FARC

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As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, Farc, são o maior grupo rebelde da Colômbia.

Eles foram fundados em 1964 como o braço armado do Partido Comunista e seguem um ideologia marxista-leninista.

Seus principais fundadores eram pequenos agricultores e trabalhadores rurais que se uniram para lutar contra os níveis de escalonamento de desigualdade na Colômbia na época.

Enquanto as Farc tinham alguns grupos urbanos, eles sempre foram uma organização guerrilheira predominantemente rural.

As Farc foram fundadas em uma época de repressão brutal contra qualquer forma de ação considerada subversiva.

A Colômbia tem sido historicamente um país que sofre de elevados níveis de desigualdade, onde vastas áreas de terra são de propriedade de uma pequena elite.

Isto é em parte devido ao fato de que o Estado colombiano vendeu grandes extensões de terra a proprietários privados no final do século 20 19 e início para pagar suas dívidas.

Alguns dos fundadores das Farc haviam estabelecido uma comunidade agrícola na região de Marquetalia, na província central de Tolima.

Inspirado pela revolução cubana na década de 1950, eles exigiram mais direitos e controle sobre a terra.

Mas seus ideais comunistas eram vistos como uma ameaça por grandes proprietários de terras e do Estado, que enviou o Exército para dissolver a comuna, ou República Marquetalia como tinha vindo a ser conhecido.

A maioria de seus combatentes são de comunidades pobres, rurais e incluem homens e mulheres de todas as idades.

Algumas das pessoas que deixaram a Farc falam de serem atraídos pela promessa de aventura e a glória de carregar uma arma.

Analistas acreditam que as Farc estão entre os mais ricos movimentos rebeldes no mundo.

A Colômbia é um dos principais produtores de cocaína e os rebeldes obtém uma grande parte de sua renda do tráfico de drogas ou de cobrança “impostos” sobre aqueles que o fazem.

Eles também têm recorrido a extorsão e seqüestro em troca de resgate para encher seus cofres.

História

farc
FARC

Em 1964, membro do Partido Comunista Colombiano (PCC) Manuel Marulanda trabalhou com Jacobo Arenas para formar as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (ou, em espanhol, Las Fuerzas Armadas Revolucionários da Colômbia, o FARC).

Após dez anos de guerra civil de 1948 a 1958, conhecido como La Violencia, os membros do PCC lideraram grupos de indivíduos, que se sentiam negligenciadas pelo governo colombiano, para resolver por todo o campo e criar suas próprias comunidades.

Marulanda levou um grupo a se estabelecer em Marquetalia, Tolima, com o objetivo de criar uma sociedade na qual as necessidades e preocupações da população rural seria abordado. O grupo de Marulanda mais tarde se tornou o FARC.

Em 27 de maio de 1964, os militares colombianos atacaram Marquetalia e outras comunidades vizinhas. Quarenta e oito guerrilheiros de Marulanda revidaram.

Depois do ataque, em 20 de julho 1964, os guerrilheiros de Marquetalia reuniram-se com outras comunidades, organizada e unificada no que chamaram a Primeira Conferência Guerrilla.

Durante esta conferência, em que cerca de 350 guerrilheiros participaram, eles formalmente declararam-se um grupo guerrilheiro, assumindo o nome do Bloco Sul.

O Bloco Sul chamado para a reforma agrária, melhores condições para aqueles no campo, e prometeram defender as comunidades de seguidores no campo do governo colombiano.

Principalmente um grupo de defesa, o Bloco Sul reuniram-se novamente maio 1966 para a sua segunda Guerrilla Conferência e rebatizou-se as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, as Farc.

Além da mudança de nome das FARC, a segunda conferência marcou também uma mudança na estratégia para o grupo; em vez de apenas defender a população rural de ataques do governo, as Farc começaram a fornecer serviços educacionais e médicas para as comunidades leais, treinando militantes para o combate, e realizar ataques.

