fortaleza. Em 1º de dezembro, os dois partidos fizeram um acordo para iniciar uma campanha por eleições diretas imediatas para a presidência.

Para substituir os ministros que precisavam se desincompatibilizar porque pretendiam candidatar-se em novembro de 1986 e montar uma equipe de sua confiança e livre dos compromissos políticos herdados de Tancredo, Sarney procedeu, em 14 de fevereiro, a uma reforma ministerial, empossando os novos titulares: Celso Furtado (Cultura), Deni Schwartz (Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente), Íris Resende (Agricultura), Jorge Bornhausen (Educação), José Hugo Castelo Branco (Indústria e Comércio), José Paulo Sepúlveda Pertence (Procuradoria Geral da República), José Reinaldo Tavares (Transportes), Marco Maciel (Casa Civil), Paulo Brossard (Justiça), Rafael de Almeida Magalhães (Previdência), Abreu Sodré (Relações Exteriores), Roberto Santos (Saúde), Saulo Ramos (Consultoria Geral da República) e Vicente Cavalcanti Fialho (Irrigação, pasta extraordinária criada em 7 de fevereiro).

O presidente se preparava, porém, para outras batalhas, sobre assuntos de seu interesse que seriam discutidos na Constituinte. Tendo recebido em 18 de setembro de 1986 o anteprojeto de constituição elaborado pela Comissão Provisória para Estudos Constitucionais, deu a entender que, embora gostasse do trabalho, só o enviaria à Constituinte se fosse solicitado. Dessa maneira, evitava comprometer-se com as teses defendidas no projeto, que incluíam a adoção do parlamentarismo, contrário à sua opção presidencialista.

Sob o impacto positivo de êxitos na luta contra a inflação, as eleições para deputados federais e senadores que comporiam o Congresso constituinte, bem como para governadores e deputados estaduais, realizadas em 15 de novembro, deram uma vitória esmagadora ao partido de Sarney. O PMDB elegeu os governadores em 22 dos 23 estados, 46 dos 72 senadores e 260 dos 487 deputados federais.

Fortalecido pelo resultado eleitoral, interpretado como uma vitória política pessoal, decretou, no dia 20, aumento de 60% nos preços dos combustíveis e, no dia seguinte, um conjunto de medidas de restrição econômica. A insatisfação generalizada com as medidas, que atingiu até mesmo setores do PMDB e motivou manifestações populares, traduziu-se no declínio da popularidade do presidente. Com a inflação voltando a manifestar-se e desgastado politicamente, lançou a proposta de construção de um pacto social, já defendido por Tancredo. Para isso, encarregou o ministro do Trabalho, Almir Pazzianotto, de conseguir o apoio de líderes sindicais. Durante o mês de janeiro, o governo fez várias reuniões com empresários e representantes dos trabalhadores, mas o pacto não foi alcançado.

Instalada a Assembléia Nacional Constituinte em 1º de fevereiro de 1987, anunciou que se manteria neutro em face das disputas políticas, solicitando apenas que os partidos se definissem em relação aos temas que diziam respeito diretamente ao seu governo – regime de governo e tempo de mandato. Em 18 de maio, porém, fez pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão, informando que, embora, de acordo com a Constituição em vigor, seu mandato estivesse fixado em seis anos, estaria disposto a abrir mão de um ano, de forma a evitar uma discussão que poderia imobilizar a nação. Defendeu, também, a manutenção do regime presidencialista.

Articulando politicamente a manutenção do presidencialismo e a fixação do seu mandato em cinco anos, seria objeto de graves acusações de utilização de recursos públicos na conquista do voto de parlamentares. A principal moeda de troca teria sido a concessão de canais de rádio e televisão.

Segundo a Folha de S. Paulo (28/11/1993), os registros do Ministério das Comunicações revelam que, durante sua gestão, Sarney beneficiou amigos com concessões, procedimento justificado por um de seus filhos, Fernando: “É natural que se dê preferência aos amigos.” Levantamento feito pela Federação Nacional dos Jornalistas e citado pela Folha de S. Paulo (3/9/1995) demonstra que até março de 1979, data da posse de Figueiredo, havia 1.483 emissoras de rádio e TV no Brasil. Durante o governo de Sarney, foram distribuídas 1.091 concessões, 257 no mês que antecedeu a promulgação da Constituição. Daquele total, 165 beneficiaram 91 parlamentares, 90% dos quais votariam a favor do mandato de cinco anos, mas também ganhariam concessões do governo ministros, governadores, jornalistas e funcionários da administração pública.

