Dia do Colono

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25 de Julho

Lei Nº 5.496, 05/09/1968

Colono era o trabalhador rural estrangeiro que veio para o Brasil logo após o fim da escravidão, no fim do século XIX, início do século XX, para substituir os escravos nas lavouras, em especial as de café.

Eles trabalhavam em regime de colonato, ou seja, moravam em casas dentro da fazenda, trabalhavam nas lavouras e recebiam em troca uma parte da colheita ou então podiam cultivar para seu próprio sustento em certas partes de terra.

Eram trabalhadores livres e chegavam ao Brasil com o sonho de, com seu trabalho, comprar terras no país. Sonho este impensável na Europa de então. Mas as condições de contrato eram regulamentadas por lei e sempre beneficiavam mais os fazendeiros, que os trabalhadores.

Assim, os colonos jamais liquidavam suas dívidas e continuavam dependendo do fazendeiro. Mesmo assim muitos colonos conquistaram sua independência e até se tornaram grandes fazendeiros no país.

Hoje, no Sul do país, onde a imigração foi mais forte, a palavra ainda é usada para os trabalhadores rurais que tiram da terra seu sustento e para os descendentes dos antigos colonos. Existem as feiras dos colonos, onde eles vendem de frutas e verduras a doces e artesanato.

Fonte: Soleis

Dia do Colono

25 de Julho

IMIGRAÇÃO PORTUGUESA NO BRASIL

Seguido ao descobrimento do Brasil, em 1500, começaram a aportar na região os primeiros colonos portugueses. Porém, foi só no século XVII que a emigração para o Brasil se tornou significativa. Acompanhando a decadência do comércio na Ásia, as atenções da Coroa Portuguesa se voltaram para o Brasil.

No século XVIII, com o desenvolvimento da mineração na economia colonial, chegaram à colônia centenas de milhares de colonos. Após a independência, na primeira metade do século XIX, a emigração portuguesa ficou estagnada. Cresceu na segunda metade do século, alcançando seu ápice na primeira metade do século XX, quando chegavam ao Brasil, anualmente, 25 mil portugueses.

O Brasil foi descoberto pelos portugueses em 22 de abril de 1500. Logo após o fato, os colonos passaram a se estabelecer na colônia, porém, de forma pouco significativa. De início, aqui foram deixados degredados (pessoas indesejáveis em Portugal, como ladrões e traidores, que tinham como pena o degredo no Brasil).

Esses primeiros colonos foram abandonados à própria sorte e acabaram sendo acolhidos pelos grupos indígenas que viviam no litoral.

Os degredados chegaram a compor de 10 a 20% da população da Bahia e Pernambuco (áreas mais ricas). Em contrapartida, nas regiões periféricas, como o Maranhão, os degredados eram entre 80 e 90%.

Durante os séculos XVI e XVII, a imigração de portugueses para o Brasil foi pouco significativa. A Coroa Portuguesa preferia investir na sua expansão comercial no continente asiático e pouco valorizava as suas possessões nas Américas. Porém, durante o século XVI, piratas franceses e de outras nacionalidades começaram a rondar o território brasileiro e a fazer tráfico de pau-brasil dentro das terras lusitanas.

Essa situação obrigou a Coroa Portuguesa a começar efetivamente a colonização do Brasil. Os primeiros colonos portugueses começaram a chegar ao Brasil em maior número após 1530. A colônia foi dividida em capitanias hereditárias e as terras foram divididas entre nobres lusitanos.

Para promover a colonização desses grandes lotes de terra, a Coroa Portuguesa passou a incentivar a ida de colonos para o Brasil, que recebiam sesmarias e tinham um prazo de tempo para desenvolver a produção

Nesse período, vieram para o Brasil portugueses de todos os tipos: ricos fazendeiros, aventureiros, mulheres órfãs, degredados, empresários falidos e membros do clero.

O foco da imigração foi a Região Nordeste do Brasil, já que as plantações de cana-de-açúcar estavam em pleno desenvolvimento. Essa imigração colonizadora ficou marcada pela mas- culinidade da população: as mulheres portuguesas raramente imigravam, pois na Europa o Brasil possuía a imagem de uma terra selvagem e perigosa, onde apenas os homens poderiam sobreviver. No Nordeste brasileiro nasceu uma sociedade açucareira rígida, formada pelo colono português e seus escravos africanos.

Para suprir a falta de mulheres portuguesas, a Coroa Portuguesa passou a enviar para o Brasil mulheres órfãs que, ao invés de seguirem o caminho religioso, vinham se casar no Brasil. Todavia, os esforços não foram suficientes e a miscigenação ocorreu em larga escala: as mulheres indígenas e africanas acabaram por substituir a falta das mulheres portuguesas.

Surge, então, o “branco da terra”: filho do colono português com as índias locais. Mais tarde, surge a figura do mulato: filho do europeu com as africanas.Desembarcaram também na colônia judeus, muitos cristãos-novos e ciganos. Sob o domínio holandês centenas de judeus de Portugal e Espanha se instalaram, sobretudo, em Pernambuco, acrescentando à diversidade étnica do Brasil colonial.

A partir do século XVIII, a imigração portuguesa no Brasil alcança cifras jamais vistas.

Os fatores para esse crescimento imigratório foram: a descoberta de ouro nas Minas Gerais, e o aprimoramento dos meios de transporte aquáticos. No início do século XVIII, as minas de ouro tornaram-se a principal economia da colônia.

O desenvolvimento e riqueza trazidos pelo ouro atraíram para o Brasil um grande contingente de colonos portugueses em busca de riqueza. Nessa época, surge o mineiro, que era o colono português que enriqueceu no Brasil graças ao ouro e as pedras preciosas.

O surto urbano que se deu na colônia graças à mineração fez crescer as ofertas de emprego para os portugueses. Antes, os colonos eram quase que exclusivamente rurais, dedicando-se ao cultivo da cana-de-açúcar, mas agora surgiriam profissões como de pequenos comerciantes.

 

25 de Julho

A colonização alemã

Por mais de 300 anos, após o descobrimento do Brasil, o Rio Grande do Sul foi dos índios. Os habitantes desta terra eram os nativos e a eles a grande área da província gaúcha pertencia. Quem vinha de fora é que tentava colonizar a região.

Coube aos alemães esta tarefa, com o trabalho e terra sendo moeda de troca na defesa das fronteiras brasileiras. Partindo da Europa rumo a América surgiam sonhos, anseios, dificuldades e um sentimento ainda pouco experimentado: a saudade de casa. Um novo mundo os esperava no sul do continente americano.

Um barco vindo da Alemanha trazia 39 esperançosos imigrantes. Deveriam ter sido 40, mas uma mulher acabou falecendo no trajeto. Seis eram católicos e 33 evangélicos.

Os colonizadores atracaram em Porto Alegre em 18 de julho de 1824, sendo recebidos pelo presidente da Província, José Feliciano Fernandes Pinheiro. Depois, foram encaminhados para São Leopoldo, chegando pelo Rio dos Sinos e desembarcando na Real Feitoria do Linho-Cânhamo à margem esquerda das águas. Era 25 de julho de 1824 e os alemães, momentos depois de sua chegada, realizaram o primeiro culto evangélico do Estado.

De lá para cá se passaram mais de 180 anos. As cidades colonizadas prosperaram, houve progresso em toda a região e os alemães se espalharam não só pelo Estado como por outras cidades do Brasil. Uma história bastante conhecida dos descendentes vivos que ainda hoje conservam seus costumes, tradições e o jeito alemão de ser.

Porque os alemães vieram

Em 1822, o major Jorge Antônio Schaffer foi enviado pelo Imperador Dom Pedro para a corte de Viena e demais cortes alemãs, para angariar colonos e conseguir soldados para o Corpo de Estrangeiros situado no Rio de Janeiro.

Este último objetivo não foi declarado, mas era mais importante do que o primeiro. Era assim que o Brasil iria garantir sua independência, ameaçada pelas tropas portuguesas que continuavam na Bahia, e pela recusa de Portugal em reconhecer o novo país.

O império anunciou aos interessados que eles receberiam 50 hectares de terra com vacas, bois e cavalos no Brasil, auxílio financeiro, isenção de impostos e serviços nos primeiros dez anos, liberação do serviço militar, nacionalização imediata e liberdade de culto.

A tal promessa do imperador foi cumprida apenas em parte. Aqui, os imigrantes receberam 77 hectares e não 50. Já a nacionalização e a liberdade de culto contrariavam a constituição brasileira. Mesmo que o cumprimento da promessa não tenha sido integral, aos colonos a posse da terra era o que interessava. Na época, a Alemanha era essencialmente rural. Existiam os senhores (donos de áreas de terra) e seus servos (cultivavam, mas não tinham a posse e cumpriam obrigações ao senhor).

Os imigrantes vieram de diferentes regiões da Alemanha, como Holstein, Hamburgo, Mecklemburgo, Hannover, Hunsrüch, Palatinado, além de grupos de pomeranos, westfalianos, wurtembergenses e boêmios.

A casa que abrigou os imigrantes foi erguida em outubro de 1788 e lá funcionava a Feitoria do Linho-Cânhamo, onde este vegetal era cultivado para a fabricação de cordas para os navios a vela da época.

Da Alemanha para o Brasil

Estima-se que, entre 1824 e 1914, entraram no Rio Grande do Sul entre 45 e 50 mil alemães, sendo criadas 142 colônias alemãs no estado. Confira os números da imigração:

Em 1824 – 39 alemães

De 1824 a 1830 – 5.350

De 1830 a 1844 – imigração paralisada

De 1844 a 1850 – 10 mil

De 1860 a 1889 – 10 mil

De 1890 a 1914 – 17 mil

Os primeiros 39 imigrantes:

Miguel Kräme e esposa Margarida.

João Frederico Höpper, esposa Anna Margarida, filhos Anna Maria, Christóvão e João Ludovico.

Paulo Hammel, esposa Maria Teresa, filhos Carlos e Antônio.

João Henrique Otto Pfingsten, esposa Catarina, filhos Carolina, Dorothea, Frederico, Catarina e Maria.

João Christiano Rust, esposa Joana Margarida, filha Joana e Luiza.

Henrique Timm, esposa Margarida Ana, filhos João Henrique, Ana Catarina, Catarina Margarida, Jorge e Jacob.

Augusto Timm, esposa Catarina, filhos Christóvão e João.

Gaspar Henrique Bentzen, cuja esposa morreu na viagem, um parente, Frederico Gross; o filho João Henrique.

João Henrique Jaacks, esposa Catarina, filhos João Henrique e João Joaquim.

A formação de Novo Hamburgo

Boa parte dos imigrantes que chegaram em São Leopoldo em 1824 formaram o principal núcleo de colonização germânica em Novo Hamburgo. O local, hoje bairro de Hamburgo Velho, foi batizado de Hamburger Berg, ou Morro dos Hamburgueses.

Um agrupamento de casas formou o primeiro núcleo de comércio da localidade. Surgiu por ser local de bifurcação de estradas e passagem obrigatória para a capital. Foi essa posição geográfica que contribuiu para o desenvolvimento da região. Logo, a localidade se transformou em um centro de comercialização de produtos da região.