Em 1972, Marulanda estabeleceu campos de treino para os guerrilheiros.

Nos primeiros anos das FARC, para pagar os acampamentos e prestação de serviços sociais, as FARC sequestravam para o resgate, visando principalmente políticos e elites.

Além de seqüestro, no final de 1970, as FARC começaram o tráfico de cocaína para financiar suas atividades, uma prática que facilitaram seu rápido crescimento durante os anos 1980.

A riqueza da FARC recém-descoberta, de seqüestros e do tráfico de drogas, e sua prestação de serviços sociais atraiu um grande número de novos membros que tentavam escapar dos crescentes níveis de pobreza na Colômbia.

Em conjunto, o aumento do lucro e novos membros marcaram o início do crescimento exponencial das FARC e aumento no poder.

No entanto, a dependência da FARC no comércio de drogas também prejudicou a sua reputação; relatórios sobre as FARC por parte do governo dos Estados Unidos, o governo colombiano, e fontes de notícias rapidamente começaram a se referir ao grupo como um cartel de drogas e seus líderes como traficantes de drogas.

Em 1982, as FARC celebrou sua Sétima Conferência Guerrilla na qual mudou seu nome para as FARC-EP para Ejército del Pueblo, que significa “Exército Popular”; no entanto, o governo colombiano, o governo dos Estados Unidos, e os meios de comunicação ainda se referem ao grupo como “as FARC.”

Além disso, em 1982, as FARC e o governo colombiano, liderado pelo presidente Belisario Betancur, iniciou negociações de paz para a primeira vez.

Em maio de 1984, a um acordo, o Acordos de Uribe, foi atingido com sucesso e pediu um cessar-fogo bilateral, que durou 1984-1987. [15] político colombiano Ivan Cepeda disse que o Acordos de Uribe permitiria que membros das FARC para começar lentamente a viver legalmente.

Como parte do acordo, as FARC co-fundaram a União Patriótica (UP), um partido político, com o Partido Comunista Colombiano (PCC) em 1985.

A UP conseguiu o sucesso de esquerda sem precedentes nas eleições de 1986, assegurando 350 assentos do conselho local, 9 assentos casa, e 6 cadeiras no Senado.

No entanto, este sucesso rápido foi rapidamente minada por desaparecimentos forçados e assassinatos sistemáticos de líderes pelo paramilitares do exército, de direita e traficantes de drogas.

Os relatórios mostram que, em 1988, entre 200 e 500 UP líderes, incluindo o candidato presidencial UP Jaime Pardo, foram assassinados.

De 1988 a 1992, entre 4.000 e 6.000 UP membros, incluindo um outro candidato presidencial, Bernardo Jaramillo, foram assassinados.

Apesar dos acordos de paz em 1980, táticas e seqüestros violentos das FARC continuaram porque o grupo acredita que as reformas políticas feitas pelo governo não eram suficientes.

Em retaliação à violência contínua das FARC, ricos proprietários de terras, os principais alvos de seqüestros das Farc, grupos militantes formados, tais como a morte para Sequestradores (MAS) e as Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC). Estes grupos alinhados com os militares colombianos na década de 1980 para livrar o país da presença guerrilheira. Grupos paramilitares mataram civis inocentes, mas relataram que eles eram guerrilheiros das FARC ou simpatizantes das FARC, a fim de aparecer como se eles estavam efetivamente mitigando influência da FARC no país. Paramilitares usaram estas táticas da década de 1980 através da década de 2000.

Em 2002, Álvaro Uribe concorreu à presidência, e ganhou, com a promessa de que ele iria combater agressivamente a presença guerrilheira e a atividade no país.

Durante a temporada eleitoral de 2002, as FARC sequestraram a candidata presidencial Ingrid Betancourt, aumentando a motivação política para combater as FARC.