A oposição ao governo motivou manifestações de rua. A mais séria aconteceu em 25 de junho de 1987, no Rio de Janeiro, quando o ônibus que conduzia Sarney ao Paço Imperial, onde participaria de uma cerimônia, foi cercado por um grupo de cerca de mil pessoas e apedrejado. No tumulto, ficaram feridos o presidente da Legião Brasileira de Assistência (LBA), Marcos Vilaça, e o porta-voz da presidência, Frota Neto.

Nesse ínterim, a Comissão de Sistematização da Constituinte aprovou a proposta de implantação do parlamentarismo. Presidencialista, Sarney, em agosto, informou ao relator da comissão, senador Bernardo Cabral (PMDB-AM), que reagiria se a proposta fosse mantida. No mês seguinte, defendeu uma proposta conciliatória, na forma de um presidencialismo em que o Congresso tivesse poder para destituir ministros mediante voto de censura. Não conseguindo mudar a tendência predominante na comissão, passou a admitir a adoção do parlamentarismo, contanto que fosse aprovado por maioria absoluta da Constituinte e incluísse o voto distrital e a possibilidade de dissolução do Congresso em caso de impasse na nomeação do primeiro-ministro.

Em meio à luta por um mandato longo e pela plenitude dos poderes presidenciais, precisou administrar séria crise em sua base, que já se vinha desgastando desde as eleições municipais do ano anterior e se agravava pelas pressões que um setor do PMDB, de orientação social-democrata, fazia para que o partido se desligasse do governo. Em fins de setembro, discutiu com Maciel e Aureliano, dirigentes nacionais do PFL, a situação da Aliança Democrática, e os três optaram por dissolvê-la. No mesmo dia, o ministro da Educação, Jorge Bornhausen, demitiu-se. Para recompor sua base, Sarney fez contatos com o PTB e o PDS e, em início de outubro, lançou à sociedade, por meio de cadeia de rádio e televisão, uma proposta de formação de um governo de união nacional. Ainda nessa direção, recebeu, alguns dias depois, apoio de 22 governadores do PMDB, que redigiram a Declaração do Rio de Janeiro, defendendo, entre outros pontos, o prazo de cinco anos para o mandato de Sarney – o governador peemedebista de Alagoas, Fernando Collor, era favorável ao prazo de quatro anos – e a manutenção do presidencialismo. Sarney encontraria precioso apoio também no Centro Democrático, formado em agosto de 1987 por constituintes identificados com teses conservadoras e que ficaria conhecido como Centrão.

Nova reforma ministerial, agora acompanhada de mudanças na estrutura administrativa, foi outro recurso tentado por Sarney para debelar a crise política.

As mudanças no organograma do governo, anunciadas em 21 de outubro de 1987, foram as seguintes: o Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente passou a chamar-se Ministério da Habitação, Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente; o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) foi extinto e suas funções transferidas para o recém-criado Instituto Jurídico das Terras Rurais (Inter). Deixaram suas pastas Rafael de Almeida Magalhães, substituído na Previdência por Renato Archer, que passou o Ministério da Ciência e Tecnologia para o deputado Luís Henrique (PMDB-SC); Roberto Santos, substituído no Ministério da Saúde pelo deputado Luís Carlos Borges da Silveira (PMDB-PR); Deni Schwartz, substituído no Ministério da Habitação, Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente pelo deputado Prisco Viana (PMDB-BA).

Em 18 de novembro de 1987, três dias depois de a Comissão de Sistematização ter aprovado a adoção do parlamentarismo e a fixação do seu mandato em quatro anos, anunciou que envidaria todos os esforços para viabilizar a realização de eleições diretas no ano seguinte. Essa fora a reivindicação feita em dezembro por partidos de oposição em comícios que reuniram milhares de pessoas no Rio de Janeiro e em São Paulo.

A crise da base agravou-se em 9 de janeiro de 1988, quando o grupo histórico do PMDB – liderado pelos senadores paulistas Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso e pelo deputado mineiro Pimenta da Veiga – exigiu do Diretório Nacional que rompesse definitivamente com o governo Sarney em um mês.