A aposta dos alemães mostrou resultados com o surgimento de várias casas comerciais. Era ali que acontecia a vida social dos colonos. Anos depois, em 1832, os imigrantes estabelecidos em Hamburger Berg fundavam sua comunidade de culto evangélico. São Luiz foi escolhido como padroeiro.

Por volta de 1850, apareceram os primeiros curtumes, as selarias e as oficinas dos sapateiros. Os colonos, com sua perícia no trabalho com o calçado, já eram responsáveis pelo abastecimento do estado gaúcho com seus produtos artesanais.

Em 1875, a Lei número 1.000, de 8 de maio, elevou Hamburger Berg à categoria de freguesia e distrito de São Leopoldo, uma vez que Novo Hamburgo não era independente do município vizinho.

O imigrante Johann Peter Schmitt foi pioneiro em Hamburg Berg. Ergueu uma casa em estilo enxaimel, na metade do século 19, e lá se estabeleceu como comerciante. A antiga venda funcionava no salão da casa como armazém de secos e molhados, drogaria, armarinho e bar.

Em 1920, o prédio foi alugado e abrigou a Padaria Reiss. Anos depois, a rua que passava em frente da casa foi rebaixada e o prédio ganhou então mais um pavimento. Foi neste espaço que Edwino Presser, casado com uma neta de Schmitt, reabriu a venda. Até 1973, ele comercializou no local tecidos e miudezas. Conservando esta história, o prédio se transformou no Museu Casa Schmitt Presser.

Ao lado da casa de Johann Peter Schmitt, Adão Adolfo Schmitt construiu um novo casarão em estilo enxaimel, no final da década de 1880. Em estilo neoclássico, o prédio serviu à comunidade de imigrantes como residência, casa comercial e até como hospital. Hoje no local, atual Fundação Ernesto Frederico Scheffel, está um das maiores pinacotecas do mundo, com mais de 350 obras do artista que deu nome ao espaço.

A evolução comercia acarretou na emancipação do município de Novo Hamburgo, pelo Decreto n.º 3818 de 5 de abril de 1927. O núcleo original, Hamburgo Velho, ficou como distrito do novo município. Com as contínuas emancipações, parte da área de Novo Hamburgo foi desmembrada para a formação de Campo Bom em 1959.

Monumento ao Imigrante

Os imigrantes alemães, a partir do momento que se identificaram com a nova pátria, decidiram marcar sua adesão à nova terra. Esta era a forma de fortalecer a identidade, suas tradições e costumes.

Enquanto organizavam as comemorações do centenário da imigração, em 1915, sociedades e associações da região discutiam o assunto. Foi em 1916 que o Pastor Bechmann teve a idéia de erguer um monumento relacionado à data.

Os colonos escolheram o primeiro lote colonizado, no povoado de Hamburger Berg. A área era pertencente a Libório Mentz, um dos primeiros imigrantes que chegaram a São Leopoldo. As famílias Mentz e Strassburger doaram do lote à Associação do Monumento ao Imigrante – Denkmalsverein.

O Pastor Richard Kreutzer cuidou da organização do acontecimento e Júlio Kunz arrecadou os recursos financeiros. O projeto foi elaborado pelo arquiteto alemão Ernest Karl Ludwig Seubert, que emigrou para o Brasil em 1913.

Em 15 de novembro de 1927, ocorreu a inauguração oficial do monumento, com a presença de Leopoldo Petry, primeiro prefeito Novo Hamburgo. Em novembro de 1950, o imóvel passou a pertencer a Sociedade Aliança, em razão da fusão das sociedades Gesangzverein, Frohsin, Sociedade de Cantores, Mente Alegre, Sociedade Atiradores e América Tênis Clube.

 

25 de Julho

180 anos depois

 

25 de Julho

A definição do 25 de julho como Dia do Colono deu-se em 1924, em meio às comemorações do centenário de vinda dos primeiros alemães para o Rio Grande do Sul.

A data simboliza a chegada da primeira leva de imigrantes à Feitoria Real do Linho Cânhamo, que, posteriormente, constituiria a sede de São Leopoldo.

Os alemães rumaram à futura colônia navegando em lanchões Rio dos Sinos acima, partindo de Porto Alegre, numa iniciativa que teve a intervenção direta do Imperador D. Pedro I e da Imperatriz Dona Leopoldina.

Os imigrantes, num total de 43, com seus pertences, instalaram-se provisoriamente em um paradeiro da Feitoria Velha, pertencente ao Império, para iniciar a ocupação da propriedade.

SÃO CRISTÓVÃO – 25 de julho também é o Dia do Motorista em homenagem ao protetor dos motoristas e dos viajantes: São Cristóvão. Ele viveu provavelmente na Síria e sofreu o martírio no século III. “Cristóvão”significa “Aquele que carrega Cristo” ou “porta-Cristo”. Seu culto remonta ao século V. De acordo com uma lenda, Cristóvão era um gigante com mania de grandezas.

Ele supunha que o rei a quem ele servia era o maior do mundo. Veio a saber, então, que o maior rei do mundo era Satanás. Colocou-se pois, a serviço deste.

Informando-se melhor, descobriu que o maior rei do mundo era Nosso Senhor. Um ermitão mostrou-lhe que a bondade era a coisa mais agradável ao Senhor.

São Cristóvão resolveu trocar a sua mania de grandeza pelo serviço aos semelhantes.

Valendo-se da imensa força de que era dotado, pôs-se a baldear pessoas, vadeando o rio. Uma noite, entretanto, um menino pediu-lhe que o transportasse à outra margem do rio.

À medida que vadeava o rio, o menino pesava cada vez mais às suas costas, como se fosse o peso do mundo inteiro.

Diante de seu espanto, o menino lhe disse: “Tiveste às costas mais que o mundo inteiro.

Transportaste o Criador de todas as coisas. Sou Jesus, aquele a quem serves”.

 

25 de Julho

O fundamento geral da questão agrária no Brasil reside em que o monopólio da terra é a causa do nosso atraso. Abalado ou eliminado esse monopólio, as forças produtivas darão um salto para a frente.

A compreensão teórica do problema exige, porém, o estudo de vários de seus aspectos, entre os quais têm um grande realce os que se referem à renda da terra no Brasil.

Teoricamente, a renda pré-capitalista pressupõe a existência de duas classes: a dos proprietários de terra e a dos pequenos produtores individuais, possuidores de meios de produção e dispondo de alguma independência econômica.

A renda capitalista pressupõe a existência de três classes: a dos proprietários de terra, a dos locatários capitalistas que exploram o trabalho assalariado e a dos assalariados que trabalham para estes capitalistas e não dispõem de meios de produção.

As relações agrárias em nosso país envolvem umas e outras classes pressupostas pelos dois tipos de renda – a pré-capitalista e a capitalista. O estudo da renda territorial contribuirá para assinalar o sentido do desenvolvimento de nossa economia agrária e definir que classes sociais e aspectos de renda predominam no campo.

Possibilitará também distinguir o sentido histórico em que marcham estas classes, o grau de diferenciação da massa camponesa e os elementos mais gerais para a solução da questão agrária.

É indispensável para isto o exame das relações econômico-sociais sob o ponto de vista da análise da renda da terra, através de cada uma das nossas principais culturas.

I. A Renda da Terra na Cultura do Café

O tipo econômico de exploração agrícola característico da cultura cafeeira é a fazenda do café. Como entidade econômica, a fazenda de café nos apresenta dois tipos básicos da população rural do país: de um lado o fazendeiro de café, de outro, o colono. São dois tipos antagônicos, que se debatem por entre contradições inconciliáveis, reflexo do predomínio absoluto da propriedade privada dos meios de produção na economia agrária.

Uma das fontes de riqueza do fazendeiro de café reside na apropriação do trabalho suplementar do colono.

Segundo Marx, a renda-trabalho, a renda da terra em sua forma mais simples, é produzida:

“quando o produtor direto trabalha parte da semana num terreno que lhe pertence de fato, com instrumentos que lhe pertencem de fato ou de direito (arado, gado, etc.) e emprega os outros dias da semana em trabalhar no terreno do latifundiário” (O Capital, livro III – cap. 47, II).

No nosso caso, a renda-trabalho produzida pelo colono apresenta-se com as modificações resultantes da época histórica que vivemos, mas isso em nada lhe modifica o caráter. O colono trabalha exclusivamente na terra do senhor.

O colono não tem nenhuma terra. Ele apenas consegue trabalhar para si na terra do fazendeiro, assim mesmo quando lhe é concedido o direito de plantar no vão. Algumas vezes lhe é permitido plantar fora, mas ainda aqui nas terras do senhor.

Nesse sentido, as vantagens históricas da derrocada do feudalismo não lhe serviam ao menos para gozar do mesmo privilégio do servo que entregava seu super-trabalho ao senhor feudal, consolando-se em trabalhar no pequeno pedaço de chão de cuja propriedade se orgulhava.

A separação entre o trabalho suplementar do colono e o trabalho necessário hoje só é nítida e só se distingue bem quando em determinados dias do ano tem que prestar serviços gratuitos ao fazendeiro de café (corvéia), consertando estradas e cercas, limpando pastos, extinguindo incêndios. No resto, já não se distingue tanto, da mesma maneira como vai se distinguindo menos nos outros tipos de renda pré-capitalista.

Mas não é somente da renda-trabalho que se apropria o fazendeiro quando explora o colono de café. O fazendeiro exige que o colono lhe venda em primeiro lugar os cereais que plantou. Plantando para si mesmo, o colono, colocado aparentemente na posição de produtor independente, além do produto necessário, se apropria, ele mesmo, do produto suplementar, isto é, do excedente do trabalho necessário à sua manutenção.

Pois bem, o produto suplementar do colono (resultante do plantio feito por sua conta) é obrigatoriamente vendido ao fazendeiro que lhe retribui com um preço abaixo do valor do produto suplementar. Nesse caso, o colono entra com uma parte do produto que plantou, o fazendeiro se apropria da renda-produto. É um novo pagamento em espécie que lhe faz o colono, na prática.

A concessão do fazendeiro de café que faculta ao colono plantar na terra da fazenda, tanto quanto a proibição de caçar, pescar, tirar lenha em suas matas, é uma das mais importantes características dos restos feudais nos dias de hoje.

O colono que recebeu qualquer parcela de terreno do fazendeiro para plantar está na completa dependência do senhor, tal como acontecia no tempo do feudalismo. Amarrado à miragem desse pedaço de terra, o colono presta serviços gratuitos ao fazendeiro quando limpa os cereais que plantou (pois aqui também limpa indiretamente o cafezal sem nenhuma retribuição), aduba o terreno gratuitamente com o feijão das águas e sujeita-se à interminável exploração do fazendeiro, permanecendo na fazenda, a troco desse precário direito de plantar, que é mais uma condição da miserável servidão que o aniquila.

Por último, o colono contribui com renda-dinheiro para o fazendeiro sempre que lhe paga os carretos de cereais ou de lenha, as mudanças, etc. Outra forma de renda-dinheiro é o pagamento de multas.