Formação das FARC

As FARC (Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia) constituíram-se oficialmente com esse nome em setembro de 1966. Tratava-se, porém, da oficialização de um processo em curso havia algum tempo. Já em 1961, o Partido Comunista Colombiano, sob cuja égide elas se colocavam, adotou a tese da “combinação de todas as formas de luta”, que implicava o recurso simultâneo à ação política legal e à luta armada. Essa tese definiria sua linha até hoje.

Em 1964, tem lugar o acontecimento que posteriormente será apresentado por elas como fundador das FARC: o ataque do Exército a Marquetalia, de uma zona de “autodefesa” camponesa formada sob a influência dos comunistas no sul de Tolima. A resposta a esse ataque foi a criação de diversos focos de guerrilha naquela zona e nas zonas circunvizinhas que se reuniram no mesmo ano sob a denominação “Bloco Sul”. O nascimento das FARC, portanto, não foi de modo algum uma improvisação.

Na realidade, a formação das FARC só é inteligível à luz de dois dados anteriores. Por um lado, a história da Colômbia foi marcada desde 1920 por intensos conflitos agrários em várias regiões. Criado em 1930, o Partido Comunista neles desempenhou papel considerável e assim obteve bases duradouras numa parte do campesinato. A nova organização, portanto, dispunha de apoios já antigos. Por outro lado, o que é mais importante, a Colômbia saía do episódio de La Violencia – guerra civil que assolou o país a partir de 1946, provocando 200 mil mortes. Durante aqueles anos surgiram grupos armados de inúmeras orientações, alguns muito politizados, outros menos. Entre eles, grupos comunistas que se qualificavam ora como “autodefesas”, ora como “guerrilhas”, que, enquanto combatiam o regime, frequentemente prosseguiam na luta pela terra. A problemática da guerrilha se insere, pois, num contexto bem diferente do de outros países da América Latina.

Deve-se até mesmo acrescentar que a noção de “guerrilha” ali tem outra conotação. De meados do século XIX até o início do século XX, o apelo à ação de “guerrilhas” fez parte do repertório ordinário dos dois partidos tradicionais em sua rivalidade pelo poder. Durante as décadas seguintes, a referência não desapareceu completamente. A contestação social ou política assumia facilmente a forma de guerrilhas locais. Portanto, foi bem natural que La Violencia se manifestasse pela eclosão não coordenada de guerrilhas.

Não pretendemos, porém, fazer da constituição das FARC o coroamento desses diversos fenômenos anteriores. Essa constituição ocorreu numa conjuntura específica, da época imediatamente posterior ao sucesso do movimento castrista, quando em toda a América Latina só ressoavam chamadas de vanguardas a tomar o poder pelas armas. Na própria Colômbia foram criadas quase simultaneamente três organizações “modernas” de guerrilha revolucionária. Para o Partido Comunista Colombiano, a formação das FARC era o modo de marcar presença naquela vasta efervescência de ideias e armas.

Os antecedentes colombianos, contudo, possibilitam compreender que os iniciadores das FARC tinham por que considerar que encontrariam terreno extremamente favorável.

Esses antecedentes também possibilitam aquilatar o caráter am bíguo das FARC no momento em que nasceram. Elas faziam parte da tradição das “guerras civis” colombianas e da contestação violenta da legitimidade do poder, portanto suas raízes estavam vinculadas a um longo período da história da Colômbia; situavam-se na continuidade dos conflitos agrários, portanto, num período mais recente da história; remetiam à experiência recente de La Violencia, isto é, a uma memória ime diata e, por fim, inseriam-se na experiência contemporânea do radicalismo revolucionário anti-imperialista. Logo, eram ao mesmo tempo “tradicionais” e “modernas”. Estavam impregnadas da sociedade rural e de reivindicações campesinas e, ao mesmo tempo contidas na efervescência das concepções emancipadoras, mas também estavam subordinadas a um partido comunista vinculado à visão “clássica” da revolução, em que o proletariado desempenha o papel principal.