Ainda em janeiro, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), motivada por informações sobre atos ilícitos do ministro do Planejamento, Aníbal Teixeira, lançou uma nota em que enunciava a corrupção no governo, afirmando que o Brasil vivia uma “crise moral”. No mês seguinte, a Folha de S. Paulo publicou material que relacionava Sarney e seu círculo pessoal com irregularidades administrativas. No centro dos fatos estava Jorge Murad, ex-genro e secretário particular do presidente, acusado de intermediar verbas federais para o Maranhão.

As denúncias contra Murad foram apuradas pela CPI instalada no Senado em 10 de fevereiro de 1988, – presidente: José Inácio Ferreira; vice, Itamar Franco; relator, Carlos Chiarelli – inicialmente para apurar as denúncias de corrupção contra o ministro do Planejamento, Aníbal Teixeira, demitido em janeiro de 1988 por força das denúncias. As investigações logo atingiram vários setores do governo, inclusive o presidente, que, inquirido pela CPI em junho de 1988, se recusou a responder às 40 perguntas que lhe foram feitas, alegando que o ofício não lhe fora entregue por meios adequados. Nos primeiros seis meses de trabalho a CPI não conseguiu provas da conivência de Sarney com as irregularidades. Nas conclusões da CPI, Sarney não chegou a ser acusado de receber propinas pela intermediação, mas aparece como um presidente que distribuía o dinheiro dos fundos especiais, controlados diretamente pela Presidência e destinados aos municípios, sem critério técnico algum, movido apenas por interesses políticos. Como conseqüência desse procedimento, os recursos nunca eram suficientes e o presidente acabava apelando para a reserva de contingência, tendo no ministro do Planejamento um prestimoso colaborador.

Uma semana depois de o PMDB declarar-se independente do governo, a Assembléia Nacional Constituinte, num dos momentos mais tensos dos seus trabalhos, aprovou em 23 de março de 1988 a manutenção do regime presidencialista e fixou o mandato dos futuros presidentes em cinco anos.

A decisão teve repercussões imediatas no PMDB: no dia seguinte, oito deputados constituintes mineiros, entre os quais o ex-líder do governo Pimenta da Veiga, e os pernambucanos Fernando Lira e Cristina Tavares desligaram-se do partido. Em 8 de abril, surgiu o Bloco Independente do PMDB, anunciado em manifesto assinado por 93 dos 280 constituintes peemedebistas, entre os quais os senadores paulistas Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso e José Richa (PR). O grupo convocava os ministros a romper imediatamente com o governo e a lutar por eleições diretas para presidente ainda em 1988.

Em 2 de junho, o plenário da Constituinte determinou que o mandato de Sarney duraria cinco anos e marcou para 15 de novembro de 1989 a escolha do sucessor. Alguns anos mais tarde, Sarney revelaria, em entrevista à Folha de S. Paulo (22/8/1993), que, na expectativa da resolução da assembléia, informara ao ministro da Justiça, Paulo Brossard, que, caso a Constituinte optasse por reduzir seu mandato para quatro anos, entenderia o fato como uma “moção de desconfiança do Congresso” e renunciaria. A decisão da Constituinte fez com que os membros do Bloco Independente do PMDB, partidários do prazo de quatro anos, abandonassem a legenda para fundar, em 24 de junho, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).

A aprovação em 26 de julho, em primeiro turno, do texto da futura Constituição levou Sarney a novo pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão.

Advertiu que se o texto prevalecesse, após a votação em segundo turno, o país se tornaria ingovernável, haveria aumento de impostos e do déficit público, recessão e desemprego. O discurso provocou crise no governo, resultando na demissão dos ministros Renato Archer, Luís Henrique e Celso Furtado. Em 5 de outubro foi promulgada a nova Constituição.