Não tendo o colono outra fonte de dinheiro e só podendo obter dinheiro do trabalho que realiza na fazenda ou dos produtos que planta, sempre que paga dinheiro ao fazendeiro, é como se estivesse trabalhando de graça para ele ou lhe entregando o produto em espécie do seu trabalho.

Como vemos, o fazendeiro mantém acorrentado o colono, explorando-o em todos os tipos de renda pré-capitalista. Para que tão odiosas relações não sejam quebradas, o fazendeiro fá-las estipular num leonino contrato escrito, que é o que pode haver de mais monstruoso como atestado das sobrevivências feudais e semifeudais.

Mas a fazenda de café não se circunscreve às limitações insuportáveis do feudalismo. Ela é, também, um empreendimento capitalista no campo. Isto se traduz no fato do colono ser também um assalariado. Não é somente com a renda pré-capitalista arrancada ao colono que o fazendeiro se satisfaz.

O colono deverá receber um determinado salário em cruzeiros por determinado número de pés de café que tratar anualmente. E não é só. Receberá salário também por determinados serviços, isto é, pela colheita do café em coco, pelo café derriçado no chão, etc. Seu salário será a mesada, que recebe de 30 em 30 dias geralmente, quando não atrasam os pagamentos.

O regime do salariato nas fazendas de café é extensivo aos volantes, isto é, aos camaradas e peões, e aos retireiros, carroceiros,etc.

A fazenda de café constitui, assim, um empreendimento de tipo todo particular no campo. De um lado encontra apoio econômico na renda pré-capitalista; de outro lado explora o braço assalariado. Mas a sua principal característica está em que não separa uma coisa da outra.

Quando se trata do colono, é tão estreita a relação entre a escravidão do salariato e a da renda-trabalho que basta um único contrato para torná-las inseparáveis. É evidente que são formas de exploração separadas historicamente, mas, num país oprimido e dominado pelo imperialismo, onde o monopólio da terra é lei geral, tornou-se possível sua junção no tempo.

É necessário também destacar que a fazenda de café não é um empreendimento industrial do campo, como é por exemplo a usina de açúcar. O capital empregado na fazenda de café tem a finalidade de desenvolver a cultura do café.

Todo o empreendimento industrial para beneficiar o café não tem o valor e a importância que se apresentam quando a matéria-prima é transformada, tal como acontece com a cana e o algodão. A importância das máquinas de beneficiar café é muito menor, desde que o produto é vendido em grão para o mercado externo.

No caso já referido da cana e do algodão é possível tirar lucros com a indústria correlata organizada, num caso para transformar a cana em açúcar e álcool, no outro para descaroçar o algodão e obter os subprodutos.

Aliás, quando se trata da usina de açúcar, a indústria é o único meio de apurar os imensos lucros da lavoura.

Tratando-se da fazenda de café, entretanto, ela por si só basta para reunir todos os benefícios da lavoura nas mãos de um só potentado – o fazendeiro de café. O fazendeiro de café (nisso – e somente nisso – ele é diferente do usineiro) consegue com o emprego do capital, sem a utilização de máquinas para transformar o produto, amealhar uma fortuna fabulosa arrancada ao suor do colono.

Ainda quando empregue máquinas para melhorar o cultivo (e não para transformar o produto), o fazendeiro de café é também um capitalista que emprega seu capital na terra, aluga o braço do trabalhador e ainda lhe suga, como latifundiário, a renda-trabalho, para não falar em toda a renda pré-capitalista.

O fazendeiro de café é dono de sua terra, que ele mesmo explora, sem jamais entregá-la a um locatário capitalista, salvo em certas circunstâncias. A mais-valia do assalariado é absorvida por ele diretamente.

Tratando-se da renda pré-capitalista, na fazenda de café deveríamos estar em presença de duas classes: a do fazendeiro de café (proprietário da terra) e a do pequeno produtor com seus meios de produção e quase independente economicamente.

Entretanto, o colono, via de regra, não dispõe dos meios de produção nem é livre economicamente. É em parte ligado à terra (principal meio de produção), planta em ruas puladas o seu cereal, ao mesmo tempo que aluga a sua força de trabalho, cede a sua mais-valia.

Se houvesse um locatário capitalista entre o fazendeiro de café (dono da terra) e o colono ou o camarada, o peão ou qualquer assalariado da fazenda, estaríamos diante do caso da renda diferencial (renda capitalista) e o fazendeiro receberia renda absoluta.

Mas esse locatário capitalista, regra geral, não existe nas fazendas de café. O fazendeiro é ao mesmo tempo latifundiário e capitalista. Como latifundiário ele se apropria da renda-trabalho e de toda a renda pré-capitalista.

Como latifundiário, sem nenhum intermediário capitalista, ele se apropria de toda a renda da terra, inclusive da renda que deveria ser absorvida pelo capitalista intermediário se houvesse. Como é ele próprio o capitalista, o que investe o capital na terra, paga salário, etc., a renda resultante do trabalho do assalariado, bem como o lucro médio, isto é, a quota de lucro médio, tudo ficará para ele.

Isto quer dizer que um fazendeiro de café como latifundiário e capitalista se apropria como único senhor de toda a renda da terra, da renda capitalista desde a absoluta à diferencial, da renda pré-capitalista e de todo o lucro do capital.

Em sua Economia Política, Leontiev, citando Lênin, diz que:

“A teoria da renda pressupõe que toda a população agrícola tenha sido dividida completamente em latifundiários, capitalistas e trabalhadores assalariados. Este é o ideal do capitalismo, mas não significa a realidade”.

E Leontiev acrescenta em seguida, com palavras suas:

“Na realidade as coisas são muito mais complicadas. Não obstante, a teoria da renda mantém toda a sua força, mesmo nas mais complicadas circunstâncias. Acontece freqüentemente na sociedade capitalista que o latifundiário não arrenda a sua terra a outrem mas aluga ele mesmo sua terra a trabalhadores assalariados para que nela trabalhem.

Ele se torna, então, a um só tempo, latifundiário e capitalista. Como proprietário, ele recebe a renda, e, como capitalista, o lucro do capital invertido. Neste caso, renda e lucro vão para o mesmo bolso”. – (Leontiev, Political Economy – International Publishers – Nova York – Cap. VII – pág. 150)

Não cabe aqui a objeção de que isto se passa em país capitalista, pois, embora o Brasil seja um país subdesenvolvido, semicolonial e semifeudal, já vimos que toda sua história é parte da evolução da economia capitalista mundial e sob esse aspecto não foge às suas leis.

Além do mais esse próprio fenômeno, característico das fazendas de café, é mais uma demonstração do caráter semicolonial e semifeudal do país. Só num país de fortes revivescências feudais seria possível, numa só peça, a junção de dois elementos tão opostos como o latifundiário e o capitalista, para uma exploração tão brutal como a das fazendas de café.

E só em tais condições seria possível, ao lado de tal fenômeno, processar-se outro, em sentido inverso, mas igualmente curioso: o do colono explorado, que reúne, a um só tempo, no mesmo elemento, o homem “liberto” dos meios de produção, o assalariado, e o homem jungido às formas de exploração feudais e semifeudais, produzindo renda-trabalho, percorrendo toda a gama da renda pré-capitalista, produzindo renda diferencial e absoluta e enchendo o fazendeiro de lucros.

Escravo ao mesmo tempo do regime do salariato e do feudalismo, não é proletário e ao mesmo tempo o é; não é um servo e ao mesmo tempo o é. A condição para que se afirme como proletário, ainda quando sujeito a um contrato com o fazendeiro, é que receba o seu salário em dinheiro.

Isto, porém, nem sempre acontece. Dado que a produção de café é mais destinada ao comércio exterior e a servir aos interesses do imperialismo e dos grandes fazendeiros, pouco contribui para o desenvolvimento do meio circulante no campo.

O fazendeiro prefere fazer correr o seu dinheiro nos centros urbanos. Para o colono reserva o vale, um pedaço de papel, o bororó, o cascudo, complemento da instituição do armazém ou do barracão, remanescente do feudalismo, que aniquila de vez o caráter “livre” da força de trabalho do colono.

O colono situa-se assim na condição de um semiproletário.

Uma tal situação, influindo em prejuízo do nosso desenvolvimento geral e contribuindo para entravar as forças produtivas, vem mostrar com clareza a força da renda pré-capitalista em todas as nossas relações agrárias.

Mas, seria falso não acentuar que, no estágio de desenvolvimento em que nos encontramos, a renda capitalista, seja a absoluta, seja a diferencial, constitui já parte sensível na exploração no campo.

É evidente, como já vimos para o caso das fazendas de café, que a renda capitalista não corresponde à coexistência de latifundiários, locatários capitalistas e assalariados agrícolas como classes independentes. Nesse caso, aqui, a renda capitalista constitui um reforço da classe dos latifundiários e da fabulosa fortuna que acumularam.

O fazendeiro de café, por exemplo, acumula todas as formas de renda pré-capitalista e mais a renda capitalista absorvida para si, amealhando uma riqueza individual considerável (gasta nos grandes centros urbanos), geralmente não concorrendo para qualquer passo adiante na economia agrária ou para a elevação total da fazenda à categoria de um empreendimento capitalista do campo, restringindo a circulação de mercadorias e o incremento do valor de uso e de troca, impondo às forças produtivas entraves feudais insuportáveis.

A renda capitalista, todavia, significa penetração do capitalismo no campo.

Isso quer dizer que, apesar de tudo o que resta de feudal na fazenda de café e de todo o fator de atraso que isso ainda representa, ela constitui também uma penetração capitalista no campo.

Para onde evoluirá? Esta é uma questão importante se quisermos analisar o sentido do desenvolvimento de nossa economia agrária e buscar as leis por onde nos deveremos reger para apressar e aprofundar a solução da questão agrária.

Sob a pressão da luta de classes no campo, os fazendeiros não ocultam sua inquietação diante do aguçamento das contradições entre as atuais relações de produção e as forças produtivas.

Os colonos lutam cada vez mais, intensificando a resistência à terrível exploração dos fazendeiros.

As lutas dos colonos têm se travado em torno das reivindicações específicas do proletariado, dada sua situação de semiproletários. Isto quer dizer que estando sujeitos a formas de exploração semifeudais e capitalistas, os colonos vêm exigindo as reivindicações que decorrem de sua exploração como assalariados.

As greves que têm desencadeado reivindicam aumento nas colheitas, aumento nos contratos, na carpa, na derriça, pagamento de férias, de salários atrasados e assim por diante. Nesta luta são acompanhados por todos os outros assalariados das fazendas de café.

Quando a resistência dos colonos se manifesta através das greves, torna-se visível pela recusa a aceitar os onerosos contratos dos fazendeiros. Os colonos abandonam as fazendas e procuram novas regiões, novas zonas onde empregar a sua força de trabalho.

Nisso são tentados pela concorrência do salário industrial nas cidades, mais elevado que os salários no campo. As cidades constituem em si um grande foco de atração. E onde surgem terras mais férteis há sempre a possibilidade da afluência dos colonos, como dos camponeses em geral, esperançosos num rendimento agrícola maior.