Movimentos agrários e zonas de antigaimplantação comunista

Na virada do século XIX para o XX, grande parte do território colombiano era constituída por terras livres ou públicas (baldías) com exceção de alguns setores dos Andes, nos quais o latifúndio tradicional estava estabelecido ao lado de um campesinato pobre. Grande parte da his tória rural da Colômbia no século XX gira ao redor da ocupação e da apropriação das terras ali situadas. O processo está longe de terminar, pois continua a ocorrer em certas zonas pouco povoadas, como as imensas planícies amazônicas.

O Estado só excepcionalmente tentou organizar as ondas de ocupação; frequentemente procedeu com atraso à regularização da propriedade nas terras ocupadas. Fortalecida por sua influência política sobre as autoridades locais ou nacionais, certa minoria conseguiu com frequência a atribuição de vastos domínios, sem se preocupar necessariamente em torná-los produtivos, limitando-se à prática da pecuária extensiva. Foi o que ocorreu em regiões inteiras como o vale do Magdalena – principal artéria fluvial do país –, e os departamentos da costa do Atlântico. Essas regiões nem sempre estavam desocupadas, mas os beneficiários dessas apropriações não hesitavam em desalojar frequentemente os pequenos camponeses ali instalados que, no entanto, não contavam com títulos de propriedade ou eram incapazes de fazê-los lavrar.

Disso só podiam resultar conflitos e litígios.

A expansão da economia cafeeira do fim do século XIX e início do XX exacerbou ainda mais esses conflitos. Enquanto na região antio-quiana essa expansão se efetuava em grande medida com base em pequenas e médias propriedades rurais, o mesmo não ocorria em Cundi-namarca e no sul de Tolima.

Lá prevalecia a mesma dinâmica, mas com modalidades ainda mais brutais: a formação de grandes latifúndios, baseada na posse frequentemente arbitrária da terra e nas práticas de sujeição ou expulsão dos numerosos camponeses que se haviam fixado ali e pretendiam cultivar café por conta própria. A resistência deles traduzia-se em vigoroso movimento agrário. Tal movimento foi suficientemente poderoso para provocar, por volta de 1930, a desagregação de vários daqueles grandes latifúndios e para incitar o governo a adotar em 1936 uma lei de reforma agrária que, na falta de efeitos concretos, teve um alcance simbólico considerável.

Diversas organizações sociais e políticas tentaram cooptar essa resistência em seu próprio benefício. Criaram-se ligas e sindicatos camponeses. O líder político Jorge Eliécer Gaitán, então à frente de uma dissidência do Partido Liberal (Unión Nacional Izquierdista Revolucionaria – UNIR), lá exerceu grande influência.

Diversos líderes camponeses regionais de orientação socialista obtiveram forte prestígio. Por fim, o Partido Comunista, fundado em 1930, começou a ter presença importante, a tal ponto que aquela região se converteria num de seus baluartes camponeses mais sólidos; algumas zonas de população indígena, ao sul de Tolima, Huila e Cauca, que enfrentavam o mesmo problema de açambarcamento das terras pelos grandes proprietários, constituíram outro baluarte para o Partido Comunista.

Zonas como Viotá e Sumapaz, em Cundinamarca, como Chaparral no sul de Tolima, se tornariam famosas como centros de uma resistência campesina orquestrada pelos próprios comunistas ou por dirigentes camponeses próximos ao partido.

Essa resistência, na época, estava longe de ser sempre revolucionária: visava ao reconhecimento dos direitos campesinos e a frear o processo de concentração da terra.

De 1936 a 1948, o Partido Comunista, aliás, tinha uma linha das mais moderadas: em muitos aspectos, mostrava-se como uma fração do Partido Liberal e, nos períodos de eleições, este último continuava carreando a simpatia de grande parte da população daquelas zonas.