Em 2 de novembro foram anunciadas no Senado as conclusões do trabalho do relator da CPI da corrupção no governo. De acordo com o relatório, que seria aprovado pela comissão em fins de novembro por nove votos a um, Sarney teria tido pleno conhecimento das irregularidades. Em seguida, o documento foi enviado ao Ministério Público, à Polícia Federal e ao Tribunal de Contas da União. Em 13 de dezembro, o presidente da CPI requereria ao presidente da Câmara, Ulisses Guimarães, o impeachment de Sarney e o seu enquadramento, com cinco ministros – José Reinaldo Tavares, João Batista de Abreu, Maílson da Nóbrega, Antônio Carlos Magalhães e Saulo Ramos -, por crimes de responsabilidade e que eles respondessem criminalmente, de acordo com o estabelecido na Constituição. O pedido seria arquivado pelo novo presidente da Câmara, Inocêncio Oliveira (PFL-PE), em 22 de fevereiro de 1989, por falta de “provas conclusivas”. Quatro dias depois, os senadores que haviam integrado a CPI entrariam com mandado de segurança no STF contra a decisão do presidente da Câmara. Os advogados Raimundo Faoro e José Carlos Bruzzi Castelo entraram com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal contra o arquivamento e perderam por cinco votos a quatro.

Uma última reforma administrativa e ministerial foi anunciada por Sarney em 15 de janeiro de 1989. Entre as várias medidas tomadas, destacam-se a extinção de órgãos federais e autarquias e dos ministérios da Habitação e Bem-Estar Social, da Reforma e Desenvolvimento Agrário, da Irrigação, da Ciência e Tecnologia e da Administração e a nomeação de Carlos Santana para o Ministério da Educação, de Vicente Fialho para o de Minas e Energia, de Seigo Tsuzuki para o da Saúde e de Oscar Dias Correia para o da Justiça.

A Nova República herdou do último governo militar muitos problemas econômicos. Entre os mais graves destacavam-se o volume da dívida externa, que em fins de 1984 somara cerca de cem bilhões de dólares, e a espiral inflacionária, que atingira o índice de 12,7% mensais em março de 1985.

Reproduzindo a retórica de Tancredo, Sarney anunciou que honraria os compromissos financeiros do país, mas não ao preço da miséria do povo ou da soberania nacional. O problema do endividamento externo tinha, contudo, dimensões continentais e opunha interesses dos países do Terceiro Mundo aos dos agentes financeiros internacionais, em especial americanos. No Peru, por exemplo, o recém-empossado presidente Alan García anunciou, em 28 de julho, que restringiria a 10% de suas exportações os recursos que o país destinaria nos 12 meses seguintes ao pagamento da dívida externa. Dois dias depois, o governo americano suspendeu toda a ajuda militar e econômica ao Peru.

Respaldado politicamente pelos governadores peemedebistas – que em julho de 1985 divulgaram um documento com o objetivo de fortalecê-lo nas negociações com o Fundo Monetário Internacional (FMI) -, Sarney procurou apoio externo para suas posições. Durante viagem ao Uruguai, em agosto, acusou o FMI de tentar impor condições contrárias aos interesses brasileiros e assinou com o presidente Julio Sanguinetti um comunicado, defendendo o pagamento das dívidas externas dos dois países sem prejuízo do crescimento sustentado e sem rebaixamento do nível de vida de suas populações. No mês seguinte, viajou a Nova Iorque onde, em discurso na Organização das Nações Unidas (ONU), advertiu que o Brasil não pagaria a dívida externa “nem com a recessão, nem com o desemprego, nem com a fome”, porque o povo brasileiro chegara “ao limite do suportável”.

Temendo que se estabelecesse uma situação de inadimplência geral entre os países latino-americanos, o FMI e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), mais conhecido como Banco Mundial, aprovaram oficialmente, em 2 de dezembro de 1985, o Plano Baker de ajuda aos países devedores empenhados em realizar o reajuste de suas economias em paralelo com políticas de desenvolvimento econômico. Em 17 de janeiro do ano seguinte, o governo brasileiro anunciou a prorrogação, por um ano, da suspensão dos pagamentos do principal da dívida externa.

Depois que uma missão do FMI permaneceu no Brasil de 18 de agosto a 5 de setembro examinando as contas brasileiras, Sarney, em 20 de fevereiro de 1987, anunciou, por cadeia de rádio e televisão, a suspensão do pagamento dos juros da dívida externa até que ficasse acertada com os credores uma forma de amortização que permitisse a recomposição das reservas cambiais. Mais tarde, na supracitada entrevista à Folha de S. Paulo, rebateria a acusação de ter decretado a moratória como recurso político para angariar popularidade, garantindo que a decisão fora uma “imposição técnica”: “Simplesmente não tínhamos mais reservas internacionais. Só tive conhecimento do nível de nossas reservas quando elas já se encontravam abaixo do limite crítico.”