A crescente resistência dos colonos tem provocado diferentes reações nos fazendeiros. O contrato já não tem a mesma solidez que garantiu a fortuna dos velhos fazendeiros das primeiras décadas da República, na fase que precedeu o craque de 1929.

Torna-se difícil manter essa solidez, por força dos golpes desferidos com as lutas dos colonos e em conseqüência de novas circunstâncias materiais. Até mesmo manter o sistema de fiscalização do trabalho do colono, tão característico da fiscalização do senhor feudal sobre o servo, encontra obstáculos maiores. E já não surte efeito a ação dos capangas armados, resto da ordem feudal, ou a brutalidade da polícia, fruto da ordem capitalista.

O colono como fenômeno da importação de braços do estrangeiro para a lavoura cafeeira, que da parceria, onde entregava a renda-produto ao fazendeiro, passou para a condição de semiproletário, empreende sua trajetória para o proletariado rural. Fugindo da renda-trabalho, procura o salariato, ou melhor, nele é atirado, perdendo toda e qualquer ilusão de tornar-se arrendatário, sitiante, produtor direto independente.

Até aqui sua sorte não diferia daquela dos volantes, camaradas ou peões, senão numa permanência um pouco maior nas terras da fazenda, com os olhos fitos no plantio do vão. Mas ele será cada vez mais erradicado da terra. O monopólio da terra comprimiu-o, esmagou-o. Daqui por diante, o colono lutará cada vez mais pelas reivindicações proletárias.

Os fazendeiros que não se conformam com a perda da renda pré-capitalista lutam por estabelecer um tipo único de contrato para o colono, querem estabilizá-lo na condição de escravo ou de servo, reclamam um código rural drástico, uma espécie de fôrma bem apertada de onde o colono não possa sair.

Estes são os piores cegos. São os que não querem ver que o colono não poderá ficar sujeito a “leis eternas”. Outros acenam com a volta ao regime da meação. Há grandes fazendeiros que diante da recusa do colono às asfixiantes condições dos contratos, entregam seu café à meia, contentando-se com a renda-produto, obrigados a renunciar em parte às vantajosas limitações que lhes dá o regime semifeudal, semiproletário do colonato.

Mas há também os que tendem para novas formas de exploração através do regime do salariato. Estes pensam resolver a situação pelo caminho do capitalismo. Sentem o fim do regime semifeudal do colonato. Inclinam-se por isso a substituir a enxada primitiva pela enxada mecânica ou pelas carpideiras. Propõem-se a só contratar assalariados. Daí decorre algo de novo. As condições materiais estão gerando um novo tipo rural. Surge a figura do empreiteiro, trabalhador assalariado para a carpa, a derriça, o trato do café, a abertura de covas, a formação do café.

Em alguns lugares já este novo tipo rural é chamado de empreiteiro anualista, recebe em dinheiro pelas tarefas que executa, tem assegurado o seu dia de serviço por uma determinada quantia em dinheiro. Muitos colonos passam a esta categoria.

Estamos, assim, em face do empreiteiro individual, do assalariado agrícola destinado a substituir o colono, a encerrar o regime misto do salariato e da renda pré-capitalista, para, em seu lugar, colocar o salariato. Nas zonas novas, a figura do empreiteiro individual já tem um alcance mais amplo, prenunciando a extensão com que passará a ser utilizado daqui por diante, sem nunca, porém, anular o terrível grau de exploração a que serão sempre submetidos os trabalhadores do campo, enquanto perdurar o monopólio da terra.

Por meio de contratos verbais, já se empregam empreiteiros individuais a troco de míseros salários para derrubar, roçar, covear, ganhando em dinheiro por alqueire. (1) A liberdade de que gozam para alugar sua força de trabalho leva-os a se endividarem com os comerciantes para comprar as ferramentas e garantir as primeiras despesas na terra, e é assim que começam, acorrentados ao capital usurário, depois de terem emigrado de outras zonas, sobretudo de Minas.

Tal regime de empreita individual de serviços cria, entretanto, novos perigos para o fazendeiro, perigos que tanto tem procurado evitar. O primeiro deles é a ameaça de estender ao campo a legislação trabalhista, reivindicação que já começa a tornar corpo.

Para fugir a este espantalho e assegurar a instabilidade do trabalhador agrícola, o que lhes faculta escapar à legislação, os fazendeiros recorrem a outro tipo de empreiteiro, que empreita o trato de tantos mil pés de café ou a carpa do cafezal e, em caso de zonas novas, empreita derrubar e roçar a mata, covear, etc. Para isso contrata o peão e lhe paga por dia (livre) ou desconta a comida.

O empreiteiro de turmas que empreita a derrubada da mata, roçar e covear com turmas de trabalhadores (peões) nas zonas novas nada tem a ver com o empreiteiro individual. Aquele tipo de empreiteiro conhecido no norte do Paraná como gato, pelos passes de mágica que faz para roubar o trabalhador, é um intermediário capitalista do campo, aliado ao latifundiário e ao capital comercial e usurário.

Explora turmas de trabalhadores de 10 até 40 homens, a quem paga salários miseráveis e a quem rouba com o fornecimento de víveres. A figura do empreiteiro das derrubadas das zonas novas é inseparável da figura do peão, que é o verdadeiro assalariado individual, nesse caso.

O empreiteiro desse tipo suga a mais-valia do peão e é daí que provém o seu lucro, com o que poderá chegar a ser sitiante e até fazendeiro rico. Sem dúvida, é um aventureiro que não deixa de ter contradições com o latifundiário que o contrata, mas na maior parte, poderíamos dizer na totalidade das vezes, é um agente do latifundiário, aliciando o peão assalariado para a empreitada estafante de desbravar o terreno, derrubar a mata, preparar as condições para a exploração da futura fazenda.

Isto se fará seja pelo trabalho assalariado, através do semeador, trabalhador por conta do fazendeiro, que ganha salário para semear em cada cova, ou através do formador de café individual, (misto de semeador e formador às vezes) também ganhando salário, e cuja missão é entregar ao fazendeiro o café formado.

O formador de café (individual) não passa de uma espécie de colono adaptado às condições das zonas novas, onde, depois de derrubado o mato, roçado e coveado, é preciso plantar o café.

O formador de café (individual) não é um tipo rural destinado a substituir o colono com o salariato e não se confunde com qualquer dos 2 tipos de empreiteiros já analisados (o individual ou o de turmas).

O formador de café (individual) tem contrato por prazo fixo (4 anos). Ganha em dinheiro de acordo com o contrato, por covas de café, mas sujeito como colono a formas semifeudais de exploração, sugado em sua renda trabalho, obrigado a consertar estradas e a formar pasto sem nada receber para isto, e com um aparente direito a ter criação e mangueirão, direito que jamais lhe é concedido pelo fazendeiro.

Por último, quando o café está formando bem, o fazendeiro tudo faz para jogá-lo fora da terra e o consegue por meio de pirraças ou pela violência, sem aguardar o término do prazo de 4 anos do contrato.

Daí em diante o fazendeiro continuará a explorar o colono ou o empreiteiro individual que venha a substituir o colono no trato e na colheita do café.

O esboço deste quadro é de inestimável valor, porém, para se compreender que a desintegração do regime do colonato e sua passagem ao salariato pela via do empreiteiro não significa a eliminação dos restos feudais e do capital usurário, a liberdade para o trabalhador do campo e o melhoramento de suas condições de vida.

Os fazendeiros realizam esforços desmedidos para fazê-lo crer, mas o aumento do êxodo rural, o crescimento da fome e da miséria no campo são um testemunho em contrário.

É evidente que este caminho não leva à emancipação do colono e apenas modifica a forma de exploração, sem levar a uma profunda modificação nas relações de produção, só possível com a quebra do monopólio da terra.

A evolução do colonato para empreiteiro individual ou para o sistema do empreiteiro com turmas de peões a seu serviço exige outras considerações. O empreiteiro individual é mais “livre” que o colono, é um assalariado desligado dos meios de produção.

Toda a forma de serviço de empreita individual ou da empreita por turmas implica o divórcio do assalariado com os meios de produção, a fim de tornar “livre” sua força de trabalho.

Em face do contrato, das obrigações de caráter semifeudal e dos encargos da família que com ele compartilha dos deveres para com a terra e o senhor da fazenda, tem o colono menos liberdade de escolher o patrão do que o volante, o camarada, o peão, o empreiteiro individual mais habituados a pôr o saco nas costas e a alugar sua força de trabalho onde melhor lhes aprouver.

Isto constitui sensível diferença entre o primeiro e os segundos e dá a estes últimos uma espantosa mobilidade e uma instabilidade jamais vista.

Tudo isso, porém, se pode facilitar a substituição do colono pelo empreiteiro, não determina e não pode determinar o desaparecimento do velho tipo rural do colono, destinado a coexistir com o empreiteiro enquanto existirem zonas novas onde a fertilidade da terra compensar a ausência dos adubos e dos meios mecânicos e fizer esquecer o rigor dos contratos.

Além do mais, o tipo rural do empreiteiro mal começa a desenvolver-se. A maior parte das fazendas de café (88%) continua a ser tocada por colonos e é isso mais uma prova da força dos restos feudais.

Do ponto de vista da análise teórica da renda territorial, o aparecimento do empreiteiro não altera a condição de latifundiário e capitalista do fazendeiro de café. O novo tipo rural do empreiteiro é apenas a mais recente aquisição do latifúndio em aliança com o capitalismo, num país cuja agricultura é ainda um apêndice do imperialismo americano.

Explorando o empreiteiro, o fazendeiro continua a absorver todo o lucro e toda a renda da terra, da renda pré-capitalista à renda capitalista. Quando contrata o empreiteiro individual, o fazendeiro, sem intermediário capitalista, se apropria de toda a renda da terra.

Quando contrata o empreiteiro por turmas, surge um intermediário capitalista, que logo é afastado, assim que termine o serviço empreitado, dispersando-se os peões em busca de novos mercados para a sua força de trabalho.

A exploração por parte do fazendeiro continua então sob as mais variadas formas, não importando se é feita com a utilização de colonos ou outros trabalhadores. Em nada disso se modifica a propriedade da terra, o fazendeiro continua sendo o único apropriador de toda a renda.

Isto se dá também em face de outro tipo de empreiteiro, comum nas zonas novas. Trata-se do empreiteiro formador de café, que não se confunde com o formador de café individual, assalariado, que tem contrato com o fazendeiro no máximo por 4 anos.

O empreiteiro formador de café difere do formador de café individual, por não ser um assalariado como este, cuja condição, como já vimos, mais se aproxima à do colono. Pelo fato de não ser um assalariado, o empreiteiro formador de café também nada tem de parecido com o empreiteiro individual, de quem difere radicalmente.

Entretanto, no que diz respeito ao empreiteiro por turmas, o empreiteiro formador de café tem semelhanças mas apresenta também diferenças radicais. O empreiteiro formador de café tem a seu serviço turmas de peões como o empreiteiro por turmas. Um e outro alugam, portanto, força de trabalho. Um e outro têm que empregar capital. Trata-se de capitalistas do campo. Um e outro têm que manter determinadas relações com o fazendeiro.