Muitas zonas marcadas pelas lutas agrárias, porém, forneceriam anos depois algumas das bases sociais das FARC. Para isso, contribuiriam tanto a experiência das organizações agrárias quanto a sociabilidade desenvolvida pelas redes comunistas.

Gaitán, a mobilização popular e sua frustração

Na memória coletiva, contudo, um acontecimento preciso constituiu o ponto de partida dos fenômenos de violência e formação de grupos armados: o assassinato de Jorge Eliécer Gaitán em 9 de abril de 1948.

Depois de contribuir para a formação de organizações camponesas nos anos 1930, a partir de 1945 Gaitán provocou uma mobilização populista sem precedentes. Afirmando situar-se além da oposição entre os dois partidos tradicionais, ele inflamou grandes multidões urbanas com uma retórica “antioligárquica” no estilo de Perón. Tornando-se, depois de uma derrota na eleição presidencial de 1946, o líder indiscutível do Partido Liberal, parecia seguro que chegaria à presidência em 1950. Seu assassinato provocou uma comoção que se traduziu num motim de vários dias em Bogotá, conhecido como Bogotazo, durante o qual houve centenas de mortos e o centro histórico da cidade foi em grande parte destruído. Na província, o choque manifestou-se na implantação mais ou menos fugaz de “juntas revolucionárias”.

A aparência irresistível do movimento populista semeara nas elites o medo dos dois partidos. O motim deu-lhes mais ainda a impressão de terem descoberto o rosto da “barbárie popular”. As massas, por sua vez, não duvidavam de que a “oligarquia” era responsável pelo assassinato. O medo de uns e a frustração de outros só acentuaram o clima de polarização social. Esse clima seria o pano de fundo para fenômenos de violência. A repressão abateu-se sobre os sindicatos e outras organizações urbanas formados a partir de 1930, que foram definitivamente destruídos. Na ausência de um líder que assumisse o lugar de Gaitán, a mobilização populista se desmantelou. O Partido Conservador aliou-se a um dirigente, Laureano Gómez, admirador de Franco e feroz detrator da democracia liberal. Levado à presidência em 1950, seu projeto era instaurar um Estado corporativista e, para além disso, uma ordem social baseada num catolicismo fundamentalista.

Destruída nas cidades, a contestação transferiu-se para a região rural na forma de diversos grupos armados. Aliás, no Programa Agráriodivulgado em 1964, os guerrilheiros que formariam o núcleo das FARC afirmavam que “o movimento revolucionário” decorria dos acontecimentos de 1948.

Se o 9 de abril continua sendo uma data mítica, é porque para muitos colombianos ela marca o momento de guinada, em que a modernização iniciada havia duas décadas foi interrompida, e uma história que parecia marcada pelo selo do progresso passou a parecer marcada pelo fracasso e pela regressão.

A experiência de La Violencia

Aquilo que é chamado La Violencia constitui na realidade, mais que o assassinato de Gaitán, é a experiência que alimenta a memória coletiva de muitos colombianos. Isso não chega a ser espantoso, porque o conjunto de fenômenos que a caracterizaram durante cerca de quinze anos se fecha com um saldo de 200 mil mortos, inúmeras migrações populacionais e, sobretudo, atrocidades comparáveis às da Guerra Civil Espanhola.

Trata-se realmente de um conjunto de fenômenos. O antagonismo político entre conservadores e liberais foi a princípio seu desencadeador — isso antes mesmo da morte de Gaitán — e continuará a ser um de seus motores ao longo do episódio. A partir de 1948-1950, associaram-se a esse fato a dimensão da contestação social, por um lado, e da reação das classes dirigentes, por outro. À medida que a violência se generalizava em muitas zonas rurais, os conflitos agrários cresciam e a formação dos primeiros grupos guerrilheiros comunistas foi uma de suas manifestações. Na última fase, houve a justaposição de uma resistência agrária frequentemente radicalizada, de um banditismo social de dimensões inéditas e da ação de aproveitadores de diversos setores para acumular bens, rendimentos e influência.