No primeiro dia de maio, metade da dívida externa foi agravada pela decisão, tomada pelos principais bancos americanos, de elevar a taxa preferencial de juros (prime rate) em 0,25%. Ainda nesse mês, os bancos americanos Citicorp, então o maior credor do Brasil, e Chase Manhattan Bank ampliaram significativamente suas reservas contra a inadimplência de países devedores, sendo seguidos, em junho, por mais três grandes instituições bancárias.

Em Nova Iorque, o ministro da Fazenda, Bresser Pereira – que dois meses antes anunciara que o Brasil suspenderia o pagamento de mais de um bilhão de dólares às agências governamentais integrantes do Clube de Paris – participou em setembro de 1987, com os ministros da Argentina e do México, da criação do Grupo dos Três (G-3), num esforço de elaboração de uma saída comum para os problemas de endividamento externo. O documento divulgado na ocasião enfatizava que era necessário promover ajustes na economia mundial e tornar mais rápido o desembolso dos empréstimos acertados com os países credores.

Alguns dias depois, aos presidentes dos três países juntaram-se no México os da Colômbia, Peru, Panamá, Venezuela e Uruguai para firmar uma base comum de negociação com os EUA, da dívida externa.

Foram defendidas três propostas: que os juros pagos fossem financiados pelos credores; que parte da dívida fosse substituída por bônus resgatáveis a longo prazo; e que as negociações com os bancos privados fossem desvinculadas do FMI.

Finalmente, em 6 de novembro o governo decretou o fim da moratória e, num ato de valor quase que apenas simbólico, efetuou o pagamento de quinhentos milhões de dólares da dívida. Em janeiro de 1988, contudo, as relações com os credores voltaram a agravar-se. Enquanto os bancos exigiam que o governo pagasse os juros da dívida vencidos nesse mês, o Citicorp anunciava ter tido grande prejuízo em 1987, atribuindo-o à moratória brasileira. Outros bancos americanos também registraram perdas atribuídas às dificuldades dos países da América Latina.

O governo, tentando regularizar as relações com as entidades financeiras internacionais, aceitou, em 1º de fevereiro, pagar parte dos juros relativos a janeiro e, um mês depois, fechou um acordo preliminar de refinanciamento da dívida externa. Assinado em 1º de julho, foi o primeiro acordo com o FMI desde o fim do governo João Figueiredo (1979-1985). No mês seguinte, a instituição liberou um empréstimo de 1,4 bilhão de dólares para o Brasil. A regularização geral da situação se completaria em setembro, quando foi assinado com o FMI o novo acordo de reescalonamento da dívida por 20 anos.

A questão da administração da dívida externa a longo prazo não estava, contudo, resolvida. A dimensão continental da crise foi enfatizada por Sarney alguns dias depois. Discursando em 25 de setembro na 44ª Assembléia Geral da ONU, acusou os países ricos de explorar a vulnerabilidade dos países pobres, “oprimidos por uma conjuntura internacional perversa”. No mês seguinte, reforçou a acusação em duas reuniões do Grupo dos Oito, formado por Argentina, Brasil, Colômbia, México, Peru, Uruguai e Venezuela, em Ica, no Peru, e Punta del Leste, no Uruguai.

Em março de 1989, o governo dos EUA anunciou um plano para redução ou cancelamento de parte da dívida dos países latino-americanos. O plano, apresentado pelo secretário do Tesouro, Nicholas Brady, condicionava a concessão do benefício à implementação de ajustes nas economias de acordo com a orientação do FMI e do Banco Mundial. A gravidade da situação, para os credores, ficou patenteada em julho, quando o Banco Mundial, em seu relatório anual, previu uma crise na América Latina em decorrência da redução dos níveis de crescimento econômico e do vulto da dívida externa. Ainda nesse mês, os presidentes dos países integrantes do Grupo dos Sete (G-7) – EUA, Japão, Canadá, Alemanha Ocidental, Itália, França e Reino Unido -, reunidos em Paris, anunciaram, entre outras deliberações, a exclusão de Brasil e Argentina da lista de beneficiários em potencial do Plano Brady.