Aqui começam as diferenças. O empreiteiro por turmas alicia trabalhadores, recebe do fazendeiro uma determinada quantia em dinheiro pela empreitada que assume. Ele é um agente do fazendeiro, explora os peões, arranca-lhes a mais-valia, tira daí o seu lucro.

Empregando o empreiteiro por turmas, o fazendeiro utiliza um intermediário, uma espécie de funcionário seu, que também tem capital, que também explora através do capital comercial e da usura, através do buteco e do fornecimento.

Isto é uma forma de empregar capital na terra (derrubar o mato, roçar, covear, etc.). O emprego deste capital, com o empreiteiro como intermediário, reverterá mais tarde em forma de renda diferencial e absoluta, de mistura com a renda pré-capitalista, assim que a fazenda começar a produzir para o seu único e exclusivo proprietário – o fazendeiro.

Com o empreiteiro formador de café é diferente. Ele não é um agente do fazendeiro. Ele é um capitalista que recebe a terra do fazendeiro para derrubar, roçar, covear, semear, formar o café, tratar o café até às primeiras colheitas. Para isso o empreiteiro formador de café realiza um contrato por 6 anos com o fazendeiro.

É evidente que se não tivesse capital não poderia fazer este contrato. Com o capital que possui o empreiteiro formador de café paga os salários dos peões e trabalha a terra. Portanto, quem inverte capital na terra é o empreiteiro formador de café, que se comporta como um locatário capitalista, embora sem pagar qualquer aluguel ao fazendeiro durante os 6 anos do contrato.

O fazendeiro, com isto, dispensa o empreiteiro formador de café do aluguel da terra, para que este capital seja diretamente empregado na terra. O fazendeiro não sofre nenhum prejuízo com este sistema, uma vez que, depois de 6 anos, a terra volta às suas mãos com o café plantado, as colheitas anuais e todas as benfeitorias. Quer dizer: depois de 6 anos sem receber aluguéis, o fazendeiro receberá a terra com os aluguéis e o capital empregado, apropriando-se ainda mais de toda a renda.

O empreiteiro formador de café emprega seu capital na terra, contando nos 6 anos de contrato tirar o máximo, isto é, o fruto de 3 colheitas de café (a primeira aos 4 anos, a segunda aos 5 e a terceira aos 6), e a renda e o lucro do trabalho dos peões a quem paga o salário. Todo o interesse do empreiteiro formador de café está na prorrogação dos contratos e luta por isso para que os contratos de 4 anos se estendam a 6.

O fazendeiro procura reduzir o tempo de permanência do empreiteiro formador de café na terra, para começar mais cedo a receber a renda e o capital invertido na terra. Procura, assim, reduzir o número de colheitas que o empreiteiro formador de café reivindica como recompensa do capital empregado, e, nos atuais contratos, encurtados para 4 anos, suprime automaticamente duas colheitas.

Na base das relações entre o dono da terra e o empreiteiro formador de café estão profundas contradições, cujas raízes mergulham no monopólio da terra. O empreiteiro formador de café pode apenas ter como sua a terra num curto espaço de tempo de 6 anos.

Depois disso terá que abandoná-la e recomeçará pelo mesmo caminho em novas terras à espera das derrubadas. Raramente o empreiteiro formador de café alcançará a posse com o fruto das primeiras colheitas do café por ele formado.

Pior, entretanto, é a situação do peão, o verdadeiro criador de toda a riqueza das zonas novas do café, e cuja força de trabalho é a fonte de toda a renda e lucro do latifundiário. O peão, explorado pelo empreiteiro formador de café, vegetará todo o tempo na terra e nem ao menos terá a sensação da posse provisória que o fazendeiro concede ao intermediário capitalista.

Esboçado o quadro da apropriação da renda territorial, capitalista e pré-capitalista, pelo fazendeiro de café, misto de latifundiário e capitalista, podemos passar ao problema da renda obtida do trabalho do proletariado agrícola e do semiproletariado no campo.

II. A Renda da Terra na Cultura da Cana

A usina de açúcar e a fazenda de café, constituindo dois tipos clássicos da penetração do capitalismo no campo (nas condições particulares do desenvolvimento histórico do Brasil) não se confundem. É manifesta a superioridade da usina de açúcar sobre a fazenda de café como empreendimento capitalista.

Esta superioridade advém de que o usineiro não se limita como o fazendeiro de café ao emprego do capital na terra ou nas máquinas e meios que melhoram a terra. O usineiro de açúcar antes de mais nada emprega o seu capital nas máquinas que transformam a cana em açúcar. O usineiro é um industrial do campo, o que não acontece com o fazendeiro de café. Sem dúvida a condição de industrial, como veremos, não lhe tira a de latifundiário, mas sua razão de ser está no capital que emprega nas máquinas, na usina. Nesse sentido, a usina encarna com nitidez a união entre a agricultura e a indústria.

Como empreendimento capitalista a usina exige o trabalhador assalariado, independente dos meios de produção, apto a alugar sua força de trabalho. Trata-se do mecânico, do foguista, do eletricista, do assalariado da moenda e da destilaria, de toda uma legião de operários recrutados dentre os melhores trabalhadores da lavoura ou importados das cidades mais próximas.

Sugando a mais-valia desses operários, o usineiro consegue reunir seus imensos lucros. Até aqui não se trata da renda da terra, e só do lucro industrial. A renda territorial começa a vir para o usineiro quando à usina este acrescenta as enormes plantações de cana de sua propriedade.

A expansão da usina pela terra, visando o plantio da cana para o seu abastecimento, leva-a sobretudo no sul do país à criação de outras lavouras (café, arroz, algodão), sem o que não tiraria o máximo da renda territorial.

O usineiro, sendo ao mesmo tempo um latifundiário, explora em suas terras o colono do café, o arrendatário do algodão e do arroz e nisso não difere do fazendeiro de café ou qualquer outro latifundiário, nem se afasta da regra geral das formas de exploração semifeudais, das limitações de toda a ordem, da manutenção de polícia própria, da utilização do vale e do barracão, meio pelo qual sujeita o trabalhador ao capital usurário e cerceia a circulação do dinheiro.

Vai assim para as mãos do usineiro toda a renda pré-capitalista tal como para o fazendeiro de café. E quando se trata da plantação da cana, as relações econômico-sociais não são de ordem muito diferente. O colono da cana, tal como o colono de café, é um semiproletário amarrado aos contratos, consumindo suas energias para que o usineiro lhe arrebate o trabalho suplementar, a renda-trabalho, a renda-produto, toda a renda pré-capitalista. Suga-lhe também a mais-valia.

Os restantes serviços nas plantações de cana na usina são por meio de empreitada e a figura do empreiteiro é aí comum. Os formadores de cana (como os formadores de milho e arroz), os cortadores de cana, os que realizam serviços de carga, transportes, etc., são empreiteiros individuais, recebem salário por empreitada.

A categoria do empreiteiro é inteiramente identificada à dos tratoristas e dos trabalhadores da usina, assalariados de quem o usineiro rouba a mais-valia, e cujas lutas são desencadeadas em torno de reivindicações específicas do proletariado (salários, férias, etc.).

Isso não exclui que a terra seja entregue em certas plantações ao arrendatário da cana, tipo de pequeno arrendatário a porcentagem, sujeito à exploração da renda-produto. Mas o tipo rural do empreiteiro predomina nas plantações de cana dos usineiros do sul, levando de vencida o colono que em muitas plantações de cana das usinas não mais existe, e tomando o lugar a outros tipos rurais.

O fato de o usineiro ser um empresário agrícola assalariando o braço trabalhador indica que, além do lucro que ele tira do trabalho dos operários da usina, obtém uma renda proveniente do maior ou menor rendimento que o trabalhador agrícola obtém nas terras da usina com o plantio da cana.

Esta é a renda diferencial. Mas, como proprietário da terra monopolizada por ele, o usineiro ainda se apropria de uma parte da mais-valia excedente do lucro médio. É a renda absoluta. Tudo isso deve ser somado à renda pré-capitalista absorvida com a exploração de outros tipos rurais que emprega, como no caso do colono da cana.

Outra maneira característica do usineiro de açúcar se apropriar da renda pré-capitalista, ao contrário do fazendeiro de café que tira esta renda especificamente do colono, está na exploração que faz do fornecedor de cana dependente, sem terra. Ele é um arrendatário da cana, trabalhando na terra da usina, pagando uma renda que no Nordeste corresponde de 15 a 30% da produção bruta de canas.

O usineiro apodera-se da renda-produto proveniente do trabalho suplementar do arrendatário da cana.

Mas o fornecedor de cana poderá ser independente, uma vez que possua terra própria, não pertencente à usina. Nesse caso são inteiramente diversas as relações entre ele e o usineiro.

O fornecedor de cana independente tem transação com o banco, tem crédito, tem que ter capital e em geral pega o maior comerciante para fornecedor de seus trabalhadores, isto é, para fornecer-lhes alimentos, ferramentas, etc.

Às vezes, o fornecedor de cana reside na cidade; outras vezes, é também comerciante; outras vezes ainda, em suas terras, também planta café. Entre os que nela trabalham figuram arrendatários, pagando não raro 50% da produção bruta ao dono da terra, o que corresponde a uma renda tão elevada como a meia.

O fornecedor de cana independente é o capitalista do campo que emprega seu capital na cultura da cana e que arranca do arrendatário a renda-produto ou do trabalhador rural a mais-valia, que lhe faculta a renda diferencial, segundo o maior ou menor rendimento agrícola por alqueire, O fornecedor de cana independente (independente de nome) é um camponês rico (um fazendeiro rico se quisermos) explorando o camponês dependente e o trabalhador agrícola.

No Nordeste e em outras regiões açucareiras do país é um tipo rural importante. Seus interesses estão em choque com os dos usineiros, que o procuram subjugar e explorar.

O fornecedor de cana independente travou a mais extensa e prolongada luta contra o usineiro no Nordeste, mas teve de perder a condição de fornecedor dos próprios engenhos e bangüês. Hoje está rebaixado à condição de fornecedor de cana e nesse sentido se pode dizer que perdeu realmente a antiga independência, agora limitada apenas à posse da terra.

O aparecimento da usina de açúcar, constituindo uma forma de penetração do capitalismo no campo, abalou a antiga classe dos senhores de engenho e bangüeseiros no Nordeste e fendeu com isso a solidez do seu patriarcalismo.

A circunstância de possuir capital e crédito no banco, em nada, porém, consolida as posições desses fornecedores de cana. O usineiro se afigura como a força maior; arrebatou as terras a muitos deles e ainda os comprime e ameaça, fazendo-lhes perigar os restos de independência.

Em seu socorro esses fornecedores de cana contam somente com o Estatuto da Lavoura Canavieira.

Enquanto a tendência da usina é a concentração agrícola-industrial, tendência nítida da penetração capitalista no campo, que assegura a vitória da indústria sobre a agricultura, sem entretanto eliminar os restos feudais, o Estatuto da Lavoura Canavieira se opõe a essa concentração.