Em muitos aspectos, La Violencia foi uma guerra civil, pois, por um motivo ou outro, toda a população se envolveu no conflito entre os dois partidos.

No entanto, foi uma guerra civil fragmentada, sem fronts precisos: sem dúvida a repressão realizada pelo regime conservador, pela polícia e pelo Exército lhe deu um mínimo de unidade, mas ela se refratou por teatros dispersos, em alguns departamentos e povoados rurais. As atrocidades que lhe deram especificidade decorreram em grande par te das relações de proximidade. É verdade que, também nesse caso, o fanatismo ligado às identificações partidárias conferiu certa coerência aos confrontos, com os conservadores brandindo as imagens da Virgem e de Cristo-Rei em seus massacres, os liberais destruindo, em contrapartida, vários símbolos religiosos, enquanto o furor no ataque aos corpos, sua crucificação e o modo como eram despedaçados consti tuíam encenações de sacrilégio das relações com o sagrado.

Contudo a maioria desses atos ocorreu em teatros locais e foi obra de habitantes de localidades vizinhas: medo, ódio e desejo de vingança eram os sentimentos que os incitavam a recorrer a tais atos de destruição recíproca.

Foi nesse contexto que surgiram inúmeros grupos armados. Por um lado, os grupos conservadores, assassinos pagos por políticos conservadores, entre os quais aqueles que seriam conhecidos com o nome de pájaros (pássaros) no departamento de Valle del Cauca e em outros departamentos produtores de café. Por outro, as guerrilhas formadas em quase todo o país.

As mais importantes dessas guerrilhas eram as formadas em nome do Partido Liberal. Surgiram em diversas zonas do país.

Entre elas, as organizadas nos Llanos orientais: algumas vezes, entraram em confronto direto com o Exército e chegaram a dominar a região. Sua reputação decorria sobretudo do fato de que em 1952 promulgaram “leis” dos Llanos referentes ao estatuto da propriedade da terra. As guerrilhas “comunistas” só aos poucos se distinguiram delas. O próprio Manuel Marulanda começou a carreira numa guerrilha liberal do sul de Tolima, antes de juntar-se às guerrilhas comunistas.

Estas últimas, aliás, tinham poucas relações com a direção do Partido Comunista como tal, partido muito fraco que, ademais, perdera crédito por conduzir durante muito tempo uma campanha contra Gaitán, que ele considerava fascistizante.

As guerrilhas formaram-se espontaneamente naquelas zonas marcadas pelos conflitos agrários antigos e já impregnadas pela sociabilidade comunista. O partido estava longe de nelas depositar confiança cega. Durante um congresso realizado em 1952, ele estimou que “a extensão e o alcance da luta de guerrilhas foram exagerados por elementos aventureiros”, e que a Colômbia ainda estava longe de uma “situação revolucionária”. Era um modo de tentar lembrar sua supremacia sobre os focos de guerrilha camponesa.

A multiplicação das guerrilhas de diversas tendências comprova, em todo caso, a importância da resistência ao regime. No entanto, ficaram como iniciativas principalmente locais, e não chegaram a uma coordenação de conjunto, a despeito de algumas tentativas nesse sentido. Em 1952, os comunistas organizaram a chamada Conferência de Boyacá para superar essa dispersão, mas ela reuniu poucos grupos e não teve repercussão. De resto, entre comunistas e liberais as tensões eram cada vez mais agudas. Eram perceptíveis já em 1951 e se acentuaram depois, até darem ensejo a confrontos prolongados entre os grupos liberais, denominados como limpios (puros) e os grupos comunistas, denominados comunes (comunas).