Depois de, em 15 de setembro de 1989, o ministro da Fazenda ter anunciado que o Brasil não disporia de recursos para o pagamento dos juros da dívida que venceriam em três dias, Sarney, abrindo, no dia 23, a 45ª Sessão da Assembléia Geral da ONU, acusou os países ricos de adiar uma solução para o problema da dívida externa do Terceiro Mundo, em benefício dos bancos credores. Em seguida, participou, em outubro, no Peru, de reunião do Grupo dos Oito – constituído, depois da exclusão do Panamá, por Argentina, Brasil, Colômbia, México, Peru, Uruguai e Venezuela -, na qual a questão da dívida externa foi o principal ponto. A essa altura, porém, as autoridades da área econômica já entendiam que a dívida externa era impagável, devendo o seu equacionamento subordinar-se a ajustes econômicos internos.

Quanto ao problema da inflação, foram adotados sucessivos planos de estabilização para combatê-lo. Sarney assumiu o governo com a economia registrando relativa queda da inflação. O índice de abril de 1985 – 7,2% – foi o menor apurado desde 1983.

Em julho, o governo, ressalvando que estava consolidada a abertura política e chegara o momento da “abertura econômica e social”, anunciou as metas gerais para a área econômica: crescimento a taxas anuais de 5% e 6%; redução do déficit público para conter a inflação; implantação do orçamento único; saneamento financeiro das empresas estatais; e combate à miséria.

Em 26 de agosto, contudo, sob intensa pressão por causa do seu programa antiinflacionário de orientação liberal – cujas metas principais, a reversão do processo inflacionário, o saneamento do setor público e o equilíbrio das contas externas, colidiam com a prioridade dada por Sarney ao crescimento econômico – o ministro da Fazenda, Francisco Dornelles, se demitiu. Seu substituto, o empresário Dílson Funaro, assumiu o cargo anunciando a intenção de conciliar o combate à inflação com a retomada do desenvolvimento econômico. Já no mês seguinte, em reunião do FMI, se pronunciou contra a política recessionista do órgão, defendendo a recuperação econômica pela via do desenvolvimento. O governo estabeleceu, então, a meta de 6% para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), em função da qual deveria ser equacionada a administração da dívida externa, cujo pagamento não poderia trazer recessão. Ao fim do primeiro ano de governo, porém, a inflação chegou a 255,16%.

Em 28 de fevereiro de 1986, Sarney anunciou o Plano de Estabilização Econômica. Desde meados do ano anterior, técnicos vinham sendo enviados a Israel para estudar a experiência de combate à inflação por métodos heterodoxos, que vinha obtendo êxito nesse país. Recolhidos os subsídios, organizou-se um grupo, integrado pelos economistas João Sayad, Pérsio Arida, André Lara Resende e Francisco Lopes, com o objetivo de formular um programa para o Brasil.

O Plano Cruzado, como ficou conhecido, visava basicamente a reverter o processo inflacionário, estabelecendo, entre outras medidas, uma reforma monetária, com o corte de três zeros do cruzeiro e a sua substituição por uma nova moeda, o cruzado; congelamento dos preços por um ano e também dos salários, pelo valor médio dos últimos seis meses, acrescido de um abono de 8%; criação do “gatilho salarial”, pelo qual, toda vez que a inflação atingisse ou ultrapassasse o patamar de 20%, os salários receberiam um reajuste automático no mesmo valor, sendo as diferenças negociadas nos dissídios das categorias; extinção da correção monetária; instituição do seguro-desemprego e criação do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) para correção das poupanças e aplicações financeiras superiores a um ano.

Pronunciando-se por meio de cadeia de rádio e televisão, Sarney convocou a população para fiscalizar o respeito às tabelas de preços. Estabelecimentos comerciais foram denunciados e muitos gerentes, detidos. O plano foi objeto de adesão quase consensual, registrando-se a oposição feita pelo governador do Estado do Rio, Leonel Brizola, pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e pelas direções sindicais ligadas à Central Única dos Trabalhadores (CUT). Em 14 de abril, Sarney anunciou que o custo de vida caíra em março, configurando-se, portanto, uma conjuntura de deflação. Três dias depois o plano foi aprovado pelo Congresso.