Estabelecendo a separação entre a atividade agrícola e a indústria, reservou para os fornecedores de cana independentes um certo número de quotas de fornecimento às usinas, com o objetivo de evitar a expansão da usina sobre a totalidade das terras dos fornecedores, fadados ao desaparecimento.

No jogo das contradições que a usina suscitou no campo, o Estatuto da Lavoura Canavieira desempenha o papel de um instrumento de defesa dos fornecedores de cana, antigos senhores de engenho, numa clara manifestação da força que ainda têm na superestrutura do país os restos das classes dominantes do sistema pré-capitalista.

Criando, porém, o regime de quotas para impedir o aniquilamento desses fornecedores de cana, o Estatuto da Lavoura Canavieira forneceu ao usineiro exatamente a arma de que precisava para aniquilá-los.

É com o cabresto das quotas que o usineiro domina e explora o fornecedor de cana. Mas, ao mesmo tempo, lhe completa a asfixia manejando esta outra arma – a balança, que o rouba no peso e lhe reduz a independência.

Os aspectos dessa luta se complicam com as contradições entre o expansionismo das usinas de açúcar do Sul em luta contra as limitações que favorecem as usinas do Nordeste. Mas passemos de largo sobre essas contradições. Voltemos aos aspectos que interessam no estudo da renda da terra na cultura da cana.

O usineiro apropria-se do lucro e de toda a renda capitalista e pré-capitalista resultante do trabalho dos tipos rurais da cana. O fornecedor de cana dito independente, resto da antiga classe dos senhores de engenhos, fazendeiro rico da cultura de cana, apropria-se de todo o lucro e de toda a renda dos que trabalham em suas terras.

O fornecedor de cana, porém, não tem a usina. Ele é obrigado a fornecer seu produto ao usineiro. O caráter monopolista da usina, a força do capital invertido em suas máquinas, a extensão territorial de sua propriedade a que se incorporam sempre e cada vez mais novas áreas, tudo isso assegura a superioridade da usina sobre o fornecedor de cana neste combate desigual.

É assim que uma parte da renda dos lucros absorvidos pelo formador de cana vai para as mãos do usineiro que, por esta forma, se apodera de uma parte da mais-valia e da renda produzida pelos trabalhadores nas terras do fornecedor.

Quando a última resistência do fornecedor de cana for vencida, já não restará aos trabalhadores nas terras do antigo fornecedor outro recurso senão o da exploração direta pela usina. O monopólio da usina sobre a produção e sobre a terra é um sério fator de encarecimento do produto e de aniquilamento das forças produtivas.

A análise teórica da renda territorial no caso da fazenda de café e da usina de açúcar, servindo para estabelecer pontos de contato e diferenças entre uma e outra, nos leva, entretanto, a mostrar o papel importante da renda pré-capitalista, sobretudo nas fazendas de café, onde a composição orgânica do capital é mais fraca do que nas usinas.

Isso fortalece a convicção de que os restos feudais predominam em nossa economia agrária e encontram sua principal fonte no monopólio da terra, tão fortemente apoiado pelo imperialismo para facilitar seu domínio sobre toda nossa economia e o nosso povo.

Não obstante, já há penetração capitalista no campo, e ela se manifesta na renda absoluta ou diferencial produzida pela exploração da mais-valia do proletariado e semiproletariado rurais.

III. A Renda da Terra na Cultura do Algodão

Vejamos em seguida o que se passa na cultura do algodão, que tipos de renda aí predominam, até onde se estendem os restos feudais, até que ponto existe uma penetração capitalista, até onde o monopólio da terra facilita o domínio do imperialismo.

A cultura do algodão é feita à base do arrendamento da terra, que cria o tipo rural do arrendatário e estabelece na lavoura algodoeira relações econômico-sociais de tipo inteiramente diverso das da fazenda de café ou usinas de açúcar.

O latifundiário se apropria da renda-produto na lavoura do algodão quando em troca de produtos arrenda a sua terra ao pequeno arrendatário, ao arrendatário pobre, que não pode tocar mais de 4 alqueires com a sua família e que não pode contratar nenhum trabalhador para ajudá-lo.

O tipo rural do arrendatário pobre sujeita-se a contratos tão extorsivos quanto os do colono do café. Ele entrega o seu produto suplementar ao latifundiário, a maior parte sob forma de renda-produto, o resto sob a forma de trabalho, renda-trabalho.

Lênin caracteriza a renda-produto dizendo:

“A próxima forma de renda é a renda em espécie (Productenrende) quando o produtor direto produz na terra que ele mesmo explora e dá ao latifundiário o total do produto suplementar em espécie.

O produtor aqui se torna mais independente e obtém a possibilidade de adquirir através de seu trabalho certa quantidade de produtos acima de suas necessidades” (The Development of Capitalism in Russia – International Publishers, Nova York – 1943 – pág. 103).

O arrendatário pobre da lavoura do algodão, incluído nessa categoria de produtor direto que paga ao latifundiário renda-produto em troca da terra, é o tipo de arrendatário a porcentagem.

Mas ele não está excluído de entrar com a renda-trabalho para o latifundiário, isto é, com o trabalho suplementar, acima do que lhe é necessário. É por isso que nos contratos de arrendamento se estabelecem cláusulas tipicamente feudais, como a prestação de uma diária de serviços por alqueire arrendado e isso, sem nenhuma remuneração, para consertar estradas, além da obrigação de plantar capim, fazer aceiros na mata e outros trabalhos gratuitos.

Nesse sentido, a servidão do arrendatário a porcentagem em nada difere daquela do colono e é tão séria que o arrendatário não pode vender seus produtos livremente no mercado; e, não raro, fica sujeito ao regime de cadeado ou correntes nas porteiras e à vigilância dos capangas do latifundiário.

Encontramos nessas terríveis condições do arrendatário a confirmação das palavras de Marx:

“Conquanto a renda-produto seja a forma imperante e mais desenvolvida da renda da terra, estará mais ou menos acompanhada pelos resíduos da forma antiga, isto é, da renda que se exprimirá diretamente em trabalho, ou seja em servidão, tanto faz que o senhor seja o particular ou o Estado”. (O Capital, livro III, Cap. 47, III).

O latifundiário que arrenda sua terra para o plantio do algodão não se limitará a embolsar a renda-produto do arrendatário pobre, a que juntará as sobras da renda-trabalho. Em muitos casos, terá em suas terras colhedores de algodão que receberão salário por este serviço; e, então, se comportará como um capitalista, arrancando mais-valia do proletariado rural e obtendo lucro. Mas fará isto na colheita, quando, então, precisa de assalariados para executar os serviços de que o arrendatário não for capaz de dar conta.

O exemplo típico, entretanto, é o do latifundiário que permanece como tal, vivendo sobretudo da renda-produto do arrendatário. Outras vezes, exigirá dos arrendatários a renda-dinheiro. O arrendamento será pago em dinheiro e não em produto.

Daí surgirá o tipo rural do arrendatário a dinheiro, hoje mais difundido que o arrendatário a porcentagem (2), mas, assim como ele, sujeito toda ordem de restrições feudais e semifeudais, não podendo vender o produto da colheita do algodão senão ao latifundiário em primeiro lugar, sendo obrigado a plantar capim, proibido de derrubar madeira de lei, tolhido da liberdade de plantar, e assim por diante.

As características do arrendatário decorrentes da renda-dinheiro que o latifundiário do algodão apropria permanecem tais e quais Marx as definiu, ao dizer:

“Em vez do produto, o produtor direto tem que pagar aqui ao proprietário da terra (seja este um particular ou o Estado) o preço do mesmo. Já não basta, pois, um excedente do produto em espécie; tem que transformá-lo de sua forma natural em dinheiro.

Se bem que o produtor direto continue agora produzindo pelo menos em grande parte sua própria subsistência, tem que converter uma parte de seu produto em mercadoria e produzi-lo como mercadoria”. (O Capital, livro III, Cap. 47, IV)

Isso dá idéia do caráter mais elevado da renda-dinheiro, que exige a quebra do isolamento do arrendatário em relação ao estado social, e pressupõe um nível alto de troca e de circulação monetária. Entretanto, o fato de a terra constituir um monopólio do latifundiário leva-o a restringir o mercado de que poderia servir-se o arrendatário para trocar sua mercadoria por dinheiro e isso não se dá por acaso.

É que o latifundiário visa ele próprio realizar essas trocas com o arrendatário, pagando-lhe pela mercadoria um preço inferior ao do mercado, com o que aumenta a parte da renda-dinheiro que lhe é devida pelo produtor.

O latifundiário do algodão simboliza o oposto do fazendeiro de café e do usineiro. Enquanto estes encarnam a aliança da terra com o capital e sintetizam, nas condições do nosso desenvolvimento, a fórmula trinitária de Marx, o latifundiário do algodão isola-se na terra e é dela somente que aspira extrair a renda, erguida sobre a fome e a miséria de milhões de arrendatários.

Sua propriedade territorial será a sua fazenda; ele próprio será denominado fazendeiro, mas não haverá equivalência entre uma fazenda de algodão (com o seu fazendeiro) e uma fazenda de café (com o tipo rural do fazendeiro de café).

Tratamos até agora da renda pré-capitalista produzida pelos arrendatários pobres e apropriada pelo latifundiário ou fazendeiro do algodão. Continuemos.

Em determinadas fazendas se fazem contratos de parceria, mas o que aí se denomina parceiro não é, no caso, mais do que o arrendatário a porcentagem ou o arrendatário a dinheiro, produzindo renda-produto ou renda-dinheiro. O verdadeiro tipo rural do parceiro é diferente desses tipos de arrendatários. Um deles é, por exemplo, o que entrega a terça, o terceiro.

Mas ainda aqui se trata da renda-produto O mesmo se dá com o meeiro, que é outro tipo de parceiro. A diferença é que o preparo da terra, os animais, as sementes, o veneno e a colheita são por conta do terceiro. O meeiro recebe a semente e a terra preparada. Mas tanto o arrendatário pobre, quanto o terceiro e o meeiro dão ao fazendeiro a renda-produto.

Às vezes, entre o latifundiário e esses tipos rurais surge um tipo rural intermediário, o arrendatário médio.

O tipo rural do arrendatário médio é menos freqüente. Este tipo corresponde ao daqueles camponeses que, possuindo alguma reserva conseguida com o trabalho de sua família, contratam para trabalhar na terra que arrendam ao latifundiário um ou outro trabalhador ou cedem uma parte de sua terra à meia ou subarrendam.

Surge assim o tipo rural do subarrendatário. Mas o aparecimento de um novo tipo rural na extremidade inferior da escala não significa outra coisa senão que sendo insuficiente o produto suplementar do arrendatário, a ele se junta o do subarrendatário, apropriando-se o latifundiário, então, de toda a renda-produto.

Em qualquer dos casos, seja a terra do latifundiário arrendada pelo arrendatário pobre ou pelo arrendatário médio (que pode arrendar terras acima de 4 alqueires até 10 ou 12 alqueires), o latifundiário luta para que os contratos tenham curta duração (um ano no máximo), enquanto os arrendatários estão sempre a reivindicar a prorrogação dos contratos.