Os guerrilheiros ligados ao Partido Liberal, porém, proclamavam-se “revolucionários” quase com a mesma frequência que os comunistas. O termo conservou a acepção que tinha no século XIX, a derrubada pelas armas do regime estabelecido. Para a maioria dos combatentes, o objetivo era pôr fim ao governo de Laureano Gómez; e os que visavam realmente a uma transformação das estruturas sociais eram minoria, inclusive nas fileiras comunistas. Prova disso é que em 1953, quando, impelido pela maioria das elites dos dois partidos tradicionais e por opinião quase unânime, o general Rojas Pinilla tomou o poder e ofereceu anistia aos guerrilheiros. Quase a totalidade deles decidiu pela desmobilização, ainda que muitos, especialmente os comunistas, conservassem suas armas. Se o conflito se reacendeu já em 1955 com as guerrilhas comunistas, foi porque o general Rojas Pinilla se mostrou decidido a liquidar as zonas de autodefesa por elas constituídas nos feudos comunistas e a mobilização agrária decorrente. Começou assim uma nova fase de guerra que atingiu mais uma vez o sul de Tolima e o sul de Cundinamarca. Essa fase foi marcada por ações muito duras do Exército, cujos bombardeios atingiam os civis. Deu ensejo àquilo que se tornaria fato recorrente, a migração de habitantes para zonas de refúgio sob a égide das guerrilhas. Nesse sentido, ela foi ainda mais determinante que a fase anterior para fortalecer entre certos setores do campesinato o sentimento de que só as guerrilhas comunistas eram capazes de lhes dar proteção perante as elites dirigentes, políticos e grandes proprietários, que recusavam qual quer ideia de mudança no campo e sempre se mostravam prontos a recorrer à força para obter a submissão dos que reivindicavam tal mudança.

O ataque às zonas de autodefesa comunistas e a resistência da resposta não foram os únicos componentes dessa nova fase de violência.

Desde o início da década de 1950, a violência também afetara as zonas cafeeiras mais recentes, situadas mais a leste, ao norte do Valle del Cauca, em Caldas e no sul de Antioquia. Ali, as guerrilhas haviam conquistado menor amplitude, mas os antagonismos políticos se combinavam a fatores econômicos associados à captação dos rendimentos do café, provocando também muitas atrocidades. Na nova fase, somou-se o surto de um banditismo meio social, meio político, às vezes subordinado aos dirigentes locais, às vezes independente, mas que se manteria e semearia terror durante muito tempo. Grande número de antigos grupos conservadores e liberais fazia parte dele, os quais eram movidos mui tas vezes pe lo desejo de vingança. Seus crimes, mas às vezes também seu comportamento de rebeldes sociais, valeram a alguns de seus chefes fama regional e até nacional. Essa última fase prolongou-se até o início da década de 1960, quando os dois partidos concluíram um acordo de reconciliação.

A importância do banditismo e dos atos de vingança na última fase da violência não manifesta a degradação do conflito político inicial: para começar, este se manifestou por meio de uma mistura de ações heteróclitas e fragmentadas. O Estado, especialmente no governo de Laureano Gómez, estava plenamente implicado nisso, mas a privatização da violência por intermédio de grupos locais opostos foi o que provocou sua refração na sociedade.

Cabe ressaltar novamente o que fez de La Violencia um fenômeno de conjunto. Em primeiro lugar, sua atrocidade. Foi uma sucessão de atrocidades, que, em razão do papel da religião, frequentemente tiveram cunho de sacrilégio. Isso ficaria na memória de muitos colombianos.

Quanto ao resto, a “violência” é, antes de tudo, uma soma de acontecimentos dispersos, a desenrolar-se em microespaços. Por isso, ela não é facilmente passível de narração numa história global. As experiências individuais só parcial e dificilmente se inserem numa história coletiva que não atende a um critério geral “amigo-inimigo” nem a referenciais temporais precisos. Além de memória das atrocidades, logo se tem aquilo que passa a ser a memória de um fenômeno quase sem história, sem origem e sem fim. Em suma, um fenômeno traumático fadado à repetição.

Fonte: www.bbc.com/web.stanford.edu/www.plataformademocratica.org

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