Em meados de 1986, contudo, a situação econômica já se tornara crítica novamente. O fornecimento começou a ser boicotado e as mercadorias, vendidas com ágio. Diante do recrudescimento da inflação, em 23 de julho o governo adotou um novo conjunto de medidas econômicas, destinadas a criar condições para que o Brasil ocupasse “seu grande espaço no século XXI”. O plano previa o crescimento do PIB a taxas superiores a 7% ao ano e os recursos para financiá-lo viriam de mecanismos basicamente fiscais que comporiam o Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND), entre os quais um empréstimo compulsório de 10% a 30% na compra de automóveis e de combustíveis, uma taxa de 25% sobre as vendas de dólares e passagens aéreas internacionais e isenção do imposto de renda para aplicações de capitais estrangeiros nas bolsas de valores.

O governo manteve o congelamento até as eleições de novembro, tentando obter maiores dividendos políticos. A popularidade de Sarney era alta, chegando a estimular o ministro das Comunicações, Antônio Carlos Magalhães, a propor que em torno dele se criasse um partido político. A estratégia eleitoral deu certo e o PMDB venceu nos principais estados.

Ainda se apuravam votos quando o governo decretou, em 21 de novembro, o Plano Cruzado II, que descongelou os preços de produtos e serviços, liberou os preços dos aluguéis para serem negociados entre proprietários e inquilinos e alterou o cálculo da inflação, que passou a ser medida com base nos gastos das famílias com renda de até cinco salários-mínimos. O resultado imediato foi um aumento generalizado de preços, levando a população a perder a confiança no governo.

A situação tornou-se crítica também na equipe governamental. Em fevereiro de 1987, Aureliano Chaves, ministro da Minas e Energia, declarou à imprensa que o Plano Cruzado falhara por ter sido usado com fins eleitorais. Em seguida, o ministro do Planejamento, João Sayad, que tivera recusado um conjunto de propostas de estabilização econômica, que previam o aumento e um novo congelamento de preços, demitiu-se em 17 de março, sendo substituído por Aníbal Teixeira, titular da Secretaria Especial de Assuntos Comunitários (SEAC). Ainda nesse mês, Sarney participou, em São Paulo, de reunião com um grupo de empresários que o pressionaram a definir um novo programa econômico, que liberasse os preços, extinguisse o “gatilho salarial” e reduzisse os custos financeiros. Também os governadores do PMDB agiam no sentido de obter do governo novas definições para a economia, exigindo ainda reformas ministeriais.

Em 26 de abril, Funaro anunciou publicamente seu pedido de demissão, apresentado ao presidente dois dias antes, e criticou “a impunidade generalizada” no governo, que teria provocado o fracasso do Plano Cruzado. Três dias depois, assumiu seu substituto, Bresser Pereira, secretário de Ciência e Tecnologia de São Paulo.

Com a inflação de maio chegando a 23,26%, Sarney adotou em 12 de junho o Plano Bresser: novo congelamento, por três meses, de preços, aluguéis e salários; para conter o déficit público, considerado responsável pela inflação, extinção do subsídio ao trigo e adiamento de obras públicas já planejadas.

Em 9 de julho, Bresser apresentou a Sarney seu Plano de Consistência Macroeconômica, que propunha cortes nos gastos do governo em projetos e no custeio da máquina governamental e a redução da meta de crescimento do PIB nos três anos seguintes, estimada em 6% ao ano, medidas adotadas pelo governo duas semanas depois. Em 18 de dezembro, porém, o ministro se demitiu, por não ter conseguido apoio de Sarney para o novo conjunto de medidas com que pretendia resolver os problemas do déficit público e da inflação. Foi substituído por Maílson da Nóbrega, secretário-geral do Ministério, que assumiu interinamente. No fim do ano, a inflação atingiu o índice de 366% e, em 6 de janeiro de 1988, Maílson foi efetivado.

O novo ministro apelidou sua estratégia de luta contra a inflação de “feijão-com-arroz”. Tratava-se de conviver com a inflação sem medidas drásticas, apenas fazendo ajustes parciais com o objetivo de evitar a hiperinflação.

Na gestão de Maílson, Sarney assinou, em maio, três decretos-leis e um decreto com alterações na política industrial: facilidades para a importação – redução do imposto de 105 para 70% – e exportação – suspensão do controle prévio pelo governo – e reformulação do Conselho de Desenvolvimento Industrial (CDI). A nova orientação rompeu com a política de substituição de importações e de protecionismo tarifário em vigor durante quase meio século, iniciando um movimento de adequação da economia ao mercado mundial que se concretizaria em governos posteriores.