Esta contradição assenta suas raízes em que o arrendatário pobre ou médio sempre emprega trabalho ou capital na terra e que é isso que dá valor ou melhor lhe dá o preço. Quanto mais benfeitorias na terra, tanto mais aumentará seu rendimento, subirá seu preço.

Independente de saber a quem pertence a terra, neste caso, dada a sua maior fertilidade, localização, etc., ela produzirá renda diferencial. Interessa ao arrendatário pobre ou médio ter contratos por muitos anos, ficar o maior tempo possível com a terra arrendada, já que de ano para ano irá colhendo melhores frutos do seu trabalho. Fixado de antemão o preço do arrendamento, ele permaneceria estável durante todo o tempo do contrato, quer se tratasse de pagamento em espécie (renda-produto), quer se tratasse de pagamento em dinheiro (renda-dinheiro).

Todo e qualquer aumento das colheitas resultantes do aumento do rendimento agrícola ou do maior valor do produto seria para o arrendatário. O latifundiário quer exatamente o contrário. Para ele, a vantagem está em renovar contratos de ano em ano, a fim de exigir sempre ao novo arrendatário um preço mais alto pela terra, o que lhe aumenta a renda, pois o preço da terra é renda posta a juros, é renda capitalizada.

Desta contradição, que o latifundiário resolve a seu favor manejando os privilégios do monopólio da terra e mobilizando as instituições jurídicas, surgem os mais sérios conflitos pela posse da terra. É daí que se origina o despejo, categoria da sociedade baseada no monopólio da terra.

O despejo é a maneira violenta que o latifundiário encontra para assegurar em seu benefício a renda capitalizada em constante progressão.

O interesse oposto do arrendatário pode levá-lo reciprocamente à luta violenta contra o despejo, mas se manifesta de modo crescente na aspiração à baixa do arrendamento. Com isso, procura diminuir o produto suplementar exigido pelo fazendeiro.

Até agora, numa constância rigorosa, temos visto que a renda de que se apropria o latifundiário do algodão é toda ela pré-capitalista, o que dá a este tipo de latifundiário uma série de características diferentes daquelas do fazendeiro de café ou do usineiro de açúcar. Isso distancia o latifundiário do algodão de um empresário agrícola e fornece elementos novos para avaliar a penetração capitalista na lavoura algodoeira.

Quanto ao tipo rural do sitiante, também denominado situante, difere do arrendatário porque não paga arrendamento. Ele compra a terra, a maior parte das vezes a prestações.

Se é um pequeno sitiante, seu lote não irá além de 4 alqueires, que é o que ele poderá tocar com sua família. Se é um sitiante médio, seu lote terá entre 4 e 15 alqueires, que é o que ele pode tocar com sua família e mais um ou outro assalariado, parceiros, arrendatários pobres e subarrendatários.

Não pagando arrendamento ao latifundiário e limitando-se suas relações com ele à compra da terra ou ao pagamento de prestações, o sitiante é um proprietário livre, mas só em certo sentido.

Podemos situá-lo na categoria de que fala Marx, ao tratar da propriedade parcelária:

“O lavrador é aqui proprietário livre de seu terreno, que figura como seu principal instrumento de trabalho, imprescindível para a aplicação de seu trabalho e de seu capital. Nesta forma não se paga arrendamento (renda)”. (O Capital, livro III, cap. 47, V).

Mas até onde vai a liberdade do sitiante, proprietário livre terra, que não precisa pagar renda?

Sua liberdade é precária e não apresenta nenhuma segurança ou estabilidade. O latifundiário não renuncia à posse da terra, ainda quando ela é vendida. Levemos em conta que o número dos que possuem pequenos lotes de terra no Brasil (propriedade parcelária) é escasso.

O latifundiário prefere alugar sua terra a vendê-la. Novas parcelas de terra estão sendo sucessivamente incorporadas às grandes áreas dos latifundiários, quer por compra, quer por expropriação e despejo dos pequenos proprietários, cujo número decresce cada vez mais. Podemos dizer que milhões de camponeses não têm terra.

Cerca de 75% das terras cultivadas só o são pelos arrendatários que não têm terras, e entregam a renda, o produto suplementar do seu trabalho, aos latifundiários.

A escassa minoria dos que possuem terra cai assim sob a dependência dos latifundiários. Em primeiro lugar, a base econômica dos proprietários parcelários, sitiantes pequenos e médios, é muito restrita, a começar pela esfera do crédito, dominado pelo capital usurário.. Em segundo lugar, o capital de que poderiam dispor para empregar nos meios de produção é gasto na compra do terreno, entregue, portanto, ao latifundiário.

Ao vender a terra, o latifundiário capitaliza a renda. Ao incorporar novos domínios e novos lotes de terra, o latifundiário reduz a área de terra posta à venda; com isto, aumenta a procura e aumenta o preço, aumenta a possibilidade de elevar a renda capitalizada. Daí por que o latifundiário prefere alugar a terra, aumentando sempre o preço do arrendamento, sem nunca alienar a posse do terreno.

Quando vende a terra (vende sempre as piores terras), ainda assim lhe resta a possibilidade de expulsar o proprietário, despejá-lo logo após as primeiras benfeitorias e quando ele se atrasar nas prestações. Com isso tornará a vender a terra, por preço mais elevado, pois ela já está beneficiada pelo capital e o trabalho do proprietário expulso.

Para os casos em que o proprietário parcelário tenha melhorado suas terras (já pagas), o latifundiário terá o recurso de propor-lhe a compra por um preço abaixo da renda que ela produz. Aos que resistem, não haverá outra, saída senão a defesa a qualquer preço de sua posse, até pela violência, ou então bater em retirada, acossado pelos capangas e pela polícia a serviço do proprietário feudal.

A instituição que resulta de todas essas relações econômico-sociais, na base das quais se encontra a renda territorial que o latifundiário canaliza sem cessar para o seu bolso, denomina-se, grilo, caxixe. Significa, em última análise, o roubo da terra, ou seja o incontrolável crescimento da renda do proprietário feudal e a expropriação interminável, a miséria e a fome dos proprietários parcelários e de toda a massa camponesa.

É nessa instituição que o tipo social do grileiro encontra sua razão de ser, até o dia em que for varrido o monopólio da terra, principal entrave das forças produtivas.

Ainda aqui a renda territorial é absorvida pelo latifundiário, sem que para isso recorra aos métodos capitalistas de exploração. Trata-se da renda territorial obtida por força do predomínio absoluto do monopólio da terra e dos métodos feudais e semifeudais de exploração, conservados religiosamente com a penetração e o domínio do imperialismo no país.

É isso que na cultura do algodão estabelece, ao contrário da usina de açúcar, uma separação rigorosa entre a indústria de beneficiamento do produto e a exploração agrícola.

A primeira, a indústria de beneficiamento do produto tanto quanto a indústria dos subprodutos, conserva-se na mão dos imperialistas americanos (Anderson Clayton e Sanbra(1*)), donos das máquinas, usineiros, industriais do campo, que manejam o capital comercial, monopolizam os produtos industriais destinados à lavoura e absorvem como senhores absolutos toda a matéria-prima.

A segunda, a exploração agrícola, com todos os seus restos feudais e semifeudais, permanece nas mãos do latifundiário. Este possui a terra, mas nada tem a ver com as máquinas.

O estudo da renda territorial na cultura do algodão revela que a penetração capitalista é maior na lavoura da cana e na do café.

O usineiro e o fazendeiro de café desde o primeiro momento, ao lado da renda pré-capitalista, se apropriam do lucro e da renda capitalista, quer sob a forma de renda diferencial, quer sob a forma de renda absoluta.

Não é o que acontece com o fazendeiro de algodão, que prefere entregar suas terras em troca do arrendamento a pequenos arrendatários, quando não adota o sistema da venda de lotes a prestações aos pequenos sitiantes. O proletariado rural na cultura algodoeira cinge-se quase aos colhedores de algodão, e, por isso, como é evidente, o seu mais largo emprego apenas se efetua na época das colheitas. Assim mesmo é na maior parte utilizado pelos arrendatários e outros intermediários da lavoura algodoeira, que pagam a renda da terra ao latifundiário.

Somente agora se começa a falar em substituir o arrendatário pelo assalariado nas fazendas de algodão, mas isso se deve ao temor do latifundiário ante o descontentamento cada vez maior que a alta dos arrendamentos vem provocando.

Além de tudo, o emprego do salariato na cultura algodoeira exige mecanização em larga escala dessa lavoura, o que certamente não será fácil enquanto o algodão brasileiro for concorrente do algodão americano no mercado internacional e o Brasil depender dos Estados Unidos (como depende) para a importação de máquinas e implementos agrícolas.

São mais reduzidas, assim, embora não excluídas, as possibilidades de transformação, por essa via, do latifundiário do algodão num empresário capitalista do campo ou, melhor, da junção da categoria de latifundiário à de empresário capitalista, com o que se apossaria da renda absoluta e da diferencial.

Entretanto, há fatores novos intervindo na lavoura algodoeira e em tais condições que vêm implicando aparecimento e desenvolvimento da renda capitalista. Muitos latifundiários estão passando do sistema de arrendamento a pequenos produtores para o de arrendamento a grandes intermediários.

Esboça-se a tendência para só conceder arrendamentos de 100 alqueires para cima, ao inverso da maioria dos contratos estabelecidos na base de 1 a 4 alqueires (pequenos arrendatários) ou entre 4 e 15 alqueires (arrendatários médios, menos freqüentes).

Sem dúvida, este sistema está levando a criar no campo uma classe de locatários capitalistas, que são os únicos que podem arrendar dos latifundiários lotes de terra de mais de 100 alqueires.

O aparecimento do locatário capitalista, isto é, do arrendatário rico, está condicionado, porém, a mais de um fator, O primeiro deles é a elevada taxa de arrendamento resultante do aumento crescente do preço da terra, que a torna cada vez mais inacessível ao arrendatário pobre.

O segundo fator, que condiciona o aparecimento do arrendatário rico, é o maior emprego de máquinas no campo. Ainda que seja pequeno o emprego de máquinas em nossa agricultura, o mínimo que delas se utilize tem que gerar novas condições.

O emprego de máquinas requer capital, um mercado mais amplo capaz de absorver o maior volume de mercadorias que a máquina proporciona. Só o capitalista está em condições de fazê-lo. Mas a terra está em poder do latifundiário e é preciso alugá-la ou comprá-la.

Se o capitalista compra a terra e continua a utilizar as máquinas, a tirar a renda capitalista dos seus trabalhadores, transforma-se num empresário agrícola, dono de enormes áreas, sem o que o emprego das máquinas não daria resultado. Se aluga a terra, sua condição é a de um arrendatário rico, um locatário capitalista, que entrega ao latifundiário a renda absoluta.

O terceiro fator que condiciona o aparecimento do locatário capitalista é a existência de amplas áreas de terras para serem alugadas. Não é por acaso que o arrendatário rico surge em zonas como a de Barretos, onde o Frigorífico Anglo monopoliza vastas extensões de terra. Suas terras são alugadas (e não vendidas) com o objetivo de restaurar as pastagens, transformando provisoriamente as invernadas em áreas plantadas com algodão, arroz, milho.

Os contratos de arrendamento, concedidos pelo frigorífico, na sua condição de latifundiário, não vão além de 3 e 5 anos. Mas isto é o bastante para renovar as pastagens, e ao fim desse prazo já o plantio do capim-colonião substitui as antigas lavouras.

É um processo mais vantajoso do que o primitivo sistema de roçada. O emprego da máquina nestes vastos campos de pastagem é uma necessidade para o arrendatário rico e uma conseqüência natural da existência das invernadas dos frigoríficos.

Não é outro o motivo por que também a zona pastoril de Barretos se transformou no maior centro de agricultura motomecanizada do país, com a média de um trator para cada 40 alqueires plantados, num total de 20.000 alqueires de área cultivada.

Ainda nesse caso, o arrendatário rico substitui o arrendatário pobre que, em outras zonas pastoris, arrendava dos frigoríficos pequenos lotes de 1 a 4 alqueires para, no fim dos contratos, plantar capim-colonião ou ser despejado.

Isto não quer dizer que o arrendatário rico já esteja predominando sobre o arrendatário pobre, que o trator sobrepuja a enxada e o arado puxado a boi, que a renda capitalista esteja mais difundida que a renda pré-capitalista. Revela apenas uma evolução em determinado sentido, uma tendência que não modifica, entretanto, o caráter da nossa produção agrícola, nem elimina o monopólio da terra e a tremenda sobrecarga dos restos feudais.

Há por isso mesmo necessidade de assinalar que o aparecimento do arrendatário rico não corresponde a um crescimento acelerado do proletariado rural. E fora de dúvida que com as máquinas também se cria um certo proletariado no campo.

Mas isso só poderá ter certa significação se, ao lado do proletariado exigido pelo maneio das máquinas, desenvolver-se a utilização em massa do trabalho assalariado no campo. Não é o que se dá, e tal fenômeno se explica pela sobrevivência do monopólio da terra, que entorpece o desenvolvimento das forças produtivas.

Além do pessoal das máquinas, tratoristas principalmente, os arrendatários ricos, salvo certas exceções, não lançam mão do proletariado para a exploração da terra. Feita a destoca, nivelado e preparado o terreno, o arrendatário rico o entrega ao meeiro.

E à meia que recorre e não ao proletariado rural. Isto estabelece sérias relações de dependência do produtor ao arrendatário rico, sobressaindo a particularidade do meeiro dele receber adiantamentos a juros até de 12% ao ano.

A colheita é dividida ao meio, depois dos descontos feitos pelo locatário capitalista. O trabalho suplementar do meeiro vai assim às mãos do arrendatário rico. O meeiro pode lançar mão de assalariados, ter arrendatários pobres e parceiros trabalhando no seu lote.

Toda a renda pré-capitalista ou produto da mais-valia que chegar às suas mãos passará para o arrendatário rico. Este pagará por sua vez ao latifundiário a renda absoluta, que é o tributo do monopólio da terra.

De qualquer modo é o monopólio da terra que pesa. E de tal modo que os arrendatários ricos que prosperam logo passam a adquirir terras, transformam-se eles também em latifundiários. É o caso, para citar um exemplo, dos irmãos Lemos, arrendatários ricos de Barretos.

Eles arrendam dos frigoríficos quase 2.000 alqueires de invernadas, mas, em virtude dos altos preços dos arrendamentos e da pequena duração dos contratos, encaminharam-se para a compra de vastas extensões de terras em outras zonas.

Preferem, assim, transformar-se em latifundiários e empregar as máquinas em seus próprios latifúndios destocando e preparando as terras para entregar à meia e à parceria.

Isso tudo indica que, embora existindo o arrendatário rico, a renda predominante não é a diferencial, o que é resultado da exploração da terra a ser feita pelo meeiro e não pelo proletariado rural.

Estamos aqui em face de uma classe de locatários capitalistas, mas não em face de uma numerosa classe de trabalhadores, “libertos” dos meios de produção, alugando a sua força de trabalho.

Termina aqui a análise do que há de essencial na renda da terra na cultura algodoeira. As rendas que nela predominam são a renda-dinheiro e a renda-produto. Mas o aparecimento do arrendatário rico leva a que do trabalho da terra se obtenha um excedente da mais-valia sobre a taxa de lucro médio. Surgem a renda absoluta e a diferencial, embora a predominância seja da renda pré-capitalista.

É preciso dizer que nas outras culturas de ciclo anual a situação não é diferente. Aliás, o aparecimento do arrendatário rico, nas condições já examinadas, pagando renda absoluta ao latifundiário, obtendo renda diferencial e lucro, não é exclusivo da lavoura algodoeira. E comum que ele, na mesma terra destocada e nivelada pelo trator, também se dedique a explorar o arroz e o milho, utilizando a meia e a parceria.

Isto se explica pelo fato de a máquina só oferecer vantagem se empregada em vastas extensões de terra, uma vez que os meios de produção são propriedade privada.

Quanto mais a lavoura seja custosa e exija inversão de capital, tanto mais campo haverá para o arrendatário rico. E o que se passa com a cultura do arroz. Quer se trate do plantio no seco, onde o trator prepara a terra em larga escala simultaneamente para o arroz, o algodão e o milho, quer se trate do plantio na várzea, onde predominam as drenagens, as obras de irrigação e outras semelhantes, o empresário agrícola, locatário capitalista, tem sempre mais possibilidade de surgir.

No entanto, arrendando terras dos frigoríficos ou de grandes companhias (donos de latifúndios), o arrendatário rico só em parte utiliza o proletariado rural, para serviços mecanizados, semimecanizados ou à mão (capina, trilhagem, sega, colheita).

É comum arrendatários ricos usarem o sistema da meia e, não raro, a parceria pela terça e pela quarta parte da produção. Em muitas regiões, a cultura do arroz é feita por pequenos arrendatários e subarrendatários que, ao lado dos meeiros, passam então a constituir a maioria dos produtores.

O aspecto geral da cultura do arroz no país não modifica o aspecto da renda territorial, sabido que só uma pequena parte dessa cultura é mecanizada e mesmo assim não exclui o trabalho de produtores não assalariados.

É evidente que, em tais condições, a renda-dinheiro e a renda-produto, como toda a renda pré-capitalista, têm largo curso, sem que por isso, entretanto, se deixe de registrar a existência da renda absoluta e da diferencial.

De qualquer maneira, porém, o latifúndio domina aqui também e o tributo da renda absoluta se torna um peso insuportável e um freio às forças produtivas.

O caminho da criação de uma burguesia rural pela via do arrendatário rico choca-se com o monopólio da terra, que gera a alta dos arrendamentos e o curto prazo dos contratos. Este tipo de burguesia rural evolui para o tipo rural do latifundiário, torna-se capitalista e proprietário da terra, limitando-se a uma débil utilização do proletariado rural, contentando-se com a renda-produto e em seguida com a renda absoluta e a diferencial, sobre o excedente da quota de lucro.

O outro caminho para a criação da burguesia rural é o da posse da terra, em que o camponês rico cultiva o excedente acima das forças dos membros de suas famílias utilizando o trabalho assalariado.

Os empreiteiros formadores de café seguem este caminho, sem conseguir, porém, a posse da terra, que só permanece em suas mãos enquanto dura o contrato (no máximo 6 anos). Entretanto o representante típico da burguesia rural que segue este caminho é o do posseiro ou posseante, de cuja luta pela posse da terra tivemos uma amostra em Porecatu.

O posseiro ou posseante, tipo de camponês rico bem caracterizado, consegue a posse da terra, inicialmente, em geral, nas zonas novas. Realizadas, porém, as benfeitorias terá que defrontar-se com o despejo, a grilagem de terras. Contra ele se voltarão o latifundiário e todo o peso do aparelho de Estado se porventura resistir.

O posseante está destinado a uma luta constante contra o latifundiário e seu complemento, o grileiro. A esperança da posse pacífica da terra o levará a vacilações e concessões nessa luta, mas não conseguirá atingir um pleno desenvolvimento como classe em conseqüência do monopólio da terra.

Quanto à grande massa camponesa, esta terá que vegetar como a grande criadora da renda-dinheiro, da renda-produto e de toda a renda pré-capitalista; irá se diferenciando para a condição de semiproletariado, impossibilitada de chegar à condição de pequeno produtor independente, ou proprietário parcelário.

A massa camponesa Vagueará como uma grande massa expropriada, impelida sem cessar para as cidades e para as novas zonas agrícolas, lutando por um pedaço de terra, mas sempre empurrada para engrossar o proletariado rural.

As contradições entre as forças produtivas e as relações de produção chegaram a um ponto crucial. Elas nos dão a caracterização no Brasil de um desenvolvimento à moda prussiana, sob a ação e a influência do imperialismo. Avança sem dúvida a penetração capitalista, mas os restos feudais vão sendo conservados e o monopólio da terra zelosamente defendido.

Daí o quadro que deparamos: de um lado os latifundiários e os latifundiários-capitalistas, de outro lado a grande massa de arrendatários pobres, os semiproletários e o proletariado rural, toda a massa de camponeses pobres ao lado dos camponeses médios e da burguesia rural em luta pela posse da terra.

De um lado acumula-se a enorme riqueza dos latifundiários e latifundiários-capitalistas; de outro lado, a miséria e a ruína, a fome e a doença de milhões de camponeses sem terra. De um lado, a renda-dinheiro, a renda-produto, a renda-trabalho, toda a renda pré-capitalista e mais a renda absoluta, a renda diferencial, os lucros, tudo isso arrancado do trabalho suplementar e da mais-valia dos pequenos produtores e trabalhadores do campo sem meios de produção. De outro lado, a pobreza absoluta de toda a população que vive no campo.

Há nisso uma profunda contradição e ela assenta, sem dúvida, no monopólio da terra e no imperialismo. Este, por toda a parte, trata de conservar e eternizar (especialmente no campo) as formas pré-capitalistas de exploração, que constituem a base da existência de seus agentes e aliados.

Em tais condições, o estudo da renda da terra nos levará à compreensão da necessidade de abalar ou eliminar o monopólio da terra, o que, ao lado da derrota do imperialismo norte-americano, criará novas condições para o desenvolvimento das forças produtivas.

A eliminação do monopólio da terra deverá ser precedida da abolição das formas de renda pré-capitalista, pelo menos da renda-trabalho e da renda-produto. Isto implica resguardar os empreendimentos industriais do campo, extinguindo, porém, as formas feudais de exploração, estendendo a legislação trabalhista ao campo, separando a usina da terra, retirando aos frigoríficos a posse das invernadas, criando a propriedade parcelária, baixando o arrendamento, prorrogando os contratos de arrendamento, incrementando o crédito agrícola e dando fim ao capital usurário, assegurando a posse da terra ao posseante, acabando com o despejo e a instituição do grilo, empreendendo, enfim, modificações radicais na estrutura agrária.

Fonte: portaldoprofessor.mec.gov.br/novohamburgo.org/radio87fm.com.br/www.marxists.org

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