Como a inflação acumulada tivesse passado dos 366% em 1987 para 933% no fim de 1988, Maílson apresentou, em 15 de janeiro do ano seguinte, um novo conjunto de medidas, o Plano Verão: congelamento de preços, salários e tarifas; substituição do cruzado pelo cruzado novo, com três zeros a menos e desvalorizado em 18,32% em relação ao dólar; extinção da correção monetária; política de gastos do governo subordinados à arrecadação; privatização de estatais; demissão de servidores; extinção dos ministérios da Habitação e Bem-Estar Social, da Reforma e Desenvolvimento Agrário, da Irrigação, da Ciência e Tecnologia e da Administração; remanejamento de atribuições e fechamento de grande número de órgãos federais e autarquias.

O plano não obteve êxito. Em setembro de 1989, Sarney e seus ministros da área econômica atribuíram à proximidade das eleições a aceleração inflacionária do mês em curso. Ao fim do mandato de Sarney, os números mostrariam uma inflação de 2.751% acumulada de fevereiro de 1989 a fevereiro de 1990.

Política externa

A política externa da Nova República foi inaugurada em 14 de junho de 1985, com um lance de alta significação simbólica do ponto de vista do processo de desmontagem do regime militar. Nesse dia, foram reatadas as relações diplomáticas com Cuba, rompidas pelo governo militar em 1964. A medida, justificada como um passo no processo de integração latino-americana, seria complementada em janeiro do ano seguinte, com a inauguração do sistema de discagem telefônica direta entre os dois países.

Em 30 de julho de 1986, Sarney assinou em Buenos Aires, com Raúl Alfonsín, presidente da Argentina, a Ata para a Integração Argentino-Brasileira, conjunto de acordos econômicos e políticos bilaterais, mas abertos à adesão de outros países da região, voltados para a formação de um futuro mercado comum latino-americano. Alfonsín retribuiria a visita em dezembro, incrementando o processo de integração, que obedeceu, num primeiro momento, a motivações mais políticas do que econômicas. Tratava-se de, por meio da criação de interesses econômicos comuns, lançar bases para a superação da tradicional rivalidade que, desde a época colonial, antagonizava os dois países. O Programa de Integração e Cooperação Econômica, instituído na ocasião, anunciou, pela primeira vez explicitamente, o propósito de instituir um “espaço econômico comum” em que setores da economia dos dois países se complementariam. Com o fim da guerra fria, simbolizada pela queda do Muro de Berlim em novembro de 1989, e a conseqüente abertura dos países ex-comunistas aos investimentos capitalistas, acirrou-se a concorrência entre as áreas periféricas por capitais e as alternativas de integração regional assumiram importância estratégica. Nesse quadro, a aproximação com a Argentina, iniciada no governo Sarney, resultaria, em 1991, na criação do Mercado Comum do Sul (Mercosul), reunindo também o Paraguai e o Uruguai, cujo início do funcionamento foi marcado para 1995.

Outra questão importante no relacionamento externo foram os conflitos com os EUA sobre a política de reserva de mercado da informática, em vigor desde 1984. Alegando prejuízos de cerca de meio bilhão de dólares com o desrespeito aos direitos de propriedade sobre softwares praticado no Brasil, o presidente americano, Ronald Reagan, para forçar o governo a alterar a legislação, ameaçou, em fevereiro de 1986, rever as concessões tarifárias para as exportações brasileiras.

Embora resistisse a mudar a Lei de Informática, Sarney enviou ao Congresso, em abril de 1986, projeto regulamentando a venda e os direitos de propriedade dos softwares, que mantinha a reserva de mercado mas facilitava a entrada de programas estrangeiros. Insatisfeito com a posição do Brasil, o governo dos EUA extinguiu em janeiro de 1987 o sistema preferencial de tarifas que beneficiava vários produtos brasileiros, como autopeças, álcool e artigos de couro, passando a gravá-los com taxas que variavam de 5% a 10%. Em dezembro, o Congresso brasileiro aprovou a Lei de Comercialização de Softwares, regulamentada em abril do ano seguinte. Os EUA suspenderam as pressões sobre o Brasil em 1989, mas a reserva de mercado só seria extinta em outubro de 1992, em decorrência do fim da validade da lei que a criara em 1984.

Fonte: br.geocities.com/www.planalto.gov.br/www.biblio.com.br/www.anglopiracicaba.com.br

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